RESULTADOS ECONÔMICOS DOS ASSENTAMENTOS RURAIS DA ZONA DA MATA DE PERNAMBUCO. José Maurício Pereira Marcio Miceli Maciel de Sousa RESUMO O trabalho analisa o processo de reforma agrária na Mata Pernambucana, a partir de dois estudos de caso, enfatizando os aspectos referentes ao acesso à terra e à diferenciação econômica e social entre os assentados. No estudo foram utilizados documentos recentes de instituições como CONDEPE, INCRA, IBGE, artigos de revistas e contatos feitos com a FETAPE. Foi realizado um diagnóstico da região, identificando-se os principais problemas e potencialidades da sua agropecuária. Estudou-se a problemática dos assentamentos rurais no país e na região. Foram realizadas entrevistas referentes ao objeto do estudo, nos municípios de Vicência e Vitória de Santo Antão. A maioria dos entrevistados sente dificuldade em utilizar a terra, em sua extensão e em intensidade, por falta de condições materiais e de apoio necessários. Disso resulta uma agricultura atrasada tecnologicamente, repercutindo no baixo nível de vida das famílias. Os assentados passaram por dificuldades enquanto acampados, como o frio, a fome e a expectativa de confronto com a polícia. A falta de apoio e de infra-estrutura determina uma diferenciação socioeconômica entre as famílias assentadas. As principais reivindicações dos assentados são a utilização de irrigação e a disponibilidade de um trator comunitário. A metade da produção dos assentados destina-se ao consumo familiar. Palavras-Chave: Assentamentos Rurais, Agricultura Familiar, Viabilidade Econômica. INTRODUÇÃO A reforma agrária no Brasil há tempo vem sendo executada, acumulando resultados tímidos e incapazes de modificar sua estrutura fundiária, caracterizada por uma injusta concentração de terras. Dados de 1995 do IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística mostram que no país 2,2% dos estabelecimentos correspondentes as unidades com 500 ha ou mais ocupam 56,5% da área total das terras no Brasil. O estudo trata da execução da reforma agrária na mesorregião da Mata Pernambucana pela análise da sua execução em dois projetos de assentamento. Prioriza os aspectos que dizem respeito às formas de luta pelo acesso à terra e à diferenciação econômica e social entre os assentados. A Zona da Mata de Pernambuco historicamente foi, e continua sendo, palco de disputas acirradas e conflitos pela posse e uso da terra. No período colonial o modo de produção era 2 calcado na plantation, mantido através de um tripé constituído da monocultura canavieira, do trabalho escravo e do latifúndio. O sistema deixou uma herança negativa, contribuindo de forma significativa para a formação de uma estrutura agrária concentrada, vigente até hoje. Dados atuais do INCRA mostram que é nesta região onde se concentra o maior número de assentamentos rurais do Estado, perfazendo 93 projetos que abrigam aproximadamente 5.200 famílias. Nestas áreas, em geral, a produção é feita sem utilização de técnicas agrícolas avançadas, resultando na oferta de um produto sem competitividade no mercado. A venda dos poucos excedentes da produção é realizada através de intermediários, a preços sempre desvantajosos para o produtor rural. A maioria das famílias, portanto, apenas trabalha para a subsistência, apresentando renda monetária média abaixo de um salário mínimo mensal. A Mata Pernambucana representa 8,6% da área do estado de Pernambuco. Sua população, calculada no ano de 2000 através do Censo (IBGE), atingia 1.207.274 habitantes, representando 15,5% do total no estado. A densidade demográfica alcançava 143 hab/km². Da população total, 69% vivem em áreas urbanas e 31% em áreas rurais. (CONDEPE, 1998, p.27). A demanda dos trabalhadores por terra é grande. A pressão das representações dos sem-terra levou o governo a promover a divisão de lotes familiares, cujo tamanho médio varia entre 5 e 7 hectares. O espaço cultivado não se constitui na sua totalidade por produção de cana-de-açúcar, mas também de lavouras anuais e permanentes, além da pecuária. A cana apresenta a maior área plantada, seguida pela banana e pela mandioca. A exploração da cana-de-açúcar ocupava até recentemente 86,45% do total da área cultivada (CONDEPE, 1998, p.43). As áreas exploradas com outras lavouras, permanentes e temporárias, correspondiam a 13,55% do total cultivado. Ainda segundo o CONDEPE (1998), somente 250 mil hectares na mesorregião apresentam condições satisfatórias para o cultivo da cana-de-açúcar; o que equivale dizer que, dos 450 mil hectares hoje cultivados (dados proporcionados pelos fornecedores de cana), há em torno de 200.000 hectares disponíveis para outras lavouras. O programa de redistribuição de terra na Zona da Mata vem se realizando de forma muito lenta e ineficiente, mesmo se considerando a grande heterogeneidade dos projetos e dos seus assentados – a trajetória seguida para obtenção da terra, a experiência acumulada por cada beneficiário, diferenças de idade, composição do grupo familiar, ideologias e práticas religiosas, as aspirações pessoais, entre outros aspectos. Os principais passos metodológicos seguidos na elaboração do estudo foram: revisão bibliográfica, seleção dos dois