Mudanças e crenças linguísticas
em redes sociais digitais
MESA
Mudança linguística em tempos de internet
Maria Cecilia Mollica
(UFRJ/IBICT/CNPq/FAPERJ)
CARACTERÍSTICAS E IMPORTÂNCIA DE REDES ONLINE
NA PESQUISA LINGUÍSTICA
• Segundo Caroline Haythornthwaite (2009),
quando redes de computadores conectam
pessoas, apoiam redes sociais que são, em
geral, provenientes de relações e
comunidades organizadas em torno de
trabalho, pesquisa, família, saúde, lazer,
interesses e preocupações pessoais.
CARACTERÍSTICAS E IMPORTÂNCIA DE REDES
ONLINE NA PESQUISA LINGUÍSTICA
• Uma comunidade virtual é liberada da
geografia, porém dependente da tecnologia.
• Servem de apoio emocional interpessoal;
• São meios importantes à pesquisa linguística na
chamada era da cibernética;
• Criam novas conexões em tempos e lugares
diferentes entre os falantes e promovem apoio
para conexões já existentes quando as
comunidades de fala se acham isoladas ou se
separam geograficamente.
Cabem então as seguintes perguntas:
– Como os falantes mantêm relações online?
– Como as comunidades de fala são formadas e mantidas online?
– São tão boas quanto as comunidades offline para a pesquisa
linguística em investigação sobre redes sociais (BORTONIRICARDO, 2011)?
– As redes digitais são colaborativas como as comunidades offline e
os fenômenos de mudança ocorrem da mesma forma?
– Podemos falar de cultura participativa, virtualmente, no campo da
sociolinguística?
– O que motiva estranhos a contribuir para uma coletividade online
e a fornecer informações para uma pesquisa linguística?
– Que tipo de informação linguística é possível captar nas redes
online?
OBJETIVOS
• Verificar os meios mais eficazes de estreitar falantes
desconhecidos;
• Identificar comunidades de fala em redes sociais;
• Captar aspectos linguísticos relacionados às atitudes dos
falantes;
• Demonstrar que tais atitudes se referem a certos traços
“salientes” e prototípicos que, segundo Cargile e Giles (1997)
constróem o imaginário de uma comunidade de fala e, dessa
forma, ofuscam as características mais importantes dos dialetos;
• Destacar a importância de se levar em conta as atitudes
linguísticas de modo a estimar: (a) o grau de preconceito
linguístico-cultural, nos termos de Cargile&Giles (1997); (b)
possíveis mudanças linguísticas através da operação da
acomodação dialetal, considerando-se a distinção de Labov
(2007) entre transmissão e difusão;
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Redes sociais digitais, metodologia e
atitudes linguísticas
• Os dados que se adequam à análise consistem de
uma reunião de vários trechos de interações online
após busca por migrantes do Nordeste residentes no
Rio. A maioria dos entrevistados é constituída de
estudantes com nível igual ou maior que o ensino
médio, vindos à procura de melhor qualificação em
centros de ensino de referência no país, como o Rio
de Janeiro, em áreas distintas. Formam redes abertas
e uniflex. São estudantes que mantêm laços entre si
em função dos interesses de formação e qualificação.
Redes sociais digitais, metodologia e atitudes
linguísticas
• As entrevistas foram realizadas através de
salas de bate-papo, i-phone etc. Nesse
sentido,
a
pesquisa
revela
grande
potencialidade de todos os meios da WEB
para permitir os indivíduos conectados online,
sem barreiras geográficas.
Redes sociais digitais, metodologia e atitudes linguísticas
• Os trechos de entrevistas que mostro nesta apresentação
revelam provável assimilação do dialeto de chegada em
relação ao dialeto de origem a partir de atitudes e de
fortes intuições que os falantes possuem sobre o que eles
crêem sobre si e como imaginam ser julgados pelos
outros, sejam por cariocas, sejam por falantes de outras
comunidades de fala, sejam por seus conterrâneos. Digno
de nota é a percepção mais recorrente da atitude dos
entrevistados ao externar um sentimento de preconceito
quanto ao dialeto de origem bem como em relação à sua
cultura.
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Trechos de entrevista e análise
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Trecho 1:
Diálogo entre a entrevistadora e uma algoana em sala de bate-papo
(E) mas, então, pra terminar, e seu sotaque?quando vc chegou aqui no rio vc acha que foi, de alguma forma ,
discriminada por isso..?
