CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE – FAC CURSO DE PEDAGOGIA LÚCIA HELENA CARVALHO BARROS A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR NA FORMAÇÃO COGNITIVA E SOCIAL DE CRIANÇAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL FORTALEZA 2012 1 LÚCIA HELENA CARVALHO BARROS A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR NA FORMAÇÃO COGNITIVA E SOCIAL DE CRIANÇAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL Monografia apresentada ao Curso de Pedagogia da Faculdade Cearense – FAC, como requisito parcial para a obtenção do grau de Licenciatura em Pedagogia. Orientadora: Luiza Lúlia Feitosa Simões FORTALEZA – CEARÁ 2012 B277i Barros, Lúcia Helena Carvalho. A importância do brincar na formação cognitiva e social de crianças na educação infantil / Lúcia Helena Carvalho Barros. – 2012. 64 f. Orientador: Profª. Ms. Luiza Lúlia Feitosa Simões. Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Faculdade Cearense, Curso de Pedagogia, 2012. 1. Educação infantil. 2. Importância do brincar. 3. Educação teóricos. I. Simões, Luiza Lúlia Feitosa. II. Título. CDU 373.2.016 CDU 657.6 Bibliotecária Maria Albaniza de Oliveira CRB-3/867 CDU 347.922.6 CDU 338.48(813.1) CDU 373.2 CDU 658.15 2 LÚCIA HELENA CARVALHO BARROS A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR NA FORMAÇÃO COGNITIVA E SOCIAL DE CRIANÇAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL Monografia como pré-requisito para obtenção do título de Licenciatura em Pedagogia, outorgado pela Faculdade Cearense _ FAC, tendo sido aprovada pela banca examinadora composta pelos professores. Data da aprovação: _____/_____/_____ BANCA EXAMINADORA _________________________________________________________________ Professora Ms. Luiza Lúlia Feitosa Simões _________________________________________________________________ Professor Esp. Bruno Feitosa Policarpo ________________________________________________________________ Professora Esp. Suzanety Franco de Sá e Souza 3 Aos meus pais, Zeneide e Dionísio Barros, exemplos de bondade e pessoas responsáveis pela minha evolução na vida pessoal e acadêmica. 4 AGRADECIMENTOS A DEUS, meu querido pai eterno, que me deu força e coragem para a realização de mais uma etapa na minha vida: a acadêmica. Aos mestres da Faculdade Cearense – FAC, pelas suas valiosas contribuições na formação do ensino superior do Curso de Pedagogia. A orientadora, Luiza Lúlia Feitosa Simões, por sua paciência, incentivo e esforço concedidos para a realização desta monografia. Aos professores que fizeram parte da Banca. A minha mãe querida, Zeneide Lima de Carvalho Barros, por todo o suporte concedido para que eu conseguisse chegar até aqui. Ao meu pai, Dionísio Durval Barros (in memorian), que sempre me incentivou nos estudos e se orgulharia desse momento. As irmãs Maria de Jesus e Laura Carvalho, incentivadoras e auxiliares nas dicas para a consecução da monografia. As colegas da faculdade: Lucijane, Aline e Gláucia, pelas palavras de força, pelo auxílio nas dúvidas e pelo empréstimo de livros na elaboração desta monografia. E a todos, que contribuíram de alguma forma para que eu avançasse sempre mais, no crescimento da minha vida acadêmica. 5 ―Um homem somente brinca quando ele é humano no sentido amplo da palavra, e ele somente é humano no sentido amplo da palavra quando Schiller, 1787). ele brinca.‖ (Friederich 6 RESUMO A inserção de brincadeiras no âmbito da educação infantil vem a cada dia se tornando mais ativa devido à luta de educadores e profissionais da área que veem nos jogos e no brincar ferramentas importantes que só agregam valores. O estudo tem como objetivo geral verificar qual o papel do jogar e do brincar na formação cognitiva e social de crianças na fase escolar da educação infantil e como objetivos específicos investigar os benefícios do brincar para a construção da aprendizagem e para o desenvolvimento das inteligências múltiplas. A metodologia para realizar esse estudo teórico foi a utilização da pesquisa bibliográfica, recurso importante para a identificação do tema. Os principais teóricos utilizados foram Piaget, Vygotsky, Wallon, Kishimoto, Gardner e Antunes. Buscou-se estudos e pesquisas sobre o desenvolvimento cognitivo infantil, inteligências múltiplas e textos que tivessem como finalidade investigar os benefícios do brincar para a construção da aprendizagem e do processo cognitivo. Procurou-se também esclarecer professores acerca da importância do brincar e de desenvolver as múltiplas inteligências na formação da Educação Infantil. Conclui-se que os jogos, brinquedos e brincadeiras usados como uma ferramenta pedagógica proporciona o desenvolvimento do ensino-aprendizagem na educação infantil, que a criança no pré-escolar consegue aprender por meio de ações espontâneas e intuitivas, interagindo e envolvendo-se no jogo ou brinquedo por meio dos processos: cognitivo, afetivo e social. Conclui-se, por fim, que o jogo, em um sentido integralizado seja o meio estimulador mais eficiente para a aprendizagem e o desenvolvimento das inteligências múltiplas, pois no espaço do jogo, há a permissão para que a criança se potencialize. Palavras-chave: Brincar e Jogar. Educação Infantil. Aprendizagem. Inteligências Múltiplas. 7 ABSTRACT The insertion of plays on the scope of childhood education has becoming more active at every day due the struggle of educators and professionals which see on games and play important tools that only aggregate value. This monograph aims to verify what is the paper of play in the cognitive and social training during school early childhood education and as specific aims to investigate the benefits to play for construction of learning and for development of multiples intelligences. The methodology of this theoretical study was made by literature, important resource to identify the subject. The principal authors mentioned were Piaget,Vygotsky, Wallon, Kismoto, Gardner and Antunes. The paper was made based on studies and researches about child‘s cognitive development, multiples intelligences and texts to aims to investigate the benefits to play for building the learning and cognitive process. This study also aimed to clarify teachers about the importance to play and develop multiples intelligences in the training of childhood education. The conclusion is that games, toys and play used as a pedagogical tool provides the development of teaching-learning on childhood education when the children on kindergarten can learn through spontaneous and instintives actions, interacting and engaging on game or toys by the process: cognitive, affective and social. The final conclusion that the game, in a paid toward be the most efficient way to learning and development of multiples intelligences, because on game space, there is permission so that the children to leverage. Keywords: Play. Childhood Education Learning. Multiples Intelligences. 8 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Enfoques do brincar ........................................................................................... 15 Quadro 2 - Modalidades de brincadeiras ............................................................................. 20 Quadro 3 - Fases do desenvolvimento em Piaget ................................................................. 28 Quadro 4 - Tipologia dos Jogos ............................................................................................. 29 Quadro 5 - Estágios do desenvolvimento em Wallon ......................................................... 32 Quadro 6 - Jogos Infantis....................................................................................................... 33 Quadro 7 - Zonas do desenvolvimento em Vygotsky .......................................................... 35 Quadro 8 - Classificação dos Jogos ....................................................................................... 36 Quadro 9 - Precursores do estudo da inteligência ............................................................... 40 Quadro 10 - Inteligência: abordagens e teorias ................................................................... 43 Quadro 11 - Trajetória sequencial da criança até a vida adulta ........................................ 45 Quadro 12 - Tipologia das inteligências ............................................................................... 49 Quadro 13 - Jogos e outros estímulos para as Inteligências Múltiplas .............................. 57 9 SUMÁRIO LISTA DE QUADROS ......................................................................................................... 08 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 10 2 HISTÓRICO DO BRINCAR ............................................................................................. 12 2.1 Origem do brincar ............................................................................................................ 12 2.1.1 Conceitos: Brinquedos, jogos, brincadeiras e brincar ............................................... 14 2.2 Modalidades de brinquedos, jogos e brincadeiras ......................................................... 18 2.3 A Educação infantil - Educação básica ........................................................................ 20 2.3.1 O brincar no Referencial Curricular Infantil ............................................................. 21 3 O BRINCAR E OS TEÓRICOS DA EDUCAÇÃO ........................................................ 26 3.1 Biografia resumida de Jean Piaget ................................................................................ 26 3.1.1 A teoria de Jean Piaget ................................................................................................. 27 3.2 Biografia resumida de Henri Wallon ............................................................................ 30 3.2.1 A teoria de Henri Wallon ............................................................................................. 30 3.3 Biografia resumida de Lev Vygotsky .............................................................................. 34 3.3.1 A teoria de Lev Vygotsky ............................................................................................. 34 4 A TEORIA DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS E A RELAÇÃO COM O BRINCAR............................................................................................................................... 37 4.1 Conceitos de inteligência ................................................................................................. 37 4.2 Estudiosos precursores da inteligência .......................................................................... 39 4.3 As teorias sobre a inteligência ......................................................................................... 41 4.3.1 A teoria das inteligências múltiplas de Gardner......................................................... 43 4.3.2 Biografia resumida de Howard Gardner .................................................................. 51 4.4 As inteligências múltiplas e o brincar ............................................................................. 52 4.4.1 Jogos para estimular as inteligências múltiplas......................................................... 55 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 61 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 63 10 1 INTRODUÇÃO Brincar é uma ação lúdica, que se desenvolve de muitas formas, através de jogos, brincadeiras, momentos onde se utiliza o corpo, brinquedos ou palavras, como também a utilização das artes, pinturas, músicas, teatro. O ato de brincar pode resultar numa ação com ou sem regras. Brincar na escola significa a construção do aprendizado, principalmente na educação infantil, que tem suporte de educação básica no país e que necessita assegurar na educação infantil o brincar como forma de aprender, de obter o conhecimento e desenvolver o social e o cognitivo infantil. Os estudos para que a inserção do brincar seja considerada como tema importante no âmbito da educação infantil é deveras um tema insistente por estudiosos de áreas diversas do conhecimento e advém de longa data, como se tem observado na historiografia da educação, como se vê em Platão (420 a.C, apud FRIEDMANN, 2006, p.33): ―A importância de aprender brincando, em oposição à utilização da violência e da repressão.‖ Ou ainda, em Huizinga (1938): O jogo é uma atividade livre conscientemente tomada como não-séria e exterior a vida habitual, mas ao mesmo tempo capaz de absorver o jogador de maneira intensa e total. É uma atividade desligada de todo e qualquer interesse material com a qual não se pode obter qualquer lucro, praticada dentro de limites espaciais e temporais, próprios, segundo uma certa ordem e certas regras. Huizinga (1938 apud FRIEDMANN, 2006, p.37). Dentro desse contexto, observa-se o papel que assume ―o brincar‖ para a educação infantil e como a pertinência ao tema se desenvolve até os dias atuais, sendo o mesmo objeto de estudos, onde, a preocupação de pesquisadores debruça-se em pesquisas aprofundadas sobre o desenvolvimento infantil a partir dos jogos, brinquedos e brincadeiras, bem como no próprio ato de brincar. Refletindo acerca do exposto, emerge o interesse em pesquisar sobre o tema e a motivação para a realização do estudo se dá pela experiência e vivência profissional com crianças e do desejo de construir algo que se relacionasse com o universo infantil, como também por ter cursado disciplinas no curso de pedagogia que estimularam a curiosidade sobre o brincar como instrumento para a formação das crianças na educação infantil. São diversos os estudos sobre o brincar na formação de crianças em fase escolar, porém, mesmo com a constância destes textos o brincar ainda não é totalmente aceito pela sociedade no âmbito escolar, isto é, ainda é visto como algo não-sério, e, partindo desse 11 pressuposto, levanta-se a seguinte problemática: O brincar influencia a formação social e cognitiva das crianças na educação infantil? Para a obtenção da resposta para essa problemática, realizou-se pesquisas bibliográficas, fundamentando-se em Severino (2007, p. 122) que define pesquisa bibliográfica como: ―Pesquisa bibliográfica é aquela que se realiza a partir do registro disponível decorrentes de pesquisas anteriores em documentos impressos como livros, artigos, teses etc.‖ A busca de dados foi realizada nas bibliotecas da Faculdade Cearense - FAC, Universidade Federal do Ceará – UFC e Biblioteca Pública Governador Menezes Pimentel. Também foram realizadas buscas em artigos nos sítios eletrônicos de periódicos da educação qualificados pela CAPES. Os dados foram coletados, e após uma leitura prévia, foram fichados, analisados e sintetizados. Os principais autores que referenciaram o estudo foram Kishimoto (2008, 2005), Piaget (1978), Vigotsky (1984), Wallon (1941), Gardner (2001, 1999) e Antunes (2008, 2002, 1998) e o documento denominado Referencial Curricular Nacional Infantil – RCNEI (BRASIL, 1998). O objetivo geral da pesquisa é verificar na literatura da área qual o papel do jogar e brincar na formação cognitiva e social de crianças na fase escolar da educação infantil e, como objetivos específicos, pretende-se investigar os benefícios do brincar para a construção da aprendizagem das crianças na visão dos autores citados e analisar essa relação para o desenvolvimento das Inteligências Múltiplas. Para atingir o objetivo proposto, a apresentação deste trabalho monográfico foi subdividida em quatro capítulos. O primeiro, a introdução, onde se comenta de forma geral o conteúdo proposto. No segundo capítulo, comenta-se sobre o histórico do brincar, enfatizando a origem, os conceitos em relação ao brincar, brinquedos, brincadeiras e jogos; comenta-se também sobre a legislação na Educação Básica e dá-se especial importância ao brincar no RCNEI. O conteúdo do terceiro capítulo se forma com o estudo mais aprofundado baseado nos pressupostos teóricos de Wallon, Piaget e Vygotsky, onde se faz uma pequena biografia dos autores, para em seguida comentar suas teorias acerca do brincar. No quarto capítulo, buscou-se confirmar a importância do brincar e dos jogos para o desenvolvimento cognitivo e o desenvolvimento das Inteligências Múltiplas, proposto por Gardner, recorrendo-se principalmente, ao pensamento de Antunes. Assim, procurou-se ver os conceitos, os precursores, as teorias e abordagens sobre a inteligência, como também pequena biografia de Gardner. No quinto e último capítulo, as Considerações Finais, onde é respondido o objetivo proposto neste trabalho monográfico. 