assentamentos, contatos com técnicos do INCRA e outras instituições e utilização de materiais do seu acervo, reuniões com membros da FETAPE – Federação dos Trabalhadores da Agricultura em Pernambuco, duas viagens a cada assentamento, entrevista com 9 assentados. No INCRA foi obtida a relação dos assentamentos existentes na Mata Pernambucana, contendo detalhes referentes ao número de famílias instaladas em cada assentamento, o município a que pertence e a área ocupada por cada um deles. A seguir foram executados os trabalhos de análise das informações coletadas e elaboradas as conclusões do estudo. A escolha dos dois assentamentos a serem definidos como objeto de estudo foi norteada levando-se em conta: a maturação do projeto, a representatividade em número de famílias, a data de fundação e a localização de um assentamento na Mata Setentrional e outro na microrregião de Vitória de Santo Antão, levando-se em consideração assim a heterogeneidade da mesorregião. Os 3 dois que mais se enquadraram mediante as características exigidas foram os assentamentos de Barrinha/Firmativo e Açude Grande. A partir de uma maior precisão no objeto do trabalho, contou-se com uma rica fonte de estudo para caracterização e análise do funcionamento dos assentamentos, identificando os principais problemas por eles vivenciados, as potencialidades ali existentes que ainda não haviam sido aproveitadas, bem como e de que forma esses projetos poderiam contribuir para o aumento do dinamismo econômico da Mata pernambucana. A partir da coleta de dados obtidos com a aplicação de dois questionários foram elaborados os resultados da pesquisa, apresentados em forma de tabelas, cujo resultado da tabulação é apresentado em percentuais, dando suporte para a elaboração da conclusão do trabalho. Nos dois estudos de caso referidos constatou-se que a reforma agrária implantada na Mata pernambucana apresenta resultados que estão longe de promover o bem-estar da maioria das famílias assentadas. Com pouco acesso aos serviços de apoio à produção e partindo de dificuldades financeiras e tecnológicas dos assentados, as atividades agrícolas são praticadas com baixa produtividade. No item I serão estudadas as características dos assentamentos, em particular os dois projetos selecionados – Barrinha/Firmativo, em Vicência e Açude Grande, em Vitória de Santo Antão - e analisadas as informações obtidas na pesquisa. No item II o estudo apresenta suas conclusões e recomendações. 1. ASSENTAMENTOS RURAIS Durante a década de 1950 tornava-se cada vez mais nítida a intensificação do fluxo de mão-de-obra que se deslocava da região Nordeste em busca de uma condição de vida melhor, no Sudeste brasileiro, mais especificamente nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Nestas localidades a indústria, principalmente a da construção civil, gerava uma grande oferta de emprego e renda para a população, transformando-se assim, num grande pólo de atração para emigrantes de outras regiões. A migração de parte da população da região Nordeste trouxe várias dificuldades para os latifundiários no que diz respeito à carência de braços no campo, fenômeno esse que jamais havia ocorrido, elevando o preço da mão-de-obra. Paralelamente a esses dois entraves, surgiam as Ligas Camponesas representadas pelo advogado Francisco Julião que lutava pela igualdade de direitos trabalhistas entre trabalhadores rurais e urbanos. Juntamente com os sindicatos foram responsáveis pela organização dos trabalhadores rurais que de tanto insistirem e reivindicarem tiveram seus direitos garantidos e reconhecidos em 1963, quando foi implantado o Estatuto do Trabalhador Rural. Mediante este quadro, muitos proprietários resolveram transformar parte de sua fazenda em atividade pecuária; já que esta necessitava de menos mão-de-obra e pelo fato do preço da carne não estar em decadência como o do açúcar, proporcionaria assim, a manutenção do capital fundiário. 4 Os assentamentos rurais representam uma situação recente na questão agrária brasileira. A partir da década de 1980, esse processo foi intensificado devido às fortes pressões dos movimentos sociais, representantes de setores marginalizados do acesso à terra. Através de muita força e luta, esses movimentos foram ganhando espaço e voz perante o Governo e a sociedade, constituindo-se num agente imprescindível no processo de transformação deste quadro. O desempenho dos projetos de reforma agrária constitui um tema muito presente na sociedade e há uma expectativa a respeito do êxito ou do fracasso dos assentamentos. Pesquisa da FAO mostra que os projetos de reforma agrária no Nordeste atingem resultados econômicos entre os piores do país. Deve-se registrar que a diversificação de culturas constitui uma das bandeiras dos movimentos pela distribuição da terra na Zona da Mata. É marcante a trajetória de obediência e da falta do exercício em tomar decisões por parte dos produtores assentados, devido à condição anterior de assalariados, dependentes de ordens emanadas dos chefes que organizavam as tarefas a serem por eles cumpridas. Hoje, proprietários de parcelas de terra, um grande número de assentados tem dificuldade em tomar iniciativas em benefício do