(F): Na verdade eu fui pra manaus
E la sim eu sofri bastante
(e): ah, sim...e depois vc veio pra cá, né?
(F): Não fui p Belem, depois Brasilia e por ultimo RJ
Enviado às 19:54 de terça-feira
(E): e, nesse tempo que vc está no Rio, vc acha que já deu pra sua fala ser influenciada pela do rio?
vc acha que já está falando que nem carioca?
(F): Acho sim
Meu S mudou muuuiiittttoooo
ate minhas amigas percebeu
Perceberam***
(E) hahaha...acho que esse é o primeiro sintoma!
e as gírias também né?
(F)): Isso, tipo: maneiro
Caraca maluco**
(E): hahahaha
sério?
(...)
(E): ah, tá...então não tem como eles influenciarem seu sotaque...Tem sua mãe também, né?
Enviado às 20:02 de terça-feira
(F): Sim minha mae n perdeu totalmente
Análise
• Pelo trecho (1), o falante reporta-se à
discriminação que F sofreu em outras regiões
do país e destaca as gírias e uma certa
pronúncia do /s/, cujas propriedades
fonológicas são desconhecidas: são marcas
do imaginário coletivo com relação à fala
carioca. Nos demais trechos, os falantes
nordestinos referem-se sempre a processos de
discriminação.
TRECHO 2:
• Trecho 2:
• M - Pernambuco
• 19:50 (E): ah, imagino...mas vc sofreu alguma
discriminação quanto ao modo de falar assim
que chegou ao Rio?
• 19:53 M: eu não tenho muito sotaque, mas
quando percebem e perguntam de onde sou,
ja escutei brincadeiras um pouco ofensivas.
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Trecho 3:
• Trecho (3):
• I - Rio Grande do Norte
• E: E você não se sentiu discriminado por causa
do sotaque, por causa de ser nordestino?
• F: Não, no início a gente foi aí. Os cliente
falava pra ela que a gente falava diferente e
achava bobo, mas foi rápido. Porque lá aonde
eu fui mora tem muita gente já e
num...(Ismael)
ANÁLISE
• Novamente aqui a discriminação é sentida.
Não se sabe bem se o preconceito advém do
fato do sotaque do dialeto de origem ou em
função de o migrante ser nordestino.
• Essa confusão se desfaz no trecho (4) em que
F não acredita em preconceito. Sua intuição
forte aponta para uma mudança linguística a
depender de quem a escuta.
Trecho 4:
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Trecho 4:
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E - Pernambuco
(E) diz:
E se sentiu, em algum momento, discriminada por ser do nordeste ou pelo seu
modo de falar?
O falante responde:
Não...fui bem recebida...
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Entrevistadora diz:
E você acha que, nesse pouco tempo no Rio, já deu pra ser influencida pelo
nosso sotaque carioca?
Falante diz:
Eu acho que não...
Depende, quem é carioca diz que eu tenho sotaque, mas quando eu falo com
algum recifense eles dizem que estou perdendo o sotaque de lá...mas eu acho
que não estou falando como carioca não.
TRECHO 5:
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No trecho (5), o entrevistado admite preconceito cultural e linguístico assim como
uma certa mudança operada no seu dialeto de origem.
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Trecho 5:
K – Alagoas
(E) Por que vc decidiu sair da sua cidade natal?E quando chegou ao Rio vc se adaptou bem ou teve
dificuldades para se acostumar com a cidade?Quais principais problemas vc enfrentou quando
chegou?Você sofreu alguma discriminação quanto ao modo de falar assim que chegou ao Rio?
(F) Eu nao decidi, decidiram por mim. haha Pelo meu chamado ministerial, resolveram me enviar pra cá.
Eu tive vários problemas, a começar por dividir apartamento. Mas a cultura daqui me chocou muito. Sao
valores totalmente invertidos e diferentes do meu.
Sim. Ate hoje eu sofro discriminaçao tanto pelo modo de falar quanto por costumes nordestinos. A
sensaçao que tenho é que tudo que faço está errado.
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(E) Quanto ao sotaque, nesse meio tempo vc acha que sua fala já tem sido influenciada pela
dos cariocas?Se sim, o que vc acha que mudou?E quanto às gírias?Vc já usa algumas gírias cariocas?
