Por quê??? Tenho certeza de que se trata de uma brincadeira. Preciso acreditar nisso!!! Assim que saiu a divulgação dos resultados do Enem, a mídia tratou de gritar aos quatros cantos que, dentre os 6,2 milhões de candidatos que realizaram a prova, em torno de 529 mil obtiveram nota zero. Evidentemente, como sempre, o resultado, por muitos, foi atribuído à suposta má qualidade da escola pública brasileira, assim como ao suposto despreparo dos professores. Como professor de Língua Portuguesa, estudei o processo de avaliação do ENEM – diferentemente dos jornalistas que cobrem o assunto – e vou tentar trazer um pouco de lucidez a essa questão. 1. Tirar nota zero não é sinônimo de não saber escrever. Nota zero é decorrência de, por algum motivo, o candidato descumprir a proposta. Eis os motivos para nota zero no caso do ENEM: a) Fuga ao tema: esse foi o principal motivo do meio milhão de zeros. O tema era “A PUBLICIDADE INFANTIL EM QUESTÃO NO BRASIL”, portanto, não adiantaria fazer um excelente texto sobre o trabalho infantil, sobre a pedofilia ou sobre a violência contra a criança. Por mais bem escrito que estivesse, seria nota zero. a) Escrever outro gênero textual que não fosse uma redação dissertativo-argumentativa: se o candidato fosse um poeta, por exemplo, e escrevesse um poema belíssimo sobre o assunto, uma verdadeira obra de arte, mesmo assim, receberia nota zero, pois só podem ser avaliadas redações dissertativo-argumentativas, ou seja, um texto que apresente e defenda um ponto de vista sobre o tema proposto, por meio de argumentos, com uma estrutura formada por proposição, argumentação e conclusão. É muito comum o candidato escrever um texto eminentemente narrativo, o que o elimina do processo, independentemente da qualidade da narração. c) Texto insuficiente: o ENEM ainda aceita textos curtos, a partir de 8 linhas (acredito que, no futuro, isso mude!). Ainda assim, alguns candidatos escrevem menos que isso e são eliminados, independentemente da qualidade da escrita. Isso se deve – ao contrário do que alguns podem pensar – não meramente à incompetência do candidato, mas ao nervosismo ou ao mau planejamento do tempo (é uma péssima ideia deixar a redação para o final!), embora também à pouca qualificação do candidato em alguns casos. d) Cópia do texto motivador: alguns candidatos, por má intenção (ou ingenuidade mesmo), utilizam cópias dos textos motivadores na redação, o que os desclassifica do processo, mesmo que as partes não copiadas estejam bem escritas. Quando isso ocorre, não é possível medir se o candidato sabe ou não escrever, bem ou mal, pois o texto apresentado não é dele. O erro não foi de conhecimento, mas de conduta. e) Fere direitos humanos: o ENEM não aceita candidatos que escrevam contra os direitos humanos, mesmo que quase toda a redação seja de excelente nível, totalmente bem escrita. Por exemplo, se, em determinado momento, o candidato escreve que, por algum motivo, alguém deva ser punido com algum tipo de tortura ou pena de morte, a redação será zerada. f) Parte desconectada: em razão das ocorrências com a redação que falava da receita de miojo, do hino de sei lá que time, etc., ocorridas no ano passado, houve esse acréscimo nas situações que levam à nota zero no ENEM. Essa regra é razoavelmente nova, pois quase nenhum vestibular considerava isso, já que todos os processos de seleção partem do princípio da boa-fé do candidato. Esse princípio precisou ser rompido não pela desqualificação do ENEM, mas pela má-fé de alguns pouquíssimos candidatos. Muitas vezes, o estudante sai do assunto por “se perder” no texto, sem necessariamente ter desejado ridicularizar a prova. Por isso, não era necessário excluí-lo do processo. Agora é. Neste ano, novamente, houve muitos casos de engraçadinhos. Foram excluídos 3.362. Como sempre estamos sujeitos a erro humano (ou mesmo, na ingenuidade, o avaliador deliberadamente desconsidera a parte desconectada, pois acha que não tenha sido por mal), este ano, vi que um moleque, que queria