28 Mananciais de água: Por que é melhor proteger? Fernando Antonio Carneiro de Medeiros Engenheiro Civil do Parque da Cidade A água é um bem natural imprescindível para os seres vivos. Para os seres humanos em especial, a importância da água de qualidade está ligada não só à questão da sobrevivência, mas também às questões ambientais, de saude pública e também às cadeias produtivas (agricultura, manufatura e serviços). Apesar da abundância e variedade dos recursos hídricos (oceanos, rios, lagos, calotas polares etc), as águas de superfície e subterrâneas viáveis ao abastecimento humano são bastante limitadas e também mal distribuídas. Segundo Braga et al (2005, p. 74)1, dos 265.400 trilhões de toneladas de água disponíveis no planeta, somente 0,5% corresponde a água doce explorável sob o ponto de vista tecnológico e econômico (lagos, rios e aquíferos). Grande parte dessa água doce está em lugares de difícil acesso ou já está poluída, restando assim cerca de 0,003% do volume total de água do planeta. Este percentual por si só já justifica a necessidade de se olhar com muito cuidado a questão da preservação dos mananciais. As atividades impactantes do homem resultantes da ocupação desordenada das bacias hidrográficas, com as queimadas, desmatamentos, impermeabilização do solo nos aglomerados urbanos, lançamento de efluentes industriais sem tratamento na natureza, dentre outras formas de poluição têm contribuído no decorrer da história para a crescente degradação dos recursos hídricos. Os elementos poluentes têm se tornado cada vez mais numerosos e complexos e, consequentemente, os processos de tratamento e desinfecção mais onerosos. É neste ponto que encontramos uma outra boa razão para a efetiva proteção dos mananciais: em termos ambientais e econômicos, o caminho mais viável, inteligente e eficaz é o da prevenção. 1 - BRAGA, Benedito et al. Introdução à Engenharia Ambiental: O desafio do desenvolvimento sustentável. 2. ed. São Paulo: Pearson Prentice-hall, 2010. W. Júnior 29 Proteger a integridade dos mananciais para abastecimento há muito tempo deixou de ser uma recomendação: hoje, a água potável é considerada um bem precioso e universal. A questão ambiental está amparada em instr umentos legais e procedimentos de gestão pública em todos os níveis administrativos, sendo uns eficientes e outros não. Além disso, existe uma boa variedade de soluções de cunho técnico e tecnológico disponíveis para atender às questões que envolvam prevenção de eventos nocivos à água e, sobretudo à proteção dos mananciais para abastecimento humano. Sendo a água de qualidade um recurso tão precioso e cada vez mais escasso, conhecer a dinâmica e as potencialidades dos recursos hídricos e, sobretudo, protegê-los de todo tipo de degradação que possa comprometer a sua qualidade para o abastecimento humano, torna-se imprescindível. As medidas protetivas de mananciais, além de mero aspecto preventivo, carregam em si aspectos estruturantes que repercutem diretamente na qualidade ambiental, no bem estar das pessoas, na gestão dos recursos públicos e na administração publica de um modo geral. A observação de medidas desta natureza, além do aparato técnico, pressupõe uma estrutura técnica, legal e administrativa mínima, para que o poder público tenha condições de colocar em prática e gerir um adequado programa de proteção. De uma forma geral, excetuados os aspectos técnico-operacionais, as medidas parecem gravitar em torno da questão do controle 2 do uso e ocupação do solo e da proteção ambiental. Neste sentido, LIMA et al (2013, p. 224) reconhece o estabelecimento da bacia hidrográfica como elemento de estudo e execução das diversas ações, e enaltece a importância destas ações no sentido de preservar a cobertura vegetal. Para ele, a relação entre a qualidade da água e a vegetação: “...Foi desde cedo reconhecido e implementado em muitos países, pelo estabelecimento das chamadas “bacias hidrográficas municipais”, ou seja, mananciais de abastecimento de água da população das cidades, que incluem não só apenas a represa de onde os órgãos municipais retiram a água para o abastecimento, mas toda a sua bacia hidrográfica de contribuição, manejada de forma integrada para garantir a preservação de sua cobertura florestal para o só propósito de produção de água.” (grifo nosso). Ao nosso ver, essa “forma integrada” a que o autor se refere compreende uma grande variedade de ações, que como já dito, englobam aspectos técnicos, legais e administrativos. Do ponto de vista jurídico, dentre os vários instrumentos de ordenamento urbanístico e ambientais locais, destacamos o Código de Meio Ambiente do Município de Natal e o Plano 3 Diretor de Natal. Como já afirmamos anteriormente (MEDEIROS, 2015, p.27) , é no controle do uso solo que está a grande contribuição destes dois instrumentos locais, para a questão da proteção sanitária dos mananciais. A administração pública tem à sua disposição estes e vários outros instrumentos para a condução de ações e programas que realmente efetivem a proteção e garantam a qualidade da água para consumo humano. 