CEENSP:
Privacidade, dados pessoais e
dados corporais na sociedade da
tecnologia da informação
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
11 de setembro de 2013
CONTEXTO POLÍTICO, ÉTICO, ECONÔMICO, SOCIAL,
CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO
11 de setembro de 2001
New York
Ameaça à Liberdade:
respeito à autonomia do
indivíduo e da coletividade
“GUERRA AO TERROR” E THE FIVE EYES ALLIANCE:
USA, CANADA, INGLATERRA, AUSTRÁLIA E NOVA ZELÂNDIA
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
1995
Irwin Winkler
Programadora de computadores recebe um software ao qual
não deveria ter acesso, passa a ser perseguida por empresa
de informática. Ela tem sua vida apagada e sua identidade
roubada. O que ela descobriu?
A empresa do software de segurança vendido ao governo era
a mesma que produzia ataques cibernéticos e chantageava os
gestores para efetivarem o contrato nos moldes que desejava.
Curso para Conselheiros Nacionais e Estaduais: Sessão Pipoca
“A Rede é a camisinha definitiva. Ninguém mais faz sexo.
Ninguém mais sai de casa”. O significado das TI nas nossas
vidas. (Impactos nas relações sociais e culturais)
Processos de trabalho – home office
Vulnerabilidade à invasão nas informações de saúde de uma
pessoa, é possível no SUS? (Vide matéria do Fantástico)
Você considera o tema do filme ficção científica ou alerta?
Como a sociedade pode lidar com a situação apresentada no filme?
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
1997
Andrew Niccol
Mostra uma sociedade em que o Estado tem controle
sobre a qualidade genética das pessoas criando novas
espécies de castas e divisões sociais, legitimadas pela
ciência.
Aos pais que desejam ter filhos é dada a oportunidade
de escolher e manipular a interação entre seus
gametas, para gerarem filhos com a melhor
combinação de qualidade genética possível.
Esse procedimento acaba criando uma distinção de
quem está mais apto para fazer o que na sociedade:
Válido ou Não-válido a partir do currículo genético.
Um Não-Válido deseja viajar para as estrelas e com
esforço e corrupção do sistema, tenta superar os
limites impostos ao seu destino.
Não existe mecanismo de segurança 100% garantido!
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
2005
Fernando Meirelles
A esposa foi assassinada por estar em uma
investigação sigilosa sobre conspiração
internacional envolvendo governos e
multinacionais do setor farmacêutico, com
testes de medicamentos em seres humanos.
Sob o pretexto de ajudar a prevenir a
disseminação da AIDS e distribuir
gratuitamente medicamentos para seu
tratamento no Quênia, grande empresa
testava novo medicamento contra a
tuberculose e ocultava, pela manipulação dos
testes, seus severos efeitos colaterais.
Sociedade capitalista:
não há “almoço de graça” na relação entre o público e o privado!
Quais são os limites éticos entre a busca de avanços da C&T e
a Dignidade Humana?
ABRASCO: Abaixo-assinado contra a rede McDonalds ser “Amiga da Saúde”
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
2002
Steven Spielberg
A Divisão Pré-Crime conseguiu acabar com
os assassinatos e o culpado é punido antes
que o crime seja cometido: Software de
Segurança!
Quando o Sistema informa ao personagem
principal que ele matará um desconhecido
em menos de trinta e seis horas: A confiança
que tinha no sistema fica abalada.
Todos os policiais que trabalhavam com ele
tentam capturá-lo. Ao tentar provar sua
inocência, ele descobre diversas fraudes no
sistema e uma delas é que os dirigentes da
empresa do software tem o poder de mudar
/ manipular as informações e com isso
chantagear e alterar o destino das pessoas.
A confiança no status quo fica abalada só quando nos prejudica
pessoalmente?