muito aparecer, escapou do zero injustamente. Podem ainda aparecer outros casos. No entanto, a grande maioria foi punida, sem dúvidas. g) Outros motivos: sempre por vontade do candidato em ser desclassificado, por exemplo, fazer um desenho no lugar de uma redação. Portanto, como dito acima, nota zero NÃO está relacionada à qualidade do ensino. Quando o sujeito tira nota zero, não é possível saber se ele aprendeu ou não algo na escola. Muitas vezes, dá para imaginar que ele não aprendeu nada na vida, pois tenta desqualificar um processo sério apenas para aparecer na mídia. (...) Por fim, a mídia está desviando o real motivo de a maioria dos candidatos que receberam a nota zero: o tema. O problema é que o tema deste ano mexeu em um dos calcanhares de Aquiles dos poderosos da mídia: a reflexão sobre a publicidade infantil no Brasil. O tema é pouco discutido na sociedade, pois quem promove os espaços midiáticos de debate tem sistematicamente silenciado sobre esse assunto. O ENEM acertou na escolha do tema, mas, mesmo assim, a mídia não coloca isso em discussão e prefere acusar nosso sistema de ensino. Por que será? *Cassiano Ricardo Haag é professor de Língua Portuguesa, doutorando em Linguística Aplicada pela UNISINOS e colaborou para Pragmatismo Político. A redação do Enem será corrigida por dois especialistas, de forma independente. Eles darão uma nota de zero a 200 para cada uma das cinco competências analisadas, de forma que a nota total pode chegar a 1.000. Nesta primeira situação, a diferença entre as dadas pelo corretor não são maiores que 100. Neste caso, não haverá nova correção e a nota final será a média aritmética das dos dois corretores A redação do Enem será corrigida por dois especialistas, de forma independente. Eles darão uma nota de zero a 200 para cada uma das cinco competências analisadas, de forma que a nota total pode chegar a 1.000. Nesta primeira situação, a diferença entre as dadas pelo corretor não são maiores que 100. Neste caso, não haverá nova correção e a nota final será a média aritmética das dos dois corretores Já neste terceiro exemplo, houve uma diferença maior que 100 pontos entre os dois primeiros corretores e o terceiro também deu uma nota discrepante. Neste caso, a diferença da primeira para a terceira nota foi de 160 pontos e a entre a segunda e terceira, também. Se isso acontecer, a redação vai para uma banca de avaliadores, que determina a nota final Neste caso, o terceiro avaliador também deu uma nota muito discrepante, bastante superior às duas primeiras. Novamente, a redação segue para a banca avaliadora, que vai dar a nota final Este é um caso de discrepância em uma das competências. As competências são os "requisitos" que o candidato precisa cumprir na redação. Cada uma das cinco vale 200 pontos, formando a nota final 1.000. Neste exemplo, o corretor 1 deu nota 160 na primeira competência e o segundo, 40. Como a diferença é superior a 80 pontos, a prova segue para um terceiro corretor, A nota final do estudante será a média aritmética entre a menção do terceiro corretor e a nota dos dos primeiros corretores que mais se aproximar dela http://educacao.uol.com.br/album/2014/10/27/veja-como-sera-a-correcao-da-redacao-do-enem-2014.htm#fotoNav=1 COMPETÊNCIAS DA REDAÇÃO Competência I: Demonstrar domínio da norma padrão da língua escrita. Competência II: Compreender a proposta de redação e aplicar conceitos das várias áreas de conhecimento para desenvolver o tema, dentro dos limites estruturais do texto dissertativo-argumentativo. Competência III: Selecionar, relacionar, organizar e interpretar informações, fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista. Competência IV: Demonstrar conhecimento dos mecanismos linguísticos necessários para a construção da argumentação. Competência V: Elaborar proposta de intervenção para o problema abordado, respeitando os direitos humanos. http://sensacionalista.uol.com.br/2015/01/14/aluno-nota-zero-em-redacao-do-enem-desabafa-no-facebook-ingustica-o-k-fiserao/