MINISTÉRIO DA FAZENDA
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO FAZENDÁRIA – ESAF
IX PRÊMIO TESOURO NACIONAL- 2004
TEMA 3: Tributação, Orçamentos e Sistemas de Informação sobre
Administração Financeira Pública.
SUBTEMA 3.6 - Previsão de arrecadação tributária.
TÍTULO DA MONOGRAFIA: MODELOS DE TRIBUTAÇÃO ÓTIMA DA
RENDA: O CÁLCULO DE ALÍQUOTAS MARGINAIS ASSINTÓTICAS
PARA O BRASIL NO ANO DE 2000.
OUTUBRO/2004
SUMÁRIO
Página
LISTA DE QUADROS, GRÁFICOS E TABELAS
RESUMO
ABSTRACT
iii
iv
v
1. INTRODUÇÃO
01
2. MODELO CLÁSSICO DE TRIBUTAÇÃO ÓTIMA DA RENDA
2.1 - Introdução
2.2 - Revisão da Literatura
2.3 - Modelo Clássico Mirrlees (1971): Uma visão geral
2.3.1 Análise Matemática
2.4 - Conclusão
10
10
11
22
24
40
3. MODELO CLÁSSICO REVISITADO: TRIBUTAÇÃO ÓTIMA DA
RENDA UTILIZANDO ELASTICIDADES - MODELO SAEZ PARA
RENDIMENTOS ELEVADOS
3.1 - Introdução
3.2 - O Modelo Saez para rendimentos elevados
3.2.1 Derivação do Modelo
3.2.2 Resultados empíricos para os EUA
3.3 - Conclusão
42
4. APLICAÇÃO DO MODELO SAEZ PARA RENDIMENTOS
ELEVADOS:
CÁLCULO
DE
ALÍQUOTAS
MARGINAIS
ASSINTÓTICAS PARA O BRASIL NO ANO DE 2000
4.1 - Introdução
4.2 - Alíquota Ótima sobre Rendimentos Elevados
4.2.1 Descrição dos Dados
4.2.2 O quociente zm/z*
4.2.3 Resultados empíricos Brasil
4.3 Conclusão
54
5. CONCLUSÃO
63
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
APÊNDICE
ANEXO
69
73
81
ii
42
43
43
50
53
54
55
55
57
59
62
LISTA DE QUADROS, FIGURAS, GRÁFICOS E TABELAS
Página
QUADROS
Quadro 1 - Propriedades do Modelo Clássico
Quadro 2 - Importância do Efeito Renda para o desenho tributário ótimo
nas faixas de rendimentos elevados
FIGURAS
Figura 1 - Perturbação na alíquota tributária sobre rendas elevadas
GRÁFICOS
Gráfico 1 - Quociente zm/z* entre R$ 0 e R$ 10 milhões/ano (Ano 2000 Brasil)
Gráfico 2 - Quociente zm/z* entre R$ 0 e R$ 40 mil/ano (Ano 2000 - Brasil)
Gráfico 3 - Quociente zm/z* entre R$ 13 mil e R$ 10 milhões/ano (Ano
2000 - Brasil)
TABELAS
Tabela 1 - Alíquotas tributárias ótimas para contribuintes com rendimentos
elevados: caso americano
Tabela 2 - Indicadores básicos da DIRPF 2001
Tabela 3 - Resumo sintético dos dados da DIRPF 2001
Tabela 4 - Alíquotas Ótimas sobre rendimentos elevados para o ano de
2000 - Brasil
iii
17
20
46
57
58
58
51
55
56
61
RESUMO
Palavras-chave:
tributação
ótima
da
renda,
alíquota
marginal
assintótica,
elasticidades, distribuição empírica de rendimentos.
O objetivo central do trabalho é obter alíquotas ótimas para as faixas de renda mais
elevadas - alíquota assintótica -, utilizando distribuições empíricas de rendimentos e
parâmetros realistas de elasticidades. Para tanto, são desenvolvidos os modelos:
clássico (Mirelees, 1971) e de perturbação (Saez, 2001), que explicam a tributação
ótima da renda, com vistas a realizar simulações numéricas (calibragens) para o
caso da alíquota assintótica para o Brasil, a partir dos dados contidos nas
Declarações do Imposto de Renda Pessoa Física relativas ao ano de 2000. Os
resultados alcançados sugerem que a alíquota assintótica média, 37,3%, é maior do
que a praticada em 2003, 27,5%, como também do que aquela inicialmente
estabelecida em 1995, 25%. Além disso, quando não há dedução do imposto
indireto, que distorce a escolha entre lazer e consumo, a alíquota assintótica ótima
para o caso americano (1992), segundo Saez (2001) igual a 50%, é similar à
calculada para o Brasil nas mesmas condições, 46%, embora a estabilidade da
distribuição empírica de rendimentos americana seja maior do que a brasileira.
iv
ABSTRACT
Keywords: optimal income taxation, asymptotic marginal rate, empirical earning
distribution.
The main objective of this work is to obtain an optimal tax rate for high-income
earners, using empirical earning distributions and a range of realistic elasticity
parameters. Therefore, are developed the Mirrlees (1971) model of determining the
optimal income tax rates and Saez (2001) variant, which uses elasticities to derive
optimal income tax rates. Moreover, simulations using the Saez model are presented
to derive high-income optimal tax rates - asymptotic rates - for the Brasilian case in
2000.
The results suggests that, on average, the Brasilian marginal optimal
asymptotic rate, 37,3%, is substancially higher than the actual tax rate, 27,5%.
Furthemore, assuming that there are no other taxes distorting the leisureconsumption choice, the optimal asymptotic rate for the American case, 50%,
following Saez (2001), is very similar to the Brasilian case, 46%, although the
American empirical income distribution is more stable than of Brasilian’s one.
v
1. Introdução
“Taxation, as Justice Holmes put it, is the price paid for
civilization”.1
“We shall deal with our economic system as it is and is may
be modified, not as it might be if we had a clean sheet of
paper to write upon; and step by step we shall make it what
it should be”.
Woodrow Wilson.2
“Os principais defeitos de nossa sociedade são sua
incapacidade de oferecer emprego e sua distribuição injusta
de riqueza e renda... Na Grã-Bretanha, especialmente
desde o fim do século XIX, algo foi feito para corrigir
disparidades muito grandes de riquezas. Imposto sobre a
renda e sobre a transmissão de herança e gastos públicos
com serviços sociais contribuíram para esse resultado”.
John Maynard Keynes.3
Uma das principais reformas que está sendo enfrentada pelo atual governo é
a tributária. Em princípio, os objetivos centrais de uma reforma tributária deveriam
ser o de aumentar a eficiência econômica e reduzir as desigualdades sociais, a partir
da correção das distorções existentes no atual sistema.
A proposta encaminhada pelo Governo Federal ao Congresso Nacional, ao
final do mês de abril de 2003, engloba efetivamente esses dois objetivos. De um
lado, o desenho geral da reforma discute a questão da eficiência em cima,
principalmente, da reengenharia do Imposto de Circulação de Mercadorias e
Serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS). Este
redesenho do ICMS consiste da uniformização das legislações estaduais, com
regulação do imposto exclusivamente por normas de caráter nacional, uniformização
das alíquotas que serão em número máximo de cinco e cobrança na origem.
1
Richard MUSGRAVE, Public Finance and Public Choice:Two Contrasting Visions of the State, p. 75.
Martim FELDESTEIN, On The Theory of Tax Reform, Journal of Public Economics 6 (1976), p. 77.
3
VALOR ECONÔMICO.EU&Fim de Semana. São Paulo, 14, 15, 16 e 17 de nov. de 2002. INÉDITO:
Trecho de depoimento de Keynes, recolhido por um funcionário do governo Rooselvet e entregue ao
Presidente em 1936 (Tradução de Celso M. Paciomik). p. 20.
2
1
De outro, centraliza o debate do tema da eqüidade a partir da autorização
expressa da progressividade do Imposto sobre Transmissão intervivos, por ato
oneroso, de Bens Imóveis ou de direitos sobre esses (ITBI), da seletividade do
ICMS, propondo a aplicação da menor alíquota nas operações com gêneros
alimentícios de primeira necessidade e da progressividade do Imposto sobre a
Propriedade Rural (ITR) e sobre a Transmissão causa mortis e Doação de quaisquer
bens ou direitos (ITCD).
Ao final do mês de setembro de 2004, ou seja, após um ano e seis meses do
envio pelo Governo federal do projeto de reforma constitucional ao Congresso
Nacional, constata-se que o ganho de eficiência com a reforma - representado pela
unificação do ICMS - ainda não foi aprovado4. Com isso, recrudesce a guerra fiscal
entre os Estados, evidenciado-se atualmente a disputa tributária entre o estado de
São Paulo e o Distrito Federal/Goiás. Por outro lado, os maiores ganhos de
eqüidade - progressividade do ITBI e ITC - foram rejeitados pelo Congresso,
restando apenas a possibilidade de progressividade no ITR.
Alguns especialistas criticam a proposta, argumentando que ela é algo tímida
em face das ineficiências do atual sistema e que ela poderia ser mais arrojada no
que tange aos aspectos da melhoria da eficiência tributária. Curiosamente, não há
críticas firmes sobre os aspectos relativos à eqüidade da proposição, que hoje se
resumi à progressividade do ITR . Por outro lado, verifica-se uma estridência
recorrente quando o governo acena com a possibilidade de propor elevação da
4
A Câmara dos Deputados ainda irá apreciar a Proposta de Emenda Constitucional nº 255/04 (PEC
255), que se encontra tramitando nessa Casa, com o restante e o mais polêmico do proposto
originalmente na Reforma Tributária. Entre os pontos mais espinhosos e importantes estão a
unificação da legislação do ICMS, a definição do número de alíquotas e se a cobrança será no estado
de origem ou de destino e a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional. Após votação
em dois turnos na Câmara, a matéria será depois submetida à apreciação do Senado Federal
também em dois turnos.
2
alíquota máxima do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), para não deixar
dúvidas acerca de seu real compromisso com a progressividade da carga tributária.
Esse comportamento estridente se justificaria, na argumentação de Werneck (2003),
pois o incremento da alíquota máxima resultaria em ganhos de receita reduzidos, “...
E recairia basicamente sobre assalariados de renda mais alta que não têm
possibilidade de oferecer seus serviços através de pessoas jurídicas, de forma a
conseguir abrigo sob um regime de taxação mais branda”.
De qualquer forma, não se pode negar o empenho firme do governo eleito em
2002, no sentido de concretizar a aprovação de sua proposta de reforma,
diferentemente do governo passado que, embora afirmasse que a reforma tributária
fosse prioridade, não a tivesse implementada nos oitos em que esteve no poder. A
razão para esse desfecho, porém nunca confessada formalmente, era a incerteza de
que o novo sistema tributário pós-reforma pudesse garantir o montante de receitas
auferidas ano após ano com seguidos recordes de arrecadação, mantidos até o
exercício de 2004.
De fato, o governo atual adota como estratégia para a reforma aquela
explicitada por Feldstein (1975): “Reformas tributárias ótimas precisam ter como
marco inicial a existência de um sistema em vigor e o fato de que mudanças factíveis
são vagarosas e graduais”. Esse mesmo autor, além disso, afirma que a
necessidade de mudanças graduais é também enfatizada por Rawls, quando esse
último diz: “Sim, o passo da mudança e de reformas específicas exigidas num dado
momento histórico dependem das condições correntes“ [Rawls (1971, p.261)].
Segundo Feldstein (1975), existem diferenças entre uma reforma tributária
ótima e um desenho tributário ótimo. A reforma tributária ótima depende de seu
3
ponto de partida, ou seja, da estrutura existente e é geralmente gradual, enquanto o
desenho tributário ótimo depende do contexto histórico para sua introdução, sendo,
na verdade, um objetivo de médio e longo prazo, e tendo como característica
intrínseca ser once-and-for- always.
Em que pese a importância da reforma tributária em andamento, a nossa
preocupação se dirige ao desenho tributário ótimo. Com efeito, a literatura acerca da
tributação ótima da renda, de acordo com Auerbach e Hines (2001), mostra que
historicamente muitos membros dos governos têm percebido que somente um
desenho mais progressivo5, ou seja, alíquotas marginais crescentes sobre a renda,
poderia fornecer um grau apropriado de progressividade para aqueles que se
encontram no topo da pirâmide de distribuição da renda, aumentando, assim, o
potencial de redistribuição da tributação direta: melhoria da eqüidade.
Na realidade, o centro do debate do desenho tributário ótimo repousa sobre o
trade-off entre eficiência e eqüidade, como relembra Saez (2000). A progressividade
permite que o governo possa redistribuir melhor a renda, transferindo-a dos mais
ricos para os mais pobres, porém a tributação progressiva com alíquotas marginais
elevadas impõe custos sobre a eficiência da economia. Com efeito, alíquotas altas
podem afetar os incentivos para o trabalho, e, em conseqüência, reduzir a base
tributária ao produzir gravames excessivos - ineficiências - significativos.
5
Na realidade, a definição mais correta de sistema progressivo é aquele em que a alíquota média é
crescente, não exigindo necessariamente que a alíquota marginal o seja. Um exemplo concreto
dessa definição é dado em Fullerton e Metcalf (2002): Seja o montante de tributo T devido sobre a
renda Y seguinte função linear da renda: T=m(Y-A), em que m é a alíquota tributária marginal e A a
renda mínima > 0 (desconto padrão). Se a renda atinge patamar abaixo de A, então T pode ser
negativo (o contribuinte recebe uma transferência do governo). Com efeito, esse possui uma alíquota
média que inicia com um valor infinitamente negativo, cresce para zero quando o nível de renda é
igual a A e continua a crescer com a renda (aproximando-se de m assintoticamente). De qualquer
forma, adotamos nesse trabalho que a progressividade está ligada a alíquotas marginais crescentes,
mais intuitivas para o homem da rua.
4
Nesse contexto, o estudo do desenho tributário ótimo, representado pelas
alíquotas tributárias ótimas, em especial as relativas às rendas mais elevadas, se
reveste de importância. De um lado, porque permite racionalizar o debate sobre a
questão da progressividade sob o prisma da eficiência e eqüidade e, de outro,
porque firma um compromisso de se buscar um objetivo de médio e longo prazo
para uma transformação otimizada do modelo tributário.
Cabe ressaltar, por oportuno, que o estudo da alíquota tributária ótima sobre a
renda implica, pelo menos nesse trabalho, olhar sobre o tema abstraindo-se de
questões referentes aos custos administrativos, financeiros e de compliance na
modelagem da tributação ótima, que poderiam inibir o escopo da progressividade
(Arnott, 1994), e também temáticas relativas aos efeitos do capital humano, ao
seguro como bem público, à mudança tecnológica, à incerteza, e à economia
informal, que exigiriam uma progressividade ainda mais forte (Haveman, 1994).
De qualquer forma, é importante lembrar, como fez Haveman6, as palavras de
um grande estudioso da matéria, Joseph Pechman (1990), em seu discurso como
Presidente da Associação Americana de Economia, quando resumiu sua posição
acerca da progressividade do imposto de renda: “Most people support tax
progressivity on the ground that taxes should be levied in accordance with ability to
pay, which is assumed to raise more than proportionately with income. Economists
have... had trouble with the ’ability to pay’ concept...I believe that the person on the
street is right and that we should continue to rely on the income tax to raise revenue
in an equitable manner.’’.
6
Modern Public Finance (9. Optimal Taxation and Public Policy), p. 255:256.
5
O atual sistema de tributação da renda (IRPF) foi estabelecido pela Lei nº
9.250, de 26 de dezembro de 1995. As únicas modificações de fundo realizadas
nesse modelo, desde sua implantação em 1996, foram a correção monetária das
faixas de renda para o exercício de 2002 e o aumento da alíquota mais elevada de
25% para 27,5% desde 1998, após longos debates no Congresso Nacional, sendo
que atualmente possui três faixas de renda e de incidência de valores de alíquotas
marginais (isenção, 15% e 27,5%)7.
As discussões das modificações no Congresso Nacional, até o final do ano de
2003, se travaram entre a esquerda, defendendo as correções das faixas e a
redução da alíquota mais elevada, e o governo, que propunha a defesa do status
quo, ou seja, a manutenção dos parâmetros tais como eram. Curiosamente, o
governo defendia sua posição com o argumento ou temor de que qualquer alteração
nos parâmetros reduziria a arrecadação da Receita Federal e, não, como seria de
esperar, com base na defesa da eqüidade vertical (progressividade). Hoje,
paradoxalmente, a esquerda, leia-se o Governo federal, resiste a correção das faixas
e a redução da alíquota mais elevada, enquanto a oposição, antiga situação, luta
pela mudança do status quo. Uma pergunta natural decorrente desse imbróglio
seria: A alíquota de 27,5% é elevada e a de 25% seria ótima?
Freqüentemente a questão da tributação ótima sobre a renda, em particular
sua maior progressividade, é simplesmente retirada dos debates, como vimos
anteriormente. Uma explicação para isso é dada pelo ex-presidente Fernando
7
A partir do segundo semestre de 2004, o Governo federal ajustou residualmente para maior a faixa
de isenção.
6
Henrique Cardoso8, quando avalia o tema da distribuição de renda: “... Como é que
o governo faz distribuição de renda? Por um lado, pagando os salários do
funcionalismo público... Por outro lado, há transferência direta da renda aos menos
favorecidos. Hoje, tudo que o governo federal arrecada de imposto de renda, de
pessoa física e jurídica, é redistribuído sob a forma de dinheiro para os mais
pobres... No Brasil há uma forte reação contra a distribuição de renda. Qualquer
tentativa de aumentar o imposto de renda, por exemplo, é imediatamente sabotada“.