12 2 HISTÓRICO DO BRINCAR Observa-se que a introdução dos termos ―o brincar na educação‖, ―a importância do lúdico na educação‖, são bem recorrentes na época de hoje em estudos e pesquisas por estudiosos da área, assim como foi o assunto ―brincar‖, ao longo da história: com filósofos como Aristóteles, Platão; com educadores como Rousseau, Froebel; com psicólogos como Piaget, Vygotsky, Wallon, Winnicott; com historiadores como Huizzinga, Áries; assim como, entre outras áreas do conhecimento (FRIEDMANN, 2006). Dessa forma, percebe-se que a arte do brincar remonta a origem da humanidade. Assim, neste capítulo, optou-se em discorrer sobre a história do brincar, a origem, os conceitos. Todavia, não se tem a pretensão de contála cronologicamente, isto é, fazer um relato histórico aprofundado; ressaltam-se apenas alguns pontos importantes da mesma. 2.1 Origem do brincar Tomando como base os estudos de Friedmann (2006) sobre o brincar, a autora comenta que o brincar sempre existiu, antes mesmo de aparecerem os primeiros estudos sobre o assunto, o que é óbvio, e que essa preocupação posterior com a inserção do brincar, do lúdico se deu provavelmente, por no mundo moderno os espaços tanto físicos, quanto temporais estarem restringidos. Dessa forma, com a inexistência do espaço para ―o brincar,‖ os educadores, as instituições escolares e esse novo mundo globalizado (as indústrias de brinquedos, a mídia televisiva e a eletrônica) influíram diretamente para a retomada do brincar e do lúdico no universo infantil. Segundo Friedmann (2006), psicólogos e estudiosos da área como, por exemplo, Piaget (1964) e Vygotsky (1988), foram alguns dos que desenvolveram teorias a respeito dos jogos e brincadeiras, tendo como fundamento o estudo do desenvolvimento infantil, objetivando uma melhor aprendizagem das crianças e um conhecimento mais aprofundado para os educadores no entendimento do desenvolver dessas crianças, e ainda tornando a educação das mesmas, mais prazerosa. Montardo (2008, p. 01), discorrendo sobre os brinquedos informa que pesquisadores da área têm procurado, por meio de pesquisa em objetos, fotografia e pinturas, a origem dos brinquedos e que alguns museus têm modelos de brinquedos achados em escavações de uma época muito remota: 13 Bonecas articuladas que podiam mover-se com barbantes, semelhantes aos atuais fantoches, eram utilizadas por crianças da Grécia e da Roma antiga, bem como modelos diminutos de cadeiras, mesas, jarros e outros objetos da vida cotidiana. Bolas (algumas de couro e cheias de crina, palha e outros materiais), e bonecas de madeira ou barro cozido também foram encontradas. O cavalo de pau, cataventos, pássaros presos por um cordão e bonecas multiplicaram-se principalmente a partir do século XV e alguns deles nasceram do espírito de imitação das crianças. Elas imitavam as atividades dos adultos, reduzindo-as à sua escala, como foi o caso do cavalo de pau, numa época em que o cavalo era o principal meio de transporte e de tração. (Grifo meu). Esse fato, de ter sido encontrado brinquedos como bolas, bonecas, chocalhos, piões e peça de jogos desde os mais remotos tempos, para Montardo (2008), se torna algo muito interessante onde se pode fazer uma analogia com os brinquedos de agora e denotar-se que as brincadeiras infantis de outrora permanecem ainda hoje, mesmo com o passar dos tempos. Dando continuidade a pesquisa histórica do autor, ele informa que na Idade Média, a fabricação de brinquedos assumiu importância na vida econômica de algumas cidades e países como na Alemanha, por exemplo. Relata que no século XV os fabricantes de Nurenberg iniciaram a sua fama por seus brinquedos e que nos séculos XVI e XVII Ulm e Augburg, (cidades da Alemanha), os fabricantes se reuniam para expor suas construções, como casas de bonecas, miniaturas de instrumentos musicais e peças de mobiliário e que esse material se configurava no artesanato, em verdadeiras obras primas. Segundo Montardo (2008), numa visão geral, na idade média o brinquedo em forma de jogo não era considerado importante, embora fosse utilizado para divulgar princípios de moral, ética e conteúdos de disciplinas escolares, pois estava associado ao azar. Relata que após a idade média, a França começou a comercializar os brinquedos, onde os mercadores os vendiam nos grandes centros comerciais que existiam naquela época. No final do século XIX teve início a revolução dos brinquedos com o surgimento das primeiras fábricas, culminando com a industrialização e comercialização. No inicio do século XX, os brinquedos de madeira e de pano foram trocados por materiais de menor custo, tais como borracha, celulóide e metal, refletindo a preocupação econômica da época. Já no renascimento, o jogo era visto como conduta livre, que favorecia o desenvolvimento da inteligência e facilitava o estudo. Por isso, foi adotado como instrumento de aprendizagem de conteúdo escolares (MONTARDO, 2008). Friedmann (2006), comentando sobre a história do brincar na antiguidade, relata que não existia separação entre as atividades das crianças e dos adultos, ou seja, as crianças participavam das mesmas atividades dos adultos como, por exemplo, as festas, rituais e 14 brincadeiras. A participação de todas as pessoas, sem distinção de idade, nos jogos e divertimentos era um dos principais meios de que dispunha a sociedade para se unirem e estreitar a aproximação entre eles. Portanto, a criança já participava desde cedo do mundo do adulto nos trabalhos e entretenimentos. Sendo assim, percebe-se que nesse contexto histórico à criança, não era voltado um olhar diferenciado como é nos dias de hoje. Com a evolução tecnológica da indústria existe uma quantidade ínfima de tipos de brinquedos que fascinam as crianças e também, aos adultos. Se na história antiga, as crianças participavam da vida adulta, hoje se pode perceber justamente, o contrário, os adultos é que participam da vida das crianças no que concerne às brincadeiras, pois os brinquedos e jogos que naturalmente fazem parte da vida da criança encantam também aos adultos, um exemplo disso são os jogos de computador, inicialmente criados para o entretenimento infantil. 2.1.1 Conceitos - Brinquedos, jogos, brincadeiras e brincar. No estudo de Friedmann (2006), a autora apresenta um conceito etimológico, isto é, o estudo da origem e da evolução das palavras, que como também apresenta um conceito através de glossário, como se vê respectivamente: Conceitos etimológicos: Brincar – no estudo etimológico, é: BRINCO + AR. Brinco que vem do alemão blinklen, que significa cintilar, brilhar cujo sentido, através do tempo, veio a ser entendido como agitar-se que remete a pular, saltar que em alemão significa Springer, que remete a divertimento e jogos infantis. Brincadeira – na etimologia da palavra, é: BRINCADO + EIRA, que tem o significado de distração, divertimento, passatempo. Jogo – origina-se do latim com significado de zombaria, escárnio, pilhéria, graça, gracejo. Essa palavra é no latim, utilizada para as brincadeiras verbais como piadas enigmas e charadas. Lúdico – Originalmente vem da palavra latina ludus, que se refere ao brincar nãoverbal e sim a ação propriamente dita. Essa palavra deu origem a outras tais como: aludir, iludir, ludibriar, eludir, prelúdio etc. Conceitos de glossário: Brinquedo – É definido como o suporte para a brincadeira ou o objeto de brincar. 15 Jogo – Significa tanto uma atividade que envolva regras e seja estruturada, quanto uma atitude. Brincadeira – envolve a ação de brincar, resulta numa atividade sem regras, desestruturada. Brincar – Designa uma ação lúdica, que pode vir a ser qualquer um dos itens anteriores ou outros objetos, como também o uso do corpo, da arte, da música, das palavras etc. A autora (2006, p. 17) comenta que ao estudar esses itens, jogos, brincadeiras e brinquedos, algumas observações são importantes ressaltar: o comportamento das crianças (a brincadeira propriamente dita) no que concerne às atividades físicas e mentais envolvidas; as características de sociabilidade que o brincar propicia (trocas, competições etc.); as atitudes, reações e emoções que envolvem os jogadores; os objetos utilizados (brinquedos e outros). Assim, de acordo com as observações surgem as interpretações dos dados e diferentes formas de análises do brincar e seus comportamentos: linguísticas, sociais, cognitivas, afetivas, culturais, morais etc. Friedmann (2006), analisa o brincar sob vários enfoques, como se vê no quadro abaixo: Quadro 1– Enfoques do Brincar ENFOQUES ANÁLISES SOCIOLÓGICO Influência do contexto social em que os diferentes grupos de crianças brincam. EDUCACIONAL A construção do brincar para a educação, desenvolvimento ou aprendizagem da criança. PSICOLÓGICO O brincar como meio para compreender melhor o funcionamento da psique, das emoções e da personalidade dos indivíduos, (exemplo a ludoterapia). ANTROPOLÓGICO A maneira como o brincar reflete, em cada sociedade, os costumes e a história das diferentes culturas FOLCLÓRICO O brincar como expressão da cultura infantil através das diversas gerações, bem como as tradições e os costumes nelas refletidos através dos tempos. Fonte: Adaptado do Livro: O Desenvolvimento da criança através do brincar (2006). Segundo Friedmann (2006) ao brincar o ser humano se mostra na sua essência, sem sabê-lo, de forma inconsciente. O indivíduo que realiza o brincar consegue a troca, a socialização, coopera e compete, ganha e perde. Consegue liberar suas emoções, põe em jogo seu corpo inteiro; suas habilidades motoras e de movimento vêem-se desafiadas. 16 De forma poética a autora, comenta que no brincar, o ser humano imita, medita, sonha, imagina. Seus desejos e seus medos transformam-se, naquele segundo, em realidade. O brincar descortina um mundo possível e imaginário para os brincantes. O brincar convida o indivíduo a ser o seu eu. Portanto, percebe-se a que a importância do brincar é essencial em especial na infância, como informa Froebel (1912 apud FRIEDMANN 2006, p. 36): Brincar é a fase mais importante da infância – do desenvolvimento humano neste período -, a representação de necessidades e impulsos internos. [...] A brincadeira é a atividade espiritual mais pura do homem neste estágio e, ao mesmo tempo, típica da vida humana enquanto um todo. [...] Ela dá alegria, liberdade, contentamento, descanso externo e interno, paz com o mundo. [...] O brincar em qualquer tempo não é trivial, é altamente sério e de profunda significação. Em sua pesquisa a autora, relatando sobre Froebel (1912) diz que o mesmo, foi considerado o psicólogo da infância ao introduzir o brincar para educar e desenvolver a criança. Froebel concebe o brincar como atividade livre e espontânea, responsável pelo desenvolvimento físico, moral e cognitivo; e os dons dos brinquedos como objetivos que subsidiam as atividades infantis. Nos estudos da autora Kishimoto (2005), informa que a conceituação dos brinquedos, dos jogos e das brincadeiras torna-se complexo, pois há uma dificuldade em se separá-los, o que significa que os mesmos estão interligados entre si. Para aumentar a complexidade surge também a questão cultural, o que normalmente pode ser considerado, brinquedo, jogo ou brincadeira em determinada cultura, podem divergir em outra. Kishimoto (2005, p. 16) utiliza-se de teorizações de estudiosos franceses, que segundo ela fez-se necessário para compreender o significado dos três termos, como se pode observar: Para compreender o significado de tais termos foi indispensável a leitura de obras como a de Brougère (Le jeu dans la pédagogie prescolaire depuis le Romantisme, 1993), Henriot (Sous couleur de jouer - la metháphore ludique, 1989) e Wittgenstein (lnvestigações filosóficas,1975). Sobre o brinquedo, a autora comenta que difere do jogo e que o mesmo pressupõe uma relação mais íntima com o infanto e que nele não há existência de regras para se fazer uso dele, na verdade a criança é quem as cria conforme suas vontades. Configura-se então, num brincar livre. Segundo Kishimoto (2005, p.18), nessa configuração o brinquedo se insere no cotidiano das crianças como a representação de sua realidade: 17 Admite-se que o brinquedo represente certas realidades. Uma representação é algo presente no lugar de algo. Representar é corresponder a alguma coisa e permitir sua evocação, mesmo em sua ausência. O brinquedo coloca a criança na presença de reproduções: tudo o que existe no cotidiano, a natureza e as construções humanas. Pode-se dizer que um dos objetivos do brinquedo e dar a criança um substituto dos objetos reais, para que possa manipulá-los. Sobre o jogo, a autora (2005, p. 16) levanta questionamentos no que se pode considerar jogo ou não. E o especifica, à luz dos autores franceses, comentando que por existir uma variedade de fenômenos considerados como jogo, torna-se difícil a sua definição: Pesquisadores do Laboratoire de Recherche sur le Jeu et le Jouet, da Université Paris- Nord, como Gilles Brougère (1981, 1993) e Jacques Henriot (1983, 1989), começam a desatar o nó deste conglomerado de significados atribuídos ao termo jogo ao apontar três níveis de diferenciações. O jogo pode ser visto como: 1. O resultado de um sistema lingüístico que funciona dentro de um contexto social; 2. um sistema de regras; 3. um objeto. Esses três níveis de diferenciação em que o jogo pode ser visto são definidos da seguinte forma: O resultado de um sistema linguístico que funciona dentro de um contexto social – o respeito ao uso da linguagem, a imagem e ao sentido que cada sociedade e sua cultura utilizam. Ex.: Numa sociedade indígena primitiva, o arco e flecha é um instrumento de trabalho e em uma sociedade civilizada passa a ser um brinquedo. Um sistema de regras – permite identificar a modalidade dos jogos. Ex.: Se pode usar um mesmo objeto como o baralho e a partir dele jogar diversos jogos (buraco, tranca, etc.) o que vai definir são as regras do jogo. Um objeto – representa a materialização do objeto. Ex.: o Jogo de xadrez é representado por um tabuleiro que pode ser de madeira ou outro tipo de material. Sobre a brincadeira, Kishimoto (2005, p. 21), comenta que o seu suporte é o brinquedo e que ambos não se confundem com o jogo, como se vê: E a brincadeira? É a ação que a criança desempenha ao concretizar as regras do jogo, ao mergulhar na ação lúdica. Pode-se dizer que é o lúdico em ação. Desta forma, brinquedo e brincadeira relacionam-se diretamente com a criança e não se confundem com o jogo. 18 Assim, Kishimoto relata as diferenciações iniciais sobre brinquedo, brincadeiras e jogos, informando que este último é um tema bem mais abrangente de onde se ramifica várias ―famílias‖, compostas por diferentes tipos de jogos. 