A EDUCAÇÃO INCLUSIVA COMO ÉTICA DOS DIREITOS HUMANOS NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA Autores: Ana Carla Paz de Oliveira e Antonilza Gonçalves de Lima Maia - Mestrandas em Psicologia da Educação pelo Instituto Superior de Línguas e Administração - ISLA - Leiria / Lisboa. Orientador: Professor Doutor Washington Luiz Martins da Silva- Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. [email protected] e [email protected]. INTRODUÇÃO O Presente ensaio se propõe a aprofundar a relação entre ética e educação e a esclarecer o significado de uma concepção de uma educação inclusiva, abordando a questão da existência de uma ética pedagógica que encontre o seu lugar entre a moral individual e os direitos humanos. A vida ética consiste na interiorização dos valores, normas e Leis de uma sociedade, construída para um sujeito moral que as aceita livre e espontaneamente, através de sua vontade subjetiva e individual. Conseqüentemente, partindo do princípio que o homem (ser único) constrói sua subjetividade na coletividade (meio social), necessário se faz um procedimento efetivo de políticas públicas que sirvam de intercambio – capacitando profissionais efetivamente envolvidos com projetos pedagógicos que aflorem a inclusão. Do ponto de vista do objetivo geral buscamos apresentar a importância da Educação Inclusiva como instrumento de inserção de direitos humanos na sociedade global e multicultural. E isso nos leva a alguns objetivos específicos baseados na identificação e problematização da idéia fundamental da filosofia da educação inclusiva que consiste basicamente em afirmar a ligação íntima existente entre ética e educação. Explicitando, assim, um ‘novo’ conceito de educação inclusiva e sua implicação no processo educacional; além de identificar as características indispensáveis àqueles que se dedicam à prática pedagógica inclusiva. A educação forma o homem, seu potencial criador, produtor e de organização social, transforma, ou pelo menos tenta, formas de pensar, isto não somente referindo-se aos alunos, mas também aos educadores. Há na educação inclusiva a introdução de um novo olhar, um novo paradigma, uma renovação de esperanças. Uma maneira nova de se ver, ver os outros e ver a educação. Para que haja inclusão social, se faz necessário, uma aceitação correlata a mudanças de paradigmas referentes às questões da moral e condutas éticas. O processo de educação inclusiva expande a participação de todos os estudantes nos estabelecimento de ensino regular. Como um reflexo das práticas políticas vivenciadas por algumas instituições de ensino, no Brasil e no mundo esta abordagem humanística e democrática favorece o crescimento e a inserção social de todos. Ao incluir os indivíduos em salas de aulas comuns, impactuam-se flexibilidades e mudanças significativas na estrutura e funcionamento das escolas, culminando em um olhar humanistico por parte dos professores e uma estreita relação como os familiares. Porém muitas das vezes nos defrontamos com algumas barreiras que dificultam a ação do ensino inclusivo, tais como negação a deficiência, falta de comunicação, apoio especializado, acesso físico, entre outros. Diante de um ambiente externo com “desequilíbrios sociais intensos” mudanças de valores e de comportamentos possibilitam uma consciência cada vez maior de cidadania e de direitos, refletindo no fortalecimento do terceiro setor, das ONG’s (Organizações Não Governamentais) e das associações de classe, onde governo, sociedade organizada e cidadãos têm o maior compromisso não somente com o que lhes afetam diretamente, mas com tudo o que comprometa a sobrevivência do planeta e das novas gerações. Tudo isso exige do profissional da educação e que lida com grupos, uma nova postura ética a partir de doação e comprometimento. REFERENCIAL TEÓRICO O pensamento filosófico sobre essa dimensão moral constitutiva da existência mostra uma tensão, que reaparece em diversas épocas, entre uma ética orientada fundamentalmente para o indivíduo e outra que sublinha a estrutura transpessoal das exigências éticas. Desde a origem, a Ética sempre esteve ligada à "Política", pois, para os gregos, a pólis estava inserida na natureza, na physis. Assim, a dike, que geralmente se traduz por justiça, significava originalmente “justeza” e era uma categoria cosmológica antes que ética. Consistia no ajustamento ou reajustamento ético-cósmico do que tinha sido desajustado e também no reajuste ético-jurídico de dar a cada um sua parte (justiça). Assim, a dike se