Neste sentido, acreditamos que devem ser realizados esforços sistemáticos
para derivar os modelos concretos e de simples manipulação de tributação ótima da
renda, com vistas a aumentar sua utilização em estudos empíricos e, por
conseqüência, evitar que os debates sobre esse tema sejam tradicionalmente
centrados somente na eficiência (deadweight burden).
Aliás, é bom citar nesse ponto a lembrança de Atkinson (1990) acerca da
idéia de Okun, em seu famoso livro Equality and Efficiency: The Big Trade-off,
quando admite a existência de dois objetivos fundamentais na tributação ótima,
porém separados, o da eficiência e o da equidade: “If both equality and eficiency are
valued, and neither takes absolute priority over the other, then, in places when the
conflicts, compromises ought to be struck. In such cases, some equality will be
sacrificed for the sake of efficiency, and some efficiency for the sake of equality”
(1975, p.88).
Os modelos apresentados no presente trabalho adotam como macroobjetivo a
maximização de uma função de bem-estar social, donde há de vir, por decorrência, a
8
VEJA. São Paulo, 20 de nov. de 2002, número 1.778, Depoimento. FHC, oito anos depois
(entrevista do Presidente Fernando Henrique Cardoso ao jornalista Roberto Pompeu de Toledo.
p.92).
7
derivar conjuntamente os objetivos de eqüidade e eficiência, ao contrário da idéia de
Okun que explica o atual nível dos debates: defesa intransigente da eficiência na
discussão da alíquota tributária daqueles com rendas mais elevadas. A ênfase do
trabalho, segundo preceito de Saez (2000), é, portanto, nos pesos marginais sociais
(tipo da função de bem-estar social a ser maximizada), nas elasticidades
comportamentais e na distribuição empírica da renda como proxy da distribuição de
habilidades na população, conceitos e parâmetros chaves para os trabalhos
aplicados relativos ao tema da tributação ótima da renda. Ademais, devemos
examinar o papel crítico que a forma da distribuição empírica da renda assume no
estabelecimento das alíquotas tributárias ótimas, como sugere Saez (2000), tendo
em vista a nossa persistente, porém injusta, desigualdade na distribuição de renda, e
avaliar a necessidade de ajustar o atual regime de alíquotas e faixas de incidência.
Destarte, o objetivo do trabalho é descrever os modelos - clássico (Mirrlees) e
de Saez para rendimento mais elevados - que explicam a tributação ótima da renda,
utilizando calibragens9 numéricas para o caso brasileiro no exercício de 2000, para
mostrar que há respostas para o questionamento de qual seria a alíquota ótima nas
faixas de renda mais elevadas. Para tanto, organizamos o trabalho em três
capítulos. No primeiro capítulo, apresentamos, de início, uma revisão da literatura
sobre a tributação ótima da renda, e, em seguida, derivamos o modelo clássico
elaborado por Mirrlees (1971), mediante o emprego da análise matemática. No
segundo capítulo, desenvolvemos o modelo de Saez (2000), o qual utiliza as
elasticidades e a distribuição empírica de rendimentos para derivar a tributação
9
Definimos calibragem como um procedimento de simulação numérica empregada como alternativa
a análise econométrica tradicional, no qual a teoria econômica apresenta um papel mais proeminente
do que o usual, ofertando ingredientes para um modelo de equilíbrio geral desenhado para responder
uma pergunta econômica específica. Esse modelo é então “calibrado” por meio do uso de valores de
parâmetros iguais a valores médios conhecidos ou que não mudaram muito ao longo do tempo ou a
estimativas empíricas de trabalhos microeconômicos.
8
ótima da renda. Com efeito, derivamos o modelo de Saez sob o prisma especial da
tributação linear da renda aplicada aos rendimentos mais elevados: alíquota
assintótica ótima, incluindo seus resultados empíricos. O terceiro capítulo apresenta
a aplicação do modelo Saez para o caso brasileiro, mostrando os resultados de
calibragens numéricas simples para a alíquota assintótica ótima do IRPF sobre
grandes fortunas no ano de 2000. Essas simulações tentam responder diretamente
se as alíquotas máximas de 25% e 27,5%, utilizadas nos últimos sete anos, incluindo
2004, são efetivamente ótimas. Finalmente, na última parte deste trabalho, são feitas
algumas observações sobre as calibragens realizadas e sobre os modelos
empregados, à guisa de conclusão.
9
2. Modelo Clássico de Tributação Ótima da Renda
2.1 Introdução
Todo tributo no mundo real, com exceção dos chamados lump-sum, distorce o
comportamento das pessoas. Não obstante, a sociedade, representada pelo
Governo, precisa coletar receitas para atender os seus diversos objetivos sociais.
Tendo em vista que o tributo dá origem a reduções na eficiência econômica, o tema
das distorções introduzidas (e corrigidas) pela tributação está no centro da análise
das finanças públicas. As ineficiências produzidas são conhecidas como perdas de
peso morto (deadweight losses) ou gravame excessivo oriundo da tributação, pois
implicam custos adicionais para os contribuintes e para a sociedade quando se
arrecadam receitas mediante o emprego de tributos que distorcem as decisões
econômicas. Os impostos invariavelmente geram perdas de bem-estar porque as
obrigações tributárias são funções do comportamento individual das pessoas. Os
tributos chamados de lump-sum são eficientes, porém de limitada aplicabilidade,
pois eles não variam com os indicadores de capacidade de pagamento, tais como
renda e consumo que são funções das decisões dos agentes econômicos. Por
conseguinte, a heterogeneidade dos consumidores e a impossibilidade de se
observar completamente as diferenças individuais justificam a adoção de um
desenho tributário sujeito às restrições usuais impostas pelo conjunto de
instrumentos tributários (Auerbach e Hines, 2001). Estabelecer um sistema tributário
ótimo, portanto, significa manter as distorções tributárias num patamar mínimo,
submetido a restrições originárias da necessidade de elevar e/ou manter a receita e
de garantir uma carga tributária equânime.
10
Em resumo, a literatura da tributação ótima identifica sistemas tributários que
minimizem a carga excessiva da tributação, sujeita a várias restrições relacionadas
aos instrumentos tributários, às informações disponíveis aos governos e a diferentes
hipóteses sobre a heterogeneidade da população e ao funcionamento dos mercados
privados (Auerbach e Hines, 2001). Nesse sentido, o presente capítulo pretende
mostrar, em seguida, um histórico da literatura sobre a tributação ótima da renda e
desenvolver o modelo clássico sob o prisma analítico.
2.2 Revisão da Literatura
O desenho acerca de tributações ótimas, historicamente, se concentra em
três vertentes principais. A primeira, iniciada pelo trabalho seminal de Ramsey
(1927) e seqüenciado de forma notável por Diamond e Mirrlees (1971), dedica-se ao
desenho ótimo das tributações sobre bens e serviços. A segunda, tendo como
representante inicial Pigou (1947) e outros, analisa o emprego de tributos para
responder dois tipos de falhas de mercado: financiamento de bens públicos não
provisionados pelo setor privado e correção de externalidades associadas a
mercados privados incompletos. Por último, e que nos interessa mais de perto, as
contribuições, iniciadas por Mirrlees (1971), que considera o caso mais geral da
tributação ótima não linear sobre a renda, enfatizando o papel de tais tributos no
tratamento de questões distributivas.
A discussão da tributação ótima da renda tornou-se concreta a partir do
trabalho seminal de Mirrlees (1971), o qual estabeleceu os pilares fundamentais para o
estudo desse tema. Com efeito, esse modelo pioneiro assumia as seguintes hipóteses
simplificadoras: (i) inexistência de problemas relativos a intertemporalidade; (ii)
ignorância de diferenças oriundas do tamanho e composição da família, de gostos e
11
nas transferências voluntárias; (iii) os indivíduos determinam a quantidade e o tipo de
trabalho que fornecem otimizando uma função utilidade, ou seja, pela racionalidade,
supondo que o bem-estar é uma função dos níveis individuais de utilidade e que a
quantidade de trabalho ofertada pode variar entre limites consideráveis sem afetar o
preço pago por isso; (iv) não existe a possibilidade de migração para fugir do desenho
tributário ótimo; (v) o governo possui informação perfeita sobre os agentes
econômicos, inexistindo incertezas sobre as rendas percebidas pelos indivíduos; (vi)
são feitas algumas simplificações com intuito de se facilitar as operações matemáticas,
por exemplo: existência de um tipo único de trabalho, presença de somente um bem
representativo do consumo e estabelecimento de que o bem estar seja expresso pela
soma das utilidades individuais, quando a função utilidade individual, a mesma para
toda a população, é cuidadosamente escolhida; e (vii) os custos de administração do
desenho tributário ótimo são desprezíveis. Segundo Heady (2000), as duas hipóteses
nucleares deste modelo clássico seriam: (1) o único desincentivo produzido pela
tributação é o número de horas ofertado por cada trabalhadora; e (2) as diferenças nos
salários de diferentes trabalhadoras são originárias pelas diferenças em suas
produtividades fixas (habilidades).
Por oportuno, cabe ressaltar que a tributação ótima da renda, em especial o
modelo clássico de Mirrlees, tem tido um efeito profundo e duradouro no campo
teórico e prático da economia aplicada. De fato, esse tema deixou cinco
contribuições significativas: (a) integração da eqüidade e eficiência, a partir do uso
de uma função de bem estar social cardinal; b) formulação do problema da
tributação ótima dentro de um escopo de equilíbrio geral à lá Arrow-Debreu; (c)
promoveu o primeiro tratamento sobre assimetria de informação, estimulando,
assim, as aplicações da economia da informação; (d) proporciona uma visão mais
12
racional e rica do papel do governo numa economia de mercado; e (e) oferece
fundamentos rigorosos para a teoria do second best (Arnott, 1994).
Com base nesse modelo, Mirrlees (1971) e Atkinson (1973) realizaram
simulações numéricas em relação à tributação não linear da renda, enquanto Stern
(1976) estabeleceu simulações no caso linear, todos eles chegando a conclusões
sobre os níveis de alíquotas ótimas e sobre a forma do desenho tributário. Com
efeito, as principais conclusões das simulações numéricas de Mirrlees (1971) podem
ser
resumidas
da
seguinte
maneira:
(i)
o
desenho
tributário
ótimo
é
aproximadamente linear; (ii) as alíquotas marginais ótimas são relativamente baixas;
e (iii) o desenho tributário ótimo, surpreendentemente, não é progressivo em toda a
sua extensão, quando avaliado da perspectiva de alíquotas marginais crescentes.
Por outro lado, Atkinson (1973) notou que as alíquotas marginais ótimas não
são tão reduzidas como relatado por Mirrlees (1971) e que o desenho tributário está
longe de ser linear nas faixas de renda que cobrem a maior parte da população,
quando se usa uma função utilidade do tipo Rawlsiana (max-min) ao invés de se
usar objetivos meramente utilitaristas. Cabe ressaltar que tanto Atkinson como
Mirrlees usaram em seus cálculos uma função utilidade do tipo log-linear, o que
implica a adoção de uma elasticidade de substituição unitária entre o consumo e o
lazer.
Nas investigações de Stern (1976), ele adota uma elasticidade de
substituição, ε, igual a 0,5, em face de estudos empíricos anteriormente elaborados,
13
correspondente a parte backward bending
10
da curva de oferta de trabalho em que
a elasticidade da oferta do trabalho é negativa. Esse procedimento faz com que ele
encontre novos resultados que demonstram que as alíquotas tributários ótimas num
modelo linear sejam consideravelmente mais elevadas daquelas encontradas por
Mirrlees, mesmo empregando objetivos igualitários moderados.
Por sua vez, Tuomala (1990) investiga as modificações nas conclusões de
Mirrlees (1971) e Atkinson (1973) quando se utiliza uma função utilidade com ε =
0,5, considerando-o o parâmetro apropriado, nos cálculos numéricos. Neste caso, as
alíquotas marginais não são tão reduzidas e a forma do desenho tributário ótimo é
substancialmente não linear para a maioria da população, não sendo inclusive
necessário se adotar objetivos igualitários do tipo Rawlsiano para se obter resultados
dessa natureza. Portanto, dada uma estimativa razoável (empírica) da elasticidade
de substituição entre consumo e lazer e objetivos sociais utilitaristas, pode-se afirmar
que as alíquotas marginais sejam elevadas nas faixas de renda menores e médias e
que o desenho tributário siga um comportamento de não linearidade.
De outra sorte, Tuomala (1990) demonstra que é realmente muito local a
conclusão de que a alíquota tributária ótima sobre as rendas mais levadas deva ser
igual a zero. Na verdade, Diamond (1998) nos diz que assumindo que exista um
10
A curva de oferta de trabalho é positivamente inclinada para quantidades de horas trabalhadas
relativamente pequenas e negativamente inclinada para quantidades elevadas de horas de trabalho.
Em outras palavras, os trabalhadores ofertam quantidades maiores de trabalho (horas trabalhadas)
em resposta a salários mais elevados, quando seu nível de remuneração não é elevado. Entretanto,
quando os salários alcançam faixas elevadas, aumentos adicionais na remuneração induzem os
trabalhadores a reduzirem o número de horas trabalhadas. A curva de oferta, portanto, volta sobre si
mesma. A razão para a inclinação negativa, no segmento em que ela pende para trás (backward
bending), deriva da existência do trade-off entre trabalho e lazer. Os trabalhadores decidem gastar
parte de seu salário mais elevado comprando mais lazer e, logo, trabalhando menos. O resultado
disso é que salários mais elevados decrescem a quantidade de trabalho ofertada.
14
máximo finito para a distribuição das habilidades, a alíquota marginal deveria ser
zero no nível de renda em que a habilidade fosse máxima, conforme demonstrado
por Sadka (1976) e Seade (1977). O argumento para esse fato é quase intuitivo.
Caso a hipótese de Tuomala (1990) não fosse verdadeira, então, segundo Diamond
(1998), estendendo a função tributária para as rendas mais elevadas com alíquota
tributária zero iria nos levar a que os detentores de maiores rendas trabalhassem
mais, aumentando o bem estar social sem perder qualquer receita tributária. Além
disso, essa condição não necessariamente nos conduz a qualquer informação
acerca de alíquotas ótimas sobre uma região significativa de faixas elevadas de
renda, pois as alíquotas ótimas somente se aproximam de zero em regiões muito
perto do topo da distribuição de habilidades. Nesse contexto, é bom lembrar a
firmação de Tuomala (1990): “Nessa questão nos alcançamos uma conclusão muito
definitiva: esse resultado é realmente muito local”. Por outro lado, Saez (2000) nos
recorda que Mirrlees não derivou este resultado intuitivo porque ele considerava a
distribuição de habilidade não limitada.
A fim de investigar se o modelo de Mirrlees (1971) - em que apenas as
condições de primeira ordem são levadas em consideração - é suficiente para
garantir a implementação do sistema tributário dele decorrente, Udo Ebert (1991)
estuda as condições de segunda ordem do modelo. Com efeito, ele afirma que
mesmo Mirrlees (1976), ao estudar o problema acima mencionado, chega à
conclusão de que um sistema tributário não-linear é passível de implementação se e
somente se: a) as condições de primeira ordem são satisfeitas; e b) a renda bruta
ótima resultante é uma função não decrescente da habilidade. Essa segunda
condição garante que os indivíduos mais hábeis também recebam as maiores
15
rendas. Na verdade, segundo Udo (1991), Mirrlees aparentemente assume a
condição b acima como sendo satisfeita automaticamente.
Diante disso, Udo (1991) propõe que se leve formalmente em consideração
as condições de segunda ordem no modelo de Mirrleees para que efetivamente se
possa garantir a implementação do sistema tributário derivado desse modelo.
Destarte, Udo (1991) apresenta três novas propriedades para o modelo clássico de
Mirrlees sobre a tributação ótima não linear da renda, além das cinco existentes, ao
se levar em conta as condições de segunda ordem do modelo. O quadro 1 a seguir
mostra as propriedades do modelo clássico.
Diamond (1998) afirma novamente que foram feitos esforços consideráveis
para gerar simulações numéricas no modelo clássico, tendo sido iniciados pelas
experiências de Mirrlees (1971). Ele ressalta que nessas simulações, Mirrlees
assume uma função utilidade u = log(c) + log(1-l), em que c é o consumo e l a oferta
de trabalho (em termos percentuais), uma função de bem-estar social G(u) = - e-bu/b
(b>0) e uma distribuição log-normal de habilidades.
Além disso, Diamond (1998) assevera que outras experiências de simulações
numéricas se seguem (Atkinson, Stern e Tuomala): sempre indicando uma trajetória
próxima da linearidade e decrescente ao longo da distribuição de renda para os
desenhos tributários, cujos resultados mais analíticos estão apresentados no quadro
1.