desenvolvimento dos seus trabalhos. “Ninguém vira empresário da noite para o dia, é difícil sair do corte da cana e chegar a empresário rural. Esta é a principal dificuldade dos assentados” (Ana Navais, professora da UFRPE). O processo de reforma agrária vem se delineando de forma lenta na Zona da Mata de Pernambuco, como em todo o restante do País. A quantidade demandada de terras ainda é muito maior que a oferta proporcionada pelo INCRA. Permanece a rigidez na estrutura de posse e uso da terra. A formação dos assentamentos rurais no Brasil ocorreu logo após a criação do Estatuto da Terra em 1964 pelo governo militar. A distribuição de terras há muito vem apresentando resultados decepcionantes, quando comparados à meta estipulada pelo governo. Como exemplo, a proposta pelo Plano Nacional de Reforma Agrária no período entre 1985 e 1989 que previa o assentamento de 1,4 milhões de famílias, alcançou apenas 6,5% do objetivo. Percebe-se a imensa defasagem entre o número de famílias assentadas anualmente pelo governo FHC, girando em torno de 70 a 80 mil por ano, em relação à demanda reprimida, a qual, segundo o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra) encontra-se em torno de quatro milhões de famílias. Quanto ao Governo Collor, apesar de seu compromisso inicial, o programa de assentamentos foi paralisado, não se registrando neste período nenhuma desapropriação por interesse social. O número de famílias assentadas foi insignificante. A evasão há muito representa um enorme problema para a política agrária brasileira. Estima-se que 40 a 50 mil famílias abandonam suas glebas por ano devido à falta de infraestrutura necessária para desenvolver uma atividade agropecuária capaz de faze-los ascender social e economicamente. Segundo listagem obtida no INCRA, existem atualmente 67 assentamentos na Mata Meridional, abrigando 3.864 famílias. Na Mata Setentrional são 16 assentamentos que abrigam 912 famílias e na microrregião de Vitória de Santo Antão identificam-se 10 assentamentos constituídos por 490 famílias (INCRA, 2002). A liberação de crédito fora do calendário agrícola, a morosidade na demarcação dos lotes familiares, a falta de assistência técnica contínua e a ausência de cooperativas, contribuem de 5 forma significativa para que famílias desistam de serem assentadas, passando a trabalhar novamente na agricultura patronal. Uma estrutura que poderia ser aproveitada pelos assentamentos foi criada por iniciativa do INCRA, em articulação com outras instituições na Zona da Mata: a Agência Regional de Comercialização – ARCO – que objetiva melhorar a renda dos agricultores familiares e promover a sua inserção competitiva no mercado. Foram instaladas duas agências, sendo uma na Mata Meridional e outra na Mata Setentrional. A ARCO define como condição indispensável que haja uma efetiva assistência técnica aos produtores e uma estrutura de assessoramento na realização de negócios. Também pretende estimular o cooperativismo. É cedo para uma análise da atuação deste instrumento, levando em conta sua recente implantação no estado. Todavia pode-se perguntar se o esforço e os recursos destinados à ARCO são condizentes com o tamanho do problema da comercialização e da inserção dos produtores no mercado. A composição populacional dos assentamentos é heterogênea, constituída de assalariados rurais, antigos moradores e assalariados de engenhos e usinas, filhos de trabalhadores que exerciam diversos trabalhos não-agrícolas, formais ou informais, posseiros, parceiros, arrendatários e aposentados. No que se refere à inserção social e à identificação política, os assentados da Zona da Mata de Pernambuco são mobilizados pelo MST, pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Pernambuco – FETAPE, pela Comissão Pastoral da Terra – CPT, pelas Comunidades Eclesiais de Base – CEBs. Cada um desses agentes institucionais propõe um modelo de organização econômica e social (D’INCAO e ROY, 1995 – p.27). Nos dias 15 e 16 de abril de 2003 aconteceu no Recife um seminário promovido pelo INCRA, intitulado “O Novo Modelo de Reforma Agrária, Instrumento de Inclusão Social e Desenvolvimento Socioeconômico”. No evento foi realizado um balanço do número de famílias assentadas nos dois mandatos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Foi também apresentado o projeto de reforma agrária do presidente Luís Inácio Lula da Silva, bem como a meta de assentar 2.000 famílias em 2003 no estado de Pernambuco. Este número foi considerado pequeno pelos representantes dos movimentos sociais presentes no evento. O superintendente do INCRA em Pernambuco prometeu que o órgão faria um esforço máximo para dobrar esta meta. 1.1Assentamento Barrinha – Firmativo Os engenhos Barrinha e Firmativo foram desapropriados, mediante o Decreto publicado no Diário Oficial da União em 25 de novembro de 1998. O projeto de assentamento foi criado em 13 de agosto de 1999, apresentando uma área de 374,55 ha dividida entre 36 famílias rurais, estando situado a 87km do Recife e 8km da Sede Municipal. As casas dos assentados dispõem de energia elétrica e foi moldada no sistema de agrovilas. O assentamento dispõe de uma Cooperativa de Produção Agropecuária. A