reparte, torna-se nomos. Falar de inclusão, na elaboração de leis e na importância do seu cumprimento legal é um discurso não condizente em todos os aspectos com a realidade. Falar em inclusão social é falar em democratização de espaços sociais, de crenças e de valores nesta sociedade de “iguais”. Incluir não é apenas juntar ou colocar junto e o mais importante, não é negar a diferença, mas respeitá-la. A lei existe e não é cumprida “na íntegra” por não existir comprometimento real com o diferente. É importante que os direitos, que hoje, são assegurados em leis sejam exigíveis. Ultimamente se tem falado muito na chamada Éticas aplicada, que seria na verdade a ampliação da Ética. A Ética aplicada à pedagogia trataria de questões mais concretas ou relevantes para a sociedade sobretudo no campo de uma educação para os direitos humanos. Podemos enquadrar um tema como “eticamente relevante”, quando nos debruçamos sobre questões onde a esfera de influência tem grande alcance sobre as pessoas. Tanto numa comparação quantitativa, como também qualitativa, uma vez que as decisões ali envolvidas vão modificar o cotidiano das pessoas quer diretamente, quer indiretamente. Inclusão significa a modificação da sociedade como pré-requisito para a pessoa com necessidades especiais buscar seu desenvolvimento harmonioso e exercer sua cidadania. Porém, vale salientar que alguns profissionais educadores, não se encontram preparados para lidar com estas mudanças e, que a falta de dados elementares sobre aspectos inerentes ao desenvolvimento cognitivo e motor destes jovens, dificultam a ação docente. Deste modo, argumentos em defesa da inclusão no projeto de cidadania terão necessariamente de desenvolver um reordenamento simbólico e prático do que é uma criança, um adulto e um cidadão. A globalização, como vem sendo posta em prática - particularmente nos países mais pobres - privilegia o capital transformando o conhecimento em mercadoria, a educação em “negócio” e os interessados em “clientes”1. O ethos do capitalismo acompanha as “mudanças”. Sabemos hoje que esse problema não é novo. É essencial que se repense o próprio conceito de cidadania, uma vez que as fórmulas tradicionais e os princípios que apoiavam antigos conceitos de cidadão e cidadania perdem cada vez mais legitimidade e acuidade. Refletir conceitos de cidadania nos leva a análises mais vastas das atuais organizações sociais, familiares, de valores, nas novas relações de gênero e até entre pares. Assim, temos uma enorme diversidade social implicando numa redefinição de papéis e de espaços. Diante desta gritante reflexão social a luta pelos Direitos Humanos se fortalece a fim de acabar com as práticas discriminatórias onde haja igualdade de direitos emergindo assim a necessidade da prática “inclusiva’. 1 Vejam-se os documentos do Banco Mundial “Education Sector Strategy”, principalmente as pp. ix, x, xi, 1, 2 e 37, e “Education Investment”, disponíveis nos sites www.worldbank.org e www.ifc.org/edinvest. No documento observa-se que as prioridades são basicamente mercadológicas e não de abrangência social. As discussões incidem, inclusive, sobre os interesses dos acionistas e aplicadores do mercado financeiro. Vid. MAGALHÃES, F. Maquavel e o PT,Revista Perspectiva Filosófica, nº21,2005,UFPE,Recife. Para que haja a efetivação da inclusão é imprescindível que se advenha mudanças de paradigmas sociais de forma a propiciar um ensino de qualidade para todos. (MANTOAN 1997; 1998). Carvalho (1997, p.104), preconiza que o processo inclusivo integrado, só terá efeitos esperados se for aceito e ambicionado por toda a comunidade escolar. Conseqüentemente, as perspectivas da inclusão determinam mudanças profundas e, acima de tudo, vontade governamental e não-governamental, além de prudência e bom senso. É imprescindível destacar que a inclusão de qualquer cidadão está condicionada ao contexto vital, ou seja, depende diretamente das condições sociais, econômicas e culturais da família, da escola e de todos que formam a sociedade contemporânea. O problema ético do nosso tempo poderia ser recolhido na seguinte questão: pode ser considerado moralmente bom um homem que aceita passivamente e em silêncio uma situação social injusta? A educação inclusiva estabelece a dimensão social e política da ética. Isso não significa, contudo, que possa ser reduzida a um capítulo da Sociologia. Segundo Vasques (2004,p.127), o sociologismo afirma que a força moral das valorações sociais procede pura e simplesmente da pressão social. Assim, segundo