Quadro 1 - Propriedades do Modelo Clássico
Propriedade
Descrição
Autor
16
1
A alíquota marginal é não negativa
Mirrlees (1971)
2
A alíquota marginal é menor do que 100%
Mirrlees (1971)
3
A alíquota marginal do indivíduo mais hábil é
zero
Seade (1977)
4
Se não ocorrer bunching11 no nível mais baixo da
renda, a alíquota marginal do indivíduo menos
hábil é zero
Seade (1977)
5
Para cada nível de renda z compreendido entre
os extremos da distribuição de habilidades, a
alíquota marginal é estritamente positiva
Seade (1982)
6
Se o fenômeno de bunching ocorrer no nível
mais baixo da distribuição de renda, a alíquota
marginal é estritamente positiva no final do
intervalo de bunching
Udo (1991)
7
Se a utilidade marginal do trabalho for zero toda
vez que o indivíduo não esteja trabalhando
[u(c,0) = 0 " c > 0] e se o menor nível da renda
for também zero [z(nMIN) = 0], então não poderá
existir bunching a esse nível menor de renda
Udo (1991)
8
Não existe a possibilidade de bunching no nível
superior da renda
Udo (1991)
Fonte: Udo Ebert, A reexamination of the optimal nonlinear income tax, Journal of Public
Economics 49 (1992), p. 58-60.
Porém, Diamond (1998) também chama a atenção para o caso de outras
simulações numéricas, em particular a de Kanbur e Tuomala (1994), as quais
apontam para um comportamento do desenho tributário ótimo diferente dos
anteriores, incluindo um comportamento padrão marcadamente de formato U
invertido. O estudo de Kanbur e Tuomala (1994) investiga o fato de que na maioria
dos países as alíquotas tributárias marginais crescem com a renda, enquanto a
literatura sobre os resultados numéricas da tributação ótima da renda sugere que o
11
Segundo Lollivier (1983), o caso em que a condição de primeira ordem do problema da tributação
não linear da renda de per se provavelmente não conduz a uma solução ótima, em razão da
17
desenho ótimo deveria ser ligeiramente decrescente. Na verdade, esses autores
realizam simulações numéricas em que empregam uma distribuição de habilidades
w (taxa salarial) log-normal com desvio padrão σ igual a 0,7 e 1, diferentemente do
estudo clássico de Mirrlees que utiliza um valor igual a 0,39. De fato, os novos
valores de σ são compatíveis com Índices de Gini acima de 0,37, ou seja,
consistentes para países com desigualdades acentuadas na distribuição de renda,
como o Brasil. Em resumo, os autores chegam à conclusão de que o desenho das
alíquotas tributárias ótimas é muito sensível à desigualdade de renda, ou seja,
quanto maior a desigualdade na renda mais progressiva deve ser o desenho
tributário, compatibilizando, assim, a literatura econômica com a realidade dos
desenhos tributários existentes na maioria dos países.
Por sua vez, Diamond (1998) deixa cristalino que as simulações numéricas
são sensíveis simultaneamente aos fatores relacionados à função utilidade adotada
e à família de distribuição de habilidades assumida, abrindo, assim, as portas para a
possibilidade de diferentes conclusões sobre o desenho tributário ótimo. Logo,
conclui que é de extrema importância o formato de distribuição das habilidades para
a tributação ótima não linear da renda. Por último e mais estimulante, Diamond
(1998) examina as condições para que as alíquotas tributárias marginais ótimas
sejam crescentes para níveis de renda elevadas e declinantes num intervalo que
contenha a habilidade modal, utilizando o modelo clássico de Mirrlees com
preferências quase lineares. Com efeito, Diamond (1998) ao analisar o caso das
alíquotas tributárias assintóticas, de acordo com a especificação acima, mostra que
pode existir o caso de alíquotas marginais elevadas quando: (i) a função utilidade é
quase linear, ou seja, ela é linear no consumo [u(c,l) = c + v(1-l)]; (ii) existência de
impossibilidade, em certos casos, de perfeita discriminação entre os agentes através do desenho
18
valores plausíveis empíricos para a elasticidade da oferta de trabalho; e (iii) uma
distribuição paretiana de habilidades acima da habilidade modal. Por fim, ele
enfatiza, mais uma vez, a importância do formato da distribuição de habilidades para
as alíquotas tributárias ótimas.
Por outro lado, Dahan e Strawczynski (2000) mostram que os efeitos renda
desempenham um papel importante na determinação do desenho ótimo da
tributação da renda. Em primeiro lugar, eles demonstram que o resultado de
alíquotas marginais crescentes sobre a renda, apresentado por Diamond (1998), é
dependente da linearidade assumida para o consumo, na função utilidade adotada.
Modificando-se essa hipótese e adotando-se uma função não linear logarítmica, que
admite a presença de efeitos renda, o resultado será o declínio das alíquotas
marginais em níveis mais elevados de renda, como nas simulações feitas pelos os
autores. Segundo, eles mostram que a forma do consumo também exerce um papel
crítico no modelo clássico de Mirrlees (1971). O desenho tributário da renda é
crescente ao invés de decrescente nas faixas elevadas de renda, quando se usa
uma forma linear de consumo na função utilidades empregada, ou seja, ausência de
efeitos renda. O quadro a seguir resume os resultados encontrados por esses
autores.
Ao mesmo tempo, Saez (2000) nos lembra que Mirrlees apresentou
conjecturas precisas sobre alíquotas ótimas assintóticas, no caso de funções de
utilidades separáveis no consumo e no trabalho. Porém, essas ficaram esquecidas
por muito tempo, em virtude de dois motivos básicos: a) as conjecturas dependiam
da distribuição de habilidades não observáveis e de propriedades da função utilidade
que não possuem significados intuitivos óbvios; e b) o resultado de que a alíquota
tributário, descreve o fenômeno de bunching.
19
marginal ótima fosse igual a zero para as rendas mais elevadas foi considerado
como definitivo por muito tempo, pois a distribuição das habilidades empíricas era
considerada limitada. Entretanto, Saez (2000) argumenta que de fato as
distribuições ilimitadas são mais interessantes do que as limitadas para a condução
de estudos relativos ao problema da alíquota ótima para rendas elevadas. Além
disso, ele procura examinar com profundidade e pionerismo o relacionamento entre
as regras de tributação ótima da renda e o conceito de elasticidade, de extrema
importância para os estudos microeconômicos, permitindo, assim, estabelecer uma
ponte entre os trabalhos aplicados e a literatura teórica.
Quadro 2 - Importância do Efeito Renda para o desenho tributário ótimo nas faixas
de rendimentos elevados
Autor
Forma do
Forma do
trabalho (y) na consumo (c) na
função
função utilidade
utilidade
Distribuição
das
habilidades
(w)
Desenho tributário
ótimo nas faixas
elevadas de renda
Mirrlees
(1971)
Logarítmica
Logarítmica
Lognormal
Regressivo
Diamond
(1998)
Logarítmica
Linear
Pareto
Progressivo
Dahan e
Strawczynski
(2000)
Logarítmica
Logarítmica
Pareto
Regressivo
Dahan e
Strawczynski
(2000)
Logarítmica
Linear
Lognormal
Progressivo
Fonte: Momi Dahan e Michel Strawczynski. Optimal Income Taxation: Na Example with a U-Shaped
Pattern of Optimal Marginal Taz Rates: Coment, The American Economic Review, vol.90, no.3
(2000), p. 685
20
Assim, pela primeira vez, com Saez (2000), existe a nítida preocupação de
se utilizar nas simulações numéricas um enfoque mais positivo do que a do
modelo clássico - em sua essência mais normativo -, a partir da utilização de
distribuições de habilidades, tendo a distribuição empírica da renda como
proxy, e das estimativas para as elasticidades, obtidas nos estudos
disponíveis.
Em sintonia, Roberts (2000) alega que, no modelo clássico, o maior problema
enfrentado pela análise da tributação ótima da renda, em particular quando o
desenho tributário é não linear, é o conjunto de fórmulas usada para caracterizar o
desenho ótimo, pois este é definido em termos de complexas funções, cuja
interpretação econômica direta é limitada (Atkison e Stiglitz 1979). Tais expressões
não possuem a clareza nem a simplicidade que têm as elasticidades da oferta que
aparecem no conjunto de fórmulas da tributação linear. Por essa razão, esse autor
propõe uma abordagem mais transparente do problema da tributação não linear,
cujas expressõs tenham a clareza e o significado econômico encontrados nas regras
de tributação linear. Para tal, ele elabora uma análise compreensível de
perturbações no desenho tributário que, quando desdobrado por uma expansão de
Taylor, é capaz de produzir um formulário apropriado para a tributação ótima da
renda.
Além disso, Roberts (2000) afirma que o trabalho desenvolvido por Saez
(2000) também utiliza a idéia de perturbação para derivar desenhos tributários não
lineares sobre a renda. Acrescenta, ainda, que Saez reconhece que não é preciso
restringir o modelo a distribuições na população baseadas em parâmetros não
observáveis, tais como habilidades, como no modelo clássico. Na verdade, Saez
21
deriva formulas tributárias numéricas usando a distribuição empírica da renda,
oriunda de dados fornecidos pelo órgão da receita federal americana (Internal
Revenue Service - IRS) e, assim, acaba por oferecer uma melhoria sobre as
soluções numéricas anteriores de Mirrlees (1971), Tuomala (1990) e Kanbur e
Tuomala (1994).
2.3 Modelo Clássico sobre Tributação Ótima da Renda de Mirrlees (1971): Uma
Visão Geral
O modelo de Mirrlees (1971) foi elaborado no sentido de tentar responder a
seguinte questão (Homburg, 2001) : De que forma o desenho tributário sobre a renda
deve ser construído para se levar em conta o trade-off entre eqüidade e eficiência?
Nesse sentido, Mirrlees constitui o modelo padrão para analisar a tributação ótima da
renda que leva em conta alguns aspectos essenciais desse tema, em especial a
escolha entre trabalho e lazer e as habilidades (capacidades) diferentes dos
trabalhadores.
De acordo com Myles (1995), o mérito da economia de Mirrlees, na qual seu
modelo esta inserido, decorre da maneira em que captura as mais importantes
características do problema do desenho tributário ótimo. Com efeito, essas
características são as seguintes: (i) existência de desigualdade na distribuição de
renda para que seja introduzida a motivação da eqüidade na tributação; (ii) os agentes
diferem entre si apenas em relação à renda que percebem, cuja distribuição é
endógena ao modelo, e a tributação da renda precisa afetar a oferta de trabalho para
que as decisões dos agentes tenham impacto sobre a eficiência; e (iii) a economia
precisa ser razoavelmente flexível para que nenhuma restrição a priori possa ser
imposta sobre o desenho tributário.
22
Para simplificar e focar a análise, assume-se que a economia é competitiva e
que os indivíduos na economia diferem entre si apenas pelo grau de habilidade no
emprego, que determina seu salário-hora e, portanto, sua renda. O nível de habilidade
é uma informação privativa do indivíduo e não é conhecida pelo governo. O único
instrumento tributário do estado é o tributo sobre a renda, utilizado em virtude de duas
razões: a) a utilização da tributação lump-sum é inexeqüível; b) assume-se que não é
possível ao estado observar separadamente o número de horas trabalhadas e a renda
por hora. Portanto, dado que somente a renda total é observável, logo ela tem que
servir de base para o sistema tributário. Por outro lado, a função tributária sobre a
renda é escolhida para maximizar o bem-estar social, condicionada a alcançar o nível
de receitas requerido. A generalidade do modelo clássico, fonte de muitas das
dificuldades envolvidas em levá-lo a uma solução, deriva do fato de que nenhuma
restrição é estabelecida a priori para as possíveis candidatas a função tributária ótima
(Myles, 1995).
O modelo tem como objeto central a otimização da função tributária da renda,
escolhida de tal sorte que venha a maximizar a o bem-estar social. Com efeito, essa
maximização é sujeita a duas restrições. A primeira restrição é decorrente de que a
função tributária da renda precisa conduzir a um resultado que satisfaça a
exeqüibilidade produtiva ou, equivalentemente, cumpra com a receita governamental
requerida. A segunda restrição que precisa ser atendida é de certa forma mais
complexa e a maneira com que ela é manuseada é de central importância para a
análise. Para ela ser melhor compreendida deve-se utilizar uma interpretação
alternativa da otimização. Ao invés de enxergar o problema da otimização como sendo
a escolha do governo de uma função tributária da renda, ele pode ser encarado como
uma dotação para cada indivíduo de um par de bens - renda bruta e consumo. Dessa
23
forma, a restrição adicional seria, então, que cada família deveria encontrar o melhor
par (renda bruta e consumo), visando a atender o seu próprio interesse, dentre
aqueles previstos pelo governo, ao invés de um par designado a outra família. Em
outras palavras, o par previsto deve ser aquele que maximiza a utilidade da família,
escolhido no conjunto de pares disponíveis. Dado a esta sua natureza, a restrição é
alcunhada de auto-seleção (Myles, 1995).
2.3.1 Uma Análise Matemática
Os agentes possuem habilidades específicas, sendo que essas são
mensuradas através da produtividade marginal daqueles, ou seja, pelo escalar w
(salário-hora). Essa habilidade é distribuída na população com função densidade
f(w), assumindo-se f(w) > 0 para
w < w < w^, em que w > 0 e w^ ≤ ∞. Ademais,
lembremos que, ao trabalhar y unidades de tempo, o agente forneçe yw unidades de
trabalho e produz yw unidades do bem consumo. Como o consumo, c, é o
numerário, w representa a taxa salarial e z = yw é a renda bruta antes da tributação.
Portanto, um indivíduo com habilidade w maximiza sua função utilidade u(c,y) =
u(c,z,w) = u(c,z/w) sujeita a restrição orçamentária c=z-τ(z), ou seja, a renda
individual líquida. Esse problema é descrito pela expressão (1).
max u(c,y) sujeito à c=z-τ(z), z=wy
(1)
A solução do problema é dada por12 :
cz = −
12
uy
ucw
⇒ cz = −
uz
uc
(2)
Ver no item 1 do Apêndice a solução passo a passo.
24
Definindo Φ = -uy/ucw = -uz/uc (3) como a taxa marginal de substituição entre o
consumo c e a renda antes da tributação (renda bruta z), é requerido que Φw =
∂Φ/∂w < 0, ou seja, que os agentes econômicos respeitem a condição de
monoticidade [Seade(1982)], pois, segundo Mirrlees (1971:181 e 182), trata-se de
uma condição necessária para o estabelecimento da tributação ótima.
A monotonicidade do agente é equivalente à condição de que o consumo irá
aumentar à medida que a taxa de salário se eleva na ausência de tributação. Além
disso, a monotonicidade implica que a cada ponto do espaço (c,z) a curva de
indiferença da trabalhadora com habilidade w1, passando por esse ponto, é mais
inclinada do que a curva de uma trabalhadora com produtividade marginal w2 se w2
> w1, tendo em vista que a taxa marginal de substituição é o gradiende das curvas
de indiferença. Dito de outra forma, a condição impõe que a curva de indiferença de
uma trabalhadora com habilidade w que passa num ponto do espaço (c,z) gira
estritamento no sentido do relógio a medida que cresce w. Portanto, a condição
suficiente para existência da condição de monotonicidade do agente é que o
consumo não seja um bem inferior (Myles, 1995). Note-se que a condição de
primeira ordem para a maximização da utilidade, expressa pela equação (2), nos
indica o trade-off entre o consumo e o trabalho, com o qual se defronta a
trabalhadora na margem.
Nesse contexto, o objetivo do governo é maximizar o bem-estar coletivo,
expresso por meio de uma função de bem-estar Bergson-Samuelson W, para um
dado nível de arrecadação R=zG, em que zG representa os gastos do governo,
então o problema da economia é dado por:
max W = ∫ W (u )f (w )dw
25
sujeito à13:
R = ∫ τ( z(w ))f (w )dw = ∫ [ z(w ) − c (w )]f (w )dw = 0
(4)
Pode-se visualizar a restrição orçamentária acima apresentada - restrição da
receita (arrecadação) governamental exigida -, utilizando a demanda e a oferta
individual e integrando-as sobre a população inteira. Nesse sentido, é possível
definir a oferta efetiva total de trabalho, Z, como ∫ z(w)f(w)dw e a demanda agregada,
C, em que C= ∫ c(w)f(w)dw. A restrição orçamentária, então, exige que a alocação
escolhida deve ser factível em termos de produção. Essa condição pode ser descrita
em termos de quantidade por C ≤ F(Z), em que F corresponde à restrição linear de
produção da economia. Esta definição de viabilidade leva em conta a receita
governamental requerida (gastos do governo), expressa como a quantidade de
trabalho consumida pelo governo (renda bruta consumida pelo governo), zG, já que
podemos podemos escrever C ≤ F^(Z-zG) = F(Z).
Em adição à restrição relativa aos recursos da economia apresentada acima,
existe uma restrição referente à compatibilidade de incentivos, chamada de autoseleção (self-selection). Com efeito, ao escolher o desno tributário ótimo, o governo
deve levar em conta o fato de que, para uma dada tributação, cada trabalhadora
escolhe uma cesta de bens que é otima para ela. Em outras palavras, a estrutura
tributária ótima pressupõe que cada trabalhadora acredite que seja do seu próprio
interesse (isto é, maximize sua função de utilidade) escolher o par renda-consumo
(z,c) que o governo deseja que elas selecionem como seus.
13
Assumindo que a receita total seja igual a zero (R = 0), significa que o governo procura maximizar
uma determinada função de bem-estar social de utilidades individuais, sujeita à restrição de que o
consumo c seja equivalente à renda bruta z (antes da tributação).