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
Há um CONTEXTO, determinado historicamente, de ameaças à privacidade
e ao uso de dados pessoais e corporais na sociedade da TI que envolve
questões de alta complexidade:
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Sociedade capitalista global
“Guerra ao Terror” e The Five Eyes Alliance
Velocidade intensa no desenvolvimento da Ciência e Tecnologia
Constatação: Não existe mecanismo de segurança 100% garantido!
Subordinação de políticas públicas a interesses da fração hegemônica
do capital em sua reprodução.
Incipiente debate político na sociedade.
Confluência de interesses entre o Complexo Econômico Industrial da
Saúde e o Complexo Econômico Industrial de TI e Telecom na Saúde.
“As articulações entre público e privado já não representam
enfrentamentos de interesses, representam uma canalização dos
interesses privados para o interior de um sistema público que se fragiliza,
por isso mesmo, cada vez mais. Hoje, ninguém quer acabar com o SUS,
todos querem fortalecê-lo para tirar dele o maior proveito, sejam eles
grupos empresariais, industriais, seguros, corporações, políticos, etc.”
(Fleury, TESES – CEBES, 2011:p 5)
NESTE CONTEXTO
Qual o papel do Estado na relação público – privado?
Qual o significado da Democracia no Estado Panóptico e do Big Data?
Qual o papel do indivíduo na Sociedade Panóptica e do Big Data?
Só atuamos e perdemos a ‘confiança’ no Sistema quando nos afeta e
prejudica pessoalmente ou aos nossos familiares?
Quais são os limites entre os interesses da esfera pública e os da esfera
privada da vida?
Quem e Como se definem os limites entre estes interesses?
As atuais respostas a estas questões vis a vis interesses políticos,
econômicos, sociais, científicos, tecnológicos, culturais e simbólicos
tecem a contextura da Governança da ITIS, nas três esferas de governo,
com reflexos sobre a privacidade e o uso de dados pessoais e corporais.
Quais são os limites entre interesses da esfera pública e privada?
DIMENSÃO PÚBLICA: Deve prevalecer os interesses da coletividade,
do dever do Estado em garantir saúde universal, o que demanda
mecanismos de gestão e o desenvolvimento de C & T em Saúde cada
vez mais complexos.
DIMENSÃO PRIVADA: Deve prevalecer o direito do indivíduo de ter
preservada sua privacidade e a confidencialidade dos dados sobre
sua Saúde e o Estado tem a obrigação de garantir esta segurança,
através de Políticas competentes de segurança da informação.
 Até onde vai o direito do Estado e da Ciência em conhecer e
usar aspectos da vida íntima das pessoas em nome da
coletividade e da defesa da segurança pública?
 Até onde vai o direito do cidadão em preservar a privacidade?
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
DADOS PESSOAIS E DADOS CORPORAIS: BIG DATA NA SAÚDE
A expansão, os avanços tecnológicos e a interligação
(interoperabilidade) entre grandes bancos de dados na Saúde
compostos por bases nominais (identificação do cidadão) ampliam o
potencial de novas ameaças à privacidade e à confidencialidade das
informações fornecidas, em confiança, pelos usuários ao SUS.
No SUS, essas novas ameaças se intensificam em algumas iniciativas:
Cartão Nacional de Saúde, e-Saúde, Prontuário Eletrônico do Paciente,
Centrais de Regulação e Telessaúde.
• Abrem um leque de possibilidades há muito almejado por seu
potencial para a melhoria da qualidade na atenção à saúde.
• Permitem o rastreamento do percurso do usuário pelos serviços de
saúde, potencializando riscos de invasão de privacidade e violação da
confidencialidade, princípios éticos fundamentais na relação do
cidadão com os profissionais e serviços de saúde.
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
EXEMPLOS DE INVASÃO DA PRIVACIDADE
Essa realidade levanta novos desafios éticos e políticos para a sociedade!
Exemplos de Invasão da Privacidade
Hospital Universitário em Marília/SP: 37% dos
profissionais já consultaram resultados de
exames de pacientes que não estão sob seus
cuidados e 30% conhecem pessoas que
acessaram exames de pacientes para outra
finalidade que não o cuidado à saúde.