Durkheim (Les règles de la méthode sociologuique, L'Education morale) e Lévy-Bruhl (La Morale et la science des moeurs), o fato moral é apenas um fato social, uma imposição exterior. Bergson (Les deux sources de la morale et de la religion) se opõe à concepção sociologista . A obrigação moral, segundo ele, é a forma que adota a necessidade no domínio da vida, quando exige inteligência e liberdade para realizar determinados fins. Está de acordo com o sociologismo em que a ética pode ser apenas pura pressão social. Nesse caso, ele a chama de "moral fechada". Mas sobre ela pode dar-se uma "moral aberta", dinâmica e ativa de alguns homens que reagem contra o meio social. Os estudos de Vygotsky sobre a aprendizagem, por exemplo, decorrem da compreensão do homem como um ser que se forma em contato com a sociedade. “Na ausência do outro, o homem não se constrói”, ou seja, a formação se dá numa relação dialética entre o sujeito e a sociedade, a seu redor. Assim, o que interessa para a teoria vygotskyana é a interação que cada pessoa estabelece com determinado ambiente, a chamada experiência pessoalmente significativa (REGO, 1997; OLIVEIRA, 1993). Segundo Vygotsky, as funções psíquicas surgidas no processo de interação com as pessoas de seu meio são as esferas que permitem a atenuação das conseqüências da deficiência e apresenta maiores chances de influência educativa. É por meio dos outros que nos tornamos nós mesmos, pois com a inclusão, o desenvolvimento e a aprendizagem do aluno com déficit intelectual o levará a exercitar sua cidadania. (...) cidadania pressupondo participação social, consciência dos direitos e deveres e luta constante (...). Uma prática discursiva que é por toda a vida. PADILHA (2001, p. 46). Nesse caso, a relação das funções psicológicas está, na sua origem, ligada às relações reais entre as pessoas. É possível identificar, acompanhar e mediar o desenvolvimento cultural do deficiente mental, uma vez que este desenvolvimento não se dá de forma natural. Para Vygotsky, o desenvolvimento intelectual e a compensação dialética da relação desenvolvimento e aprendizagem, tem implicações substanciais para a educação especial, uma vez que concebe o processo de desenvolvimento das crianças deficientes de maneira atípica, mas, ainda assim, aliado as mesmas leis gerais do desenvolvimento das demais. O ponto principal da educação inclusiva é entender, portanto, qual a igualdade diz respeito aos diretos humanos e não às características das pessoas. METODOLOGIA A princípio escolhemos para um primeiro momento uma ênfase à pesquisa bibliográfica em cima dos principais teóricos da educação inclusiva no Brasil tendo como pano de fundo uma reflexão a luz das teorias de Vygotsky. Para um segundo momento, mantivemos um enfoque maior no debate das principais concepções contemporâneas da ética e dos direitos humanos, que é a matéria para a qual este trabalho se destina, deixando a ponte com a filosofia da educação. Em seguida, faremos uma contextualização e em um terceiro momento, na conclusão, destacaremos a relação entre a educação inclusiva e os direitos humanos, para responder qual é a contribuição da ética para a proposta da educação inclusiva. CONSIDERAÇÕES FINAIS Acredita-se que a educação como fator de transformação do homem, propiciará mudanças ideológicas de valores comportamentais de apoio, auxiliando na erradicação das diferenças e não apenais no respeito a estas mesmas diferenças. As propostas são sempre dos “bons”. Da análise de todas estas concepções pode-se concluir que a ética social não é um simples apêndice ou uma aplicação da Ética, senão uma de suas dimensões constitutivas. Portanto, a Ética, que sem dúvida é sempre pessoal, tem que incluir sua dimensão social, sob pena de gerar uma situação de alienação e falsa consciência moral. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, F. Inclusão: muitos olhares, vários caminhos e um grande desafio. Rio de Janeiro: Wak Ed., 2005. ARANHA, M.S.F. Educação inclusiva: a fundamentação filosófica. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, 2004. BEYER, H. O. Inclusão e avaliação na escola: de alunos com necessidades educacionais especiais. Porto Alegre: Mediação, 2005. BRASIL. Declaração de Salamanca e linhas de ação sobre as necessidades educativas especiais. Brasília: CORDE, 1994. ____________. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/SEF/SEESP, 1999. ____________. Diretrizes nacionais para a educação básica. 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