26
Portanto, as reações individuais das trabalhadoras tem que se levada em
conta a priori. Mirrlees (1976) propõe o seguinte método para representar essa
restrição. Seja (c(w),z(w)) o plano ótimo para uma trabalhadora com habilidade w, tal
como desejado pelo governo. Essa trabalhadora escolhe esse plano se o mesmo for
melhor do que todos os outros planos possíveis, ou seja,
u(c (w ), z(w )) ≥ u(c (w 0 , z(w 0 ))∀w 0 ∈ [w ,w ^ ]
(5)
Isto significa que o plano ótimo corresponde àquele que assegura que, para
uma trabalhadora com habilidade w, a utilidade é maximizada [equação (1)]. A
restrição de compatibilidade de incentivos pode ser definida também da seguinte
maneira: uma trabalhadora com habilidade w não almeja os ganhos de outra com
um nível de habilidade diferente. Isto significa que alguém, cuja produtividade
marginal é w, teria que trabalhar w0/w vezes a mais do que outro com habilidade w0
para auferir os mesmos ganhos.
Assim, o requisito de que o plano ótimo seja individualmente racional para
uma trabalhadora com habilidade w0 significa que a utilidade u(c(w0),z(w0)) alcance
um máximo em w0=w. Com efeito, isso pode ser expresso em termos da condição
de primeira ordem,
du
du
=
= uw (c (w ), z(w ))
dw 0 dw
(6)
ou
⎛ ∂u ⎞ dc
⎛ ∂u ⎞ dz
= 0 ⇒ u c .c ' (w ) + u z , z ' (w ) = 0
+⎜
⎜
⎟
⎟
⎝ ∂c ⎠ dw 0 ⎝ ∂z ⎠ dw 0
(7)
27
Essa condição indica que a trabalhadora não pode aumentar sua utilidade
mediante uma variação local na oferta de trabalho. Portanto, considerando que as
preferências são idênticas, a variação na utilidade quando a taxa salarial aumenta é
simplesmente a derivada da função utilidade em relação a w, mantendo c e z
constantes (fixas):
⎛ z⎞
du ⎜ c , ⎟
⎝ w ⎠ = ∂u ( c , y ) = ∂u . ∂c + ∂u . ∂y = u .0 + u . − z = − yu y
c
y
dw
∂w
∂c ∂w ∂y ∂w
w
w2
(8)
Além disso, a condição de segunda ordem para a restrição de seleção própria
é satisfeita se:
⎛ du
d ⎜⎜
⎝ dw 0
dw 0
⎞
⎟⎟ d ⎛⎜ du ⎞⎟
⎠ = ⎝ dw ⎠ = u (c (w ), z (w ))
ww
dw
(9)
ou
d [u c .c ' (w ) + u z .z' (w )]
≥ 0 ⇔ u cw .c ' (w ) + u zw .z' (w ) ≥ 0
dw
(10)
De (10) temos que:
c ' (w ) = −
u z z ' (w )
uc
(11) → (10) : −u cw .
(11)
⎡
⎤
u z .z' (w )
u
+ u zw .z' (w ) ≥ 0 ⇒ ⎢− u cw z + u zw ⎥.z' (w ) ≥ 0
uc
uc
⎣
⎦
− [Φ w .u c ].z' (w ) ≥ 0
14
(12)
(13)14
Φ=-uz/uc ⇒ Φw=(-uzw.uc +uz.ucw ) /u2c ⇒ Φw=1/uc[ucw.(uz/uc)-uzw] ⇒ -Φw.uc=[-ucw.(uz/uc)+uzw]
28
Tendo em vista que Φw < 0 (condição de monotonicidade do agente) e uc > 0,
então z’(w) ≥ 0. Portanto, qualquer função tributária que conduza a um resultado que
atenda a equação (7) e z’(w) ≥ 0 irá, por consequência, satisfazer a restrição de
auto-seleção. Além disso, se z’(w) ≥ 0, uc > 0 e uz < 0, então de (7) temos que c’(w)
≥ 0. Logo, a restrição de compatibilidade de incentivos requer que tanto a renda
bruta como o consumo sejam não decrescentes em w, ou seja, trabalhadoras com
mais habilidade (w) têm maior renda e possuem consumo mais elevado.
Podemos agora descrever o modelo clássico de Mirrlees de maneira precisa.
O problema econômico é descrito pela escolha do governo de um desenho tributário
da renda que maximize o bem-estar social sujeito à restrição orçamentária, tal como
apresentado em (4), sob a condição de seleção própria mostrada em (6) ou (7) e de
que as cestas ótimas de bens sejam continuamente diferenciáveis em quase todo o
intervalo. Em outras palavras, nesse modelo o ótimo é caracterizado por um par de
funções, u(w) e y(w), que maximiza o bem-estar social sujeito à restrição da
produção factível dado por (4) e as condições de maximização da utilidade individual
apresentadas em (8). A solução deste problema tanto pode ser dada pela escolha de
uma cesta ótima (c,z), como também pode ser vista como uma escolha do nível de
utilidade U e da oferta de trabalho y (por exemplo, y é igual ao número de horas
trabalhadas), sendo que U=u(c,y) e z=yw.
Nesse contexto, o problema de otimização enunciado pode ser formulado
como um problema de princípio máximo, também conhecido como o princípio
máximo de Pontryagin. Na verdade, o problema de princípio máximo se origina do
problema do controle, sendo que ele pode ser definido resumidamente, de acordo
29
com Dixit (1990: 145-153)15 e Fuente (2000: 549), da forma que segue, adaptada
para o nosso tema. Inicialmente, considere um sistema econômico cuja evolução no
tempo ou, como no nosso caso, evolução em relação ao nível da taxa salarial
(produtividade marginal) ou habilidade w pode ser controlada, pelo menos
parcialmente, pelas ações de um tomador de decisão, no caso o governo. Essa
estruturação especial do problema geral de otimização é decorrente da existência de
relacionamentos estoque-fluxos entre as variáveis em sucessivos pontos no tempo
ou da função densidade de habilidades.
De um lado, a cada ponto no tempo ou a cada habilidade w, o estado do
sistema pode ser descrito por um vetor peculiar de variáveis reais, x(w) ∈ Rn, o qual
chamamos de vetor estado. Este possui dimensões de variáveis do tipo estoque. De
outro lado, a cada instante ou a cada w o governo escolhe um vetor de controle ou
de variáveis de decisão, u(w) ∈ Rm, que tem dimensões de variáveis do tipo fluxo.
Dessa forma, o estado corrente do sistema ou a habilidade específica atual
(estoque presente) e as escolhas dos controles (fluxos) conjuntamente determinam
o valor do vetor estado para o instante ou habilidade seguinte, de acordo com uma
lei de movimento (possivelmente dependente do tempo ou da habilidade) dada por:
x (w + ∆w ) = Q( x (w ),u(w )w ) + x (w ) ⇒
dx (w )
= Q( x (w ),u(w ),w
dw
(14)
Portanto, diferentes escolhas de variáveis de controle e do estoque inicial das
variáveis de estado irão produzir diferentes trajetórias ou caminhos para o sistema.
Essa é, por consequência, a primeira restrição do problema de princípio máximo. Em
15
O modelo que iremos apresentar do princípio máximo é aquele em que o tempo ou a habilidade
são considerados como variáveis contínuas.
30
adição à restrição que governa as variações nos estoques - variáveis estado podem existir outras restrições em todas ou algumas variáveis de estado ou de
controle, relativas a algum período de tempo ou intervalo de habilidade, tais como:
G( x (w ), u(w ),w ) = 0
(15)
Assumimos que o tomador de decisão tem preferências definidas sobre as
diversas trajetórias que podem ser representadas por uma função objetivo ou de
retorno esperado, aditiva no tempo ou em relação à habilidade w, descrita por:
W = ∫ F ( x (w ), u(w ),w )dw
(16)
Logo, o problema do princípio máximo é :
max W = ∫ F ( x (w ), u(w ),w )dw
sujeito à:
dx (w )
= Q( x(w ), u(w ), w );G( x(w ), u(w ), w ) = 0
dw
x (w ) = x 0 ; x (w ^ ) = x 1
A solução do problema do Princípio Máximo é dado por16:
dα(w )
= −H x * ( x, α,w )
dw
(17)
dx (w )
= −H α * = ( x, α,w )
dw
(18)
16
Ver a solução no item 2 do Apêndice.
31
Os resultados encontrados podem ser resumidos da seguinte maneira. As
condições necessárias de primeira ordem para o problema de princípio máximo são
dadas por:
para cada w, u maximiza o Hamiltoniano H(x,u,α,w), sujeito à restrição de
um único período G(x,u,w) = 0; e
as mudanças em x e α ao longo da distribuição de w são comandadas
pelas equações diferenciais (17) e (18).
O princípio máximo apresenta seu grande mérito conceitual na interpretação
econômica da condição de maximização. É cristalino que não deveríamos escolher
u(w) para maximizar F(x(w),u(w),w), pois sabemos que a escolha de u(w) afeta x em
w+dw, via a expressão (14), e, portanto, afeta os termos da função objetiva em
w+dw. Um exemplo concreto deste fenômeno pode ser retirado da interpretação da
questão da produção: um boom no consumo hoje iria aumentar a utilidade presente,
porém significaria um estoque de capital menor no futuro e, portanto, menos
consumo e menos utilidade no futuro.
Com efeito, esse fenômeno nos mostra a necessidade de se captar os efeitos
futuros ou ao longo da distribuição de habilidades que naturalmente são
representados pelo uso do preço sombra sobre o estoque. O efeito de u(w) em
x(w+dw) equivale ao impacto sobre Q(x(w),u(w),w) e o resultado da mudança na
função objetiva é representado pela multiplicação de Q pelo preço sombra α(w+dw)
de x(w+dw). Isso nada mais é do que o segundo termo da definição do hamiltoniano.
Destarte, o hamiltoniano nos oferece um modo simples de alterar a função objetiva
32
em determinada habilidade para levar em conta as conseqüências futuras da
escolha da variável controle u(w) no espectro de habilidade específico w.
A expressão (17), também possui uma interpretação econômica interessante.
Uma unidade marginal de x produz um retorno marginal Fx(x(w),u(w),w) λGx(x(w),u(w),w) dentro de um espectro de habilidade w. Isto é, levando-se em conta
o custo sombra (shadow cost) da restrição, associado à uma habilidade específica, e
o estoque extra Qx(x(w),u(w),w) da habilidade seguinte, valorizada por α(w+dw).
Com efeito, isto pode ser pensado como sendo um dividendo. A variação do preço
sombra dα(w)/dw é como um ganho de capital, exceto pelo fato de que os preços
são representados pelo seus valores presentes. Logo a variação contém um fator de
desconto extra que captura a taxa de juros ou o custo de oportunidade de carregar
u(w) de um espectro para outro de habilidade. Quando u(w) é otimizada, o retorno
marginal total, ou a soma de seus componentes, deve ser zero. Isto é exatamente o
que (17) expressa, quando escrita da seguinte forma:
H x* ( x, u, α,w ) +
dα(w )
=
dw
[Fx ( x(w ),u(w ),w ) − λGx ( x(w ,u(w ),w )] + α(w )Qx ( x(w ),u(w ),w ) + dα(w ) = 0
dw
(19)
Em outras palavras, os preços sombras assumem valores, de forma a
eliminar os excessos de retorno, por manutenção do estoque, estabelecendo, assim,
a condição intertemporal de não arbitragem.
Em verdade, os resultados obtidos por meio do princípio de máximo não são
simples como os apresentados, pois as integrais não podem ser diferenciadas de
uma maneira ordinária com respeito a uma variável em uma determinada habilidade
específica ou instante de tempo. Portanto uma teoria de otimização rigorosa no
33
tempo contínuo ou sobre uma distribuição contínua de habilidades, representada
pela renda, é muito complicada. Porém, atalhos como os derivados acima conduzem
a resultados úteis. Por fim, aplicações práticas do princípio de máximo têm como
ponto central a derivação das equações diferenciais (17) e (18) e a soluções das
mesmas para as condições apropriadas nos intervalos w=w e w= w^.
Recordando o nosso problema original de tributação ótima não linear da
renda, porém usando como restrição somente a condição de primeira ordem para a
oferta de trabalho, teremos:
max W = ∫ W (u )f (w )dw (MBS )
sujeito à :
R = ∫ [z(w ) − c (w )]f (w )dw = 0(RO )
yu y
zu
du
=−
= − z (MIUouCPO )
dw
w
w
intervalo entre w e w^
as condições de transversalidade α(w) = α(w^) = 0
Neste contexto,
a variável estado é dada pela função utilidade u(w) e a
variável oferta de trabalho y(w)17 é a variável controle. Por sua vez, adotamos os
multiplicadores de Lagranje λ e α(w) como sendo o preço sombra da restrição
orçamentária e variável de coestado (preço sombra da Condição de Primeira Ordem
-CPO), respectivamente. Para simplificar o problema de otimização do governo,
17
Como y não é verificável, a variável de controle é na verdade z(w), ou seja, a renda antes da
tributação.
34
podemos expressar c como uma função de u e z. Esta inversão é possível, pois u(w)
é monotonicamente crescente em c(w). Sendo c=h(u,z) e du/dw=g(u,z), então a
diferenciação de h e g em relação a z e u produz os seguintes resultados:
hz = - uz/uc = Φ, hu = 1/uc, gz = (uwcΦ + uwz) = - ucΦw, gu = uwc/uc
(20)
Seguindo o princípio de máximo e adotando o hamiltoniano como sendo:
H = {W (u ) + λ[ z(w ) − h(u, z )]}f (w ) − α(w )g (u, z )
Então, encontramos as seguintes expressões para para a solução do
problema da tributação ótima18:
dα(w )
dα(w )
= 0 ⇔ Wu f (w ) − α(w )g u − λhu f (w ) −
=0⇔
dw
dw
dα(w )
Wu f (w ) − λhu f (w ) −
− α(w )g u = 0
dw
Hu −
(21)
(20) → (21):
−
dα(w ) α(w )uwc ⎡
λ⎤
−
+ ⎢Wu − ⎥f (w ) = 0
dw
uc
uc ⎦
⎣
H z = −α(w )g z + λ(1 − h z )f (w ) = 0
(22)
(23)
(20) → (23):
α(w )u c Φ w + λ[1 − Φ ]f (w ) = 0
(24)
Podemos reescrever a condição principal de otimização da tributação não
linear da renda (36), como:
18
A solução é apresentada no item 3 do Apêndice.
35
[1 − Φ ] = −α(w ) u c Φ w
λf (w )
(25)
Lembrando que Φ = cz = 1 - τ’(z), a expressão (25) torna-se, então:
τ' ( z ) = −α(w ).
uc Φ w
λf (w )
(26)
A expressão acima informa que a alíquota marginal tributária ótima sobre a
renda é crescente em α(w)ucΦw e decrescente em λf(w). Além disso, a renda z é
uma função estritamente crescente da habilidade w, quando a condição de segunda
ordem não está ativa. Em outras palavras, podemos afirmar que essa alíquota é a
distorção no preço relativo da renda z que a trabalhadora com habilidade w deveria
se defrontar no ponto ótimo.
Multiplicando o lado direito da expressão (26) por Φ.w/Φ.w, adotando
ψ = - Φw.w/Φ e lembrando que Φ = 1 - τ’(z), temos:
τ' ( z )
⎡ α(w )u c ⎤ ψ
=⎢
[1 − τ' (z )] ⎣ λ ⎥⎦ wf (w )
(27)
A expressão acima diz que a alíquota marginal tributária ótima é decrescente
em wf(w). Na verdade, esse efeito tem um significado muito cristalino: quanto maior
for a efetiva oferta de trabalho submetida a alíquota marginal tributária numa dada
habilidade w, maior será o excesso de carga associada a essa alíquota tributária.
Por outro lado, a alíquota marginal tributária ótima é crescente em relação a
α(w)uc/λ] e a ψ. A interpretação desses dois termos e de seus efeitos é facilitada
para o caso especial em que a função utilidade é quase linear: u(c,y) = c + ν(1-y),
em que ν é uma função estritamente côncava.
36
Neste caso temos que19:
ψ=
1
+1
ε
(28)
em que ε é a elasticidade compensada da oferta de trabalho em w.
Portanto, elasticidades da oferta de trabalho mais elevadas geram valores
inferiores de ψ que, por sua vez, implicam
menores alíquotas marginais. Esse
comportamento é esperado dado ao fato de que elasticidades da oferta de trabalho
mais elevadas estão também associadas a aumentos mais acentuados de gravame
excessivo por unidade de receita gerada.
Finalmente, os efeitos do termo α(w)uc/λ, podem ser vistos a partir da
seguinte equação, supondo também que a função utilidade seja quase linear20:
∞
∞
α(w )
⎡ W (w ) ⎤
⎡Wu (w ) ⎤
[
]
f
(
w
)
d
(
w
)
1
F
(
w
)
= ∫ ⎢1 − u
=
−
−
⎥
⎢ λ ⎥f (w )dw
∫
λ
λ ⎦
⎦
w⎣
w⎣
(29)
em que F(.) é afunção acumulada de densidade, tendo como base f(.).
A expressão (29) iguala o valor social, ponderado pelo custo marginal dos
fundos λ de se elevar uma unidade monetária adicional de receita, a partir do
acréscimo da alíquota tributária marginal, num determinado nível de taxa salarial w.
O valor social contido na equação (29) possui dois componentes:
•
primeiro, representado pelo termo [1 - F(w)], é o montante de receita
auferida, equivalente aos tributos coletados de todos aqueles que pagam o
19
20
Ver a derivação da expressão de ψ no item 4 do Apêndice.
A derivação da equação está no item 4 do Apêndice.
37
tributo adicional - aqueles cujas taxas salariais são no mínimo tão altas
como w; e
∞
•
segundo,
⎡Wu (w ) ⎤
f (w )dw , corresponde ao valor, novamente em termos
λ ⎥⎦
w
∫ ⎢⎣
de unidades de receita, da perda de bem-estar social dos indivíduos que
pagam o tributo adicional.