2.2 Modalidades de brinquedos, jogos e brincadeiras. Kishimoto (2005, 2008), discorrendo sobre tipos de brinquedos e brincadeiras comenta não ter a pretensão de classificá-los e que apenas ressalta em seu texto algumas modalidades de brincadeiras que se apresentam na educação infantil. Dentre as modalidades ou tipos de brincadeiras Kishimoto (2005) relata sobre o brinquedo educativo (jogo educativo), as brincadeiras tradicionais infantis, brincadeiras de faz-de-conta e brincadeiras de construção: Brinquedo educativo (jogo educativo): o brinquedo educativo é da época do Renascimento, e se expande juntamente com a educação infantil, em especial no século atual, onde o mesmo vem conquistando seu espaço nas escolas, principalmente na educação infantil, pois além de ser um meio que desenvolve e educa a criança; ainda o faz de modo prazeroso e dinâmico. Exemplos de brinquedos educativos: brinquedos de tabuleiros, quebra-cabeças, brinquedos de encaixe. Tratando sobre a ludicidade e a educação que exercem os jogos e brinquedos na educação infantil, Kishimoto (2005, p. 37) comenta sobre as funções que exercem: Ao assumir a função lúdica e educativa, o brinquedo educativo merece algumas considerações: 1. função lúdica: o brinquedo propicia diversão, prazer e até desprazer, quando escolhido voluntariamente; e 2. função educativa: o brinquedo ensina qualquer coisa que complete o indivíduo em seu saber, seus conhecimentos e sua apreensão do mundo. As brincadeiras tradicionais infantis: são consideradas como partes da cultura popular. Por serem consideradas como elemento folclórico, as brincadeiras tradicionais assumem características de anonimato, tradicionalidade, transmissão oral, conservação, mudança e universalidade. Não se sabe bem a origem, pois foram passadas de geração em geração, através da oralidade e transmitidas espontaneamente. Exemplos de brincadeiras tradicionais: amarelinha, empinar papagaios, jogar pedrinhas, pião, parlendas. 19 Brincadeiras de faz-de-conta: são conhecidas também como brincadeiras simbólicas, onde a presença da imaginação flui na criança em torno de dois ou três anos de idade, surge com a manifestação da linguagem. No faz-de-conta a criança modifica o significado dos objetos e representa seus sonhos e fantasias. A imaginação inicia-se de experiências anteriores adquiridas pelas crianças em variados contextos, na sociedade, família, círculo de amizade e em sala de aula. Exemplos: Contos de faz de conta, dramatização, cavalo de pau. O faz-de-conta é uma modalidade que provoca o uso da imaginação, que influencia fortemente as atitudes e o comportamento do indivíduo. Através das brincadeiras de faz-de-conta a criança pode amenizar, entender ou modificar as emoções de situações que vivencia no mundo real e que são difíceis de tolerar. Situações que lhe causam excitação, medo, tristeza, raiva e ansiedade. Brincadeiras de construção: os jogos de construção são considerados de grande importância, no sentido de que estimulam a criatividade, enriquecem a experiência sensorial e desenvolvem habilidades. O jogo de construção tem uma estreita ligação com as brincadeiras faz-de-conta, pois a criança na sua imaginação ela constrói, transforma e destrói. Desta maneira, diante dessas ações, a criança manifesta as suas representações mentais; todavia para se entender a relevância dos jogos de construção se faz necessário, considerar tanto a fala como a ação da criança. É importante, também, saber como elas adquirem os temas, a idéia de suas representações e de como o mundo real contribui para a sua construção. Exemplos: Jogos de empilhar, jogos de montar. As modalidades de brincadeiras segundo Kishimoto (2005) podem ser observadas com mais clareza no Quadro 2: 20 Quadro 2 – Modalidade de brincadeiras. MODALIDADES DE PARTICULARIDADES EXEMPLOS BRINCADEIRAS Brinquedos ou jogos Desenvolve e educa a criança Brinquedos de tabuleiros, educativos. de modo prazeroso e quebra-cabeças, brinquedos dinâmico. de encaixe. Brincadeiras tradicionais infantis. Consideradas como partes da cultura popular. Amarelinha, empinar papagaios, jogar pedrinhas, pião, parlendas. Brincadeiras de faz-de-conta A criança modifica o significado dos objetos e representa seus sonhos e fantasias. Estimulam a criatividade, enriquecem a experiência sensorial e desenvolvem habilidades. Contos de faz de conta, dramatização, cavalo de pau. Brincadeiras de construção Jogos de empilhar, jogos de montar. Fonte: Elaboração própria. As brincadeiras e jogos inseridos no contexto infantil, em especial na educação infantil tende a valorizar cada vez mais o conhecimento e o seu desenvolvimento. 2.3 A Educação infantil – Educação básica A Educação Básica é composta por Educação Infantil, Educação Fundamental e Ensino Médio, que são regidos pela Secretaria da Educação Básica, que norteiam o caminho da educação, no sentido de assegurar às crianças e jovens o exercício da cidadania, como também subsidiá-los para um futuro em estudos posteriores e progresso nas profissões escolhidas. Segundo pesquisas obtidas, no portal do Ministério da Educação – MEC, os documentos principais na legislação brasileira que asseguram a Educação Básica são dois: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 que estabeleceu a Educação Infantil como a 1ª etapa da Educação Básica, como um direito da criança, opção da família e dever do Estado; e o Plano Nacional de Educação – PNE, Lei nº 10.172/2001, regidos, pela Constituição da República Federativa do Brasil. Em pesquisa ao documento Política Nacional de Educação Infantil – PNEI (BRASIL, 2006) verificou-se que a necessidade de se manter uma base homogênea nos 21 parâmetros curriculares do país na Educação Infantil, a LDB (1996), estabelece a criação de guias para a orientação dos professores da educação infantil com a criação em 1998, do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil – RCNEI, que não caracterizava obrigação e sim orientações, sendo assim no ano seguinte em 1999 foi criado o documento, Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil – DCNEI, com caráter obrigatório das diretrizes. Sobre os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, objeto do estudo da seção seguinte, os mesmos integram a série de documentos que compõe os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, estabelecidos no artigo 26 da LDB, e, são compostos por três volumes: Volume I – Introdução, documento introdutório acrescido do título, Algumas considerações sobre creches e pré-escola; Volume II – Formação pessoal e social e Volume III – Conhecimento de mundo. Eles foram planejados com o objetivo de funcionar como um guia para os profissionais da educação. Nos volumes I e II, os mesmos têm seção especial sobre o tema brincar na educação infantil, como se vê a seguir: 2.3.1 O brincar no Referencial Curricular Infantil Em toda essa seção toma-se como base, através de citações diretas ou indiretas o Volume I do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil – RCNEI (BRASIL, 1998), assim segundo o próprio RCNEI, o mesmo foi desenvolvido de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais elaborados pelo Ministério da Educação e do Desporto que atende as determinações da Lei 9.394/96, Lei de Diretrizes e Bases – LDB (BRASIL, 1996). Essa lei estabelece que a educação infantil seja a primeira etapa da educação básica. Dessa forma, o Referencial (BRASIL, 1998, p. 05) surge para definir metas integradas que envolvam as creches, pré-escolas como se vê: Considerando a fase transitória pela qual passam creches e pré-escolas na busca por uma ação integrada que incorpore às atividades educativas os cuidados essenciais das crianças e suas brincadeiras, o Referencial pretende apontar metas de qualidade que contribuam para que as crianças tenham um desenvolvimento integral de suas identidades, capazes de crescerem como cidadãos cujos direitos à infância são reconhecidos. Visa, também, contribuir para que possa realizar, nas instituições, o objetivo socializador dessa etapa educacional, em ambientes que propiciem o acesso e a ampliação, pelas crianças, dos conhecimentos da realidade social e cultural. (Grifo do autor). Esse documento representa um grande avanço para a educação infantil, pois busca soluções para esse segmento. Ele foi criado de maneira a servir como um ―guia de reflexões 22 de cunho educacional‖ para que os profissionais da área, que lidam com crianças de 0 a 6 anos possam buscar no mesmo, orientações didáticas, objetivos e conteúdos para uma melhor educação infantil, respeitando a diversidade de cultura existente e também os estilos pedagógicos. (BRASIL, 1998). Entre outras orientações, no RCNEI (BRASIL, 1998, p. 27), tem uma seção própria em relação ao brincar na Educação Infantil e informa sobre o brincar: A brincadeira é uma linguagem infantil que mantém um vínculo essencial com aquilo que é o ―não-brincar‖. Se a brincadeira é uma ação que ocorre no plano da imaginação isto implica que aquele que brinca tenha o domínio da linguagem simbólica. Isto quer dizer que é preciso haver consciência da diferença existente entre a brincadeira e a realidade imediata que lhe forneceu conteúdo para realizar-se. Nesse sentido, para brincar é preciso apropriar-se de elementos da realidade imediata de tal forma a atribuir-lhes novos significados. Essa peculiaridade da brincadeira ocorre por meio da articulação entre a imaginação e a imitação da realidade. Toda brincadeira é uma imitação transformada, no plano das emoções e das idéias, de uma realidade anteriormente vivenciada. Assim, no RCNEI informa que quando a criança brinca exercita a sua imaginação e insere contextos de sua realidade constituídos de ―uma nova roupagem‖, isto é, a atribuição de novos significados. Nesses novos significados as crianças assumem novos papéis, começam a repensar os acontecimentos que deram origem às brincadeiras, todavia conscientes de que estão brincando. Ao brincar, as crianças, melhoram sua auto-estima e conseguem superar progressivamente de forma criativa às novas aquisições de sua realidade, como também para a internalização de modelos da vida adulta em vários tipos de grupos sociais; e todas essas significações passam a fazer parte de um espaço único, singular na sua constituição de infantil. Através das brincadeiras as crianças transformam os conhecimentos já adquiridos em conceitos gerais, como por exemplo, quando assumem um papel em uma brincadeira; esse conhecimento advém da imitação de um adulto, de uma experiência já vivenciada, de uma história ouvida etc. E conseguem através dessas brincadeiras conciliarem ou até mesmo a resolverem problemas. Como se vê no RCNEI (BRASIL, 1998, p. 28): Para brincar é preciso que as crianças tenham certa independência para escolher seus companheiros e os papéis que irão assumir no interior de um determinado tema e enredo, cujos desenvolvimentos dependem unicamente da vontade de quem brinca. Pela oportunidade de vivenciar brincadeiras imaginativas e criadas por elas mesmas, as crianças podem acionar seus pensamentos para a resolução de problemas que lhe são importantes e significativos. Propiciando a brincadeira, portanto, cria-se um espaço no qual as crianças podem experimentar o mundo e internalizar uma compreensão particular sobre as pessoas, os sentimentos e os diversos conhecimentos. 23 Ainda no RCNEI, o brincar pode se apresentar como categorias de experiências que podem ser diferentes, dependendo dos recursos utilizados e essas categorias podem incluir: O movimento e as mudanças da percepção resultantes essencialmente da mobilidade física das crianças; a relação com os objetos e suas propriedades físicas assim como a combinação e associação entre eles; a linguagem oral e gestual que oferecem vários níveis de organização a serem utilizados para brincar; os conteúdos sociais, como papéis, situações, valores e atitudes que se referem à forma como o universo social se constrói; e, finalmente, os limites definidos pelas regras, constituindo-se em um recurso fundamental para brincar. De acordo com o RCNEI (BRASIL, 1998), as categorias de experiências podem ser agrupadas em três modalidades básicas: Brincar de faz-de-conta ou com papéis – considerada como atividade fundamental da qual se originam todas as outras; brincar com materiais de construção; brincar com regras. Todos esses tipos de jogos propiciam a criança, a ampliação dos seus conhecimentos através do lúdico. É dentro desse universo lúdico que o adulto, no papel de professor, deve assumir na escola, uma forma de ajudar os infantos na estruturação do campo dessas brincadeiras, isto é, devem inferir intencionalmente: A intervenção intencional baseada na observação das brincadeiras das crianças, oferecendo-lhes material adequado, assim como um espaço estruturado para brincar permite o enriquecimento das competências imaginativas, criativas e organizacionais infantis. Cabe ao professor organizar situações para que as brincadeiras ocorram de maneira diversificada para propiciar às crianças a possibilidade de escolherem os temas, papéis, objetos e companheiros com quem brincar ou os jogos de regras e de construção, e assim elaborarem de forma pessoal e independente suas emoções, sentimentos, conhecimentos e regras sociais. (BRASIL, 1998, p. 29). 24 No volume II do RCNEI, Formação Pessoal e Social (BRASIL, 1998), reforça o brincar na educação infantil sobre o que já foi informado no volume I, disposto no texto acima, enfatizando a importância do brincar como fundamental para o desenvolvimento da autonomia e da identidade. Salienta que nas brincadeiras, as crianças desenvolvem importantes capacidades ―tais como a atenção, a imitação, a memória, a imaginação.‖ Que no brincar, algumas socializações são amadurecidas, através das interações e experimentações de regras e papéis sociais: A diferenciação de papéis se faz presente sobretudo no faz-de-conta, quando as crianças brincam como se fossem o pai, a mãe, o filhinho, o médico, o paciente, heróis e vilões etc., imitando e recriando personagens observados ou imaginados nas suas vivências. A fantasia e a imaginação são elementos fundamentais para que a criança aprenda mais sobre a relação entre as pessoas, sobre o eu e sobre o outro. No faz-de-conta, as crianças aprendem a agir em função da imagem de uma pessoa, de uma personagem, de um objeto e de situações que não estão imediatamente presentes e perceptíveis para elas no momento e que evocam emoções, sentimentos e significados vivenciados em outras circunstâncias. (BRASIL, 1998, p. 23). No referencial, (BRASIL, 1998) explicita que nas brincadeiras de faz-de-conta, as crianças, buscam imitar, imaginar, representar e comunicar-se com outros personagens, na condição de que uma pessoa pode ser um super-herói, um animal ou um objeto, que um local em que esteja, no faz-de-conta é outro. Dessa forma, no referencial, observam os significados e a importância do brincar, na vida das crianças: Brincar funciona como um cenário no qual as crianças tornam-se capazes não só de imitar a vida como também de transformá-la. Brincar é, assim, um espaço no qual se pode observar a coordenação das experiências prévias das crianças e aquilo que os objetos manipulados sugerem ou provocam no momento presente. Brincar constitui-se, dessa forma, em uma atividade interna das crianças, baseada no desenvolvimento da imaginação e na interpretação da realidade, sem ser ilusão ou mentira. No brincar, quando utilizam a linguagem do faz-de-conta, as crianças enriquecem sua identidade, porque podem experimentar outras formas de ser e pensar, ampliando suas concepções sobre as coisas e pessoas ao desempenhar vários papéis sociais ou personagens. 25 Na brincadeira, vivenciam concretamente a elaboração e negociação de regras de convivência, assim como a elaboração de um sistema de representação dos diversos sentimentos, das emoções e das construções humanas. Por meio da repetição de determinadas ações imaginadas que se baseiam nas polaridades presença/ausência, bom/mau, prazer/desprazer, passividade/atividade, dentro/fora, grande/pequeno, feio/bonito etc., as crianças também podem internalizar e elaborar suas emoções e sentimentos, desenvolvendo um sentido próprio de moral e de justiça. Assim, observa-se que a importância do brincar é confirmada, inclusive na Legislação Brasileira que orienta e diretriza a Educação Infantil, também sobre esse tema, visto com grande importância por estudiosos da educação como se pode verificar no capítulo seguinte. 26 3 O BRINCAR E OS TEÓRICOS DA EDUCAÇÃO Neste capítulo, considerou-se importante discorrer sobre as teorias dos principais teóricos da educação acerca do brincar: Piaget, Vygotsky e Wallon psicólogos, que muito contribuíram para o aprimoramento da educação como um todo, e, em especial, sobre o brincar, sobre os jogos e como esse tipo de ludicidade infere no desenvolvimento da criança e consequentemente na educação infantil. Inicia-se com uma pequena biografia dos teóricos e, posteriormente disserta-se sobre suas teorias. 