Inglaterra: Em hospital geral com mais de 1.000
leitos, 72% da equipe de enfermagem acessou
indevidamente o sistema, colhendo informações
de pacientes que não estavam sob seus
cuidados profissionais.
A justificativa apresentada por violarem a
privacidade dos pacientes: CURIOSIDADE!
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
EXEMPLOS DE INVASÃO DA PRIVACIDADE
NewYork-Presbyterian Hospital: Dados médicos
de 6,8 mil pacientes acessíveis por mecanismos
de buscas na internet, em 2010. (NYT)
Justificativa: "vazamento por engano", na
tentativa de afastar qualquer prática criminosa.
Nome, idade, situação clínica, cirúrgica, pulso e
temperatura, etc: acessíveis pela internet.
Segundo o New York Times, o erro foi
encontrado no início de julho/2010, depois que
parentes de um paciente encontraram
informações sobre ele na internet.
O problema só foi tornado público por causa da
investigação do caso.
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
EXEMPLOS DE INVASÃO DA PRIVACIDADE
Cartão Nacional de Saúde : 44 municípios pilotos
Em 2002, foram identificadas diversas situações:
 Empréstimo de Cartões dos Profissionais,
 Compartilhamento de senhas de acesso,
 Esquecimento de “fechar” o BD após consulta,
 Troca de cartões do usuário,
 Comentários dos Agentes de Saúde com
“vizinhos” sobre diagnóstico de pacientes.
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
INVASÃO DA PRIVACIDADE
Em todos os casos citados (Hospitais de São Paulo, da Inglaterra, de
Nova York e os 44 municípios-piloto do Cartão Nacional de Saúde),
os sistemas de informação utilizados incluíam as tecnologias de
segurança preconizadas.
As violações ocorrem não por falta de dispositivos de segurança!
Os estudos evidenciam, não só no Brasil como em outros países,
que as normas, os regulamentos e os mecanismos de segurança são
fundamentais, mas por si só têm se mostrado insuficientes para a
preservação do direito à privacidade.
ENTÃO, O QUE FAZER?
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
“A humanidade só levanta os
problemas que é capaz de resolver e
assim, numa observação atenta,
descobrir-se-á que o próprio problema
só surgiu quando as condições para
resolver já existiam ou estavam, pelo
menos, em vias de aparecer.”
Karl Marx
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
 Para superar este desafio, estão sendo pensadas diferentes
alternativas, não necessariamente excludentes.
 Uma
estratégia possível é fomentar um processo de
comprometimento da equipe (tanto de saúde quanto de
tecnologia da informação) em torno da vontade e da
compreensão (Ética Racional) sobre a importância da privacidade.
 Fundamentação: O respeito à privacidade é requisito para a
existência de uma sociedade mais respeitosa para com o Outro e
para si próprio enquanto nação justa, fraterna e digna.
Através do estabelecimento de um Pacto Ético e Político que
expresse o VALOR atribuído pela sociedade brasileira à Vida!
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
Estabelecimento de um pacto ético e político que tenha por
fundamento a ética racional (Espinosa).
 Difere da doutrina dos deveres do homem.
 É fruto da vontade, da inteligência, da compreensão racional.
 Quem age movido pelo dever, com medo de penalidades (Códigos
de Deontologia, por exemplo), não é verdadeiramente livre,
autônomo, age por mandamento.
 Na medida em que o imperativo do dever transforma-se em um
jubiloso optativo pelo querer, passa-se a cumprir o Pacto por
compreensão interna e não mais por compulsão externa.
 O saber, conhecer ou compreender confere liberdade e libertação.
 A ética racional é a proclamação da liberdade consciente e
conquistada.
