Jornal de Hoje, Natal (RN), p. 2- 2, 9. Julho 2005
PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL
Por Tassos LYCURGO
(www.lycurgo.org )
Seria bom que todos soubessem os princípios que regem o direito, pois
nada senão o imperioso dever de distinguir o reto do torto, como muita vez lembrou
Horácio, é que deve nortear os referidos preceitos. Princípios esses que subjazerão a
todos os encaminhamentos tomados no ordenamento jurídico, pois não falam das leis
em si, mas, como foi sugerido, do que é certo, justo e reto. É, portanto, neste contexto
que se afirma que as leis mudam, mas os princípios permanecem e, com eles, nosso
ímpeto em seguí-los, no fito maior da realização do que é prudente e pio.
Desta feita, note-se que princípios há vários: existem os que influenciam à
interpretação legal, que são os princípios gerais e os positivos do direito; há os
princípios genuinamente constitucionais, que são positivados pela carta magna; há os
processuais constitucionais, entre os quais, pode-se destacar o do devido processo
legal, o qual oferece ao cidadão garantias formais (como, por exemplo, a do direito ao
contraditório, a do direito ao conhecimento da essência da acusação, a do direito à
citação, a do direito à assistência judiciária gratuita, entre outros) e garantias materiais
(tais como a do direito à razoabilidade das decisões).
Entre todos os princípios, há um grupo especial, qual seja, o que trata da
tutela de um dos bens jurídicos mais importantes da humanidade: a liberdade. Tal
grupo é pormenorizadamente estruturado na análise dos princípios fundamentais do
direito criminal, ou, como mais comumente se diz no Brasil, do direito penal.
Entre tantos, o direito penal apresenta o p. da reserva lega (“não há crime
sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”), cuja versão
histórica inicia-se com Ulpiano, que proferiu a assertiva “nulla poena sine lege” —
não há pena sem lei —, a qual imortalizou-se no conjunto dos brocardos jurídicos da
contemporaneidade. Note-se que esse princípio muito se assemelha ao p. da
legalidade, segundo o qual, “ninguém está obrigado a fazer ou deixar de fazer algo
senão em virtude da lei”. Ambos são muita vez confundidos. A diferença é que o p. da
reserva legal é uma espécie de restrição do escopo do p. da legalidade, de sorte que se
pode dizer que aquele concerne apenas ao direito penal, enquanto o último diz
respeito a todas as áreas do direito.
Muito semelhante é o p. da anterioridade da lei penal, o qual é relativo à
questão da lei penal no tempo e se positiva na declaração de que “ninguém pode ser
punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime”. Vê-se que tal p. é
decorrente do p. da reserva legal. Há ainda o p. da irretroatividade da lei mais severa,
segundo o qual “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. Embora
Ulpiano tenha dito que “durum hoc est sed ita lex scripta est” — a lei é dura, mas foi
escrita assim —, pode-se argumentar que, em certos casos, ela pode ser dura, desde
que não retroaja.
Vê-se também o p. da taxatividade, de acordo com o qual, as normas
penais devem ser elaboradas de tal forma que as condutas sejam tipificadas de
maneira taxativa, incontestável. O sentido de tal princípio é o de se evitar confusões
na interpretação do código e, conseqüentemente, evitar-se que o judiciário, ao
interpretá-lo, venha a decidir de uma forma diferente da que pensou o legislador.
Há ainda o p. da proporcionalidade da pena (as penas devem ser
proporcionais aos crimes correspondentes), o p. da intervenção mínima (o direito
penal não deve intervir quando outros ramos do direito podem resolver o problema), o
p. da proibição da analogia (não se pode utilizar a lei penal de forma análoga, a não
ser em favor do réu), o p. da insignificância (não se deve punir alguém por conduta
insignificante), o p. do estado de inocência (todos são presumidamente inocentes), o
p. da lesividade (o direito penal deve concernir apenas àquelas condutas que agridem
bens jurídicos), o p. da igualdade (todos são iguais perante a lei), o p. da humanidade
(devemos preservar a dignidade da pessoa humana), o p. da culpabilidade (nenhuma
pena poderá passar da pessoa do condenado), o p. do ne bis in idem (ninguém pode
ser julgado duas vezes pelo mesmo crime), o p. da individualização da pena (cada
caso deve ser analisado individualmente), entre tantos outros.
Vê-se, assim, que o direito penal, em que pese a evolução que atualmente
vem sofrendo, deve-se comportar de maneira previsível no que tange ao respeito às
diretrizes impostas pelos princípios do direito constitucional criminal, os quais, antes
de tudo, são elementos de delimitação de eventuais impulsos do Estado. Os princípios
seriam, assim, como troncos fixos em que os juizes podem se segurar quando somente
se vêem ventania e correnteza nos códigos e demais leis — e não raramente este é o
cenário.
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Seria bom que todos soubessem os princípios que regem