3.1 Biografia resumida de Jean Piaget Segundo pesquisa de Alessandra Lucchetti (2008), Jean Piaget foi um grande teórico da educação que nasceu em Neuchâtel, Suíça, no dia 09 de agosto de 1896 e faleceu em Genebra em 17 de setembro de 1980, com 83 anos. Ele se interessou em estudar a evolução do pensamento até a adolescência, buscando e se esforçando para compreender os mecanismos mentais que o ser humano possa utilizar para captar o mundo. Como epistemólogo, pesquisou o processo de construção do conhecimento. Nos últimos anos de sua vida se dedicou aos estudos no pensamento lógico-matemático. Piaget estudou Filosofia e Biologia na Universidade de Neuchâtel, aos 22 anos recebeu o seu doutorado em Biologia. Na área da educação teve grande realização na Biologia e Psicologia. Professor de psicologia na Universidade de Genebra de 1929 a 1954 ficou famoso especialmente por organizar o desenvolvimento cognitivo em uma série de estágios. Segundo a autora, ele fundou e dirigiu o Centro Internacional para Epistemologia Genética. Piaget ensinou em diversas universidades européias como também na famosa Universidade de Sorbonne (Paris, França). Desenvolveu trabalhos no laboratório de Alfred Binet, em Paris, a partir de testes organizados por ele pesquisou o desenvolvimento intelectual da criança. Através deste trabalho adquiriu motivação para desenvolver suas investigações na área da Psicologia do desenvolvimento. Piaget escreveu mais de 100 livros e artigos, alguns tiveram a colaboração de Barbel Inhelder1 que mais destacaram foram: Seis Estudos de Psicologia; A construção do Real na Criança; A Epistemologia Genética; O Desenvolvimento 1 Barbel Inhelder (1913-1997), Suíça, Psicóloga do Desenvolvimento, famosa colega de trabalho de Jean Piaget. Fonte: Psychology. jrank.org – Acesso em 27/03/11. 27 da Nação de Tempo na Criança; Da Lógica da Criança à Lógica do Adolescente; A Equilibração das Estruturas Cognitivas. 3.1.1 A teoria de Jean Piaget De acordo com os estudos de Lucchetti (2008), o ano de 1919 para Piaget foi um ano de grandes descobertas, ele deu início a seus estudos experimentais sobre a mente humana e também à pesquisa do desenvolvimento das habilidades cognitivas. Seus estudos na biologia notaram o desenvolvimento cognitivo de uma criança como sendo uma evolução gradativa. A maior pesquisa de Jean Piaget foi observar as crianças brincarem e registrar cautelosamente as palavras, ações e processo de raciocino delas. A grande parte das teorias estudadas por Piaget teve início pela observação de seus próprios filhos e de outras crianças. Deduziu em muitas questões, que as crianças não pensam como os indivíduos adultos por lhe faltarem à capacidade, portanto o modo de pensar é diferente, não somente em grau, como em classe. Segundo Lucchetti (2008), a teoria de Jean Piaget, sobre o desenvolvimento cognitivo, é uma teoria de etapas que pressupõe que os indivíduos passam por uma série de mudanças ordenadas e previsíveis, como: Organização – à medida que cresce a maturação da criança, elas estabelecem modelos físicos ou esquemas mentais em sistemas mais complexos. Adaptação – habilidade de adaptar as suas estruturas mentais ou condutas para se adaptar ao meio. Assimilação – adaptar novas informações para inserir nos esquemas existentes. Acomodação – transformação dos esquemas existentes pela modificação de antigas formas de pensar e agir. Equilibração – vocação para conservar as estruturas em equilíbrio. Dando continuidade aos estudos das etapas, Piaget (1978 apud OLIVEIRA, 2006, p. 01) comenta que a brincadeira, o jogo é fundamental na vida da criança, pois é a partir dele que ocorre a assimilação. Segundo o autor, a criança coloca no jogo aquilo que percebe em sua realidade e que o mesmo pode não modificar estruturas, porém pode ser capaz de 28 transformar a realidade. Dessa feita, Piaget (1978) classifica em seis fases o desenvolvimento da criança através dos jogos, como se pode observar no quadro abaixo: Quadro 3 – Fases do desenvolvimento em Piaget. FASES CARACTERÍSTICAS Primeira fase ou fase da adaptação Conforme os instintos necessários, como por exemplo, a sucção como refeição. Segunda fase ou fase da dualidade Os processos adaptativos prosseguem, contudo com uma diferenciação: a dualidade. Como exemplo, os jogos da voz, as primeiras lalações. Terceira fase ou fase das relações circulares O processo permanece, mas a diferença entre secundárias. jogo e assimilação intelectual é mais clara. Nesta fase a criança domina os objetos, e passa a entender o jogo. Quarta fase ou fase da coordenação dos As manifestações lúdicas são realizadas por esquemas secundários. pura assimilação, por prazer e sem esforço, o objetivo é atingir uma finalidade. Baseia-se em repetir e associar os esquemas já formados, com um fio não lúdico. Quinta fase ou fase da transição das Transição entre as condutas rituais e o condutas. símbolo lúdico. As manifestações lúdicas surgem com variadas combinações. Sexta fase ou fase da representação O lúdico desliga-se do ritual, sob a forma de esquemas simbólicos, graças ao progresso de sua representação. Fonte: Adaptado do texto de Oliveira (2006). Nos estudos de Maluf (2009) sobre os jogos informa que Piaget (1978) apresenta uma classificação dos jogos de acordo com a evolução das estruturas mentais, classifica por três tipos de categorias: Jogos de exercício – ocorre de 0 a 2 anos de idade e a principal característica do ato exercida pela criança no período sensório-motor é o aspecto prazeroso. Age para realizar ou saciar a sua necessidade e obter cada vez mais a oportunidade de garantir prazer. E é este prazer que traz significado à ação. Jogos simbólicos – ocorre dos 2 aos 7 anos de idade, no período pré-operatório. No jogo simbólico a criança encontra o mesmo prazer que tinha antes no jogo de exercício. A função simbólica já está bem formada e começa a criar imagens mentais, visto que domina a linguagem falada. Os jogos simbólicos têm as seguintes 29 características: liberdade total de regras (a não ser aquelas criadas pela própria criança), desenvolvimento da imaginação e da fantasia, ausência de objetivo (brincar pelo prazer de brincar), ausência de uma lógica da realidade, assimilação da realidade ao seu mundo (a criança adapta a realidade a seus desejos). Ex.: caso presencie uma briga, vai brincar de casinha e resolve o conflito por meio das suas bonecas. Com o progresso do desenvolvimento da criança o jogo simbólico sofre modificações. Jogos de regras – ocorre a partir dos 7 anos idade no período operatório concreto, nele está contido o prazer dos jogos de exercício, o lúdico do simbolismo, a criança aprende a estabelecer os limites no espaço e no tempo. As regras são as leis do jogo, orienta as ações dos competidores, determina seus limites de ações, durante a disputa existe a penalidade ou premiação desta decisão. Para ser incluído como um jogo de regras é necessário que: haja um objetivo claro a ser alcançado, existam regras dispondo sobre este objetivo, existam intenções opostas dos competidores, haja a possibilidade de cada competidor levantar estratégias de ação. Cada etapa das tipologias dos jogos tem uma continuidade na evolução da criança. A evolução inicia com a fase reflexiva, passando pela assimilação, pelo simbolismo até aproximar-se à acomodação. Desta feita, pode-se perceber melhor as tipologias dos jogos segundo Piaget (1978) resumidos no quadro a seguir: Quadro 4 – Tipologia dos jogos TIPOLOGIA Jogos de exercício Jogos simbólicos Jogos de regras Fonte: Elaboração própria. PERÍODO Sensório-motor (0 a 2 anos de idade) Pré-operatório (2 aos 7 anos de idade) Operatório concreto (a partir dos 7 anos de idade) CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS Aspecto prazeroso Criação de imagens mentais Objetivo a ser alcançado bem definido. 30 3.2 Biografia resumida de Henri Wallon Segundo Mahoney e Almeida (2002), Henri Wallon nasceu no dia 15 de junho de 1879 em Paris, e viveu toda a sua vida na França entre 1879 e 1962. Ele fazia parte de uma família que gostava de política, justiça e democracia. Seu avô era historiador e foi político importante para a história francesa. O pai, Paul Alexandre Joseph Wallon, era arquiteto. Sua família era composta de sete irmãos. Ele era o terceiro filho de uma família aristocrática. Wallon viveu uma época de muito agito por causa de duas grandes guerras. Como médico, na primeira guerra (1914-1918), a sua participação foi importante, teve oportunidade de estudar lesões orgânicas e seus reflexos sobre processos psíquicos. Na segunda guerra (1939-1945), ele tomou parte do movimento da Resistência contra os domínios nazistas, onde acreditou que a escola necessita assumir valores de solidariedade, justiça social, antirracismo como meio para reformar uma sociedade justa e democrática. Seu percurso como membro acadêmico divulgou importantes formações em filosofia, medicina, psiquiatria, áreas que configuraram seus interesses em psicologia. Suas obras e atividades também se voltaram para a educação e o mais importante, foi o Projeto Langevin-Wallon, plano organizado, junto com o físico Langevin, para a correção completa do sistema educacional francês. Wallon ocupou-se primeiro à psicopatologia com criança de 2 a 15 anos com muitas perturbações de comportamento: instabilidade, delinquência, perversidade etc. Esse estudo deu origem ao seu livro L’enfant Turbulent (1925). Wallon publica os seus melhores livros durante a década de 1940, embora estivesse ocorrendo à época grandes problemas provocados pela segunda grande guerra (1939-1945). Os livros são: A evolução psicológica da criança (1941), Do ato ao pensamento (1942) e As origens do pensamento na criança (1945). 3.2.1 A teoria de Henri Wallon Segundo Mahoney e Almeida (2002), na opinião de Wallon (1941), o que é mais importante na formação da criança é o ambiente social em que ela vive e não o meio físico. Ele dá atenção ao aspecto emocional, afetivo e sensível do ser humano e nomeia a afetividade, que está relacionada com a motricidade, como desencadeadora da ação e do desenvolvimento psicológico da criança. Dessa forma, os estágios do desenvolvimento em Wallon são definidos através de cinco estágios, como se vê: 31 Estágio impulsivo emocional – Na primeira fase, impulsiva (0 a 3 meses) é o momento em que a criança explora o seu próprio corpo em relação as suas sensibilidades internas e externas. É uma situação ainda não firme, com movimentos bruscos, desordenados de enrijecimento e relaxamento da tensão muscular. Na segunda fase, emocional (3 a 12 meses), começa o método de discriminação de forma a se comunicar pelo corpo. Podem ser identificados padrões emocionais diferenciados para o medo, alegria, raiva etc. Estágio Sensório-Motor e Projetivo – as atividades que realizam buscam a procura concreta do espaço físico pelo agarrar, segurar, manipular, apontar, sentar, andar, etc. Essa atividade motora prepara o afetivo e o cognitivo que oferta subsídios à criança para o próximo estágio. Estágio do Personalismo – começa o processo de discriminação entre o eu e o outro, separando-se, distinguindo-se do outro, que se mostra no uso das expressões como eu, meu, não, etc. Estágio Categorial – ocorre entre os 6 e 11 anos; a criança acha-se no estágio de desenvolvimento tanto no plano motor como no afetivo . É uma idade que acontece a evolução mental, se comparada a uma época de crises profunda que se abrem na adolescência. A diferenciação nítida entre o eu e o outro, da estrutura sólida para a exploração mental do mundo físico. Esta organização do mundo físico em categorias mais bem definidas dá oportunidade também para uma compreensão mais evidente de si mesmo. Estágio da Puberdade e Adolescência – ocorre entre 12 e 18 anos. Descobrimento de si mesmo, como uma identidade autônoma, por meio de atividade de confronto, autoafirmação, questionamento, ao mesmo tempo em que se acontece à mudança física pelo amadurecimento sexual, que causa na criança varias modificações corporais seguidas por uma transformação psíquica. Se sujeita e se apoia nos grupos de pares, apresenta oposição aos valores tal como interpretados pelos adultos com quem convive. Posse de categorias cognitivas de maior nível de abstração, nas quais a dimensão temporal toma relevo, é possível uma discriminação mais nítida dos limites de sua autonomia e de sua dependência. 32 Os estágios do desenvolvimento infantil que Wallon (1941 apud Mahoney e Almeida, 2002) definiu, podem ser melhores observados no quadro a seguir: Quadro 5 – Estágios do desenvolvimento em Wallon ESTÁGIOS Estágio Impulsivo Emocional CARACTERÍSTICAS Exploração do próprio corpo, com movimentos bruscos, desordenados de enrijecimento e relaxamento da tensão muscular. (0 a 3 meses). Identificação de padrões emocionais diferenciados para o medo, alegria, raiva etc. (3 a 12 meses). Estágio Sensório-Motor e Projetivo Estágio do Personalismo Estágio Categorial Estágio da Puberdade e Adolescência Buscam a procura concreta do espaço físico pelo agarrar, segurar, manipular, apontar, sentar, andar etc. Discriminação entre o eu e o outro no uso das expressões como eu, meu, não, etc. Estágio de desenvolvimento no plano motor/afetivo. Idade que acontece a evolução mental. A diferenciação nítida entre o eu e o outro, da estrutura sólida para a exploração mental do mundo físico. (6 e 11 anos). Identidade autônoma: atividades de confronto, autoafirmação, questionamentos. Mudança física pelo amadurecimento sexual, modificações corporais seguidas por transformações psíquicas. (12 e 18 anos). Fonte: Elaborado a partir do texto acima Como visto acima, para Wallon (1941 apud MAHONEY E ALMEIDA, 2002) é através do corpo com a sua projeção motora que a criança cria a primeira comunicação (diálogo tônico) como uma maneira importante para o desenvolvimento da linguagem. A motricidade tem uma ligação muito grande com as emoções que ao mesmo tempo antecede a construção da ação com contato ao mundo exterior. Para o autor toda atividade da criança é lúdica, portanto infantil significa lúdico. Desta maneira, a natureza livre do jogo é como uma atividade voluntária da criança. Ainda segundo Mahoney e Almeida (2002), a classificação dos jogos infantis feita por Wallon apresenta quatro espécies: 33 Jogos funcionais – manifesta-se por movimento simples de exploração do corpo através dos sentidos. No momento em que a criança compreende os resultados de ato agradável e interessante conseguido nas suas ações gestuais, a sua escolha é procurar o prazer usando novamente suas ações. Jogos de ficção – são jogos lúdicos que se manifesta de modo imaginário através do faz-de-conta, a criança representa papéis no seu contexto social, brincando de imitar adultos, casinha, escolhinha e etc. Jogos de aquisição – estes jogos começam quando a criança passa a ter grande interesse para compreender, conhecer, imitar canções, gestos, sons, imagens e história. Jogos de fabricação – são jogos em que a criança, fabrica, cria e improvisa com atividades manuais o seu brinquedo. Portanto, os jogos de fabricação e jogos de ficção que se assemelha muito, pois os jogos de fabricação quase sempre as suas causas permitem uma continuidade do jogo de ficção. Essas apresentações dos jogos infantis a partir da motricidade são denominadas por Wallon como atividades voluntárias. Informadas acima, podem ser visualizadas de forma mais sucinta no quadro abaixo: Quadro 6 – Jogos Infantis JOGOS CARACTERÍSTICAS Jogos funcionais Compreensão de atos agradáveis em ações gestuais, a sua escolha é procurar o prazer usando novamente suas ações. Jogos de ficção Modo imaginário através do faz-de-conta, representação de papéis no contexto social: brincando de imitar adultos, casinha, escolhinha e etc. Jogos de aquisição A criança passa a ter grande interesse para compreender, conhecer, imitar canções, gestos, sons, imagens e histórias. A criança, fabrica, cria e improvisa com atividades manuais o seu brinquedo. Jogos de fabricação Fonte: Elaboração própria 34 3.3 Biografia resumida de Lev Vygotsky Segundo pesquisa de Luchetti (2008), Vygotsky nasceu em Orsha na Bielo-Rússia em 5 de novembro de 1896 e faleceu em 11 de junho de 1934. Estudou na universidade de Moscou no curso de Direito, ocupou-se nas pesquisas literárias e também como professor e pesquisador no campo de artes, literatura e psicologia. Esta época, com a Revolução Soviética, foi marcada pela interdisciplinaridade o que despertou grande interesse no projeto de formação do homem novo, da sociedade nova, de uma nova psicologia. Seu empenho pela psicologia acadêmica teve inicio a partir do estudo de criança com defeitos congênitos. Nesta época (1924), Vygotsky, ocupou-se mais à psicologia, para estudar a infância como uma maneira de poder explicar o comportamento humano no geral. Ao longo do desenvolvimento humano e sua relação com o contexto social ele buscou identificar as mudanças qualitativas do comportamento. 