produção está ligada ao cultivo de feijão, macaxeira e milho, em sua maior parte para subsistência. A falta de possibilidades financeiras para adquirir insumos representa uma grande dificuldade para os produtores em combater as pragas. No início das atividades no assentamento 6 foi elaborado um projeto para plantar limão e côco, sendo acordado, também, que cada assentado deveria comprar uma vaca. A educação é desenvolvida de forma ineficiente no assentamento Barrinha/Firmativo. As taxas de analfabetismo são bastante elevadas. Os problemas são os mesmos vividos pela educação pública brasileira. A saúde da população residente no assentamento Barrinha/Firmativo é bastante precária. Existem problemas como a verminose causada pela falta de higiene no preparo dos alimentos, pela falta d’água apropriada para o consumo e pelo contato com animais domésticos que não recebem vermifugação. Um problema bastante sério é o do alcoolismo. Do total da área foram reservados 75 ha para a constituição de área de reserva, seguindo e respeitando as leis de amparo ao meio ambiente. O INCRA considera como adequados para o assentamento a bovinocultura de leite e carne, a plantação de fruteiras, o cultivo do inhame e da banana. Entrevistado, o senhor João José da Silva, pai de um filho e residente da parcela de número 09, revelou o quanto foi dura a chegada à terra: “O começo foi bastante duro, fomos despejados do acampamento de Terra Nova por setenta policiais. O proprietário da terra nos ofereceu o engenho Barrinha-Firmativo para a desapropriação. Ficamos debaixo de lonas em Terra Nova por um bom tempo, onde plantávamos apenas para o nosso consumo”. Seu João afirmou que houve ajuda por parte do MST e de um deputado federal às pessoas acampadas. “As parcelas já estão demarcadas, mas a terra ainda não está regularizada. Dentro do assentamento existem algumas parcelas melhores do que outras”. Outra pessoa entrevistada foi o senhor José Roberto da Silva, pai de quatro filhos e residente da parcela de número 04: “A terra que nos foi dada é pouca e fraca, além de ser desnivelada. Os sete hectares da parcela não é suficiente para nós plantar, além do mais algumas terras são melhores do que as outras. No inverno a parcela alaga e no verão seca ligeiro”. “Aqui só tem energia na casa, não tem na parcela. A energia é fraca por ser do tipo monofásica, dificultando e muito a instalação de um projeto de irrigação aqui no assentamento”. A última entrevista foi bastante curiosa, pois a assentada não participou do acampamento. Dona Maria José Barros Pereira, mãe de três filhos e residente da parcela de número 08, considera o tamanho de sua parcela suficiente, bem como a qualidade de sua terra. 1.2. Assentamento Açude Grande O engenho Açude Grande, localizado em Vitória de Santo Antão resultou da situação vivida pela Zona da Mata, palco de disputas pelo uso da terra entre proprietários e produtores sem-terra. Era utilizado pelo proprietário para criação de gado. Mesmo tomando essa medida alternativa, a propriedade sofria com a baixa produtividade obtida pela má administração por 7 parte do proprietário do estabelecimento. O fracasso das atividades fez com que o engenho ficasse em situação difícil. Um grupo de trabalhadores sem-terra orientados pela FETAPE e pelo sindicato de Vitória de Santo Antão resolveu ocupar o engenho em 1997, transformando-o em acampamento. Um empecilho inicial, que foi contornado através do diálogo entre os acampados e os técnicos do INCRA, foi referente à divisão das parcelas e ao estabelecimento de uma área padrão. Segundo o módulo fiscal do INCRA, a área do assentamento, de aproximadamente 300 hectares, deveria receber apenas 27 famílias, pois o módulo oficial para a Zona da Mata Pernambucana é de 15 hectares por pessoa detentora da titularidade da terra. Os representantes dos assentados mantiveram firmes e inalterados a opção pelas 47 famílias. O INCRA decidiu cedeu, ressalvando-se a condição de que todos deveriam assinar uma declaração assumindo perante a sociedade a responsabilidade de terem querido ficar com parcelas de apenas 5 hectares. Uma vez assumida o lote, a demarcação e o parcelamento da terra conquistada foi financiado pela produção remanescente de cana-de-açúcar vendida por dez mil reais, sendo utilizado parte desse dinheiro para o pagamento de uma firma contratada para fazer os trabalhos topográficos, dando a cada assentado o mapa de sua parcela e da área comunitária do assentamento. O dinheiro restante foi utilizado na contratação de um geólogo que juntamente com sua equipe fez os estudos e localizou sete poços artesianos. Vencida a batalha pela água, começava outra dura conquista pela energia elétrica, ainda mais árdua, já que a CELPE (Companhia Energética de Pernambuco) havia sido privatizada. Depois de muita luta foi instalada às vésperas do Natal de 1999 a energia nas casas dos parceleiros, sendo do tipo monofásica. Seu Regino é um dos sete chefes de família que já moravam no engenho antes desse se tornar acampamento. Ele considera a terra como sendo de boa qualidade, mas no que diz respeito ao tamanho da parcela ele a classifica como pequena e insuficiente. : “Falta muita coisa como: irrigação, energia