Neuroimagem e métodos computacionais: avanços no conhecimento sobre transtornos psiquiátricos e possíveis aplicações clínicas GERALDO BUSATTO FILHO LIM21 – Neuroimagem em Psiquiatria Núcleo de Apoio à Pesquisa em Neurociência Aplicada (NAPNA – USP) Definição de biomarcador (FDA-USA) • Característica que é medida de forma objetiva com o propósito de servir como indicadora de: – um processo biológico normal do organismo OU – um processo patológico associado a uma doença OU – padrão de resposta a uma dada intervenção terapêutica Doença de Alzheimer - Neuroimagem estrutural • Avaliação de neuroimagem estrutural (CT ou RM) indicada na investigação diagnóstica de quadros demenciais e prédemencias, como comprometimento cognitivo leve (CCL). • Atrofia cerebral com progressão documentada através de avaliações seriadas ao longo do tempo: reforço do diagnóstico de provável demência de Alzheimer. Atrofia e alargamento de sulcos e ventriculos em imagem de RM de paciente com provável diagnóstico de DA Doença de Alzheimer – Neuroimagem funcional Metabolismo de glicose medido através de PET Áreas de deficiência metabólica em córtex temporoparietal Biomarcadores para uso clínico em Psiquiatria? DESCOBRINDO UMA DOENÇA MÉDICA POR TRÁS DOS SINTOMAS PSIQUIÁTRICOS... Ressonância magnética com contraste paramagnético Depressão maior como primeira manifestação de meningeoma frontal numa mulher de 46 anos (ocorrência rara) • A confirmação do diagnóstico e o prognóstico de um transtorno psiquiátrico (depois de descartadas doenças médicas gerais) se baseiam fundamentalmente na identificação clínica de alterações de comportamento, e na observação dos padrões de continuidade destas alterações ao longo do tempo • Não há nenhum biomarcador válido que seja usado na prática clínica para reforçar uma determinada hipótese diagnóstica Seria útil termos biomarcadores para uso clínico em Psiquiatria? O exemplo dos transtornos psicóticos... • Num caso com sintomas psicóticos de início recente (delírios / alucinações) – Poderia ser um transtorno do humor grave ao invés de esquizofrenia? (mania, depressão com sintomas psicóticos) – Se as características clínicas forem “esquizofreniformes”, vai se confirmar o diagnóstico de esquizofrenia ao longo do tempo? – Poderia ser algum outro tipo de transtorno psicótico? (como transtorno delirante persistente, etc). Biomarcadores para uso clínico em Psiquiatria? O exemplo dos transtornos psicóticos... The McLean-Harvard First Episode Project: Two-year Stability of DSM-IV Diagnoses in 500 First-Episode Psychotic Disorder Patients Salvatore et al, J Clin Psychiatry 2009 Sempre diagnóstico provisório (antes de 6 meses de doença) Taxas de transição para esquizofrenia em jovens de alto risco • Multisite longitudinal study in North America: 35% de jovens com sintomas prodrômicos (de um total de 291) evoluíram para esquizofrenia ao longo de 2 ½ anos Cannon et al, Arch Gen Psychiatry 2008 • Prospective European Prediction of Psychosis Study: 19% de jovens com sintomas prodrômicos (de n=245) evoluíram para esquizofrenia depois de 18 meses Ruhrmann et al, Arch Gen Psychiatry 2010 PROGNÓSTICO DA ESQUIZOFRENIA É VARIÁVEL Muitos pacientes recaem, outros melhoram, alguns têm remissão completa ao longo do tempo Portanto, o que deveríamos esperar de um bom biomarcador para uso clínico em Psiquiatria? • Ser capaz de diferenciar as pessoas que têm sintomas daquelas que estão mentalmente sãs • Contribuir para o diagnóstico diferencial – Exemplo: em