3.3.1 A teoria de Lev Vygotsky Vygotsky apresenta em sua teoria um dos mais essenciais conceitos: a zona de desenvolvimento proximal (ZDP), que afirma que nos indivíduos existem dois níveis de desenvolvimentos: um nível de desenvolvimento efetivo, indicado pelo que o sujeito pode realizar sozinho e um nível de desenvolvimento potencial, indicado pelo que o indivíduo podem realizar com ajuda de outra pessoa mais velha ou mais experiente. Vygotsky (1984), forma o indivíduo como altamente social e o conhecimento como produto social. A partir daí ele protege todos os processos psicológicos superiores (comunicação, linguagem, raciocínio, etc.), que são obtidos primeiramente num contexto social e após, se internalizam, pois essa internalização é um produto da utilidade de um determinado comportamento cognitivo social. Então o pensamento teórico de Vygotsky (1984), está no estudo do desenvolvimento tanto efetivo como em potencial entendendo o processo de aprendizado pelo guia da Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), que mede rigorosamente a distância entre esses dois níveis e que menciona como podemos interferir no desenvolvimento de uma pessoa e modificá-lo. Segundo Oliveira (2006), Vygotsky relata que na brincadeira existem três tipos de características: a imitação, a imaginação e a regra. Elas acontecem em todas as brincadeiras infantis, como nas tradicionais, nas faz-de-conta, e nas que existem regras. 35 Dessa forma, Vygotsky (1984 apud OLIVEIRA, 2006) informa que sobre os jogos e brincadeiras, diz que as habilidades humanas começam pelos três anos de idade e que no brinquedo, a criança projeta-se nas atividades adultas de sua cultura e ensaia seus futuros papéis e valores. Assim, o brinquedo antecipa o desenvolvimento que só pode ser completamente atingido com assistência de seus companheiros da mesma idade e também dos mais velhos. Vygotsky define o desenvolvimento da criança a partir de dois tipos de zonas: Zona de desenvolvimento real – a bagagem de conhecimento que o indivíduo traz consigo. Zona de desenvolvimento proximal – a diferença existente no nível atual da criança, e o nível que chega a atingir quando recebe auxílio de pessoas mais capazes. Quadro 7 – Zonas do desenvolvimento em Vygotsky ZONAS CARACTERÍSTICAS Zona de desenvolvimento real Conhecimento de forma autônoma, já consolidado pelo indivíduo. Zona de desenvolvimento proximal Conhecimentos fora do alcance atual, mas potencialmente atingíveis. Fonte: Elaboração própria. Durante a brincadeira, todos os aspectos importantes da vida da criança tornam-se tema do jogo. Vygotsky (1984) vê a aprendizagem como um processo social. As interações com os adultos e a linguagem fazem o desenvolvimento cognitivo acontecer. Verificando as classificações dos jogos segundo os três teóricos, e fazendo uma analogia a partir de Jean Piaget, observa-se que as denominações de classificações dos jogos são diferentes, todavia seus sinônimos e suas características são iguais, assim os Jogos de Exercícios de Jean Piaget são os jogos funcionais de Wallon e os jogos de imitação de Vygotsky. Os Jogos Simbólicos de Jean Piaget são os jogos de ficção de Wallon e os jogos de imaginação de Vygotsky e por último os Jogos de Regras de Jean Piaget são os jogos de aquisição e de fabricação de Wallon, como também, o mesmo jogo de regras de Vygotsky. Essas observações podem ser vistas com maior clareza no quadro 08 (oito) abaixo: 36 Quadro 8 – Classificação dos Jogos TEÓRICOS CLASSIFICAÇÃO DOS CARACTERÍSTICAS JOGOS Jogos de exercício Aspecto prazeroso Jogos simbólicos Criação de imagens mentais Jogos de regras Objetivo a ser alcançado bem definido. Jogos funcionais Aspecto prazeroso Jogos de ficção Criação de imagens mentais Jogos de aquisição Objetivo a ser alcançado bem definido Jogos de fabricação Objetivo a ser alcançado bem definido. Jogos de imitação Aspecto prazeroso Jogos de imaginação Criação de imagens mentais Jogos de regras Objetivo a ser alcançado bem definido. JEAN PIAGET HENRY WALLON LEV VYGOTSKY 2 Fonte: Elaboração própria - Segundo os textos sobre os teóricos da educação descritos neste capítulo. Como o processo cognitivo advém do conhecimento e consequentemente das interações com o meio, e o brincar e as brincadeiras fazem parte dessas interações, como fora observado neste capítulo, no capítulo seguinte, a abordagem cognitiva gerada a partir do brincar será relacionada às inteligências múltiplas. 2 Nos estudos pesquisados sobre Vygotsky, o mesmo não estabelece classificação dos jogos. No quadro 7, foi adaptado uma classificação, de acordo com as características que o autor propõe para o jogo infantil: imitação, imaginação e regras. Fonte: Psychology. jrank.org – Acesso em 27/03/11. 37 4 A TEORIA DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS E A RELAÇÃO COM O BRINCAR Considerar que o indivíduo é portador de não somente um ou dois tipos de inteligências: a inteligência lógico-matemática e a linguística como são comumente conhecidas, mas de vários outros tipos também, torna-se imprescindível conhecê-las. Conforme os estudos realizados pelo psicólogo Howard Gardner que criou a Teoria das Inteligências Múltiplas, os indivíduos são portadores de outros tipos de inteligência, e essa informação revolucionou a psicologia e, em especial a educação. Neste capítulo, a abordagem sobre o processo cognitivo e o brincar serão relacionadas com as Teorias das Inteligências, detendo-se mais precisamente na Teoria das Inteligências Múltiplas de Gardner e relacionando-as com os estudos de Celso Antunes, de como os jogos e brincadeiras favorecem o desenvolvimento dessas inteligências. 4.1 Conceitos de Inteligência No Dicionário Eletrônico Aurélio (2004), conceitua de forma abrangente a inteligência, como a qualidade ou capacidade de compreender, a adaptar-se facilmente enfocando como qualidade: perspicácia, penetração, capacidade e agudeza. Já no Dicionário Aurélio Online3 conceitua a palavra de forma mais sucinta: inteligência é a faculdade de conhecer, de compreender. Conceitua também cognição como faculdade, ato ou ação de conhecer; aquisição de um conhecimento. Assim, entendendo inteligência e cognição como sinônimas, para Paradela (2007, p. 23), a cognição, é um processo de busca do conhecimento que envolve também a memória, o raciocínio, juízo, atenção, percepção, pensamento, imaginação e a linguagem. Ele comenta que a cognição é algo muito maior, quando informa: A cognição é, portanto, mais do que simplesmente a aquisição de conhecimento e, consequentemente, a nossa melhor adaptação ao meio; é, também, um mecanismo de conversão do que é captado para o nosso modo de ser interno. Ela é um processo pelo qual o ser humano interage com os seus semelhantes e com o meio em que vive, sem perder a sua identidade. [...] Ela começa com a captação da informação pelos sentidos, e, em seguida, pelo desenvolvimento da percepção. É, desse modo, um processo de conhecimento, que tem como material a informação do meio em que vivemos e o que já está registrado na nossa memória. 3 Fonte: Disponível em: http://www.dicionariodoaurelio.com. Acesso em 21/02/12 38 Buscando a origem da palavra inteligência, observa-se que deriva do latim intellingentia, inteligere e obtém-se o seguinte resultado: no latim, inter é intus (pré-fixo) – que significa entre, ligência é legere (sufixo) – que significa escolhas. Assim, percebe-se que o indivíduo portador da inteligência tem a faculdade de escolher entre alternativas, que provavelmente, as convenham em determinadas situações e/ou culturas. Gardner (2001, p. 47) se utiliza do conceito de inteligência utilizado em seu livro de 1983, formulado a partir do Projeto Van Leer4: Frames of mind: The Theory of Multiple Intelligences e o refina neste de 2001: Inteligência: um conceito reformulado, como se pode verificar: Comecei definindo uma inteligência como ―a habilidade para resolver problemas ou criar produtos valorizados em um ou mais cenários culturais‖. Chamei atenção para os fatos fundamentais sobre a maioria das teorias sobre inteligência: isto é, só se olhava para a resolução dos problemas e se ignorava a criação de produtos, e se supunha que a inteligência seria evidente e apreciada em qualquer lugar independentemente do que era (e do que não era) valorizado numa cultura e num tempo específicos. Esta é a definição que usei no livro de 1983, que saiu do projeto Van Leer: Frames of mind: The Theory of Multiple Intelligences. Praticamente duas décadas depois, apresento uma definição mais refinada. Agora conceituo inteligência como um potencial biopsicológico para processar a informações que pode ser ativado num cenário cultural para resolver problemas ou criar produtos que sejam valorizados numa cultura. Essa modesta modificação no enunciado é importante porque sugere que as inteligências não são objetos que podem ser vistos, nem contados. Elas são potenciais – neurais presumivelmente - que poderão ser ou não ativados dependendo dos valores de uma cultura específica, das oportunidades disponíveis nessa cultura e das decisões pessoais tomadas por indivíduos e/ou suas famílias, seus professores e outros. Celso Antunes (2008, p. 17) educador, especialista em inteligência e cognição, utiliza a mesma linha de pensamento de Gardner e, discorre que sobre o significado da inteligência ou cognição existem maneiras diversas de defini-las e diz que qualquer conceito que se apresente sobre o tema informará que a inteligência humana permite compreender, conhecer, entender e, sobretudo, aprender: ―A inteligência é assim juízo, discernimento, capacidade de se adaptar, de conviver. Serve para resolver problemas, vencer desafios e faculta a possibilidade para criar ideias ou inventar ―coisas‖ que as sociedades acreditam pertinentes‖. 4 Projeto Van Leer – Gardner se refere à Fundação Bernard Van Leer, que custeou com uma ―generosa bolsa de cinco anos‖ um projeto sobre potencial humano, o qual, já vinha desenvolvendo em Harvard com um grupo de colegas, e que lhe deu a possibilidade de escrever o livro sobre as inteligências múltiplas. Fonte: GARDNER, Howard. Inteligência: um conceito reformulado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. 39 4.2 Estudiosos precursores da inteligência Como informa Gardner (2001) em cada época da sociedade busca-se o ideal de ser humano. Na Grécia antiga valorizava-se o indivíduo de boa forma física, ágil e virtuoso; em Roma eram admirados os indivíduos de coragem máscula, na China eram admirados aqueles que sabiam manejar o arco, o desenho, quem tinha dons para a poesia, música e para a caligrafia. Para o autor, nos últimos séculos, em especial nas sociedades ocidentais o ideal é o do homem inteligente e os ideais para a composição desse indivíduo inteligente variam e evoluem de acordo com o cenário e o tempo em que ele vive. Dessa forma, entende-se que em meio a essa busca pelo o ideal da inteligência, surgiram os estudiosos da inteligência. Segundo Cavalieri e Soares (2007) em suas pesquisas histórico-evolutivas sobre a inteligência, os precursores estudiosos da inteligência e preocupados em avaliá-la foram: Francis Galton – na Inglaterra (1822 a 1911), entendia que a capacidade do intelecto dos indivíduos revelava-se através das discriminativas capacidades (sensoriais e motoras); entendia que o indivíduo ter alguma aptidão era apenas uma simples manifestação da inteligência; que as características intelectuais não mudariam e seriam estáveis; que a capacidade mental seria única; avaliava a inteligência principalmente em índices fisiológicos (tempos em que se dava a reação); preocupava-se com a eugenia5. James Catell – nos Estados Unidos (1860 a 1944), entendia a inteligência na mesma linha de pensamento de Galton e interessa-se pelo trabalho dele sobre a eugenia. Foi quem primeiro empregou a expressão teste mentais e, administrou vários testes a seus alunos. Os tipos de testes eram para medir a amplitude e a variabilidade da capacidade humana, os testes lidavam com as medidas sensório-motoras, nos testes de inteligências usava medições mais complexas de habilidade mental. Alfred Binet – na França (1857 a 1911) – Não concordando com os entendimento anteriores, acredita que a capacidade de intelecto do indivíduo revelava-se por complexas funções superiores; que as características do intelecto poderiam se 5 Eugenia - é um termo cunhado em 1883 por Francis Galton (1822-1911), significando "bem nascido" Galton definiu eugenia como o estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações seja física ou mentalmente. Em outras palavras, melhoramento genético. Fonte: Psychology. jrank.org – Acesso em 26/02/12. 40 desenvolver, entendia a capacidade mental como algo que se integraria a outros tipos de capacidades; sua avalição se dava em torno da memória, da aprendizagem, da capacidade de resolução de problemas e observação no desenvolvimento do pensamento infantil. Desenvolve em 1905, em parceria com Theodore Simon, escalas de medidas para as inteligências infantis, introduz o conceito de idade mental, as escalas serviram de base para todos os testes de inteligências que surgiram mais tarde. No quadro de nº 09, pode-se observar de forma sintetizada o pensamento dos estudiosos sobre a inteligência: Quadro 09 – Precursores do estudo da inteligência ESTUDIOSOS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS FRANCIS GALTON Capacidade intelectual através das capacidades discriminativas sensoriais e motoras; Características intelectuais estáveis; Capacidade mental unitária; Inteligência centrada em índices fisiológicos; JAMES CATELL Preocupação com a eugenia. Capacidade intelectual através das capacidades discriminativas sensoriais e motoras; Características intelectuais estáveis; Capacidade mental unitária; Inteligência centrada em índices fisiológicos; ALFRED BINET Preocupação com a eugenia. Capacidade intelectual através de funções complexas superiores; Características intelectuais passíveis de desenvolvimento; Capacidade mental é vista como um produto que integra diferentes capacidades. Fonte: Elaborado a partir do texto de Cavalieri e Soares (2007, p. 07). 