elétrica trifásica em toda a parcela, um trator que nos ajude na plantação, um transporte, uma escola melhor, mais dinheiro, assistência técnica e uma Igreja Católica para nós rezar”. “A terra é fraca, precisa de adubo, mas uso apenas estrume de gado para adubar a plantação. O dinheiro é muito curto pra comprar adubo”. Uma diretora do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Vitória de Santo Antão falou: “Eu participei de uma associação e juntamente com o sindicato iniciei a luta pela terra. Senti grande dificuldade em chegar no acampamento, pois morava em Pombos. Deixei meu marido e meus filhos para ir lutar no acampamento em busca de um pedacinho de chão para que pudesse morar e plantar”. A senhora Maria das Dores de Sousa, mãe biológica de dois filhos e adotiva de um, residente na parcela de número 24 revelou que: “Não houve resistência por parte da polícia nem por parte do senhor de engenho, quando acampamento todos nós se ajudávamos (sic), o trabalho era feito em conjunto e no final agente dividia a produção”. 8 “A terra não está regularizada porque nós não recebemos ainda o título de posse, a terra já tá toda demarcada. Algumas parcelas são melhores do que as outras”. Dona Maria revelou que o acesso à água é difícil e cansativo. Ela aponta a falta de assistência técnica como sendo um outro grave problema a ser combatido. Pela falta de um veterinário que desse assistência ao assentamento, ela perdeu a sua única vaca, de onde tirava o leite das crianças. “A terra tem que ser adubada, pois ela é de má qualidade, eu não adubo ela porque não tenho dinheiro para isso”. A terra está no seu nome, o que demonstra o espaço conquistado gradativamente pelas mulheres no meio rural. Dentro do assentamento Açude Grande existem sete proprietárias de parcelas rurais. O senhor Edílson confessou que muitos assentados estão substituindo a lavoura branca pelo cultivo da cana-de-açúcar. Pois a cana rende lucros 3 vezes maiores do que a plantação de inhame, macaxeira, feijão e hortaliças. Entrevistando o senhor Amaro Vicente da Silva, pai de cinco filhos e residente da parcela de número 26, este revelou: “Nós chegamos no acampamento em 1997, tivemos de passar alguns meses lutando para que o engenho fosse transformado em assentamento, passamos necessidades de todo tipo. Quando já estávamos assentados recebemos a ajuda do sindicato da construção civil”. “O tamanho da terra é suficiente, a terra que não é boa, por conta de quando bate a chuva alaga tudo e, quando está seco é inviável a plantação. Falta um maior apoio por parte do Governo Federal principalmente em assistência técnica” Alguns demonstraram intranqüilidade com o futuro e a sua situação de assentado. “A terra é financiada pelo Governo Federal, não sei quando vou ter que começar a pagar a terra”. Através do corpo-a-corpo com os assentados obteve-se a possibilidade de ouvir as inúmeras reivindicações feitas por eles, consideradas fundamentais para que o assentamento prospere tanto no prisma econômico quanto no que diz respeito ao social. Várias foram às dificuldades por eles apontadas. “A terra tem que ser adubada, pois ela é de má qualidade, eu não adubo ela porque não tenho dinheiro para isso”. “Não utilizo adubo por não ter condições financeiras, somente a terra não é suficiente para a minha sobrevivência e da minha família. Por isso trabalho como topógrafo. Se eu utilizasse adubo e a minha parcela fosse irrigada aumentaria a produtividade da minha terra”. Na sede do Sindicato de Vitória de Santo Antão, o atual Secretário de Finanças, destaca a falta de comprometimento com a agricultura familiar representado através da criação de um processo de burocratização que dificulta e muito a melhoria de vida das pessoas dependentes do dinheiro obtido junto aos bancos. Segundo ele, há dez anos atrás a inadimplência da pequena produção era mínima, enquanto hoje vem aumentando de forma preocupante. 9 1. 3. RESULTADOS Sobre o processo de chegada a terra e a organização no acampamento, 100% dos entrevistados declararam ter passado por dificuldades enquanto acampados. Em relação a organização do acampamento todos foram unânimes ao revelar o modo de trabalho coletivo com divisão da produção após a colheita. Das dificuldades na obtenção da terra, 44% apontaram o despejo sofrido mediante atuação policial e a dificuldade e lentidão no processo de transformação de acampamento em assentamento como os principais problemas. Ao serem perguntados sobre quem os ajudou, mais da metade afirmou ter recebido ajuda da FETAPE, do Sindicato e de um deputado estadual. Enquanto 22,3% disseram não terem recebido ajuda de ninguém e, 11% falaram ter recebido ajuda de um deputado federal, do MST e da prefeita de Vicência. Todos os entrevistados afirmaram que a terra encontra-se demarcada, enquanto 89% disseram que a terra não está regularizada. Um pouco menos da metade das pessoas entrevistadas consideram o tamanho da parcela insuficiente, não atendendo às suas necessidades e mais da metade acham o solo pobre e de má qualidade. Entre os entrevistados, 77,8% declararam necessitar de adubo para que a terra se tornasse mais produtiva. A tabela abaixo representa os principais