Com efeito, cada um dos termos acima apresentados se reduzem com o
aumento de w, pois coletamos menos receitas e impomos menor carga tributária ao
aumentarmos os tributos em um número menor de pessoas. Note-se, porém, que a
diferença entre esses termos é que se torna relevante no problema de tributação
ótima. A pergunta básica seria: Qual seria o padrão de comportamento da diferença
entre os termos, ao longo da distribuição de w? De fato, a diferença deveria ser
positiva se as alíquotas tributárias são positivas e convergeria para zero, quando
∞
w → ∞. Se Wu declina com w, então o segundo termo,
⎡Wu (w ) ⎤
f (w )dw , ou seja, o
λ ⎥⎦
w
∫ ⎢⎣
custo social de um aumento na alíquota tributária marginal em w, converge para zero
mais rapidamente do que o primeiro termo, 1 - F(w). Portanto, deve existir um
intervalo sobre o qual a diferença entre os dois termos aumenta. A intuição seria que
alíquotas tributárias marginais elevadas aplicadas em níveis elevados de renda
seriam ineficientes porque elas produziriam pouca receita, enquanto que alíquotas
tributárias marginais muito elevadas, aplicadas em faixas de renda baixas são
iníquas, pois elas impõem um ônus fiscal excessivo sobre aqueles, cuja utilidade
marginal social da renda, Wu(w) é elevada. Neste contexto, o melhor compromisso
poderia ser aumentar a alíquota tributária marginal sobre os níveis de renda médios.
Nesses níveis, as obrigações tributárias não recairiam sobre aqueles para quem a
38
carga tributária elevada gera um custo social elevado, porém é onde as alíquotas
tributárias elevadas permitem ainda incrementar consideravelmente as receitas.
Destarte, o padrão exato que o termo a esquerda da expressão (29) irá seguir
à medida que aumentarmos w depende da função de bem-estar social e do formato
da distribuição de salário na economia. Mesmo que esse termo realmente indique
que as alíquotas tributárias marginais deveriam recair sobre a média/moda da
distribuição de salário, é exatamente neste ponto que o outro termo na expressão
(27), wf(w), impõe um efeito maior de redução da alíquota tributária marginal.
Portanto, não é possível dizer muito sobre a forma geral da programação ótima da
alíquota marginal sobre a renda.
De acordo com Tuomala (1990), pode-se dizer que é da natureza básica dos
problemas de tributação da renda a necessidade de se requerer resultados
quantitativos, pois meros princípios gerais, como vimos, não são de muita valia.
Portanto, é importante ter como objetivo encontrar o modo de como conectar
medidas empíricas com propostas numéricas específicas dentro de um arcabouço
de modelos tributários ótimos sobre a renda.
Como afirma Myles (1995), as questões relativas à demonstração formal de
que considerações sobre equidade são relevantes para o aumento das alíquotas
marginais (progressividade) e a evidenciar que o critério de eficiência, em especial o
efeito da tributação sobre a oferta de trabalho, afeta a escolha do desenho tributário
são melhores encaminhadas via simulações numéricas, em decorrência da
complexidade analítica do modelo não linear de tributação da renda.
39
Nas principais simulações numéricas feitas por Mirrlees (1971), Atkinson
(1972), Stern (1976) e Tuomala (1990) foram utilizadas as seguintes hipóeses: (i) a
∞
1
função de bem-estar social seria dada por W = ∫ e −βu f (w )dw , forma paramétrica
β
0
que permite variações sobre o tipo de função de bem-estar social a ser empregada,
a partir de mudanças em β (grau de aversão a desigualdade). Valores elevados de β
representam grande preocupação com a eqüidade, enquanto que com β=0 ou β=1
representaria o caso utilitarista. Por outro lado, β=∞ corresponderia a função
utilidade rawlsiana (max-min) que impõe peso exclusivo nos pobres, ou seja,
somente na melhora dos indivíduos de mais baixa renda; (ii) a função utilidade
individual assumida é a Cobb-Douglas, u(c,y) = logc+log(1-y) , em que ε=1, e/ou
u(c,y) = (-1/c) - (1/1-y), em que ε=0,5; e (iii) a função distribuição de habilidades
adotada é a log-normal com desvio padrão igual 0,39.
No final do próximo capítulo apresentaremos um quadro comparativo com os
principais resultados das simulações numéricas realizadas por esses autores e Saez
(2000).
2.3 Conclusão
O modelo clássico da tributação ótima da renda, como vimos, capta aspectos
importantes do problema tributário e mesmo assim tem, ainda, a vantagem de
permanecer ainda tratável. Além disso, graças ao poder analítico do modelo
clássico, a tributação ótima pode ser caracterizada, resultados teóricos foram
provados e métodos numéricos aplicados. Com efeito, isso não significa que sua
caracterização seja fácil; na verdade, ela requer inovações analíticas que se
revelaram ser tão ou mais importantes do que ela própria, como os resultados
40
produzidos pelo modelo (Hammond e Myles, 2000).
Segundo Hammond e Myles (2000), após trinta anos do surgimento do
modelo clássico (1970-2000), nenhum outro modelo melhor de tributação não linear
da renda foi proposto. Ao contrário, novos resultados estão ainda sendo descobertos
dentro do escopo original e suas especializações, como os trabalhos de Diamond
(1998) e Saez (2000). Então podemos nos perguntar: Qual a razão de estudar o
modelo de Saez (2000) já que ele é somente uma extensão do trabalho seminal de
Mirrlees (1971)?, mais ainda, Quais são as inovações propostas, por que foram
necessárias e quais são suas conseqüências?
41
3. O Modelo Clássico Revisitado: Tributação Ótima da Renda
Utilizando Elasticidades – Modelo Saez para rendimentos elevados
3.1 Introdução
O argumento central para se buscar uma melhoria no modelo clássico sem
dúvida foi o de tornar mais transparente e intuitiva sua apresentação. Com efeito,
buscou-se uma forma sistemática de derivar resultados de tributação ótima que
pudesse ser facilmente utilizada em estudos aplicados, mediante o emprego de
elasticidades comportamentais - conceito chave em trabalhos empíricos -, capaz de
produzir um conjunto de equações que tivessem a elegância do modelo da
tributação linear da renda. Nesse sentido, Saez (2000) estuda o problema da
tributação não linear da renda usando a idéia de perturbação no desenho tributário.
A principal inovação proposta por Saez é que ele reconhece, pela primeira vez na
literatura, que não é necessário ancorar o modelo de distribuição da população em
um parâmetro não observável, como a habilidade, tal como no modelo original de
Mirrlees. Ao contrário, uma distribuição mais natural, como a da renda, pode ser
utilizada. Com efeito, ele emprega distribuições empíricas da renda para realizar
simulações numéricas (calibragens), oferecendo uma melhoria significativa sobre as
soluções numéricas elaboradas por Mirrlees (1971) e Tuomala (1990).
Além disso, o modelo de Saez (2000) amplia o modelo clássico em quatro
novas direções: a) uma fórmula simples para a alíquota tributária ótima sobre as
rendas mais elevadas é derivada como uma função dos efeitos renda e substituição
e da densidade da faixa mais elevada da distribuição da renda; b) a derivação do
42
conjunto de fórmula do modelo clássico em termos das elasticidades proporciona
uma compreensão transparente dos efeitos econômicos chaves subjacentes ao
formulário; c) introduz a possibilidade de preferências heterogêneas; e d) as
soluções numéricas (calibragens) podem ser facilmente implementadas a partir do
uso de distribuições empíricas da renda e de hipóteses realistas sobre parâmetros
de elasticidades, dado que as expressões derivadas são relacionadas bem de perto
com magnitudes empíricas. Por fim, o modelo de Saez mostra que a forma da
distribuição da renda exerce um papel crítico no comportamento das alíquotas
tributárias ótimas.
3.2 O Modelo Saez para Rendimentos Elevados
Como vimos na apresentação do modelo clássico de Mirrlees, a condição
geral de primeira ordem dependem de forma complexa das derivadas da função
utilidade u(c,y), que não são relacionadas de uma maneira direta a magnitudes
empíricas. Além disso, o modelo, de acordo com Saez (2000), é derivado mediante o
uso de instrumento poderoso, porém cego, do princípio máximo de Pontryagin, ou
seja, ele não permite elucidar os efeitos econômicos chaves que conduzem ao
formulário básico da tributação ótima da renda.
3.2.1 Derivação do Modelo
Saez (2000) emprega o método clássico da tributação linear ótima da renda
para derivar uma fórmula simples para estabelecer a alíquota tributária ótima sobre
os rendimentos mais elevados percebidos pelas trabalhadoras. Com efeito, o modelo
considera que o governo fixa uma alíquota única, τ, acima de um determinado valor
elevado de rendimento tributável, z*, e então calcula os efeitos no bem-estar social e
43
na receita tributária, usando elasticidades, de um pequeno incremento (perturbação),
dτ, em τ.
Utilizando o modelo padrão de dois bens, c e z, da teoria do consumidor, cada
contribuinte maximiza sua função utilidade individual bem comportada21, u=u(c,z),
que depende positivamente do consumo c (estritamente crescente em c) e
negativamente do rendimento z (estritamente decrescente em z). Além disso, a
habilidade ou o conhecimento profissional individual da trabalhadora, representada
pelo salário-hora w, está incorporado à função de utilidade u, em particular no
parâmetro z22. Por fim, supõe-se que o contribuinte deve respeitar uma restrição
orçamentária linear. Logo, o problema individual do contribuinte é dado por: max
u(c,z) sujeito à c=z(1-τ) + R, onde τ é alíquota tributária marginal e R indica o
rendimento virtual não oriundo do trabalho23. A solução desse problema é dada
por24:
u z + (1 − τ)u c = 0
(30)
A condição de primeira ordem expressa em (30) implicitamente define as
funções de demanda Marshalianas, não compensadas25, de rendimento z=z(1-τ,R) função oferta salarial - e de consumo c=c(1-τ,R) do contribuinte. Por outro lado, se
formularmos o problema dual, encontraremos a seguinte solução26:
21
Uma função utilidade u(x,y) é dita bem comportada, neste caso, se ela é contínua, diferenciável e
estritamente côncava (no caso rawlsiana é suficiente assumir estrita quase-concavidade)
22
z=ny=wy
23
O rendimento virtual R é o rendimento pós-tributação que a contribuinte obteria se ele declarasse
rendimento salarial zero e fosse permitida a ela ficar na mesma faixa de restrição orçamentária dada
pela alíquota marginal constante τ.
24
A solução passa a passo é feita no item 5 do Apêndice.
25
Uma função de demanda é hicksiana quando a renda é “compensada” de tal sorte a manter a
utilidade constante, admitindo somente efeitos substituição quando os preços variam. Já a demanda
marshaliana é não compensada, pois admite efeitos substituição e renda quando os preços variam.
26
Ver item 5 do Apêndice.
44
uZ
uC
= −(1 − τ )
(31)
Da mesma forma, a condição de primeira ordem expressa em (31) define uma
função de demanda Hicksiana, compensada, de rendimento zh=zh(1-τ,u*) - função
oferta salarial - do contribuinte. A partir de (30) e (31) podemos construir a equação
de Slutsky para o caso especial de uma variação do preço tributário 1-τ, também
chamada de own-price change, definida por:
∂z[(1 − τ), R ] ∂z h (1 − τ, u *)
⎧ ∂z[(1 − τ), R ] ⎫
+ z(1 − τ).⎨
=
⎬
∂R
∂(1 − τ)
∂(1 − τ)
⎭
⎩
(32)
A equação (32) estabelece a resposta do rendimento tributável z a variação
da alíquota tributária marginal τ , composta de um efeito substituição dado pela
inclinação da curva de demanda hicksiana e do efeito renda dado pelo parâmetro
mais esquerda da expressão em comento. Podemos reescrever na expressão acima
da seguinte maneira:
ζ NC = ζ C + η ⇒ ζ C = ζ NC − η
(33)
Na realidade, a expressão (33) é uma forma de reescrever a equação de
Slustky em termos de elasticidades, sendo que ζNC nada mais é do que a
elasticidade-preço da demanda não compensada da função oferta salarial
marshaliana, também chamada de elasticidade-preço do tributo27; η é o parâmetro
que captura os efeitos da variação da renda virtual; e, por fim, ζC é a elasticidadepreço da oferta salarial compensada (hicksiana).
27
(1-τ).
45
Supondo-se um incremento dτ na alíquota única, τ, acima de um determinado
valor elevado de rendimento tributável, z*, tal perturbação terá dois efeitos sobre a
receita tributária (vide Figura 1 a seguir). O primeiro, chamado de efeito mecânico,
representa aumento na receita tributária caso não existisse qualquer resposta
comportamental. O segundo, chamado efeito comportamento, implica redução na
receita tributária, decorrente de ações comportamentais que diminuem os
rendimentos.
Figura 1 – Perturbação na alíquota tributária sobre rendas elevadas
Renda z
depois da
tributação
Antes da reforma
Depois da reforma
Inclinação 1-τ
dR=z*dτ
Inclinação 1-τ-dτ
z*
Renda z antes da tributação
Nesse sentido, um indivíduo com rendimento z (acima de z*) irá pagar tributos
adicionais no montante de (z-z*)dτ. Α soma total M das receitas adicionais de todo
os indivíduos da população com renda acima de z*, cuja média de rendimentos é
dada por zm, será igual a:
M = z m − z * dτ
(34)
46
Por outro lado, a perturbação dτ produz efeitos comportamentais que podem
ser decompostos em duas partes: (i) um incremento não compensado na alíquota
tributária marginal de dτ em toda população; e (ii) um aumento generalizado no
rendimento virtual de dR=z*dτ. A redução total, B28, das receitas tributárias, em
razão do efeito comportamental, será a soma dos termos τdz sobre todos os
contribuintes com rendimentos superiores que z*, logo:
(
)
* NC
* *
B = − ζ z m − η z τd τ
(1 − τ )
(35)
Com efeito, ζ*NC é a elasticidade não compensada média ponderada, sendo
que a elasticidade ζNC(z) no interior da integral é a elasticidade média dos
contribuintes com rendimento z. Por outro lado, η* é o efeito renda médio29.
O efeito desta pequena reforma tributária - incremento dτ na alíquota
tributária para a parcela da população que percebe rendimentos acima de z* - no
bem estar social é dado pelo parâmetro g* que reflete os objetivos redistributivos do
governo. Na realidade, o parâmetro g* é definido como sendo a razão entre a
utilidade marginal social das contribuintes com rendimento acima de z*, ou seja, as
que compõem a faixa de rendimentos mais elevada da população, e o valor marginal
dos fundos públicos para o governo.
Em outras palavras, g* é definido de tal sorte que o governo é indiferente
entre g* reais de gasto social e um real adicional para o consumo das contribuintes
28
Ver dedução no item 6 do Apêndice.
Saez (2000) afirma que os pesos estabelecidos para os parâmetros ζNC e η são diferentes, pois ele
assume que os contribuintes de mesmo rendimento não precisam ter a mesma elasticidade, o que é
relevante nos parâmetros são as elasticidades médias em determinados níveis de rendimento. Além
disso, esse mesmo autor assume que o conjunto de contribuintes que porventura passam a contribuir
descontinuamente mais, em razão do aumento infinitesimal na alíquota tributária, é desprezível.
29
47
com rendimentos superiores a z*. Neste caso, quanto menor for g*, menor será o
peso que o governo dá ao consumo daqueles com rendimentos elevados. Para
calcularmos os efeitos no bem estar social, notemos que a função utilidade pode ser
descrita com sendo a utilidade individual na escolha ótima da oferta de trabalho para
um contribuinte de faixa de rendimento mais elevada, ou seja:
u (c, z ) = u [(z(1 − τ, R )(1 − τ ) + R ), z (1 − τ, R )]
Utilizando o teorema do envelope, o efeito de uma pequena variação na
alíquota tributária na utilidade é du = uc(-zdτ + dR), substituindo dR=z*dτ, logo du = -
uc(z - z*)dτ, em que (z - z*)dτ é o aumento nas receitas tributárias devido ao efeito
mecânico do incremento infinitesimal na alíquota tributária. Como resultado da
definição de g*, cada real adicional arrecadado pelo governo, em virtude da pequena
reforma tributária, reduz o bem estar social das contribuintes da faixa mais elevada,
em média, de g* . Portanto, a perda total de bem-estar social devida a reforma
tributária em apreço será igual a g*M. Logo, o governo estabelece a alíquota
tributária τ de tal forma que atenda:
(1 − g )M + B = 0
*
(36)
A expressão acima nos mostra que a alíquota tributária ótima é aquela que
equaliza os efeitos sobre a arrecadação, oriundos dos aspectos mecânico e
comportamental, ao impacto sobre o bem estar social, em virtude de uma reforma
tributária marginal (introdução da perturbação dτ). Nesse sentido, utilizando (34) e
(35) em (36), obtemos:
(1 − g )(z
*
m
−z
*
)dτ − (ζ
* NC
)
z m − η * z * τ dτ
=0⇒
1− τ
48
[(
)(
) ]
)]
1 − g * z m − z * dτ
τd τ
=
(1 − τ )
ζ *NC z m − η * z *
[(
(37)
Dividindo e multiplicando o lado direito da expressão acima por z*, além de
cancelar dτ de ambos os lados da equação, obtemos:
⎡
⎞⎤
* ⎛ zm
⎢ 1 − g ⎜ * − 1⎟⎥
τ
⎝z
⎠⎦
=⎣
(1 − τ ) ⎡⎛ *NC zm * ⎞⎤
− η ⎟⎥
⎢⎜ ζ
z*
⎠⎦
⎣⎝
(
)
(38)
A expressão (38) nos informa que a alíquota marginal ótima para os
contribuintes que percebem rendimentos elevados depende basicamente dos
parâmetros comportamentais relevantes: elasticidade e efeitos renda médios dos
contribuintes com rendimento acima de z*. Além disso, essa alíquota (τ), como
esperado, é uma função decrescente do peso social g* que recai sobre os
contribuintes de rendimentos elevados, da elasticidade média ζ*NC e do tamanho
absoluto dos efeitos renda η*. De outro lado, porém ainda mais instigante, a alíquota
ótima é uma função crescente do parâmetro zm/z*, que está relacionado à forma da
distribuição empírica dos rendimentos da população fato este ainda pouco explorado
pela literatura tributária.