Acho que perdi um pouco do meu sotaque sim. Mas na vida eu só sei disso qnd volto pra Maceió, pq por
aqui é nítido que sou nordestina. haha Acho que está menos "cantado", somente. Porque as vogais
abertas e todas as "girias" e trejeitos nordestinos permanecem.
As vezes me pego falando uma ou outra gíiia carioca, mas é muito pouco.
ANÁLISE
• A percepção do falante em relação à existência
de um falar “ meio cantado” aliando-se ao
emprego de “vogais menos abertas” (no caso
de Recife) demonstra uma percepção
prototípica que se tem do dialeto nordestino . A
presença de gírias novamente vem marcar o
dialeto carioca como traço “exclusivos” e
salientes.
Primeiras conclusões
• No estágio em que se encontra a pesquisa, consegui
evidenciar, através de entrevistas digitais, que o
falante “conectado” tem consciência de que existe
um “jeito” de falar do seu dialeto: são os traços de
natureza suprassegmental que ele não sabe explicar
tecnicamente e que dificilmente esconde sua origem
completamente. De acordo com Aaron et al, (1994),
o sotaque e a cultura são objeto de discriminação,
revelando que as atitudes linguísticas não dissociam
língua de questões contextuais.
PRIMEIRAS CONCLUSÕES
• Os depoimentos são um rico material de
investigação para analisar a questão da avaliação
positiva e negativa dos dialetos que inclui
aspectos não linguísticos.
• O material serve para inferir o grau de
acomodação que os migrantes julgam ter
atingido em relação ao dialeto de chegada.
• É também fonte de reflexão sobre como os
falantes são julgados por conterrâneos e pela
comunidade do dialeto de chegada.
PRIMEIRAS CONCLUSÕES
• Em alguns casos, é possível estimar, pelas crenças nos
relatos, o grau e o nível linguístico da mudança que se
processou no usuário que, em contato com outras
comunidades de fala.
• Em geral, F abre mão de traços segmentais mais
característicos da comunidade de fala de origem,
motivado pelo movimento em direção ao prestígio,
como atestou Labov(1972).
• No entanto, continuam a ser identificados
suprasegmentalmente.
• Esta conclusão lança o desafio de pesquisa das sobre as
comunidades dialetais sob outro ponto de vista.
PRIMEIRAS CONCLUSÕES
• Os traços entonacionais memasnescentes mais marcados e mais
frequentes aludidos nos trechos analisados referem-se ao
“cantado”, à abertura/fechamento das vogais e à ausência de gírias.
• Há algo de verdadeiro nas percpeções dos Fs mas também há
atitudes distantes da realidade.
• Todos os dialetos têm marcadores próprios e as comunidades criam
suas “gírias” organizadas, em geral.
• Fica comprovado, conforme concepçção de Coupland&Giles (1988),
que a operação de acomodação é processo muito dinâmico que
envolve vários níveis da gramática, portanto, a caracterização
sociolinguística PB deve contemplar além dos aspectos da estrutura
segmental, o nível supragmental e antropo-cultural.
REFERÊNCIAS
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•
BORTONI-RICARDO, Stella maris. Do campo para a cidade: estudo sociolingüístico de migração e
redes sociais. São Paulo: Parábola Editorial, 2011.
.
CARGILE, Aaron; GILES, Ryan; BRADAC, James J. Language Attitudes as a social process: a conceptual
model and new directions. Language&Communication, Vol. 14, No. 3, pp. 211-236, 1994.
CARGILE, Aaron; GILES, Ryan. Understanding language attitudes exploring listener affect and identity.
Language and Communication, Vol. 17, n. 3, pp. 195-217, 1997.
•
•
•
COUPLAND, Nikolas; GAILES, Howard. Language and communication, Vol 8, N. 3 / 4, pp. 175-182.
•
•
•
LABOV, William. Sociolinguistic patterns. University of Pennsylvania Press., 1972.
•
•
LABOV, William. Transmission and diffusion. Language N. 83, junho de 2007.
HAYTHORNTHWAITE, Caroline. IV SEMINÁRIO DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO: Redes
Sociais On-Line E Off-Line. IBICT/UFRJ, Junho de 2009
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