41 4.3 As teorias sobre a inteligência Depois dos precursores estudiosos da inteligência, fazendo uma abordagem sobre as teorias da inteligência e seus respectivos estudiosos, Cavalieri e Soares (2007), informam que as mesmas podem ser organizadas em dois tipos: Abordagens tradicionais que se subdividem em psicométrica e desenvolvimentista e Abordagens contemporâneas que dentre elas se destacam a do processamento da informação e a cognitivista. Abordagem tradicional psicométrica – teve como iniciadores Binet & Simon (1905) na França, nesse tipo de abordagem a inteligência é concebida como um conjunto de traços mentais que devem ser testados, e, limitados a constatação dos resultados, onde é observado e analisado a ―quantidade‖ de inteligência e de esperteza de cada indivíduo. Os primeiros testes mentais publicados foram os testes para identificar crianças com dificuldades na aprendizagem levando em consideração os conhecimentos práticos e os conhecimentos do cotidiano. Como continuísta dessa teoria Stern (1925), cria os testes de Quociente de Inteligência – QI, utilizados até hoje para medir a capacidade cognitiva dos indivíduos. Spearman (1904) contribui com a psicometria através da teoria dos dois fatores que explica as relações entre diferentes tarefas sensoriais e as matérias acadêmicas: não havia relações interdependentes entre as inteligências: geral ou ―g‖ (tarefas intelectuais) e especificas ou ―s‖ (fatores específicos), isto é, qualquer capacidade que fosse única para executar determinada tarefa, não havia relação entre elas. Thurstone (1938) para ele a inteligência é desdobrada em sete fatores identificados como capacidades mentais primárias: compreensão verbal, fluência verbal, raciocínio indutivo, visualização espacial, número, memória e rapidez perceptiva. Concebe as aptidões como unidades funcionais diferenciadas e que explicam ou são à base das diferenças individuais nas situações de realização cognitiva. Abordagem tradicional desenvolvimentista – representada por Piaget (1978) e Vygotsky (1984), como informado no capítulo 3 (três), a preocupação se dava com a estrutura e os esquemas internos e com a forma de como se estruturavam esses esquemas em modos qualitativos no desenvolvimento do indivíduo. Abordagem contemporânea do processamento da informação – o enfoque se dá nos processadores da informação (o tratamento da informação recebida). Neste tipo de abordagem se importa com a rapidez e exatidões dos processos, fazem da inteligência uma analogia com o computador ―nos processos de codificação, armazenamento, 42 tratamento e uso da informação que vem do exterior‖. Neisser (1967) escreve "Psicologia Cognitiva" - com estudos numa tentativa de compreensão de como a informação é codificada, transformada, guardada, relembrada. O autor Estes (1974), estuda a inteligência computadorizada destacando três capacidades principais: a de manejo de símbolos, a de avaliação e previsão das consequências das soluções alternativas e a capacidade de investigação da sequencialização simbólica. Abordagem contemporânea cognitiva - se destaca no enfoque cognitivista, acentuam a possibilidade de desenvolvimento dos traços cognitivos e dão importância ao contexto. Entre os estudiosos cognitivistas se destacam Robert Sternberg (1986) nos Estados Unidos com a "Teoria Triárquica da Inteligência", que enfatiza a dimensão em que os aspectos da inteligência funcionam, através dos pensamentos: 1. Pensamento analítico – trata da relação da inteligência com o mundo interno tentando resolver novos tipos de problemas; 2. Pensamento prático – relação da inteligência com o mundo externo tentando resolver problemas que apliquem o que se sabe aos contextos cotidianos para adaptação no ambiente, moldar os ambientes presentes para criar e selecionar novos ambientes; 3. Pensamento criativo – trata da relação da inteligência com a experiência, tentando resolver problemas conhecidos utilizando estratégias que manipulem os elementos de um problema ou as relações entre os elementos. Ainda nas abordagens contemporâneas encontra-se a abordagem dos Processos Simbólicos criada pelo psicólogo Howard Gardner (1983), a teoria das Inteligências Múltiplas que posiciona o indivíduo como capaz de desenvolver várias inteligências e não apenas uma. Na seção seguinte, será abordado sobre esse estudioso e sua teoria, e, no quadro 10 (dez), abaixo, se pode vislumbrar a síntese das abordagens dos estudiosos citados nesta seção. 43 Quadro 10 – Inteligências: abordagens e teóricos ABORDAGENS PRINCIPAIS TEÓRICOS TRADICIONAL Binet & Simon PSICOMÉTRICA Stern Thurstone TRADICIONAL Piaget DESENVOLVIMENTISTA Vygotsky CONTEMPORÂNEA DO Neisser PROCESSAMENTO DA Estes INFORMAÇÃO CONTEMPORÂNEA Robert Sternberg COGNITIVA Howard Gardner CARACTERÍSTICAS Preocupação na mensuração e/ou quantificação da inteligência através de testes. Preocupação com a forma de como se estruturavam os esquemas internos em modos qualitativos no desenvolvimento do indivíduo. Preocupação com a rapidez e exatidões dos processos, analogia da inteligência com o computador: codificação, armazenamento, tratamento e uso da informação. Preocupação no enfoque cognitivo. Acentuam a possibilidade de desenvolvimento dos traços cognitivos e dão importância ao contexto Fonte: Elaborado a partir do texto da seção 4.3. (Elaboração própria) 4.3.1 A teoria das inteligências múltiplas de Gardner Nos escritos de Gardner sobre a inteligência, em seu livro Mentes Extraordinárias, Gardner (l999, p.28), o autor tece comentários sobre o desenvolvimento comum da inteligência, ele cita Freud (1856-1839) e Jean Piaget (1896-1980) como os dois grandes observadores das crianças e comenta: Talvez não seja por acaso que dois dos mais famosos estudiosos do desenvolvimento humano, Sigmund Freud e Jean Piaget, tenham se concentrado nos aspectos integrais da criança. [...] Jean Piaget (1896-1980) dedicou sua carreira ao desenvolvimento cognitivo da criança: o crescimento de seus poderes intelectuais. Como Freud, ele estava interessado nos aspectos universais do desenvolvimento – os marcos que caracterizavam cada criança. 44 Dessa forma, percebe-se o interesse de Gardner no desenvolvimento de estudos a respeito da inteligência. Assim ainda nesse livro (1999, p. 30), comenta que: ―[...] a mente infantil já é um aparelho mental articulado e completamente detalhado. Mesmo a criança de três ou quatro meses de idade tem plena impressão do que seja um objeto físico‖. O autor analisa a mente da criança de 1 a 6 anos, como uma mente além da infância, e usuária de símbolos que é um dos veículos primordiais para a evolução intelectual. A criança no desenvolvimento dessa etapa de idade é possuidor dos ―principais sistemas simbólicos de sua cultura‖, sendo ―coroado‖ no final dessa etapa, por volta dos cinco ou seis anos com habilidades que o permitem fazer referências a objetos e pessoas simbolicamente separados. Gardner (1999, p. 33), também analisa a criança como um teórico da mente, e diz que na década de 80 pesquisadores retomaram uma pergunta de Jean Piaget: ―Como é que as crianças avaliam a mente humana em geral?‖. E que a resposta a tal pergunta se revela muito complexa, pois o autor entende que ainda bem pequenas elas já detém algum entendimento da mente humana, mas para que a criança tenha a compreensão aproximada a do adulto ocorre uma sequência de desenvolvimento ou marcos, como se vê: Aos dezoito meses – as crianças são capazes de fingir. Podem fazer de conta que um objeto é outro e rir quando entende que alguém a acompanha nesse faz de conta. Entre dois ou três anos – as crianças se conscientizam que tem desejos, crenças e medos diferentes dos outros. Nesta fase apreciam a brincadeira do esconde-esconde. Aos quatro anos – ocorre um momento crítico, pois se tornam aptas a avaliar a representatividade que os outros indivíduos têm em mente, elas entendem que determinadas crenças ou pensamento de um indivíduo a respeito de um determinado assunto ou objeto podem ser falsas. Gardner (1999, p. 33) exemplifica da seguinte forma: Uma prova experimental intrigante vem de tarefas de ―crença falsa‖. A criança testemunha uma mudança, digamos, na localização de um objeto, e também vê que outra pessoa não percebeu a mudança. Perguntam então à criança onde a pessoa que não viu o movimento do objeto pensará que ele está. Crianças de menos quatro anos acham que a pessoa sabe a verdadeira localização do objeto. Depois dos quatro, percebem que a pessoa acha que o objeto está no lugar errado e, portanto, mantém uma falsa crença. A criança passa a entender a mente como representativa da realidade, em vez de simplesmente se espelhar nela. Só a mente que cria uma representação do que está ―lá fora‖ pode criar uma representação errada – e assim a criança fica ciente de que suas próprias crenças podem às vezes estar erradas. 45 Para o autor, fica claro que a teoria da mente infantil, se torna pouco provável de estar completa nessa fase de idade, porém já tem adquirido importantes formas de compreensão, na verdade, a criança juntou o que antes via em separado: o mundo das pessoas e o mundo dos objetos e está aberta à sua cultura e às novas possiblidades. Gardner (1999) traça uma trajetória sequencial da criança até a vida adulta do indivíduo, como se pode observar no resumo do quadro 11 (onze) abaixo: Quadro 11 – Trajetória da criança até a vida adulta PERÍODOS RELAÇÃO COM RELAÇÃO COM PESSOAS OBJETOS INFÂNCIA Ligação com o Conhecimento senso responsável motor do mundo físico FASE DOS Primeiros colegas Regras físicas PRIMEIROS básicas PASSOS DE 5 A 7 ANOS Drama edipiano Teorias iniciais ANOS ESCOLARES ADOLESCÊNCIA VIDA ADULTA SISTEMAS SIMBÓLICOS Significados mundanos Brincar: primeiros usos dos sistemas simbólicos. Conhecimento esboçado dos sistemas simbólicos. Mestria em notações Amizades Mestria em domínio Busca de identidade (self, comunidade); Relações sexuais Família, intimidade, ensinando outros. Escolhas vocacionais Pensamento teórico; Mundos hipotéticos. Especialidade em domínios; Opções da criatividade. Criar e transmitir práticas simbólicas. Fonte: Adaptado do diagrama de Howard Gardner em Mentes Extraordinárias (1999, p. 43). Discorrendo sobre a inteligência e as formas como são vistas na sociedade e o interesse que a mesma apresenta para quantificar a inteligência, Gardner comenta que se está diante de uma escolha difícil: conservar a visão tradicional de inteligência, e de como ela deve ser mensurada ou buscar uma forma melhor e diferente de conceituação do intelecto humano. Sendo optante da última proposição informa Gardner (2001, p.14): [...] os seres humanos têm um leque de capacidades e potenciais – inteligências múltiplas – que, tanto individualmente quanto em conjunto, podem ser usadas de muitas formas produtivas. Os indivíduos podem não só a vir entender suas inteligências múltiplas, como também desenvolvê-las de formas altamente flexíveis e produtivas dentro dos papéis humanos criados por varias sociedades. Inteligências múltiplas podem ser mobilizadas na escola, em casa, no trabalho ou na rua – isto é, nas varias instâncias de uma sociedade. 46 O autor, dando continuidade ao assunto diz que no futuro, muitas outras disciplinas, que não somente a psicologia ajudará a definir a inteligência e muitos outros grupos de interesses compartilharão de suas aferições e de seus usos. Mas que, sob o seu ponto de vista, o seu enfoque sobre as inteligências múltiplas, conta com o apoio cientifico mais forte e será mais útil no próximo milênio. Dessa forma, Gardner (2001) pontua inicialmente as sete inteligências originais: 1. Inteligência linguística – envolve a sensibilidade para a oralidade e a escrita, a facilidade no aprendizado de línguas e a capacidade de atingir objetivos através das mesmas. Os locutores, escritores, poetas e advogados são portadores elevados desta inteligência. 2. Inteligência lógico-matemática – envolve a capacidade de investigações cientificas, análise de problemas através da lógica e realização de operações matemáticas. Os indivíduos exploradores dessa inteligência são matemáticos, cientistas e lógicos. O autor observa que para quem vive se submetendo a provas e testes ser possuidor dessas duas inteligências: a linguística e a lógico-matemática é um ser abençoado. Sobre as três inteligências seguintes (3, 4 e 5), Gardner informa que são notáveis nas artes e que podem ser usadas de muitas outras maneiras. 3. Inteligência musical – envolve a habilidade na atuação, na apreciação de padrões musicais e na composição. O autor comenta que em sua opinião esta inteligência tem uma estrutura quase paralela à linguística e, sendo assim, não se concebe cientificamente, nem logicamente chamar a linguística de inteligência e a musical, de talento. Ambas, são inteligências. 4. Inteligência físico-cinestésica – envolve a capacidade de se usar o corpo como, por exemplo, a boca ou as mãos para resolver problemas ou fabricar produtos. O autor comenta que os atores, dançarinos e atletas são portadores desta inteligência, mas que a mesma é também importante para cientistas, artesãos, cirurgiões, mecânicos e outros profissionais técnicos. 5. Inteligência espacial – envolve a capacidade de reconhecer e manipular os padrões de espaço utilizados por navegadores, pilotos, como também os padrões de áreas confinadas como as utilizadas por arquitetos, jogadores de xadrez, cirurgiões, artistas gráficos e escultores. 47 O autor comenta que as duas últimas da lista original ele chama de inteligências pessoais: 6. Inteligência interpessoal – envolve a capacidade de entender as motivações, os desejos e intenções do outro e a partir disso, trabalhar com o outro eficientemente. Líderes religiosos, políticos, atores, vendedores, professores necessitam ter bem aguçada esse tipo de inteligência. 7. Inteligência intrapessoal – envolve a capacidade de conhecer a si mesmo, seus medos, capacidades e desejos, e de usar esse conhecimento para regular com eficiência seus caminhos. Sobre a inserção de inteligências adicionais, Gardner (2001, p. 63) informa: Aqui, considero diretamente as provas para três ―novas‖ possíveis inteligências: uma inteligência naturalista, uma inteligência espiritual e uma inteligência existencial. A força das provas para elas varia, e declarar ou não que alguma capacidade humana seja outro tipo de inteligência certamente é uma decisão de julgamento. Minha missão aqui é explorar de novo os processos de identificação de uma inteligência e manifestar minhas reservas quanto a estender o conceito em direções menos seguras. 1. Inteligência naturalista – para o autor o termo naturalista caracteriza um papel valorizado em muitas culturas. Envolve a capacidade de demonstrar grande experiência no reconhecimento e na classificação de numerosas espécies – a flora e a fauna – de seu meio ambiente. Em outras culturas, naturalista pode ser o indivíduo que aplica melhor as taxonomias folclóricas, um biólogo que reconhece e categoriza espécimes, na cultura ocidental naturalista é relacionada ao indivíduo que tem grande conhecimento sobre o mundo vivo. 2. Inteligência espiritual – sobre essa inteligência, Gardner informa ocorrer grande complexidade em relação às outras, pois qualquer discussão sobre o espírito é assunto contestado dentro das ciências e provavelmente em todo o meio acadêmico, pois não se concebe reconhecer o espírito como se reconhece a mente ou o corpo. Para abordagem dessa área Gardner propõe três diferentes sentidos do espiritual: o espiritual enquanto preocupação com questões cósmicas ou existenciais, onde o âmbito do espiritual ―se refere a tudo: á mente, ao corpo, ao self, `a natureza, ao sobrenatural e, às vezes, a nada!‖; o espiritual como a conquista de um estado, onde se faz importante distinguir com bastante cautela os dois sentidos clássicos de saber: o saber como e o saber quê, respectivamente ter domínio de um conjunto de conteúdos e domínio da arte da alteração da consciência. Gardner (2001, p. 74): 48 Mas as discussões do espiritual baseadas na cognição podem ser complicadas, uma vez que os observadores interessados veem a essência do espírito [...] como a chegada a um estado, o que se chama de ―sentimento de entrega‖ e não como um campo que envolva qualquer campo de resolução de problema ou de produção de algo. Na verdade, alguns veem o interesse espiritual como algo basicamente emocional ou afetivo – centrado num sentimento de certo tom ou certa intensidade – e, portanto, fora do âmbito de uma investigação cognitiva. O espiritual enquanto efeito nos outros – aqui Gardner comenta que algumas pessoas causam aos outros um efeito espiritual sejam pelo seu jeito de ser ou pelo trabalho que realizam. E cita alguns exemplos como o conhecimento da vida de Madre Tereza de Calcutá, ser abençoado pelo papa ou ouvir uma sinfonia, uma música fazem os indivíduos se sentirem mais completos ou de bem consigo mesmo. O autor tem muito cuidado em explorar esse tipo de inteligência e acha mais prudente deixar o termo inteligência espiritual de lado e chamá-la de Inteligência Existencial que explora a natureza da existência de múltiplas formas, que tem preocupações com questões primordiais. Uma qualidade essencial do indivíduo portador desta inteligência seria segundo Gardner (2001, p. 79): [...] a capacidade de se situar em relação aos limites mais extremos do cosmos – o infinito e o infinitesimal - e a capacidade afim que é a de se situar em relação a elementos da condição humana como o significado da vida, o sentido da morte, o destino final dos mundos físico e psicológico e experiências profundas como o amor de outra pessoa ou a total imersão numa obra de arte. Note que aqui não há nenhuma estipulação para se chegar a uma verdade última, como não se estipula que quem desenvolve inteligência musical precise produzir ou preferir certos tipos de música. Antes há o potencial de uma espécie para se envolver com preocupações transcendentais, uma capacidade que pode ser despertada e desenvolvida sob determinadas circunstâncias. 