casos de primeiro episódio psicótico, distinguir esquizofrenia de transtornos do humor com características psicóticas • Identificar casos de alto risco • Exemplo: casos de jovens de alto risco (com sintomas prodrômicos) que podem evoluir para esquizofrenia • Prever quais são os sujeitos de risco que têm mais chance de desenvolver a doença (permitindo intervenções precoces) • Prognóstico daqueles que já foram diagnosticados – Quem vai ter resposta pobre ao tratamento, quem vai ter remissão dos sintomas sem que seja necessária a continuidade do tratamento, etc Alguns exemplos de biomarcadores na atualidade • Dosagens de proteínas plasmáticas (citocinas, neurotrofinas, etc) • Dosagens hormonais plasmáticas (exemplo: eixo hipotálamohipófise-adrenal) • Dosagens liquóricas (exemplo: peptídeo beta-amilóide -Ab42 em suspeita de doença de Alzheimer) • Achados eletroencefalográficos • Achados de exames neuro-radiológicos Avanços no uso de biomarcadores de neuroimagem na prática clínica? Neuroimagem - Neurocomputação Hipometabolismo cerebral em proporção ao risco cardiovascular (levando em conta a presença de APOE4) Cíngulo posterior / precúneo (áreas afetadas precocemente na doença de Alzheimer) Hanashiro et al, Age 2012 Primeiro episódio psicótico (n= 122) versus controles (n=94) na cidade de São Paulo:DEFICITS DE SUBSTÂNCIA CINZENTA EM ALGUMAS REGIÕES DO CÉREBRO Z max = 4.93; p<0.05, corrected Psicoses como um todo < controles Esquizofrenia (n=62) < controles Schaufelberger et al, British J Psych 2007 Primeiro episódio de psicoses AFETIVAS (n= 46) versus controles (n=94) em São Paulo Aumento de substância cinzenta em bipolares (n=20) vs controles – CÍNGULO ANTERIOR Diminuição de substância cinzenta em deprimidos unipolares (n=26) vs controles – SOMENTE NO CORTEX PREFRONTAL DORSOLATERAL Azevedo-Marques Perico et al, Bipolar Disorders 2011 Dilatação de ventrículos laterais já no primeiro episódio de esquizofrenia (mais do que em psicoses afetivas) Rosa et al, World Journal of Biological Psychiatry 2010 • Na nossa amostra de São Paulo, assim como em vários grupos de pacientes com psicose recrutados em outros países, quanto menor o volume de áreas frontais e temporais no início dos sintomas de esquizofrenia, mais persistentes são os sintomas ao longo da progressão dos anos da doença Rosa et al, submetido para publicação Brain volume reduction associated with drug treatment in schizophrenia Ho et al, Arch General Psychiatry 2011 Por outro lado, pacientes que apresentam remissão dos sintomas depois de um ano (n=10) têm reversão das alterações cerebrais em comparação com pacientes com esquizofrenia que mantêm sintomas intensos (n=29) p<0.05, corrected Schaufelberger et al, Psychological Medicine 2011 Jovens em alto risco para esquizofrenia (n=182) já podem apresentar diminuições de volume cerebral em comparação com controles (n=167) Mechelli et al, Arch Gen Psychiatry 2011 Estudos longitudinais de ressonância magnética: medidas repetidas entre o estado de alto risco e a esquizofrenia propriamente dita • Há redução progressiva do volume cerebral quando há transição entre o estado de alto risco e o quadro clínico de esquizofrenia am áreas frontais e temporais T0 T1 Borgwardt et al., 2007 and 2008; Job et al., 2005; Pantelis et al., 2003, Sun et al 2008 , Takahashi et al 2009 Kuroki et al, American J Psychiatry 2006 Resultados de neuroimagem são “uma paisagem com detalhes variados” : exemplo de comparação entre pacientes com doença de Alzheimer (n=15) vs controles pareados para idade e gênero (n=14) Busatto et al, Neurobiology of Aging 2003; Chaim et al, Psychiatry Research 2007 RECONHECIMENTO DE PADRÕES COMPLEXOS CLASSIFICADOR AUTOMÁTICO DE IMAGENS CEREBRAIS (aprendizagem de máquina) Controles Alzheimer Thomaz et al, J Math Imaging Vision 2007 Carlos Thomaz e cols, Engenharia Elétrica FEI (J Mathematical Imaging and Vision 2007) Classificador automático de imagens: Performance diagnóstica para primeiro episódio de esquizofrenia não parece ser muito boa Kasparek et al, Psychiatry Res: Neuroimaging, 2011 Classificador automático de imagens: Performance diagnóstica para primeiro episódio de esquizofrenia relativamente pobre Zanetti et al, 2011 Pattern classification in psychosis – recent studies Study Method Imaging Female subgroup SVM T1 1.5T MRI Male subgroup SVM ARMS-E X Controls Sample AUC Accuracy Sensitivity/ Specificity 23 chronic schizophrenia 38 controls NI 91.8% NI T1 1.5T MRI 46 chronic schizophrenia 41 controls NI 90.8% NI SVM T1 1.5T MRI 20 ARMS-E individuals 25 controls NI 87% 95% / 80% ARMS-T X ARMS-NT SVM T1 1.5T MRI 15 ARMS-T individuals 18 ARMS-NT individuals NI 82% 83% / 80% Ingalhalikar et al, 2010 SVM DTI 0.90 90.6% NI Sun et al, 2009 SMLR T1 1.5T MRI 36 recent-onset psychosis patients 36 matched controls NI 86.1% NI MULDA T1 1.5T MRI 39 first-episode schizophrenia 39 matched controls NI 72% 66.7% / 76.9% Continuous course at follow-up SVM T1 1.5T MRI 28 first-episode psychosis 28 matched controls NI 67% 71% / 61% Episodic course at follow-up SVM T1 1.5T MRI 28 first-episode psychosis 28 matched controls NI 54% 64% / 43% ARMS-T X Controls SVM T1 1.5T MRI 16 ARMS-T individuals 22 controls NI 92.3% 93.8% / 90.9% ARMS-NT X Controls SVM T1 1.5T MRI 21 ARMS-NT individuals 22 controls NI 66.9% 42.9% / 90.9% ARMS-T X ARMS-NT SVM T1 1.5T MRI 16 ARMS-T individuals 21 ARMS-NT individuals NI 84.2% 81.0% / 87.5% Fan et al, 2007 Koutsouleris et al, 2009 Kasparek et al, 2011 27 women with chronic schizophrenia 37 controls Mourão-Miranda et al, in press Koutsouleris et al, in press Combinação de biomarcadores para o diagnóstico da doença de Alzheimer e comprometimento cognitivo leve (CCL) Proposta de estadiamento baseada no consenso do National Institute on Aging e Alzheimer’s Association workgroup (Sperling et al., 2011) Método híbrido de aprendizagem de máquina fundindo dados de ressonância magnética funcional e genética molecular em pacientes com esquizofrenia Yang et al, Frontiers in Human Neuroscience 2010 Método híbrido de aprendizagem de máquina fundindo dados de ressonância magnética funcional e genética molecular em pacientes com esquizofrenia Yang et al, Frontiers in Human Neuroscience 2010 Conclusão • Poucos estudos até hoje investigando a acurácia diagnóstica da combinação de múltiplos biomarcadores em Psiquiatria • São necessários estudos com amostras amplas, abarcando todo o espectro de gravidade das diferentes síndromes psiquiátricas (amostras de base populacional). No caso das psicoses, por exemplo: • Esquizofrenia, transtorno esquizofreniforme, psicoses afetivas, outras • Casos que apresentam remissão completa • Estados prodrômicos • Inclusão do maior número possível de pacientes nunca expostos a tratamento medicamentoso • Estudos longitudinais de seguimento para coletar informações sobre previsão de desfechos e resposta a tratamentos • Nova onda de estudos que investiguem o uso de biomarcadores validados por psiquiatras no “mundo real” da prática clínica