problemas da parcela apontados pelos entrevistados. Tabela nº 1 - Reivindicações Feitas pelos Assentados Reivindicações Irrigação Trator comunitário Água encanada Energia trifásica na parcela Crédito extra Adubo orgânico Assistência técnica Fonte: Pesquisa de Campo.PIBIC 2002/2003. (%) 100 100 44 77 44 33 55 10 No que se refere à mecanização dos trabalhos, não havia o uso de equipamentos a tração mecânica ou animal. A totalidade dos entrevistados considera a falta de irrigação e de um trator comunitário como principais problemas vivenciados. Em segundo lugar aparece a falta de energia trifásica na parcela, restringindo o consumo, em geral, e a irrigação em particular Apenas dois dos nove assentados não mencionaram o problema. Em terceiro lugar aparece a falta de assistência técnica. Cinco dos nove assentados acreditam que com um maior acompanhamento técnico, obteriam melhores resultados nas plantações e na criação de animais. Em relação ao acesso à água para consumo, todos os entrevistados a consideram de boa qualidade, porém lamentam não dispor de água encanada em suas casas. Quando perguntados sobre o acesso à energia elétrica, todos os entrevistados afirmaram possuir energia apenas nas casas, sendo essa do tipo monofásica. Em visitas realizadas em abril de 2003 encontrou-se um cenário mais animador em relação as visitas anteriores, feitas em período de seca. No cenário dessa segunda visita havia cor na paisagem, o verde era predominante, as pessoas não mais estavam dentro de suas casas, desesperançosas. Estavam todos trabalhando em suas parcelas, foram presenteados pela chuva. Apesar de toda essas dificuldades a recepção foi acolhedora, realizada por cidadãos que alegam ter a sua saúde como única riqueza. Quando perguntados sobre as atividades agrícolas desenvolvidas em sua parcela, a resposta aparece representada na tabela abaixo: Tabela nº 2 – Atividades Praticadas nos Assentamentos. Atividades Macaxeira Batata Coco Banana Milho Cana-de-açúcar Inhame Feijão (%) 100 78 89 89 100 55 78 66 Fonte: Pesquisa de Campo. PIBIC 2002/2003. Observa-se que todos os assentados plantam macaxeira e milho. A banana e o coco aparecem em segundo lugar, pois 89% dos parceleiros os cultivam, enquanto 78% dos entrevistados revelaram plantar batata e feijão. Um fato bastante interessante e revelador é o percentual de apenas 55% dos entrevistados plantarem cana-de-açúcar, dada a hegemonia histórica desta cultura na mesorregião da Zona da Mata de Pernambuco, se bem que os assentamentos são iniciativas que apontam para a diversificação. Parece estar se dando início a um processo lento de expansão da pluriatividade em detrimento da monocultura canavieira. Foram mencionados também os cultivos de limão, acerola, manga, mandioca entre outros. Além de também existirem algumas casas de farinha no assentamento. Deve-se ressaltar que os coqueiros são ainda novos e que grande parte ainda não começou a produzir. Todos os entrevistados disseram ter adquirido uma vaca quando receberam o crédito do PRONAF. Hoje em dia, apenas um assentado ainda a possui. Os outros disseram ter perdido o seu animal por falta de assistência médica veterinária, que estava assegurada pelo projeto. Seria o 11 leite importante fonte de proteína para alimentar as crianças do assentamento, contribuindo para o combate da desnutrição infantil. Outro acontecimento bastante triste foi a morte de todas as cabras adquiridas com o dinheiro do PRONAF. Em relação ao crédito o INCRA liberou a verba para construção das casas. Havia uma planta básica e o financiamento de R$ 2.500,00 para aquisição de material, sendo o trabalho de construção das casas realizado em mutirão. Ao chegar à terra, as famílias se abrigavam, na sua maioria, em moradias precárias na parcela Os de maior posses, ampliaram a planta inicial, aumentando o número de quartos ou construindo terraço em volta da casa. O apoio creditício destinado a implantar os trabalhos na parcela consta de: financiamento para a implantação de culturas temporárias – custeio – é de R$ 1.400,00 por família; para realizar investimentos o assentado recebe em financiamento subsidiado a importância de R$ 9.000,00, com carência de três anos e prazo total de 12 anos. A criação de animais nos dois assentamentos se restringe mais ao apoio às atividades de subsistência. Os jumentos, bem como os cavalos, servem para transportar água para a irrigação de pé em pé, e auxílio no transporte das famílias no caso do assentamento Barrinha-Firmativo, pois as parcelas distam 2,5 km das casas, organizadas no estilo de agrovila. Já em Açude Grande as casas ficam dentro das parcelas. Tabela nº 3 – Atividades Exercidas Fora da Parcela Atividades Sim Não Assentados (%) 22,2 77,8 Fonte: Pesquisa de Campo. PIBIC 2002/2003 Indagados sobre a realização de atividades fora de sua parcela, sete entrevistados disseram obter toda a sua renda da própria terra, consolidando o caráter de exploração familiar nos assentamentos. Dos dois assentados que têm atividades fora de sua parcela, um trabalha no período do verão no corte da cana-de-açúcar, enquanto a outra assentada trabalha no sindicato de trabalhadores rurais de Vitória de Santo Antão, não tendo salário