Cordel da Argumentação
João Bosco Bezerra Bonfim
Valei-me São Rui Barbosa,
protetor dos oradores,
nesta hora, neste dia,
invoco os seus favores:
um discurso de encantar
os ouvintes e os leitores.
Todo argumentador
deve ter sua ciência.
Por isso, neste cordel,
eu peço sua licença
para lembrar os passos
dessa arte de excelência.
Primeiro de tudo, saiba
onde é que quer chegar.
Ao final dessa oratória,
qual ação se esperar
dos ouvintes, decisores,
que estão a lhe escutar?
Firme bem esse desejo
de levar convicção,
pois, para se convencer,
e fazer persuasão
o melhor é ter certeza
e não uma indagação.
Definida essa meta,
agora crie um mapa
para chegar ao final,
precisa cumprir etapas:
fixe um ponto de partida.
Andar tonto é pra baratas.
Qual é a sua base?
No que é que você crê?
Você parte de um consenso?
Ou só o iluminado vê?
É uma ideia universal
ou acaba de nascer?
Seja um valor social,
dogma da filosofia,
um princípio do Direito,
uma lei da Economia,
a sua proposição
carece de ter valia.
Afirme essa ideia
igual a uma premissa
com a generalidade;
expresse sem ser omisso,
em base bem sintética,
pense bem, sem preguiça!
"Tudo", "todo" ou "nenhum"
"Nunca", "sempre", "qualquer um":
são palavras bem usadas;
não venha com zum zum zum!
A premissa inicial
impõe-se em um segundo.
Pronto, criada a base,
passa à argumentação,
perguntando bem por quê
você tem a opinião:
qual a causa, o motivo?
Exponha sua razão.
Muitos, antes de você,
desta e de outra idade,
já pensaram no assunto,
e fixaram as verdades,
por isso, seus argumentos
têm toda a autoridade.
A ciência não se faz
começando de um zero.
Por isso, quem veio antes,
é referência, isso é vero:
a opinião fundada
sedimenta uma matéria.
Para provar sua tese,
além da opinião,
precisa de uma pesquisa,
baseada na razão:
há dados desse assunto?
Ponha fundamentação!
Estatísticas, de fato,
podem ser a sua base:
a verdade e a certeza
não se contentam com "quase".
Apure bem suas fontes,
para passar desta fase.
Além do número atente
para a pessoalidade;
por isso, cite um exemplo,
visto na realidade,
passado aqui neste mundo,
pra criar identidade.
O exemplo pode ser
mais que citado, estendido,
com história verossímil,
que tenha lido ou ouvido,
narrativas de emoção,
bem que fixam o sentido.
O lugar da quantidade
é clássico na Retórica:
argumento de verdade,
tem sua base na lógica,
mas precisa coerência,
não de coisa estrambótica.
O lugar da qualidade
vê o que é singular,
que, não tendo outro igual,
por ser figura sem par,
vence até uma multidão,
não se pode comparar.
.
Mona Lisa ficou sendo
exemplo de qualidade:
única na categoria,
não importando a idade,
mesmo se reproduzida,
tem a originalidade.
Tem o lugar da essência,
a que busca o vero ser,
onde há o fundamento,
acima do "parecer":
essencial é a vida,
esse exemplo é pra valer.
Não há nada deste mundo
que seja sempre o primeiro.
Por isso, o lugar da ordem
é argumento certeiro:
pra criar prioridades
em busca do verdadeiro.
Também tem outro lugar,
em homenagem à pessoa:
mas que coisas e ideias,
essa é referência boa:
o humano em primeiro
é o que mais alto ressoa.
Mas, combinado aos outros,
há o lugar do existente:
primeiro o que aí está;
depois o que está pendente;
não o que estar por vir;
não o passado, o presente.
Pois pronto, argumentador,
se você fez a lição,
ordenando os argumentos,
com ordem e precisão
agora é hora boa
de chegar à conclusão.
Mas não basta repetir
as ideias anunciadas:
deve reforçar a tese
para evitar coisa errada:
como é que agirá
a plateia conquistada?
Toda argumentação
já ensinavam os gregos
dirige-se ao auditório
não para guardar segredo,
mas para levar à ação,
movida pelo enredo
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orador - João Bosco Bezerra Bonfim