2 - LIMA, W. P. , FERRAZ, S. F. B. , FERRAZ, K. M. P. M. B.;Ferraz, Katia Maria P. M. B.;Ferraz, . Interações Bióticas e Abióticas na Paisagem: Uma Perspectiva Ecohidrológica. CALIJURI, Maria do Carmo; CUNHA, Davi Gasparini Fernandes. Engenharia Ambiental: Conceitos, tecnologia e gestão. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013. 3 - MEDEIROS. Fernando Antonio Carneiro de. Abastecimento de água em Natal: proteção dos mananciais e a importância da ZPA-01. Parque da Cidade em Revista. V. 1, n. 1, p. 27, 2015. Acervo do Parque 30 Quanto aos aspectos técnico-científicos relacionados à proteção dos mananciais de um modo geral, destacamos a importância do desenvolvimento de ações inovadoras, do estabelecimento de novos paradigmas e de uma gestão inteligente, que coordene com eficiência todos os setores envolvidos nos processos. Para alguns especialistas, estabelecer novos paradigmas do ponto de vista tecnológico seria, inclusive, uma condição crucial. Ao vislumbrar “a universalização sustentável e socialmente justa dos serviços de abastecimento 5 de água potável”, Andrade Neto (2011, p. 390) afirma que o desenvolvimento tecnológico, terá que assumir novos paradigmas, que considerem a necessidade de proteger sanitariamente os mananciais. Isto é perfeitamente viável com o auxílio das pesquisas científicas e do uso das tecnologias de um modo geral. O elemento científico-tecnológico aliado à gestão do solo e à proteção ambiental são interdependentes e complementares entre si. O estímulo à pesquisa, ao desenvolvimento de programas inovadores e o uso de ciência e tecnologia são hoje elementos indispensáveis nas questões de saneamento, e mais: no que tange à proteção dos mananciais, as análises mostram que investir em pesquisas, desenvolver programas e ações preventivas são muito mais viáveis que o posterior tratamento de águas contaminadas. No “Panorama do Saneamento Básico no Brasil” - documento que subsidiou a elaboração do Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB) - na parte referente à ciência e 5 tecnologia, Andrade Neto (2011, p. 385) ao falar dos custos de uma estação de tratamento de água (ETA), afirma: O custo de uma ETA para tratar adequadamente água de mananciais contaminados e fortemente poluídos, com micropoluentes e microcontaminantes de difícil remoção e patogênicos emergentes, seria altíssimo e insuportável para aplicação em larga escala. Mais adiante (p. 386), complementa: Já se faz necessário intensificar as pesquisas e desenvolver tecnologia de tratamento para água de má qualidade, mas se a degradação das águas de mananciais sem a devida proteção continuar nesse ritmo, em poucas décadas será necessário refazer as ETAs existentes, adequando-as em larga escala para tratamento complexo, o que acarretará um custo muito alto para o país. Sem dúvida, é muito mais sensato e muito mais econômico proteger os mananciais e tratar os esgotos, para adiar a necessidade e evitar ETAs cada vez mais complexas e caras. (grifo nosso). Analisando as nossas afirmações, de que projetos, programas e ações relacionados à proteção de mananciais pressupõem uma estrutura técnica, legal e administrativa mínima, para que o poder público tenha condições de colocá-los em prática de forma eficiente, entendemos que o sistema jurídico vigente permite - havendo vontade e estrutura administrativa, a execução de medidas protetivas eficientes. Neste sentido, a elaboração dos Planos Municipais de Saneamento Básico torna-se um elemento crucial do processo. Do ponto de vista técnico e tecnológico, como aponta o já referido documento do PLANSAB, os empecilhos são superáveis, feitos os devidos aperfeiçoamentos e as adequações aos casos e realidades locais. Daí exsurge a necessidade de se estimular o saber científico e a sua disseminação a todos. 5 - ANDRADE NETO, Cicero Onofre de. Desenvolvimento tecnológico: caderno temático nº 8. In: REZENDE, S.C. (Org.). Cadernos temáticos. Brasília: Ministério das Cidades, 2011. (Panorama do Saneamento Básico no Brasil, v. 7). Disponível em: <http://www.cidades.gov.br/images/stories/ArquivosSNSA/PlanSaB/PANORAMA_vol_7.pdf>. Acesso em 29 jul 2015. W. Júnior W. Júnior Umari-bravo Calliandra sp. 31