fixo. Torna-se importante ressaltar que ambos trabalham uma parte do tempo em suas parcelas e o restante desempenham outras atividades fora de seus lotes. Constatou-se na pesquisa que alguns produtores, mesmo entre os não entrevistados, além dos afazeres no lote, dedicam-se a outras atividades. Entre as temporárias permanece a ligação com o corte da cana. Por outro lado, pode-se constatar que há uma relação entre o assalariamento na palha da cana e a situação de pouco progresso ou fraco dinamismo na sua própria parcela. Ou seja, os produtores encontram-se inviabilizados para desenvolver os trabalhos na terra, por falta de crédito, assistência técnica, braços da família para trabalhar, ou mesmo por falta de capacitação profissional, e então recorrem ao trabalho como diaristas em usinas e engenhos da região. Dizendo de outra forma, o acesso à terra ainda não significou uma mudança nas suas condições econômicas, capaz de se libertarem da situação de vida anterior, de trabalho na palha da cana. Ainda como fonte de renda, os que se dedicam a tarefas fora da sua gleba, o fazem também nas parcelas de companheiros do mesmo assentamento. Tabela nº 4 - Acesso à Terra e Diferenciação Econômica. 12 Assentamentos Barrinha/Firmativo e Açude Grande Situação da terra Demarcada Regularizada Destino da produção Consumo familiar Comercialização Outras rendas Sim Não Percentual (%) 100 11 50 50 55,7 44,3 Fonte: Pesquisa de Campo - PIBIC2002/2003. Os nove assentados entrevistados disseram comercializar a metade do que produzem, guardando a outra metade para o consumo familiar. Da parte comercializada geralmente a produção é vendida a atravessadores ou em feiras-livres nas cidades onde estão localizados os assentamentos. Gráfico 1 - Formas de Comercialização dos Produtos dos Assentamentos e Parte do Consumo Familiar. G r á f ic o 1 - D e s t in o d a p r o d u ç ã o 5 0 ,0 % 3 3 ,5 % 1 6 ,5 % A tra v e s s a d o re s F e ir a - liv r e C o n s u m o F a m ilia r Fonte: Pesquisa de Campo. PIBIC 2002/2003. Dos principais produtos comercializados destacam-se a macaxeira, o milho, o inhame, a banana e a farinha de mandioca. Os que produzem a cana-de-açúcar em suas parcelas, vendem-na integralmente, por esta atividade possuir um mercado garantido na região. Mesmo em terras de assentamentos tem se verificado, nos últimos dois anos, a implantação ou ampliação do cultivo da cana. “Na Mata, o pequeno agricultor planta cana para garantir a feira e, se poupar, compra alguns animais. A diversificação surge agora, mas enfrenta como desafio a velha cultura”. (Thales Wanderley, professor da UFRPE) Todos os assentados do Barrinha-Firmativo vendem o seu produto a atravessadores, enquanto a grande maioria dos parceleiros de Açude Grande vendem o seu produto em barracas (bancas de pequenos comerciantes). Dentre os assentados entrevistados, 22,3% recebem aposentadoria (marido ou mulher) e 33,4% são beneficiados pelo programa Bolsa-Escola, auxílio proveniente do governo federal que a família recebe para manter os filhos na escola, constituem os principais elementos desta renda obtida fora da atividade primária. Por outro lado, é bastante significativa a renda familiar 13 originada de outras fontes que não das atividades agrícolas, como as aposentadorias/pensões, tanto por parte do assentado como por parte dos membros da família. Tabela nº 5 – Percentual de Pessoas da Família que Trabalham na Parcela Pessoas que trabalham na parcela 1 2 3 Mais de 3 Utilizam mão-de-obra contratada esporadicamente Assentados (%) 11 22,2 22,2 44,6 88,8 Fonte: Pesquisa de Campo. PIBIC 2002/2003 Todos os assentados sinalizaram para a necessidade de contratar trabalhadores para aumentar a área plantada de sua parcela e 88,8% dos parceleiros contratam trabalhadores de forma bastante esporádica. A mínima contratação de mão-de-obra se dá também devido à pouca possibilidade financeira dos produtores. As famílias carentes do campo têm como quase único acréscimo de capital produtivo, o crescimento de suas famílias, pois essa expansão representa mais braços disponíveis para o trabalho no roçado. O nível de participação nas áreas em estudo é baixo, com as decisões concentradas nas mãos de um grupo reduzido. Verifica-se, todavia, a existência de um grupo com um grau maior de participação na vida da comunidade, fazendo-o de forma positiva e afirmativa. Estes associados, nem sempre alfabetizados, enfrentam desafios pela implantação de novas atividades através de esforços pessoais, apresentando idéias sobre a organização da produção e da comercialização e aproveitam melhor os treinamentos e a capacitação. 