Um resultado interessante da expressão (38) pode ser encontrado quando
admitimos que a distribuição de rendimento é limitada. Nesse caso, quando z* se
situa bem perto do limite superior, a razão zm/z* tende a um e, portanto, a alíquota
marginal é igual a zero, em virtude de que (zm/z* - 1) = 0. Esse resultado
corresponde àquele já visto na revisão da literatura, enunciado por Sadka (1976) e
Seade (1977): no limite superior da distribuição de rendimentos, a alíquota tributária
49
ótima é igual a zero. A intuição que está por detrás desse resultado clássico é de
que o incremento mecânico na receita tributária, M, é desprezível em face da perda
de receita B, devida a resposta comportamental, indicando que a alíquota ótima
esteja necessariamente perto de zero.
3.2.2 Resultados Empíricos para os EUA
Analisando a distribuição de rendimentos da população americana nos anos
de 1992 e 1993, Saez (2000) verificou que a razão zm/z* , a partir do rendimento de
U$ 150 mil até bem perto do final da distribuição, é razoavelmente constante em
torno do valor 2. Ora, distribuições com parâmetro zm/z* constante correspondem às
distribuições paretianas. Portanto, as caudas das distribuições empíricas de
rendimentos podem ser aproximadas de maneira satisfatória por esse tipo de
distribuiçãi, definida como: Prob (rendimento>z) = C/za , com a>1, sendo que a razão
zm/z* é constante e igual a a/(a-1). Quanto mais elevado for o parâmetro a, mais
curta é a cauda da distribuição de rendimento. Para o caso americano (anos de 1992
e 1993, pelo menos), a razão zm/z* é aproximadamente 2 e, portanto, o parâmetro a,
por definição, é também próximo de 2.
Admitindo que a elasticidade ζ*NC e os efeitos renda η* convergem a medida
que z* aumenta e que a razão zm/z* converge para um limite descrito por a/(a-1),
então a alíquota ótima também converge. Utilizando a equação de Slutsky (33),
podemos reescrever a expressão (38), em termos dos valores limites das
elasticidades e do parâmetro de Pareto a, da seguinte forma30:
30
Ver dedução no item 7 do Apêndice.
50
τ* =
(1 − g )
*
[ζ
* NC
(
+ ζ C (a − 1) + 1 − g *
)]
(39)
De acordo com Saez (2000), o governo deseja estabelecer aproximadamente
uma alíquota linear uniforme, para rendimentos elevados. Portanto, τ* é realmente a
alíquota assintótica ótima não linear do problema de Mirrlees. Analisando-se a
expressão (39), nota-se que a alíquota τ* depende negativamente da espessura da
cauda superior da distribuição, medida pelo parâmetro paretiano a. Trata-se de um
resultado intuitivo, pois se a cauda é pouco espessa, então, a arrecadação gerada
por aumentos da alíquota superior, que incide sobre contribuintes de alta renda, será
pouco significativa. Por outro lado, para uma dada elasticidade compensada, quanto
maior for o valor absoluto dos efeitos renda, em relação à elasticidade não
compensada, maior será a alíquota tributária assintótica31. Em outras palavras, o
mais importante para a tributação ótima é se os contribuintes continuam trabalhando
após elevações nas alíquotas tributárias (sem compensação da utilidade). Cabe
ressaltar que embora a elasticidade compensada seja crucial para definir o gravame
excessivo da tributação, os mesmos valores de ζ C podem conduzir a alíquotas
tributárias ótimas bastante díspares. Se g*= 0 implicando, assim, que o governo não
valoriza o consumo marginal dos que percebem rendimentos elevados, obtém-se
uma alíquota, τ*, que maximiza a arrecadação. Além disso, supondo-se que não
existem efeitos renda (ζ C = ζ NC) e fixando a=2 (parâmetro paretiano da distribuição
americana), pode-se reescrever a expressão (39) como:
31
Se dividirmos o numerador e o denominador do lado esquerdo da expressão (54) por ζ*C e
assumirmos (1-g*)/ζ*C = b, então τ *=b/[b+(ζ*NC/ζ*C)+(a-1)]. Logo quanto menor for (ζ*NC /ζ*C), menor
será o denominador e, por conseqüência, maior será τ *. Porém, para que (ζ*NC /ζ*C) seja menor,
então (ζ*C /ζ*NC) tem que crescer, logo o valor de 1-η* /ζ*NC tem que aumentar (vide de Slutsky). Isto
somente ocorre se o módulo de (-η*), relativamente a ζ*NC, seja maior.
51
τ* = 1
(ζ
*
)
(40)
+1
Saez (2000) denota essa alíquota τ * de alíquota “Laffer”. A expressão acima
é uma generalização da conhecida fórmula da alíquota tributária única (flat tax) que
maximiza a receita tributária, onde ζ* é a elasticidade média sobre o conjunto dos
contribuintes de alta renda. Na literatura empírica sobre o tópico, não existe
consenso sobre a magnitude desse tipo de elasticidade. Alguns estudos estimam
que essas elasticidades são superiores à unidade enquanto que outros afirmam que
esses parâmetros são próximos de zero. Por essa razão, quando do cálculo das
alíquotas, ótimas diferentes suposições a respeito da magnitude desse parâmetro
serão utilizadas.
A Tabela 1 apresenta resultados da simulação numérica realizado por Saez
(2000) para alíquotas tributárias ótimas, utilizando a expressão (40) para diversos
valores de elasticidades compensadas e não compensadas, parâmetro paretiano a
de distribuição dos rendimentos e de utilidade marginal social g*.
Tabela 1 - Alíquotas tributárias ótimas para contribuintes com rendimentos elevados
g*=0
g*=0,25
ζNC = 0,2; ζC =
0,5; η = - 0,3
ζNC = 0,2; ζC =
0,8; η = - 0,6
ζNC = 0,5; ζC =
0,5; η = 0
ζNC = 0,5; ζC =
0,8; η = - 0,3
A=1,5
69
63
57
53
a=2
59
50
50
43
A=2,5
51
42
44
37
A=1,5
63
56
50
45
a=2
52
43
43
37
a=2,5
44
32
38
31
Fonte: Emmanuel Saez, Using Elasticities to derive Optimal Income Tax Rates, Review of Economic
52
Studies 68 (2001), p. 213.
3.3 Conclusão
O Modelo de Saez para a Tributação Ótima da Renda estudado neste
capítulo evidencia que a derivação do modelo clássico, utilizando elasticidades, pode
proporcionar as seguintes vantagens: a) mostra precisamente como os diferentes
efeitos econômicos atuam para a dedução da alíquota tributária ótima e quais são os
parâmetros relevantes para o seu cálculo; b) as equações chaves do modelo são
expressas em termos de parâmetros observáveis e passíveis de estimação,
permitindo que simulações numéricas possam ser realizadas e calibradas, usandose distribuições empíricas de rendimentos; e c) permite um cálculo simples e direto
das alíquotas ótimas para rendimentos elevados.
Po outro lado, as simulações para o caso norte-americano mostram que a
alíquota assintótica ótima para diversos valores dos parâmetros básicos do modelo
são sempre superiores a 30%. Com efeito, o cálculo para as alíquotas assintóticas
ótimas, relativo aos rendimentos mais elevados, é muito simples e direto, permitindo
o uso transparente da distribuição empírica de rendimentos.
Neste contexto, o
presente trabalho procura aplicar concretamente o Modelo Saez para as faixas de
rendimentos mais elevadas, tendo como base a distribuição empírica de
rendimentos, relativa ao exercício de 2000, a partir de dados fornecidos pela
Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda.
53
4.
APLICAÇÃO
ELEVADOS:
DO
MODELO
CÁLCULO
DE
SAEZ
PARA
ALÍQUOTAS
RENDIMENTOS
MARGINAIS
ASSINTÓTICAS PARA O BRASIL NO ANO DE 2000
4.1 Introdução
Tendo em vista a complexidade dos modelos de tributação não linear da
renda, os elementos chaves que determinam as alíquotas tributárias ótimas,
segundo Saez (2001), são as elasticidades, a forma da distribuição de rendimentos e
as preferências distributivas do governo, que são melhores examinados por meio de
análises numéricas. Como vimos anteriormente, a alíquota marginal assume valores
percentuais entre 0 e 100, porém não temos pista alguma sobre o comportamento
da alíquota marginal ao longo da distribuição, ou seja, quão longe ou perto ela está
desses valores extremos, a não ser exatamente nos pontos extremos da distribuição
(a alíquota assume valor zero em ambos casos). De maneira análoga, não
conseguimos mostrar formal e categoricamente que, em face de considerações de
eqüidade, a alíquota marginal deveria ser crescente nem de que forma é afetada a
escolha do desenho tributário quando se examina o critério de eficiência a partir do
efeito da tributação na oferta de trabalho.
Nesse contexto, torna-se imperativo a simulação numérica (calibragem) para
que possamos analisar melhor as questões básicas da tributação ótima da renda.
Com efeito, apresentamos na seção seguinte o cálculo da alíquota ótima sobre
rendimento elevados, sendo que na primeira subseção descrevemos os dados,
depois examinamos a distribuição empírica dos rendimentos tributáveis para o
exercício de 2000, em especial o quociente zm/z* e, por fim, calculamos a alíquota
54
tributária assintótica ótima, a qual chamamos de alíquota ótima sobre grandes
fortunas, sob diversas condições dependentes dos valores assumidos pelos
elementos básicos.
4.2 Alíquota Ótima sobre Rendimentos Elevados
4.2.1 Descrição dos Dados32
Os dados utilizados neste trabalho, constantes do Anexo, foram fornecidos
em caráter precário pela Secretaria da Receita Federal. O significado de precário é:
a Receita Federal não se responsabiliza pela veracidade das informações e nem por
quaisquer resultados obtidos a partir da manipulação dos dados brutos. Os números
constantes da tabela do Anexo são relativos às Declarações do Imposto de Renda
Pessoa Física 2001 (DIRPF 2001), Ano Base 2000. O número total de declarantes
foi de 13.906.145 (treze milhões e novecentos e seis mil e cento e quarenta e cinco)
pessoas. Do montante total entregue, 92,06% foi enviado eletronicamente e o tipo de
formulário
mais utilizado foi o modelo simplificado (62,77%). A Tabela a seguir
mostra alguns valores interessantes que retratam de forma sintética a DIRPF 2001.
Tabela 2 - Indicadores básicos da DIRPF 2001
Itens
Valores em R$ Valores Médios
bilhões
em R$
Alíquota
Efetiva (%)
1. Rendimento Total
403,56
30.407,77
5,36
2. Rendimento Tributável
276,15
21.258,01
7,84
3. Rendimento Tributável Líquido
205,22
16.248,81
10,54
4. Imposto Devido
21,64
4.169,80
-
32
Alguns dos dados foram retirados do seguinte endereço do sitío da Receita Federal na
Internet:http://www.receita.fazenda.gov.br/Historico/EstTributarios/ConsolDeclIrpf2001/ConsolidaPF2001.pdf
55
Por sua vez, os dados constantes da tabela a seguir descrevem de forma
mais analítica os dados do IRPF 2001, privilegiando a distribuição dos rendimentos
por faixa. Cabe ressaltar das informações constantes da tabela 3 que do total de
contribuintes no exercício de 2000, aproximadamente 61% ganham até 5 saláriosmínimos por mês (R$ 15 mil por ano), 84% percebem até 10 salários mínimos por
mês (R$ 30 mil por ano) e apenas 7,2% recebem mais do que de R$ 4.080,00 por
mês (R$ 50.000 por ano).
Ademais, verifica-se que uma alíquota sobre grandes fortunas – rendimentos
anuais superiores a R$ 1 milhão – abrangeria apenas 1.521 contribuintes, que
representa o insignificante percentual de 0,011% do total de contribuintes no
exercício de 2000. Tendo em vista o pequeno número de agentes acima dessa faixa
renda, a teoria nos diz que os desincentivos (ineficiências) gerados, ao se aplicar
uma alíquota mais agresssiva sobre os contribuintes acima dessa faixa de R$ 1
milhão, seriam muitos maiores do que as eventuais receitas adicionais conquistadas.
Tabela 3 - Resumo sintético dos dados da DIRPF 2001
Faixa em
SM
Valor
aproximado
em R$
mil/ano
Total de
contribuintes
que ganham até
a faixa (A)
Total de
contribuintes que
ganham acima da
faixa (B)
%
(A)
%
(B)
Até 1 SM
Até 3 SM
Até 5 SM
Até 9 SM
Até 10 SM
Até 17 SM
Até 26 SM
Até 35 SM
Até 42 SM
Até 87 SM
Até 174 SM
Até 347 SM
Até 1.736 SM
Até 3.472 SM
3.000
9.000
15.000
25.000
30.000
50.000
75.000
100.000
120.000
250.000
500.000
1.000.000
5.000.000
10.000.000
1.959.745
3.881.954
8.479.976
10.074.643
11.675.160
12.898.667
13.438.506
13.662.144
13.768.287
13.884.122
13.900.902
13.904.642
13.906.075
13.906.129
11.946.400
10.024.191
5.426.169
3.831.502
2.230.985
1.007.478
467.639
244.001
137.858
22.023
5.243
1.521
70
16
14,093
27,915
60,980
72,447
83,957
92,755
96,637
98,245
99,009
99,842
99,962
99,989
99,999
100,000
85,907
72,085
39,020
27,553
16,043
7,245
3,363
1,755
0,991
0,158
0,038
0,011
0,001
0,000
56
Seguindo os preceito do modelo clássico, podemos inferir que a melhor faixa
para se aplicar um aumento na alíquota marginal seria sobre aquelas acima de 9
sálarios-mínimos, ou seja, rendimentos acima de R$ 25 mil/ano (próximo do
rendimento tributável médio), pois as obrigações tributárias adicionais recairiam
sobre as costas daqueles, aproximadamente 3,8 milhões de contribuintes, para
quem o custo social não é tão elevado e proporciona ainda um incremento
expressivo nas receitas.
4.2.2 O quociente zm/z*
Em primeiro lugar, é importante examinar a razão zm/z*, utilizando a
distribuição empírica de rendimentos tributáveis relativa ao IRPF/2001 - Ano Base
2000. Os gráficos 5, 6 e 7 plotam os valores da razão zm/z* comparando-a com a
faixa acumulada de rendimento tributável das declarações dos contribuintes, dado
esses retirados do IRPF 2001, relativo ao exercício fiscal de 2000.
Gráfico 1
Rendim ento Tributável Médio acim a de z* dividida por z*
Ano 2000
10,0
9,0
Coeficiente zm/z
8,0
7,0
6,0
5,0
4,0
3,0
2,0
1,0
1
5,00
10,00
15,00
20,00
75,00
250,00
1.000,00
Rendim ento Tributável z* em R$ m il
57
Gráfico 2
Quocie nte zm/z*, z* e ntre R$ 0 e R$ 40 mil/ano
Ano 2000
Coeficiente zm/z*
11
9
7
5
3
1
0
2,00
5,00
8,00
11,00
14,00
17,00
20,00
40,00
Rendimento tributável z*
Gráfico 3
Quociente zm/z*, entre R$ 13 mil e R$ 10 milhões
Ano 2000
Coeficiente zm/z*
3,00
2,00
1,00
13,00
18,00
40,00
150,00
500,00
7.500,00
Rendimento Tributável z*
58
Os três gráficos mostram as razões zm/z* como função de z* para
rendimentos anuais entre R$ 0 e R$ 10 milhões; entre R$ 0 e R$ 40 mil; e entre R$
13 mil e R$ 10 milhões, respectivamente. De fato, esses três gráficos mostram que a
razão parece se estabilizar precocemente a partir de rendimentos acima de R$ 13
mil/ano, em torno de valores entre 2,5 e 2. Entretanto, verificamos uma redução em
relação ao parâmetro 2, mergulhando para valores em torno de 1,7, entre os
rendimentos anuais acima de R$ 50 mil até acima de R$ 150 mil, voltando a subir
em seguida para valores próximos de 2 entre rendimentos anuais acima de R$ 200
mil até R$ 1 milhão, declinando em seguida e estabilizando em torno de 1,64 para
rendimentos superiores a R$ 7,5 milhões.
Analiticamente vimos que o valor para a faixa mais elevada de rendimentos
deveria ser 1, porém o gráfico 3 demonstra que mesmo para rendas anuais de mais
de R$ 10 milhões, esse valor (1,64) é mais próximo de 2 do que do valor esperado.
Logo, deduzimos que o quociente zm/z* somente deve alcançar valores próximos de
um nas proximidades daquele
contribuinte com o rendimento mais elevado na
distribuição. Conseqüentemente, como Tuomala afirmou, o resultado de alíquota
marginal zero apenas se aplica para o contribuinte com o rendimento mais elevado
e, portanto, não é de interesse prático.