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
DEFESA DA PRIVACIDADE FUNDAMENTADA NA ÉTICA RACIONAL
•Expressão de um ato da vontade de cidadãos, conselheiros de saúde,
profissionais e gestores em torno da compreensão das consequências
do rompimento da confiança construída, ao longo da história, na
relação do sistema de saúde com o paciente.
•Fruto da compreensão sobre os riscos e benefícios do uso da TI, em
um mundo cada vez mais controlador – The Big Brother - onde as
informações constituem-se em um dos mais sutis e estratégicos
dispositivos de um Estado Vigilante no exercício de seu Biopoder.
•Liberdade para agir eticamente na defesa da privacidade por opção e
não por coação e medo de penalidades.
Edward Snowden
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
A TÍTULO DE CONCLUSÕES:
•Nenhuma ação isoladamente garantirá, com efetividade, o respeito a
limites entre a dimensão pública e privada.
•Estes limites são historicamente definidos a partir de pactos
políticos e éticos orientadores da governança dos Estados em sua
relação com a sociedade.
•Ainda é preciso ser incorporado à cultura institucional do SUS o
princípio de que as informações fornecidas pelo cidadão em seu
contato com o sistema de saúde são dele e não da instituição, da
equipe ou do médico: prontuário eletrônico do paciente (PEP).
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
A TÍTULO DE CONCLUSÕES:
Considerar os dados pessoais e
corporais fornecidas pelo indivíduo como DELE alarga o papel e a
função do cidadão na sociedade.
Significa conferir valor à vontade do cidadão, dotado de razão (ética
racional): Ele decide, conscientemente, sobre a destinação que quer
PERMITIR sobre as informações que lhe dizem respeito.
Um dos mecanismos desse princípio:
Consentimento Esclarecido para o acesso e uso dos dados nominais e
corporais fornecidos na relação com a equipe de saúde: o cidadão
passa a deter o controle sobre os termos da autorização.
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
A TÍTULO DE CONCLUSÕES:
 Formação permanente para todos os trabalhadores do SUS em torno
do respeito à privacidade e à confidencialidade dos dados:
expressão de um pacto ético de responsabilidade para com o outro.
 Constituição de códigos de ética para os agentes de saúde e os
técnicos de informática, por exemplo, não são suficientes, apesar de
necessários, mas sua elaboração ampliará o debate político.
 Adoção em larga escala na Saúde do uso de certificados digitais
emitidos pela Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira
(ICP/Brasil)
 Incluir na Agenda de Luta do Controle Social e da defesa do SUS: A
privacidade como questão estratégica para o respeito à dignidade
na atenção à saúde.
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
A TÍTULO DE CONCLUSÕES:
•Sem um conjunto de iniciativas políticas, éticas e tecnológicas
voltadas para o respeito à privacidade do cidadão, ampliam-se as
condições de um “ambiente de risco” para o projeto de um país que
preserve o valor da vida.
•O respeito à dignidade humana (construída historicamente)
constitui o limite à ação do Estado.
•O desafio é inscrever o respeito à dignidade humana na práxis da
atenção à saúde como conquista da sociedade:
Expressão de um amplo Pacto Ético e Político orientado pela
responsabilidade para com o próximo e para com a coletividade.
UTOPIA?
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
“A utopia está no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se distancia
dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos mais.
Por mais que eu caminhe, nunca o alcançarei.
Para que serve a utopia? Para isso, para caminhar.”
Eduardo Galeano
Ilara Hämmerli Sozzi de Moraes
Pesquisadora Titular – ENSP/FIOCRUZ
TRATA-SE DE PROJETO CIVILIZATÓRIO
a ser conquistado em um longo processo de luta e aprendizagem
coletiva calcada na solidariedade, na articulação, no
compartilhamento de responsabilidades, na justiça cognitiva ...
e na paciência histórica.
“A prioridade absoluta
tem de ser o SER
HUMANO. Acima dessa
não reconheço
nenhuma outra
prioridade.”
José Saramago
(1922-2010)
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