2. CONCLUSÂO e RECOMENDAÇÕES A partir análise dos dados obtidos constata-se que a reforma agrária desenvolvida na Zona da Mata de Pernambuco apresenta resultados insatisfatórios, causados pela falta de infra-estrutura e apoio necessários para que os assentamentos prosperem. O processo de distribuição de terras promovido pelo Governo Federal, através do INCRA, tem se mostrado incapaz de promover a inclusão social de grande parte dos assentados, que por não deter das condições básicas para sobreviver com dignidade, situam-se a margem da sociedade, impossibilitados de desfrutar da riqueza da nação. Os lotes dos assentados não são aproveitados em sua totalidade, por falta de crédito agrícola e pela não utilização de técnicas modernas na produção, tornando estes pequenos produtores rurais menos competitivos no mercado em relação à agricultura patronal. Esta falta de competitividade da agricultura familiar é resultado do desenvolvimento de uma agricultura com menores investimentos, compensada pelo aumento da extensão da jornada de trabalho familiar. A precariedade das estradas nos assentamentos em geral constitui outro fator que complica a comercialização, bem como todo o processo produtivo e a vida das famílias nas suas articulações com outras comunidades e com os centros urbanos da região. 14 A burocracia na liberação do crédito inviabiliza a aquisição de insumos, tornando a terra menos produtiva, dificultando ainda mais a venda do produto, que quase sempre é comercializado de forma desvantajosa para o produtor, remetendo-o a uma baixa qualidade de vida. A falta de irrigação, de um trator comunitário e de energia elétrica nas parcelas, bem como a inexistência de assistência técnica permanente e de boa qualidade, impossibilitam um melhor rendimento das atividades. Verifica-se entre os produtores uma descrença e uma frustração em relação ao trabalho das instituições, sentimento consolidado pela condição de abandono em que vive a pequena produção agrícola. A eletrificação é um exemplo bem concreto. Poucas parcelas são beneficiadas por este serviço, se bem que parte da verba para a instalação da eletricidade já esteja aprovada e os representantes da comunidade insistam junto aos órgãos competentes. As estradas vicinais são precárias, sobretudo no período chuvoso. Não existe o serviço de abastecimento d´água nas residências. Há os que debitam a responsabilidade ao Estado por não suprir as condições mínimas e necessárias ao desenvolvimento dos assentamentos e os que atribuem à incompetência do produtor. Há um dado que nem sempre é colocado: o desenvolvimento do assentamento depende desses fatores referidos, sim, mas também é processual, interagindo com o mercado e com os fatores internos, que incluem o homem e sua capacidade de desenvolver a parcela, e fatores externos às unidades produtivas. Verifica-se uma diferenciação socioeconômica entre as famílias assentadas, no que diz respeito ao nível de renda e qualidade de vida, dependendo de experiências adquiridas antes de chegar à terra, do grau de capacitação e da disponibilidade da força de trabalho familiar. Todos estes fatores aglutinados justificam o índice de evasão nos assentamentos rurais da Mata Pernambucana, fazendo-se necessário uma maior reflexão por parte dos órgãos competentes acerca do projeto de política agrária desenvolvida no país. O desenvolvimento dos assentamentos rurais requer uma decisão política, de possibilitar o acesso aos produtores tanto da infra-estrutura econômica e dos serviços de apoio, como assessorar na construção de formas associativas, na construção de um modelo de gestão definido pelos produtores. No aspecto produtivo propriamente dito, constituem-se de fundamental importância a assistência técnica, o crédito e o apoio à comercialização. A assistência técnica requer um grande esforço de revitalização, não só para acompanhar as operações de crédito, mas, sobretudo, para levar aos produtores as inovações tecnológicas adequadas às atividades praticadas nos respectivos assentamentos. O crédito precisa ser mais ágil, liberado no período adequado e acompanhado pela assistência técnica. O apoio à comercialização necessita de recursos suficientes para se munir de informações, com os produtores, buscar brechas no mercado local e regional e criar, utilizar ou ampliar instrumentos como feiras, postos de venda, centrais de abastecimentos, etc. 15 Pela sua história de obediência e sentimento de inferioridade nos aspectos econômico e social, não se deve esperar que estas gerações, no seu total e em curto prazo, dêem uma resposta positiva aos incentivos para que se tornem um pequeno empresário rural inserido no mercado, participando de um modelo de gestão que requer mais do que a sua capacidade. Faz-se prioritário um trabalho de educação e capacitação junto aos jovens, nos aspectos técnicos, econômicos e na gestão participativa, em geral mais capazes de assumir novos valores para a construção do futuro. A partir dos dados que mostram baixo grau de alfabetização, vislumbra-se como prioritário o trabalho de educação, capacitação e assessoria à construção da gestão, já que tem acesso a um requisito básico, a terra. O levantamento da situação educacional mostrou que os produtores possuem poucos rudimentos de aritmética, não sendo capazes, por exemplo, de fazer o acompanhamento dos custos e das receitas obtidas em sua gleba de trabalho. 3. REFERÊNCIAS CONDEPE. Plano de Desenvolvimento Pernambucana. Recife, dez.1998. Sustentável da Mesorregião da Mata D’ INCAO, Maria da Conceição; ROY, Gerard. Nós, Cidadãos; Aprendendo e Ensinando a Democracia. Paz e Terra, São Paulo, 1995. FAO/INCRA. Diretrizes de Política Agrícola e Desenvolvimento Sustentável. Brasília, 1994. FIBGE. 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