4.2.3 Resultados empíricos para o Brasil (2000)
A partir da hipótese de que a razão zm/z* converge para o limite de uma
distribuição paretiana (a/(a-1)), então a fórmula da alíquota marginal ótima sobre
grandes fortunas é dada, como vimos no capítulo anterior, pela seguinte expressão:
τ=
1− g *
1 − g * + ζ NC + ζ C (a − 1)
(41)
59
A partir dessa expressão, construímos as tabelas a seguir que mostram as
alíquotas ótimas sobre “grandes fortunas” (assintóticas) para um espectro de valores
realísticos do parâmetro paretiano a da distribuição de rendimento empírica para o
exercício de 2001, das elasticidades e para diversos valores de g*. Cabe recordar
que g* representa a razão entre a utilidade marginal social da renda dos
contribuintes que se situam nas faixas mais elevadas de renda e o valor marginal
dos fundos públicos, ou seja, quanto menor g* menor será a importância dada pelo
governo ao consumo marginal daquele com maiores rendimentos. Além disso, a
alíquota τ, calculada pela equação acima, foi reduzida em virtude da incidência de
impostos distorcidos indiretos relativos ao consumo com alíquota média33 t = 17%,
da seguinte forma:
τótima = τ.(1 − t ) ⇔ τótima = 0,83 τ
(42)
A Tabela 4, em suas três vertentes, mostram que as alíquotas ótimas
são decrescentes em relação às elasticidades compensadas e compensadas e ao
parâmetro g*, com valores médios em torno de 37,5%, considerando as três
preferências distributivas do governo em relação ao consumo dos mais ricos e
elasticidades de 0,5. Essa alíquota ótima média é superior em dez pontos
percentuais a maior alíquota existente no atual desenho tributário nacional (27,5%).
Além disso, o valor do coeficiente zm/z* apresenta uma oscilação entre as faixas de
maior renda, sendo que ela é mais acentuada na faixa entre R$ 200 mil e R$ 1
milhão/ano, em torno de 2,08, próximo ao valor norte-americano (2).
Por fim, verificarmos que para termos alíquotas marginais ótimas em torno de
25% e 27,5%, mantendo constante as elasticidades e o parâmetro paretiano, a,
33
A hipótese aqui foi considerar a alíquota usual das operações internas do ICMS.
60
assumindo o valor médio de 2,13, seria necessário que o governo tivesse um g* em
torno de 0,60 e 0,65, respectivamente. Isso significa que o governo brasileiro, ao
praticar alíquotas assintóticas de 25% e 27,5% e caso desejasse que elas fossem
ótimas, estaria preocupada com o consumo das classes mais abastadas de maneira
extremamente generosa, o que absolutamente não seria uma política responsável
num um país que possui uma grave e persistente desigualdade de renda.
Tabela 4 - Alíquotas Ótimas para o ano de 2000
g*=0
Rendimento
zm/z*
a
(em R$ mil)
ζNC=0,2
ζNC=0,5
ζC=0,2
ζC=0,5
ζC=0,2
ζC=0,5
30-50
1,97
2,03
0,59
0,48
0,49
0,41
75-150
1,74
2,35
0,56
0,44
0,47
0,38
200-1.000
2,08
1,92
0,60
0,50
0,49
0,42
2.500-10.000
1,74
2,36
0,56
0,44
0,47
0,38
Média simples
1,88
2,13
0,58
0,47
0,48
0,40
g*=0,10
Rendimento
zm/z*
a
(em R$ mil)
ζNC=0,2
ζNC=0,5
ζC=0,2
ζC=0,5
ζC=0,2
ζC=0,5
30-50
1,97
2,03
0,57
0,46
0,46
0,39
75-150
1,74
2,35
0,55
0,42
0,45
0,36
200-1.000
2,08
1,92
0,58
0,48
0,47
0,40
2.500-10.000
1,74
2,36
0,54
0,42
0,45
0,36
Média simples
1,88
2,13
0,56
0,45
0,46
0,38
g*=0,25
Rendimento
zm/z*
a
(em R$ mil)
ζNC=0,2
ζNC=0,5
ζC=0,2
ζC=0,5
ζC=0,2
ζC=0,5
30-50
1,97
2,03
0,54
0,42
0,43
0,35
75-150
1,74
2,35
0,51
0,38
0,41
0,32
200-1.000
2,08
1,92
0,55
0,44
0,43
0,36
2.500-10.000
1,74
2,36
0,51
0,38
0,41
0,32
Média simples
1,88
2,13
0,53
0,41
0,42
0,34
Média Geral
0,373
61
4.2 Conclusão
A resposta da pergunta elaborada no capítulo inicial deste trabalho é que as
alíquotas marginais assintóticas praticadas pelo país nos últimos anos não foram e
não são ótimas, de acordo com os resultados encontrados para o ano de 2000. Na
realidade, as alíquotas ótimas deveriam estar em patamar mais elevado, acima de
30%, desde que as elasticidades estimadas estejam corretas, a distribuição empírica
de rendimentos tenha a forma apresentada para o exercício de 2000, e as
preferências distributivas do governo sejam ainda confortavelmente favoráveis aos
ricos (g*=0,25). Cabe destacar que a média geral simples dos casos apresentados
na tabela 4 aponta para uma alíquota assintótica ótima de 37,3%.
Cabe destacar, por último, que os números encontrados por Saez (2001) para
as alíquotas assintóticas ótimas, não levando em conta os impostos indiretos, são
próximos aos encontrados neste estudo. Para o caso em que g*=0 e as
elasticidades sejam iguais a 0,5, a alíquota ótima para Saez foi de 50% (a=2),
enquanto para o Brasil, nessas mesmas condições, o valor encontrado foi de
aproximadamente 46% (a=2,13), embora a estabilidade da curva zm/z* versus z*
americana seja mais consistente.
62
5. Conclusão
“...The results seem to say that, in a economy where there is
more intrinsic inequality in economic skill, the income tax is
more important weapon of public control than it is in a
economy where the dispersion of innate skill is less. The
reason is, presumably, that the labour-discouraging effects of
the tax are more important, relative to the redistributive
benefits, in the latter case”.34
Os objetivos do trabalho foram apresentar uma revisão da literatura sobre
tributação ótima da renda, desenvolver os modelos clássico e de perturbação
(elasticidades) da tributação ótima da renda e realizar simulações numéricas para o
caso da alíquota ótima assintótica - alíquota sobre grandes fortunas - constante do
modelo das elasticidades.
Neste sentido, o capítulo dois tratou da revisão da literatura existente sobre a
tributação ótima da renda e derivar analiticamente o modelo clássico. O modelo
clássico da tributação ótima não-linear da renda, como vimos, tem como foco a
seleção do melhor desenho tributário para a tributação da renda, balanceando as
perdas decorrentes do decréscimo da eficiência contra os ganhos devidos a uma
distribuição da renda pós-tributo mais igualitária (Feldstein, 1975).
Em virtude de que os resultados analíticos do modelo tradicional são de
pouca valia, limitando sua utilização como instrumento de política tributária e fiscal,
foram realizadas simulações numéricas com esse modelo que mostraram
34
J. A. MIRRLEES, An Exploration in the Theory of Optimum Income Taxation, Review of Economic
Studies, 38 (1971), p. 207.
63
inicialmente que o desenho tributário ótimo seria algo linear e teria alíquotas
marginais ligeiramente declinantes ao longo da distribuição de renda, contrariando a
política de alíquotas marginais progressivas não lineares aplicadas pela maioria dos
governos.
Porém, ao longo do tempo, os estudos na literatura trabalhos vêm mostrando
que sob determinadas formas da função de distribuição de habilidades (renda),
vinculadas também ao grau de desigualdade da renda, da função utilidade e de
valores das elasticidades é perfeitamente possível o emprego de desenhos
progressivo, ou seja, a teoria começa a evidenciar a realidade das políticas de
tributação ótima praticadas pelos governantes.
O terceiro capítulo, desenvolveu o modelo de perturbação a partir de sua
vertente da tributação linear da renda para o cálculo da alíquota ótima sobre grandes
fortunas. Com efeito, a utilização das elasticidades para desenvolver a alíquota
ótima para o imposto de renda é um método promissor, em virtude de três pontos.
Em primeiro lugar, é muito direto e simples a obtenção da equação para a tributação
ótima para rendas elevadas, permitido que essa alíquota possa anualmente ser
ajustada a partir dos parâmetros chaves: distribuição empírica dos rendimentos do
IRPF, elasticidade compensada e não compensada da oferta de trabalho, ζC e ζNC,
e do gosto do governo, g*, em relação ao bem estar dos mais ricos. Em segundo
lugar, o método da elasticidade ou perturbação de Saez tem a vantagem de mostrar
precisamente como os diferentes efeitos econômicos entrem em jogo e quais são os
parâmetros relevantes para a tributação ótima.
Finalmente, as
simulações
numéricas podem ser realizadas e calibradas utilizando a distribuição empírica de
64
rendimentos, pois as fórmulas da tributação ótima são expressas em termos de
parâmetros que podem ser observados ou estimados.
O quarto capítulo, tratou de realizar as simulações numéricas (calibragens)
pretendidas. Com efeito, as simulações numéricas para a alíquota ótima sobre
grandes fortunas, mostraram que o seu menor valor (38%; 36% e 32%) e seu
valor médio de 37,3% (40%, 38% e 34%), em qualquer das hipóteses
levantadas, são maiores do que o valor hoje praticado, 27,5%, como também
daquele inicialmente estabelecido em 1995, 25%. Logo, a pergunta constante
do intróito pode ser respondida: as alíquotas de 25% e 27,5% talvez não
fossem ótimas, quando se leva em conta a distribuição de rendimentos de
2000, porém eram convenientes e oportunas para o embate, à época e ainda
hoje, entre oposição e situação, atualmente em campos opostos.
De fato, usando o valor da elasticidade igual a 0,5, encontrado na literatura
empírica internacional, sendo a distribuição de rendimentos de formato paretiano
(zm/z*=a=2), o governo indiferente ao bem-estar social dos ricos e sem efeito renda,
a fórmula para a alíquota ótima assintótica (equações 41 e 42 do capítulo anterior)
sugere que a alíquota marginal sobre a renda do trabalho deveria ser em torno de
41,5% no caso brasileiro (t=17%).
Isso significa que poderíamos aplicar essa
alíquota a partir da faixa de rendimento igual ou superior a R$ 30 mil reais/ano, ou
seja, R$ 2,5 mil por mês, tomando como base o IRPF/2001 ano base 2000.
Entretanto, não se pode esquecer que o eventual aumento na alíquota assintótica
ótima para 41,5% teria uma repercussão negativa junto à opinião pública. Isso se
deve ao elevado nível de carga tributária em relação ao PIB - 33,84% em 2001
65
(dado da SRF), 35,86% em 2002 (dado da SRF), 36,11% (estimativa do Instituto
Brasileiro de Planejamento Tributário - IBPT) em 2003 e 38,11% (estimativa do IBPT) em
2004 -,
e a insatisfação da sociedade com a pouca eficiência no gasto público.
Ressalte-se, por oportuno, que caso a reforma tributária em curso promova a
unificação do ICMS com uma alíquota máxima (usual) em torno de t=12% - 30% de
ganho de eficiência sobre a alíquota usual de 17% -, obrigaria o Governo Federal a
aumentar ainda mais a alíquota assintótica ótima: passaria dos 41,5% para em torno
de 44%.
Os resultados apresentados neste trabalho mostram a influência central dos
parâmetros básicos: elasticidades, objetivo redistributivo do governo e a distribuição
empírica dos rendimentos tributáveis, no cálculo da alíquota marginal assintótica
ótima. Assim sendo, seria muito importante o desenvolvimento de estudos com
vistas a estabelecer valores paramétricos mais específicos e robustos para a
realidade brasileira, o que certamente tornaria os resultados mais consistentes e
realistas. Logo, muito esforço e pesquisa devem ser empreendidos no sentido de
determinar os valores desses parâmetros para o Brasil.
Cabe ressaltar que as condições da economia estabelecidas nos modelos são
altamente estilizadas, embora elas tragam benefícios analíticos compensadores,
como demonstrado nos capítulos dois e três, porém deixam de fora alguns aspectos
importantes que são de interesse prático. Por exemplo, a hipótese de que a
economia só tenha uma única forma de trabalho com diferenças na habilidade das
trabalhadoras na performance do trabalho, não é compatível com a realidade de que
66
há muitas outras formas de trabalho na economia que requerem diferentes
habilidades e condições de trabalho. Ademais, o pagamento monetário para a oferta
de trabalho pode ser somente uma parte do pacote de remuneração, pelo menos
daqueles que recebem rendas mais elevadas. No Brasil, começa a crescer o número
de executivos, gerentes e especialistas que deixam de ser assalariados nas
empresas, passando a ser uma pessoa jurídica prestadora do mesmo serviço a suas
empresas, com o objetivo de permitir que o empregador reduza seus encargos
trabalhistas e que o empregado pague menos imposto de renda: ao se tornar pessoa
jurídica, o profissional fica sujeita a uma
alíquota
menor.
Nesse sentido, um
aumento no imposto de renda será mais sentido pelos assalariados que possuem
remuneração basicamente monetária, do que os que recebem pacotes de
remuneração, em que a pecúnia é somente uma parte dos benefícios
que
percebem.
De outra sorte, existem também aspectos intertemporais que influenciam a
decisão sobre oferta de trabalho, tais como o momento de entrada na força de
trabalho e de solicitação da aposentadoria. Em vista que um imposto de renda irá
introduzir distorções nessas decisões, ele aumenta o potencial de perdas de
eficiência. Por outro lado, existem outras extensões do modelo clássico, tais como a
introdução da incerteza na renda, escolha educacional e interdependência da
utilidade ou efeitos externos, que eventualmente tornam o problema clássico mais
complexo. Entretanto, para os temas da incerteza da renda (desigualdades da renda
produzidas somente pela sorte ou pela sorte e habilidade) e dos efeitos externos
(existência de altruísmo e inveja) nota-se, de acordo com Tuomala35, que as
simulações numéricas definem um desenho ótimo progressivo para as alíquotas
67
marginais em quase toda a extensão da distribuição de rendimentos, contrariando o
resultado padrão do modelo de Mirrlees.
Por último, gostaríamos de ressaltar que a presente investigação resultou
pelo menos em um instrumento adicional para o calculo rápido e simples da alíquota
marginal assintótica ótima do imposto de renda. Os governantes, portanto, podem
dispor desse mecanismo para atacar o que o economista Marcelo Neri36 chama de
inércia da desigualdade da renda, desde que, ceteribus paribus, não se perca de
vista a intuição do homem simples da rua, conforme disse Joseph Pechman em
trecho de discurso transcrito na introdução de nosso trabalho: “...Eu acredito que a
cidadã nas ruas está certa e que nós deveríamos continuar a confiar no tributo sobre
a renda para aumentar a receita de uma maneira eqüitativa.”
35
Matti TUOMALA, Optimal Income Tax and Redistribution, p.14:19.
Prado, Maria C. R. M. Ataque à inércia da desigualdade. GAZETA MERCANTIL. São Paulo-SP, 3
de outubro de 2002. Opinião, A-3.
36
68
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72
Apêndice
1. A solução do problema individual do agente no Modelo Clássico
max u(c,y) sujeito à c=z-τ(z), z=wy
O lagrangeano para a solução do problema é dado por :
L(c, y , λ ) = u(c, y ) − λ( z − τ( z ) − c )
∂L
∂L
∂c
= uc + λ = 0 ⇒ uc = −λ
∂y
= u y − λ(w −
(43)
∂τ( z )
) = 0 ⇒ u y − λ(w − τ' ( z ).w ) = 0 ⇒ u y − λw (1 − τ' ( z )) = 0
∂y
(44)
⇒ u y − λwc z
dado que:
∂τ(z)/∂y = [∂τ(z)/∂z].∂z/∂y = τ‘(z).w e c=z-τ(z) ⇒ ∂c/∂z = cz = 1-τ‘(z)
( 43) → ( 44) : u y + u c wc z = 0
⇒ cz = −
uy
ucw
⇒ cz = −
(45)
uz
uc
(46)
pois ∂u(c,y)/∂z= ∂u/∂y.∂y/∂z ⇒ uz=uy/w
2. A solução do Princípio de Máximo
O Lagrangeano para a solução do problema é dado por :
⎧
⎫
⎡ dx (w )
⎤
L( x, u, λ, α ) = ⎨F ( x (w ), u(w ), w ) − α(w )⎢
− Q( x(w ), u )w ), w )⎥ − λ[G( x(w ), u(w ), w )]⎬dw
⎣ dw
⎦
⎩
⎭
∫
L( x, u, λ, α ) =
⎧
∫ ⎨⎩F ( x(w ), u(w ), w ) + α(w )Q( x(w ), u )w ), w ) + x(w )
dα(w )
⎫
− λ[G( x (w ), u(w ), w )]⎬dw
dw
⎭
(47)
+ α(w 0 )x (w 0 ) − α(w 1 )x(w 1 )
73
Integrando por parte temos que: u=α(w) e dv=d(x(w)/dw)dw ⇒ − ∫udv = - uv + ∫vdu ⇒
− ∫α(w)d(x(w)/dw)dw = - α(w)x(w)⎢w0w1 + ∫x(w)d(α(w)/dw)dw ⇒ ∫x(w)d(α(w)/dw)dw +
α(w0)x(w0) - α(w1)x(w1)
∂L
≡ Fu ( x(w ), u(w ), w ) + α(w )Qu ( x(w ), u(w ), w ) − λGu ( x (w ), u(w ), w ) = 0
∂u
(48)
dα(w )
∂L
≡ Fx ( x(w ), u(w ), w ) + α(w )Qx ( x (w ), u(w ), w ) +
− λGx ( x(w ), u(w ), w ) = 0
dw
∂x
(49)
ou
dα(w )
= −[Fx ( x (w ), u(w ), w ) + α(w )Qx ( x (w ), u(w ), w ) − λGx ( x(w ), u(w ), w )]
dw
(50)
Essas condições de primeira ordem podem ser escritas de uma forma mais
compacta, a partir da definição de uma nova função H, chamada de Hamiltoniano,
descrito por:
H ( x, u, α, w ) = F ( x (w ), u(w ), w ) + α(w )Q( x(w ), u(w ), w )
(51)
Então, a condição (48) sustenta que a variável de contole u(w) para uma
determinada habilidade w deveria ser escolhida para maximizar H(x,u,α,w), sujeita a
restrição (18). Portanto, podemos escrever H*(x,u,α,w) como sendo o valor máximo
resultante.