49 Assim, percebe-se que Gardner fala de nove tipos de inteligências que se pode observar resumidamente no quadro 12, abaixo: Quadro 12 – Tipologias de inteligências TIPOS DE INTELIGÊNCIAS CARACTERÍSTICAS Inteligência linguística Sensibilidade para a oralidade e a escrita Inteligência lógico-matemática Capacidade para análise de problemas através da lógica. Inteligência musical Habilidade na atuação, na apreciação de padrões musicais e na composição. Inteligência físico-cinestésica Capacidade de se usar o corpo como, por exemplo, a boca ou as mãos para resolver problemas ou fabricar produtos. EXEMPLOS Locutores, escritores, poetas e advogados. Matemáticos, cientistas e lógicos. Músicos, maestros, etc. Atores, dançarinos, atletas, cientistas, artesãos, cirurgiões, mecânicos e outros profissionais técnicos. Inteligência espacial Capacidade de reconhecer e manipular os padrões de espaço. Navegadores, pilotos, arquitetos, jogadores de xadrez, cirurgiões, artistas gráficos e escultores. Inteligência interpessoal Capacidade de entender as motivações, os desejos e intenções do outro. Capacidade de conhecer a si mesmo, seus medos, capacidades e desejos. Líderes religiosos, políticos, atores, vendedores, professores. Indivíduos com facilidade em fazer amigos, liderar, etc. Relacionada ao indivíduo que tem grande conhecimento sobre o mundo vivo. Capacidade de se situar em relação aos limites mais extremos do cosmos – o infinito e o infinitesimal. Biólogos, paisagistas, botânicos. Inteligência intrapessoal Inteligência naturalista Inteligência existencial Indivíduos que se situam em relação à condição humana como o significado da vida, o sentido da morte, o destino final dos mundos físico e psicológico e experiências profundas como o amor de outra pessoa ou a total imersão numa obra de arte. Fonte: Elaborado a partir do texto da seção 4.3.1 - Informações de Gardner e Antunes (Elaboração própria). 50 Segundo Antunes (2008, p. 39), discorrendo sobre as inteligências múltiplas de Gardner já citadas acima pelo autor, inicia seu texto fazendo um comparativo entre a teoria e a prática, comenta que as duas palavras andam juntas, todavia a primeira normalmente não é valorizada como merece e que a segunda é que recebe todos os créditos e aplausos, e, continua informando que: ―O substantivo feminino ―Teoria‖ significa conhecimento especulativo, conjunto de princípios fundamentais de uma ciência, ou ainda, uma suposição [...]‖. Dessa forma, entende que a teoria das inteligências múltiplas é apresentada por Gardner como um conjunto sistematizado de ideias cientificas, sugerindo assim indiscutível validade prática. O autor argumenta que se a existência das inteligências múltiplas, fosse um fato ao invés de teoria, haveria a possibilidade de se tocá-la, e diz que as inteligências humanas são como nossos pensamentos não se conseguem tocá-los, todavia eles existem. Comenta que os argumentos que são levantados por Gardner para mostrar às várias inteligências parecem ser indiscutíveis, como o argumento de que quando o cérebro humano sofre uma lesão ou disfunção parcial, somente são afetados no indivíduo inteligências referentes à parte do cérebro afetada, ficando disponíveis outras. Assim, se o indivíduo fosse possuidor apenas de apenas uma inteligência, quando sofresse um dano cerebral em parte do cérebro, não deveriam se apresentar outras e o mesmo ficaria inutilizado. Outro argumento interessante também são as manifestações de indivíduos de inteligências extraordinárias como Einstein que era portador não de uma inteligência genial, todavia de uma genial inteligência lógico-matemática, assim como Shakespeare de uma genial e específica inteligência linguística, os gênios geralmente se destacam em apenas uma especificidade de inteligência, provavelmente alguns poucos como Leonardo da Vinci e Goethe tenham expressado em suas genialidades mais de um tipo de inteligência. Fazendo a leitura das inteligências múltiplas de Gardner, Antunes (2008, p. 42) comenta suas impressões por cada inteligência e informa também que inicialmente o autor em 1985 iniciou seus estudos fazendo um levantamento de sete inteligências e que posteriormente ao aprofundar seus estudos elevou esse número para nove, admitindo ainda, a possibilidade de ampliação, visto a um aprofundamento no conhecimento da mente humana e que de um modo geral todos os indivíduos ―sem disfunções cerebrais agudas apresentam em diferentes níveis de grandeza as inteligências:‖ 1. Linguística – compreensão e domínio no mundo da linguagem, a capacidade de se pensar com palavras e de usar a linguagem para expressar ideias verbais ou escritas. Ex: jornalistas, professores, oradores, etc, 51 2. Lógico-matemática – confrontação com o mundo dos objetos, ligada a competência da compreensão dos elementos, permitindo a ordenação de símbolos numéricos e algébricos, compreensão de quantidades, espaço e tempo. Ex: engenheiros, contadores, etc. 3. Sonora ou musical – a capacidade de compor melodias e a combinação de sons. A inteligência sonora destaca indivíduos com extrema sensibilidade para a entoação, o ritmo, a melodia e o tom. Ex: Músicos, maestros, etc. 4. Cinestésico-corporal – é a representada pelos movimentos, utilizadas no esporte, na dança, etc. Ex: Ginastas, bailarinas, tocadores de violão. 5. Espacial – permite a percepção do mundo visual com precisão, se configura na capacidade de perceber o espaço do próprio indivíduo com a correlação do espaço do todo. Ex: Motorista que tem orientação desenvolta no trânsito. 6. Interpessoal – extremamente nítida em indivíduos que tem elevada compreensão da natureza humana, os indivíduos portadores dessa inteligência seguem o seu próprio caminho, sem se importar com o que os outros pensam, são guiados por sentimentos e idéias e valorizam a privacidade. 7. Intrapessoal – é a inteligência que expressa a facilidade de relacionamentos afetivos com o próprio eu, construindo uma percepção apurada de si mesmo despontando a autoestima e o autoconhecimento. Ex: indivíduos com facilidade em fazer amigos, liderar, etc. 8. Naturalista – conhecida como inteligência ecológica, está associada a sensibilidade de perceber e compreender a natureza, compreensão coerente e racional da interdependência entre a vida animal, vegetal e ecossistemas. Ex: paisagista, botânicos. 9. Existencial – capacidade de se situar sobre os limites mais extremos do cosmos, relações com elementos da condição humana como o significado da vida, o sentido da morte, o destino final do mundo físico e outras relações de natureza filosóficas e metafísicas. 4.3.2 Biografia resumida de Howard Gardner Segundo pesquisa de Ferrari (2008), Howard Gardner nasceu em Scranton, no estado norte-americano da Pensilvânia, em 1943, filho de judeus alemães refugiados do nazismo. Fez ingresso na Universidade Harvard no ano de 1961 para estudar direito e história, 52 porém ao se aproximar do psicanalista Erik Erikson (1902-1994) acabou redirecionando a carreira acadêmica para as áreas combinadas de psicologia e educação. Pesquisou o desenvolvimento dos sistemas simbólicos pela inteligência humana sob a orientação do célebre educador Jerome Bruner, quando estava na pós-graduação. Nesse período, Gardner integrou-se ao Harvard Project Zero, que era um projeto inicialmente destinado às pesquisas sobre educação artística. Em 1971, tornou-se codiretor do projeto, cargo que mantém até hoje. Foi em Harvard que desenvolveu as pesquisas sobre as inteligências múltiplas. Elas vieram a público em seu sétimo livro, Frames of Mind, de 1983, que lhe deu uma projeção extraordinária nos Estados Unidos. O assunto foi aprofundado em outro livro que intensificou sua notoriedade e foi um campeão de vendas, Inteligências Múltiplas: Teoria na Prática, publicado em 1993. Nos escritos sobre educação que se seguiram, enfatizou a importância de trabalhar a formação ética simultaneamente ao desenvolvimento das inteligências. Dando continuidade ao tema e acrescentando mais alguns tipos de inteligências além das sete iniciais, publica em 1999 o livro, Inteligência: um conceito reformulado, publicado no Brasil pela editora objetiva em 2001. Atualmente, leciona neurologia na escola de medicina da Universidade de Boston e é professor de cognição e pedagogia e de psicologia em Harvard. Nos últimos anos, vem pesquisando e escrevendo sobre criadores e líderes exemplares, tema de livros como Mentes Extraordinárias. Em 2005, foi eleito um dos 100 intelectuais mais influentes do mundo pelas revistas Foreign Policy e Prospect. 4.4 As inteligências múltiplas e o brincar Assim como Gardner, Celso Antunes é um educador estudioso da inteligência e cognição, e busca o desenvolvimento das inteligências através dos jogos e brincadeiras, objeto desse estudo. Dessa forma, Antunes (2002, p. 114) comenta: A inteligência é estimulável e, independentemente da carga genética ou da história biológica e evolucionista de uma pessoa, são inegáveis os efeitos em seu progresso, ocasionados por um ambiente estimulador e por pessoas empenhadas nesse fim. Antunes (2002) entende que para ocorrer os estímulos, para os diferentes tipos de inteligências se faz necessária uma organização como verdadeiros projetos, pois ―se aplicados acidentalmente ou provocados em circunstancias aleatórias‖ não há como haver uma produção de resultados significativa. O autor faz uma analogia com a perda de peso e comenta 53 que o indivíduo que entra num regime estabelece metas, mudanças de hábitos, procedimentos e outras ações visando atingir o objetivo, da mesma forma devem acontecer com o estímulo às inteligências múltiplas. Para o autor, o potencial das inteligências é variável de indivíduo para indivíduo e esse potencial pode tornar-se ainda mais diverso se levar em consideração os fatores genéticos e os estímulos ambientais desenvolvidos dentro do ambiente escolar ou fora dele. Antunes (2002, p. 118) observa que o cérebro é comprometido pelo seu desuso, assim há a necessidade de estimular as manifestações dos diferentes tipos de inteligências ―da vida pré-natal até idades bastante avançadas, embora as ‗janelas da aprendizagem‘ não se mostrem abertas com igual intensidade para todas as faixas etárias‖. Sobre como abordar as inteligências múltiplas em sala de aula e como utilizar os jogos para estimular a cognição dos alunos, Antunes (2002, p. 118) comenta: Não existe uma única abordagem pedagógica para se trabalhar as inteligências múltiplas em sala de aula. Consequentemente, não existe e não pode existir ―proprietários‖ específicos de ―receitas definitivas‖ sobre como trabalhar essa diversidade de competências humanas. Os jogos estimuladores de inteligências são válidos desde que desenvolvidos como produto de um projeto pedagógico, consistente, que deixe claro suas metas, ―os produtos‖ que buscam alcançar, as estratégias que serão utilizadas e a intensidade com que o treinamento poderá vir a ser feito. O autor fazendo um comparativo sobre o potencial de inteligência das crianças de hoje com os da geração passada, diz que as da geração de hoje cresce significativamente. Informa também, que estudos recentes mostram que estão ocorrendo mudanças fisiológicas e anatômicas na microtextura do cérebro dessas crianças, mudanças essas que podem ser observadas, apesar de ainda não serem compreendidas em sua plenitude. Algumas razões colocadas como responsáveis sobre essas novas mudanças nas gerações de hoje, seriam os novos estilos de vida, como uma alimentação mais saudável e de qualidade, que faz com que hoje os filhos cresçam mais que os pais; famílias menores que faz com que os pais se dediquem mais aos filhos; as exigências do mercado de trabalho que faz com que os pais busquem uma aprimoração cultural mais elevada, os novos saberes, estudos e pesquisas que enfatizam a importância e a prática dos estímulos e que, principalmente, ensinam como fazê-lo; os equipamentos eletrônicos, que quando bem utilizados podem exercitar a criança e ainda, e, mais importante ou significativo, os novos perfis das escolas que buscam e desenvolvem projetos estimuladores para as crianças. 54 Antunes (2002) coloca alguns traços comuns e característicos das inteligências na infância: Curiosidade – a criança perguntadora, xereta, essa curiosidade é importante e desenvolve-a, sobretudo se os pais e os professores souberem como validar esses momentos. Bom humor – a espontaneidade da alegria, o riso fácil, a facilidade em fazer piadas e rir delas, são claros indícios de intensas atividades cerebrais. Persistência e empenho na satisfação de seus interesses – A ―teimosia‖ são características de crianças inteligentes, enquanto que crianças apáticas, conformadas e resignadas, não. Facilidade na proposição de ideias encadeadas – busca comparações e destaca exemplos mesmo não pertinentes, quando se conta algo a elas. Saltam do texto para o contexto, associam textos a imagens, entre o ontem e o agora, entre a imaginação e a visualização são traços expressivos de crianças inteligentes. Liderança – a facilidade em reunir outras crianças em torno delas e de suas brincadeiras, ter seguidores, identifica uma atividade cerebral mais forte e uma inteligência interpessoal. Poder de transposição de uma linguagem para outra – inventar uma música para ilustrar algo que viu ou ouviu ou desenhar uma cena, criar movimentos corporais para a expressão de sentimentos, transposições são traços expressivos de diversas inteligências. Sentimento de revolta diante do que acredita ser injustiça – a criança emocionalmente inteligente fica furiosa quando acredita ter sido injustiçada ou quando vê alguém sendo injustiçado. Criatividade e imaginação – o poder de fantasiar e viver as fantasias com manifestações verbais, visuoespaciais, sonora ou mimicas são formas características de inteligências. Facilidade de adaptação – essas crianças mesmo com um desconforto natural conseguem superar com facilidade essa sensação, tem uma facilidade maior que seus colegas com a mesma faixa etária. Facilidade em relacionar informações aparentemente diversas – descobre novos sentidos em situações relativamente parecidas com as que vivenciaram ou que viu alguém vivenciar ao ver algumas situações numa cena na TV, por exemplo. 55 4.4.1 Jogos para estimular as inteligências múltiplas Da mesma forma que as autoras Friedman (2006) e Kishimoto (2005, 2008) no início deste trabalho buscaram conceituar os jogos no capítulo 2, seção 2.1.1 e demonstrar a importância dos mesmos no desenvolvimento cognitivo infantil, Antunes (1998, p. 11) também inicia seu estudo sobre os jogos para a estimulação das múltiplas inteligências conceituando e informando: A palavra jogo provém de jocu, substantivo masculino de origem latina que significa gracejo. Em seu sentido etimológico, portanto, expressa um divertimento, brincadeira, passatempo sujeito a regras que devem ser observadas quando se joga. Significa também balanço, oscilação, astúcia, ardil, manobra. Não parece ser difícil concluir que todo jogo verdadeiro é uma metáfora da vida. E essa reflexão exige cuidado: [...] empregamos a palavra “jogo” como um estímulo ao crescimento, como uma astúcia em direção ao desenvolvimento cognitivo e aos desafios do viver, e não como uma competição entre pessoas ou grupos que implica em vitória ou derrota. Antunes (1998) comenta que os cincos primeiros anos de vida dos indivíduos são fundamentais para o desenvolvimento das inteligências, e entende que para ocorrer o desenvolvimento cerebral com toda a sua potencialidade, o mesmo necessita de estímulos, e observa que os estímulos devem ser produzidos pelas próprias crianças, por adultos, mas com tranquilidade, pois o excesso é tão nocivo quanto qualquer outro exagero e que estímulos excessivos atuam como desestímulos, e deve-se lembrar de que mesmo quando não há a oferta de estímulos ―o cérebro sabe procurá-los nos desafios a que se propõe‖. O autor comenta que o jogo num sentido integralizado é o meio estimulador mais eficiente para as inteligências, pois no espaço do jogo há a permissão para que a criança realize tudo aquilo que ela deseja, decide sem restrições, no jogo se obtém simbolicamente a satisfação do desejo de ser grandioso. No âmbito social, o jogo impõe o controle dos impulsos, pois há a aceitação das regras pelo os que estão no jogo ―e não imposta por qualquer estrutura alienante‖. Assim para o autor, quando a criança brinca com sua espacialidade se envolve nas fantasias estabelecidas por elas e constroem um atalho entre o mundo real e o mundo onde desejaria viver. Antunes (1998, p. 18) comenta ainda que ―os estímulos são o alimento das inteligências.