Definindo o Lagrangeano L* para essa determinada habilidade w, evitando-se
confundir com o lagrangeano L elaborado para o problema geral, que engloba todo o
espectro de habilidades e não somente para uma dada habilidade, como:
L* = H ( x, u, α, w ) − λG( x(w , u(w ), w )
(52)
Logo, podemos reescrever (51) de uma maneira mais simples, ou seja:
dα(w )
= L x * ( x, u, α, w )
dw
(53)
Num problema de maximização estática, somente u(w) seria a variável de escolha,
enquanto x(w) e α((w) seriam considerados parâmetros. Portanto, podemos aplicar
74
o teorema do envelope (que afirma que o efeito total no valor otimizado da função
objetiva quando um parâmetro muda - portanto, o problema geral deveria ser
otimizado novamente -, em princípio pode ser deduzido simplesmente tomando a
derivada parcial do Langrangeano original em relação ao parâmetro e avaliar o
resultado nas condições de primeira ordem do problema original), transformando
(53) na seguinte expressão:
dα(w )
= −H x * ( x, α, w )
dw
(54)
Além disso, o teorema do envelope também nos permite dizer que H*u = L*u = Q,
quando avaliadas no ótimo. Assim sendo, podemos escrever (17) numa forma
simétrica a (51):
dx (w )
= −Hα * = ( x, α, w )
dw
(55)
3. A solução do problema da Tributação Ótima da Renda no Modelo Clássico
Construímos o Langrajeano L da seguinte forma:
⎧
⎫
⎡ du
⎤
L(u, z, α, λ ) = ⎨W (u )fw + α(w )⎢
− g (u, z )⎥ + λ[z(w ) − h(u, z )]f (w )⎬dw
⎣ dw
⎦
⎩
⎭
∫
(56)
Integrando por partes a componente do Lagranjeano que contém α(w).du/dw,
obtemos:
du
du
du
∫ α(w ) dw ⇔ u = α(w );dv = dw ⇔ ∫ udv = uv − ∫ vdu ⇔ ∫ α(w ) dw = α(w )u(w ) − ∫ u
dα(w )
dw
Então, temos:
dα(w )
⎧
⎫
− α(w )g (u, z ) + λ[z(w ) − h(u, z )]f (w )⎬dw + α(w ^ )u(w ^ ) − α(w _)u(w _)
L(u, z, α, λ ) = ⎨W (u )fw − u(w )
dw
⎩
⎭
∫
(57)
e o Hamiltoniano dado por:
75
H (u, z, α, λ ) =
∫ {W (u )fw − α(w )g (u, z) + λ[z(w ) − h(u, z)]f (w )}dw
dα(w )
∂L
dα(w )
= Hu −
= W u f (w ) − α(w )g u − λhu f (w ) −
=0
dw
∂u
dw
(58)
(20) → (58):
−
dα(w ) α(w )uwc ⎡
λ⎤
−
+ ⎢Wu − ⎥f (w ) = 0
dw
uc
uc ⎦
⎣
∂L
= Hz = −α(w )g z + λ(1 − hz )f (w ) = 0
∂z
(59)
(60)
(20) → (59):
α(w )u c Φ w + λ[1 − Φ ]f (w ) = 0
(61)
4. Derivação de uma expressão para ψ e para a equação (29), quando a função
utilidade é quase linear e descrita por: u(c,y) = c + υ(1-y), em que υ é uma função
estritamente côncava – Modelo Clássico
Com efeito, sendo y=z/w, então ∂y/∂w = - z/w2 = -y/w, então teremos:
u c = 1; u cw = 0; u y = −υ' (1 − y ); u yw =
∂u y ∂y
y
.
= −υ' ' (1 − y )
∂y ∂w
w
y
y
− υ' ' (1 − y )
υ' ' (1 − y )
u yw
u cw
Φ w .w
w
w
ψ=−
= −w .
+ 1 + w.
= −w .
+ 1⇒ ψ = −
+ 1⇒
uy
Φ
uc
− υ' (1 − y )
υ(1 − y )
ψ=
(62)
1
+1
ε
A expressão (22) pode ser reescrita da seguinte forma:
⎡
u
dα(w )
λ ⎤
= −α(w ). cw + ⎢Wu −
⎥f (w )
dw
uc
uc ⎦
⎣
(63)
Multiplicando ambos os lados da expressão (61) por -uc/λ e recordando que para
uma função quase linear ucw = 0 e uc=1, obtemos:
76
dα(w ) 1 ⎡ Wu (w ) ⎤
+ 1⎥f (w )
. = −
λ
dw λ ⎢⎣
⎦
(64)
Integrando ambos os lados da equação acima e impondo a condição de
transversalidade (α→ 0 quando w →∞) ), então:
∞
∞
α(w )
⎡ W (w ) ⎤
⎡ W (w ) ⎤
= ⎢1 − u
f (w )d (w ) = [1 − F (w )] − ⎢ u
⎥
⎥f (w )dw
λ
λ ⎦
⎣
⎣ λ ⎦
w
w
∫
∫
(65)
Em que F(.) é a função acumulada de densidade, tendo como base f(.).
5. A solução do problema individual do agente no Modelo de Saez (2000)
O lagranjeano para a solução do problema é dado por :
L(c, z, λ ) = u (c, z ) − λ[z(1 − τ) + R − c ]
∂L ∂c = u c + λ = 0 ⇒ u c = −λ
(66)
∂L ∂c = u z − λ(1 − τ) = 0
(67)
(1) → (2) : u z + (1 − τ)u c
(68)
=0
Por outro lado, se formularmos o problema dual, ou seja, minimizar a função gasto
e(1-τ,u*) da contribuinte teremos:
min c-z(1-τ) sujeito à u(c,z)=u*,
em que τ é alíquota tributária marginal e u* é o nível de utilidade que minimiza o
gasto do contribuinte.
O lagranjeano para a solução do problema é dado por :
L(c,z,λ) = c-z(1-τ) - λ[u*- u(c,z)]
∂L/∂c=
1
+
λuc
=
0
⇒
uc
=
-
1/λ
(69)
77
∂L/∂z= -(1-τ) + λuz=0 ⇒
uz = (-τ)/λ
(70)
(67) / (66) : uz /uc = - (1−τ)
(71)
Com efeito, partirmos de Teorema da Teoria do Consumidor que estabelece a
seguinte relação entre a demanda hicksiana e a demanda marshaliana:
zh(1-τ,u*) = z[(1-τ),e(1-τ,u*)]
(72)
Diferenciando (72) em relação a (1-τ) temos:
∂zh(1-τ,u*)/∂(1-τ)
=
∂z[(1-τ),e(1-τ,u*)]/∂(1-τ)
+
∂z[(1-τ),e(1-τ,u*)]/∂e(1-τ,u*).∂e(1-
τ,u*)/∂(1-τ)
(73)
Além disso, utilizando o teorema que nos diz que e(1-τ,u*) = R, o lema de Shephard
que estabelece que ∂e(1-τ,u*)/∂(1-τ) = - zh(1-τ,u*) e sendo e = c-z(1-τ), então ∂e/∂(1-τ) =
-z, a expressão (73) pode ser descrita da seguinte forma:
∂zh(1-τ,u*)/∂(1-τ)
=
∂z[(1-τ),R]/∂(1-τ)
∂z[(1-τ),R]/∂R.zh(1-τ,u*)
-
(74)
Aplicando (72) em (74), obtemos:
∂zh(1-τ,u*)/∂(1-τ)
=
∂z[(1-τ),R]/∂(1-τ)
-
∂z[(1-τ),R]/∂R.z(1-τ,R)
(75)
Rearranjando (75), temos:
∂z[(1-τ),R]/∂(1-τ)
=
∂zh(1-τ,u*)/∂(1-τ)
+
z(1-τ,R).{∂z[(1-τ),R]/∂R}
(76)
Multiplicando os dois lados da equação (76) por (1-τ)/z(1-τ,R) e tendo em vista que:
z[(1-t),e(1-t,u*)] = z[(1-t),R]= zh(1-t,u*), temos:
∂z[(1-τ),R]/∂(1-τ).[(1-τ)/z(1-τ,R)] = ∂zh(1-τ,u*)/∂(1-τ)).[(1-τ)/zh(1-τ,u*)] + z(1-τ,R).{∂z[(1τ),R]/∂R}).[(1-τ)/z(1-τ,R)]
(77)
E, portanto:
78
ζNC
ζC
=
+
η ⇒ ζC
ζNC
=
η
-
(78)
sendo que:
ζNC
[∂z(1-τ,R)/∂(1-τ)].[(1-τ)/z(1-τ,R)])] =
=
[∂z/∂(1-τ)].[(1-τ)/z]
(79)
ζC
[∂z(1-τ,R)/∂(1-τ)].[(1-τ)/z(1-τ,R)] ⎢u =
=
[∂z/∂(1-τ)].[(1-τ)/z]
⎢u
(80)
η
=
{∂z[(1-τ),R]/∂R}).(1-τ)
(∂z/∂R).(1-τ)
=
(81)
6. Resposta comportamental no Modelo de Saez (2000)
Uma variação infinitesimal dz nos rendimentos z(1-τ ,R) de uma contribuinte
individual é descrita por:
dz
=
-
[∂z/∂(1-τ )]dτ
+
(∂z/∂R)dR
(82)
Multiplicando ambos lados por (1-τ)/z, teremos:
(1-τ)/z.dz
=
-
(1-τ)/z.[∂z/∂(1-τ )]dτ
+
(1-τ)/z.(∂z/∂R)dR
(83)
(79) e (81) → (83) : (1-τ)/z.dz = - ζNCdτ + η/z.dR
(84)
Sendo dR=z*dτ, então (84) toma seguinte forma:
dz
=
(-
ζNCdτ + η/z.z*dτ)z/(1-τ)
⇒
dz
=
-
(ζNCz − ηz*)dτ/(1-τ)
(85)
Tendo em vista que η é sempre não positivo e ζC não negativo, em razão de que o
lazer não é considerado um bem inferior, então a variação dz da expressão (75) é
79
negativa, desde que garantido que ζC≥0, η≤0 e ζC≥ η, então ζNC≥0, o que significa uma
redução nas receitas tributárias de τdz.
Nesse sentido, a redução total, B, das receitas tributárias devida ao efeito
comportamental será a soma dos termos τdz sobre todos as contribuintes com
rendimentos superiores que z*, logo:
B
=
-
(ζ*NCzm − η*z*)τdτ/(1-τ)
(86)
em que:
∞
ζ * NC =
∫
ζ NC zh( z )
z*
dz
e η* =
zm
∞
∫ ηh(z)dz
z*
Cabe ressaltar que h(z) é a densidade da distribuição de rendimentos no
regime tributário ótimo, sendo que a população com rendimento superior a z* é
normalizada sem perda de generalizada, e que
ela é endógena ao desenho
tributário. Além disso, ζ*NC é a elasticidade não compensada média ponderada,
sendo que a elasticidade ζNC(z) no interior da integral é a elasticidade média dos
contribuintes com rendimento z. Por outro lado, η* é o efeito renda médio. Saez
(2000) afirma que os pesos estabelecidos para os parâmetros ζNC e η são diferentes,
pois ele assume que os contribuintes de mesmo rendimento não precisam ter a
mesma elasticidade, o que é relevante nos parâmetros são as elasticidades médias
em determinados níveis de rendimento. Ademais, esse mesmo autor assume que o
conjunto de contribuintes que porventura passam a contribuir descontinuamente
mais, em razão do aumento infinitesimal na alíquota tributária, é desprezível.
7. Dedução da expressão (39) a partir da equação (38), utilizando o parâmetro de
Pareto a
τ/(1-τ)
=
1)]/[(ζ*NCzm/z* − η*)]
[(1-g*)(zm/z*
-
(38)
τ/(1-τ) = (1-g*)[a/(a-1) - 1]/[ζ*NC .a/(a-1) − ζ NC+ζ C)]
80
τ/(1-τ) = (1-g*)/(a-1)/{ζ*NC .[a/(a-1) − 1]+ζ C}
τ/(1-τ) = (1-g*)/(a-1)/[ζ*NC /(a-1)+ζ C)]
τ/(1-τ) = (1-g*)/(a-1)/[ζ*NC+ζ C(a-1)]/ (a-1)
τ/(1-τ) = (1-g*)/[ζ*NC+ζ C(a-1)]
τ= (1-g*)/[ζ*NC+ζ C(a-1)] .(1-τ)
τ + {(1-g*)/[ζ*NC+ζ C(a-1)]}τ= (1-g*)/[ζ*NC+ζ C(a-1)]
τ{1+ (1-g*)/[ζ*NC+ζ C(a-1)]}= (1-g*)/[ζ*NC+ζ C(a-1)]
τ= (1-g*)/[ζ*NC+ζ C(a-1)] / {1+ (1-g*)/[ζ*NC+ζ C(a-1)]}
τ= (1-g*)/[ζ*NC+ζ C(a-1)] / {[ζ*NC+ζ C(a-1)]+ (1-g*)]}/[ζ*NC+ζ C(a-1)]
τ *= (1-g*) / [ζ*NC+ζ C(a-1)+ (1-g*)]
(39)
81
ANEXO
DADOS DIRPF 2001
Faixa de Renda Anual
Tributável (em R$/ano)
Total (Acima de R$ 0,00)
Acima de R$ 1,00
Acima de R$ 1.000,00
Acima de R$ 2.000,00
Acima de R$ 3.000,00
Acima de R$ 4.000,00
Acima de R$ 5.000,00
Acima de R$ 6.000,00
Acima de R$ 7.000,00
Acima de R$ 8.000,00
Acima de R$ 9.000,00
Acima de R$ 10.000,00
Acima de R$ 11.000,00
Acima de R$ 12.000,00
Acima de R$ 13.000,00
Acima de R$ 14.000,00
Acima de R$ 15.000,00
Acima de R$ 16.000,00
Acima de R$ 17.000,00
Acima de R$ 18.000,00
Acima de R$ 19.000,00
Acima de R$ 20.000,00
Acima de R$ 25.000,00
Acima de R$ 30.000,00
Acima de R$ 40.000,00
Acima de R$ 50.000,00
Acima de R$ 75.000,00
Acima de R$ 100.000,00
Acima de R$ 125.000,00
Acima de R$ 150.000,00
Acima de R$ 200.000,00
Acima de R$ 250.000,00
Acima de R$ 300.000,00
Acima de R$ 400.000,00
Acima de R$ 500.000,00
Acima de R$ 750.000,00
Acima de R$ 1.000.000,00
Acima de R$ 2.500.000,00
Acima de R$ 5.000.000,00
Acima de R$ 7.500.000,00
Acima de R$ 10.000.000,00
No.de
Valor Total da Renda Renda Média
Declarações Tributável por Faixa Tributável por
de Renda (R$
Faixa (R$ Mil)
Milhões)
13.906.144
12.983.409
12.794.183
12.189.154
11.946.400
11.650.440
11.375.645
11.038.322
10.753.150
10.415.551
10.024.191
9.529.442
8.619.883
7.899.553
7.001.338
5.911.180
5.426.169
5.035.768
4.697.384
4.374.051
4.087.581
3.831.501
2.867.854
2.230.985
1.453.756
1.007.478
467.639
244.001
137.858
83.599
37.957
22.023
14.510
8.022
5.243
2.560
1.521
306
70
34
16
276.112,97
276.112,97
276.025,07
274.998,16
274.380,62
273.333,46
272.076,39
270.183,58
268.320,34
265.777,52
262.427,06
257.682,72
248.047,66
239.693,66
228.393,93
213.744,65
206.712,87
200.664,91
195.083,03
189.416,47
184.117,60
179.124,35
157.631,02
140.196,50
113.370,59
93.459,58
60.816,36
41.613,60
29.829,93
22.436,03
14.680,23
11.153,32
9.108,62
6.889,06
5.653,47
4.045,77
3.147,19
1.421,80
633,77
417,08
261,73
19,85
21,26
21,57
22,56
22,96
23,46
23,91
24,47
24,95
25,51
26,17
27,04
28,77
30,34
32,62
36,15
38,09
39,84
41,53
43,30
45,04
46,75
54,96
62,84
77,98
92,76
130,04
170,54
216,38
268,37
386,75
506,43
627,74
858,77
1.078,28
1.580,37
2.069,15
4.646,40
9.053,85
12.267,05
16.358,12
82
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Modelo de Tributação Ótima da Renda