‖ E que sem essa ―alimentação‖ a criança crescerá com limitações, que o seu desenvolvimento cerebral ficará de forma muito significativa comprometido, todavia como já 56 comentado anteriormente, ele ressalta de forma analógica que se deve ter moderação, pois a alimentação excessiva, além do que a criança necessita, é tão prejudicial quanto a sua ausência. Sobre essa moderação com os estímulos, reforça sobre o ensinamento da criança em casa e na escola: Um berço precisa ser a primeira sala de aula de uma criança e sua primeira escola da vida é o quarto, a sala e a cozinha, com mães e pais estimulando todas as inteligências. Mas isso não pode ser feito o tempo todo. A casa ou mesmo a escola não pode virar um laboratório, onde a criança recebe a toda hora, todas as iniciações linguísticas, lógico-matemáticas, espaciais, corporais e outras. Cabe ao professor ou aos pais estarem plugados na criança o tempo todo e sentirem que quando surgir o apetite pelo desafio do jogo, é importante ter em mão todos os recursos para que sejam usados com sobriedade, principalmente com a co-participação de outras crianças e de adultos. Outro elemento importante para os estímulos, que o autor recomenda é a observação da criança e a anotação dos seus progressos em uma ficha para cada inteligência, pois ajudará a compreender melhor a criança. Deve-se perceber a importância da aprendizagem, pelo progresso e não na manifestação do alcance de uma meta numérica. Antunes informa analogicamente que as inteligências no ser humano são como janelas de um quarto que se abrem devagar, aos poucos e que para cada etapa dessa abertura muitos estímulos acontecem e que presumivelmente essas janelas não se fecham até os 72 anos de idade do indivíduo, e que na puberdade perdem um pouco o brilho, não significando desinteresse, mas nesse momento ocorre a consolidação do que foi aprendido num período de maior abertura. Antunes (1998, p. 18-19) continuando, informa ainda, que as inteligências vistas analogicamente como janelas e em relação às aberturas: Abrem-se praticamente para todos os seres humanos ao mesmo tempo, mas existe uma janela para cada inteligência. Duas crianças na mesma idade, possuem a janela da mesma inteligência com o mesmo nível de abertura, isso não significa, entretanto, que sejam iguais; a história genética de cada uma pode fazer com que o efeito dos estímulos sobre essa abertura seja maior ou menor, produza efeito mais imediato ou mais lento. É um erro supor que o estímulo possa fazer a janela abrir-se mais depressa. Por isso essa abertura precisa ser aproveitada por pais e professores com equilíbrio, serenidade e paciência. O estímulo não atua diretamente sobre a janela, mas se aplicado adequadamente, desenvolve habilidades e estas sim, conduzem a aprendizagens significativas. Dessa forma, Celso Antunes elaborou um quadro que sintetiza ―os espaços dessa abertura das janelas‖ e insere alguns jogos e estímulos possíveis para o desenvolvimento das inteligências, onde aqui se procurou priorizar o que estaria mais direcionado a educação infantil e adaptou-se o quadro que segue nas páginas seguintes, nesse intuito: 57 Quadro 13 – Jogos e outros estímulos para as Inteligências Múltiplas. INTELIGÊNCIAS FAIXA ETÁRIA LINGUÍSTICA 1 a 2 anos 2 a 3 anos 3 a 4 anos 4 a 5 anos MUSICAL Perde o brilho aos 10 anos 3 anos 4anos HABILIDADES Aprende duas palavras novas por dia. ESTÍMULOS POSSÍVEIS Estimular a pensar para respostas simples como sim e não. Constrói frases com até 3 palavras. Repertório de até 40 palavras. Conversam e respondem perguntas. Surge o plural. Repertório de mais de 500 palavras. Ensinar a imitar os sons de animais, de avião, automóvel. Elabora frases e inicia a compreensão da gramática Devidamente estimulada pode falar até 10.000 palavras e emprega alguns verbos corretamente Compreende os sons e associa aos emissores Ajudar a aumentar o vocabulário. Contar histórias e solicitar ajuda para a construção dos personagens. Desenvolver questões com suposições. Evitar respostas monossilábicas Estimular a leitura. Fazer com que conte ―casos‖. Pode iniciar o aprendizado de uma língua. Decifrar frases construídas fora de ordem Gravar a voz e fazê-la ouvir a gravação. Estimular a identificar sons diferentes. Brincar com flauta doce, gaita ou tambor. Discrimina ruídos e sons. Distingue sons de diferentes instrumentos musicais. Percebe o ritmo. Perde o brilho por volta dos 10/11 anos. LÓGICOMATEMÁTICA 2 anos 3 anos 4 anos Perde o brilho por volta dos 10 anos Começam a perceber que as coisas acontecem mesmo que não as deseje. Percebem diferenças entre fino/grosso, largo/estreito, etc. Começam a perceber o significado de conjuntos e grandezas. Compare valores e conceitos matemáticos Trabalhe verbalmente alternativas de muito/pouco, grande/pequeno. Ordenar objetos por tamanho Propor jogos dos sete erros, jogos de dominó. Procurar fazê-lo entender as horas. 58 INTELIGÊNCIAS FAIXA ETÁRIA CINESTÉSICO2 anos e 6 meses CORPORAL 3 anos NATURALISTA 5 anos Perde o brilho por volta dos 12 anos 1 a 3 anos HABILIDADES Praticam esportes simples, andam de triciclo. Seguram o lápis. Conseguem manter a atenção por períodos mais longos. Adoram ouvir e inventar histórias. Vestem a roupa Reconhecem animais e plantas. São generosas e carinhosas com amiguinhos e animais. Faça-a descobrir a chuva, o sol, o vento. Retire-a do carrinho. Faça-a pisar na areia. Faça-a descobrir amigos. Estimule passeios. Valorize suas descobertas naturais Não gosta de ficar sozinha. Agradece as companhias queridas. Já dá seus beijinhos. Reconhecem-se em fotos. Brincadeiras de ―escondeesconde‖ vão preparando para as frustações. Valorize e comece a legitimar suas emoções. (Ajude-a descobrir que todas as pessoas possuem sentimentos de tristezas e de alegrias, de afetos e de mágoas). Faça-a descobrir expressões de tristeza e de alegrias em desenhos. Saiba legitimar as emoções da criança. Respeite seu ―espaço‖. Ajude-a lidar com seus medos. Não desvalorize ou mude os seus sentimentos. 3 a 5 anos PESSOAIS (Inter e Intrapessoais) Perde o brilho por volta dos 14 anos. De 1 ano a 18 meses. 2 anos Tornam-se ―rabugentas‖, adoram dizer ―não‖. 3 anos Começam a ficar mais independentes dos pais. Perde o brilho por volta dos 17 a 18 anos. (Continua na página seguinte) ESTÍMULOS POSSÍVEIS Incentive nesses períodos as brincadeiras de escondeesconde 59 Continuação Quadro 13 - Jogos e outros estímulos para as IM. INTELIGÊNCIAS FAIXA ETÁRIA ESPACIAL 2 anos HABILIDADES Acreditam em mitos Amam papai-noel e o Coelhinho da Páscoa. ESTÍMULOS POSSÍVEIS Dê expressões para os sentimentos. Invente signos para as cores. Invente histórias. Faça caretas e peça que sejam imitadas. Trabalhe a espacialidade. 3 anos Descobrem os monstros e adoram as histórias em que são derrotados, Começam a descobrir o espaço. Faça- a descobrir roteiros. Estimule descobrir o ―perto‖ e o ―longe‖. Discuta um trajeto a percorrer. 4 anos Descobrem seus super-heróis e muitos inventam seus amigos imaginários. Inicie a alfabetização cartográfica da criança. Ensine a desenhar objetos vistos por diferentes ângulos. Perde o brilho por volta dos 10 anos Fonte: Adaptado do livro de Celso Antunes: Jogos para estimulação das múltiplas inteligências, 1998 p. 19 - 21. Os possíveis estímulos recomendados por Antunes no quadro acima, são os jogos e brincadeiras que o autor numa análise de cada etapa da criança sugere para que as mesmas desenvolvam-se cognitivamente, a partir de cada inteligência. O autor informa ainda que se joga com a criança também quando se conversa com ela, quando se faz um passeio, quando se assiste TV com elas ou até mesmo quando estimulam as interações com os amiguinhos ou com os avós. Assim, percebe-se que os jogos e brincadeiras estão inseridos em atos que se realizam comumente no dia a dia e que se pode estimular às crianças de formas diversas, com brincadeiras simples e não somente com jogos mais sofisticados, que uma maioria nem sempre tem acesso. Dando continuidade ao pensamento de Antunes (1998) sobre os jogos, brincadeiras e as inteligências múltiplas de Gardner, Antunes fala que este autor muito mais do que qualquer outro ―é da opinião que as habilidades cognitivas podem ser aceleradas‖. E isso hoje é realidade, quando se verifica, que o desenvolvimento cognitivo infantil de crianças a partir dos três anos de idade, são mais facilmente desenvolvidos, e isso, não era observado na época piagetiana, esse desenvolvimento se revela com maior intensidade nos jogos de linguagem. Ainda sobre o desenvolvimento cognitivo infantil dos três aos seis anos o autor dá dicas de como ajudar as crianças nesse período: 60 Construir a historicidade – deve-se ensinar a criança a pensar em termos de passado presente e futuro, deve-se ampliar seu vocabulário, fazendo-as construir frases com mais de cinco palavras. Despertar a capacidade lógica – fazer associações de quantidades com números e contagem, utilizar os conceitos de muito, pouco, grande, pequeno. Ensinar a dar sentido às cores, mostrar figuras e deixar rabiscar a vontade. Estimular associações – associar figuras a sons, estimular a cantar e imitar vozes; estimular também a escovar os dentes, amarrar os sapatos, comer com talhares e legitime suas emoções. Ensinar a ser um ―mecânico‖- exercitar as habilidades com as mãos fazê-los martelar, encaixar, parafusar. Ensinar a mexer no computador, a varrer a casa, ―arrumar‖ o quarto. Explorar o lado positivo da TV – planejar com antecedência o que vai ser assistido, estabelecer limites do tempo diante da TV, não usar a televisão como prêmio ou castigo. Conversar muito sobre o que é visto, falar de amor, morte, guerra, sexo. Mostrar outras alternativas além da TV. Libertar dos estereótipos – evitar presentes estereotipados como boneca para meninas e bola para meninos, ensinar que não existem profissões masculinas ou femininas. Mostrar a diversidade cultural e que pessoas diferentes possuem crenças diferentes. Estimular relacionamentos com outras crianças – falar sobre amigos, animar a participação de atividades em grupos e brincadeiras associativas, ensinar a vencer ou perder uma disputa. Antunes (1998) entende que nessa fase a educação infantil deve ser repleta de brincadeiras que possibilitem exaltar os sentidos, que levem ao domínio de habilidades, despertem a imaginação, estimulem as cooperações e a compreensão de limite e regras, que estimulem o respeito, a exploração e ampliação dos inúmeros saberes que toda criança possui. 61 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Analisando tudo o que foi pesquisado no decorrer deste trabalho, considera-se que o brincar, é uma atividade natural à criança e que a acompanha em todo o seu desenvolvimento, tanto físico quanto intelectual. Ao longo da contextualização histórica percebe-se a importância que o brincar faz para esse desenvolvimento. Todas as técnicas e estudos que foram desenvolvidos pelos estudiosos de áreas diversas, que não só a da educação tem mostrado que o brincar é tão importante quanto qualquer atividade que a sociedade considere como necessária para a educação das crianças. Numa perspectiva psicológica, verifica-se que sem tal construção - a do brincar, às crianças não conseguiriam se socializar e fazer às descobertas necessárias para cada etapa do desenvolvimento infantil. Percebeu-se essa confirmação com maior precisão através dos estudos de Gardner e Antunes onde se pode verificar a influência dos jogos e do brincar para a expansão das inteligências múltiplas. Respondendo, portanto, ao questionamento inicial desta monografia - O brincar influencia a formação social e cognitiva das crianças na educação infantil? - conclui-se que o brincar influencia de forma positiva na formação dos educandos na educação infantil e que essa inserção do brincar, influenciará o indivíduo por toda a sua vida. Tendo em vista os objetivos gerais e específicos desta pesquisa, conclui-se que: os jogos, brinquedos e brincadeiras usados como uma ferramenta pedagógica caminha para a valorização do desenvolvimento do ensino-aprendizagem na educação infantil; a criança no pré-escolar consegue aprender através de ações espontânea e intuitiva, interagindo e envolvendo-se no jogo ou brinquedo por meio dos processos: cognitivo, afetivo e social; o jogo num sentido integralizado seja o meio estimulador mais eficiente para as inteligências múltiplas, pois no espaço do jogo há a permissão para que a criança realize tudo aquilo que ela deseja, decide sem restrições, no jogo se obtém simbolicamente a satisfação do desejo de ser grandioso; no âmbito social, o jogo impõe o controle dos impulsos, pois há a aceitação das regras pelo os que estão no jogo. Observa-se, portanto que o brincar assume forma e modo de uma nova educação, onde os indivíduos, em especial as crianças, possam sentir-se sujeitos donos de seu caminhar, portanto, livres para expressarem-se através de conhecimentos que se tornam transformadores. O que provavelmente, possa faltar é uma maior conscientização da sociedade educacional e isso inclui escolas públicas e particulares, pois foi percebido através da 62 legislação específica à educação infantil, que as mesmas, têm buscado inserir o brincar como etapa essencial para o desenvolvimento infantil, portanto a aplicabilidade do que está escrito nessa legislação é que deve ocorrer de forma mais efetiva e, para isso uma ampla divulgação e campanha poderiam ajudar de forma mais significativa. Dessa forma, sugere-se que educadores e estudiosos da área se empenhem para que ocorra essa divulgação do que já está escrito na lei e que deve apenas se sedimentar cada vez mais na educação infantil. Sugere-se ainda a inserção nas escolas atividades e jogos direcionados para o desenvolvimento das Inteligências Múltiplas, pois já é comprovado que todos os indivíduos são detentores de várias inteligências, esse é um assunto deveras importante e urge também o envolvimento das universidades e faculdades para promover e fazer a sociedade como um todo compreender que existe a necessidade de valorização do desenvolvimento dessas inteligências, pois as nossas crianças tem todo um potencial que precisa ser bem direcionado e a comunidade acadêmica tem que estar atenta a isto. Recomendam-se as leituras de Howard Gardner e Celso Antunes, que em seus livros. exemplificam e ensinam como vivenciar e desenvolver as inteligências. Portanto, ratificando tudo o que já foi exposto, confirma-se que o brincar é um momento lúdico de valiosa importância para o desenvolvimento cognitivo infantil, e a inserção do brincar na escola significa fazer aprender de forma mais criativa e interessante, e, a educação infantil é sem dúvida, um dos suportes principais para fomentar esse tipo de aprendizado. 63 REFERÊNCIAS ANTUNES, Celso. Pais e educadores estimulando inteligências para o amanhã. Fortaleza: IMEPH, 2008. ______. Novas maneiras de ensinar, novas formas de aprender. Porto Alegre: Artmed, 2002. ______. Jogos para a estimulação das múltiplas inteligências. 13 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental. — Brasília: MEC/SEF, 1998. Volume I. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. 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