BRINQUEDOTECA COMO UM ESPAÇO INCLUSIVO: UMA EXPERIÊNCIA COM CRIANÇA AUTISTA Aretuza de Sousa Lacerda∗ Christina Maria Brazil de Paiva** Vera Lúcia de Brito Barbosa*** RESUMO O brincar é uma ação fundamental para o desenvolvimento da saúde física, emocional e intelectual da criança e muito importante para sua formação futura. Através do brinquedo as crianças aprendem a conviver com as outras crianças, aprendem regras, valores e desenvolve a criatividade. Visando atender os anseios dos alunos e alunas do Curso noturno de Pedagogia que não tinham onde deixar seus filho/as, criou-se um ambiente seguro e divertido para acolher essas crianças e seus pais passarem a assistir aulas com tranquilidade. Para tanto, foi criado uma Brinquedoteca - espaço lúdico onde as crianças vão para brincar de forma espontânea. Este trabalho relata uma experiência desenvolvida com crianças, filho/as, de alunos e/ou funcionários da UFPB. Esta experiência vem apresentando resultados significativos sobre a inclusão de uma criança autista neste espaço. Palavras-chave: brinquedoteca; inclusão; brincar; autismo. RÉSUMÉ La pièce est une action fondamentale pour le développement de son développement physique, affectif et intellectuel des enfants et très important pour leur formation future. A travers les enfants des jouets apprendre à vivre avec les autres enfants, apprendre les règles, les valeurs et développe la créativité. Afin de répondre aux aspirations des garçons et des filles dans Abendkurs de l'éducation qui n'avaient nulle part où laisser leur enfant à l', il a créé un environnement sûr et amusant d'accueillir ces enfants et leurs parents vont assister aux cours avec la facilité. À cette fin, nous avons créé un jouet - aire de jeux où les enfants vont à jouer spontanément. Ce document rend compte d'une expérience menée avec des enfants, des enfants, et, d'étudiants et / ou salariés de UFPB. Cette expérience a montré des résultats significatifs sur l'inclusion d'un enfant autiste dans cet espace. Mots-clés: inclusion jouet; jouer; autisme. 1 Introdução Neste artigo pretende-se relatar uma experiência lúdica que está sendo desenvolvida na Universidade Federal da Paraíba-UFPB. Nesta Instituição de Ensino Superior – IES – existe ∗ Licenciada em Letras pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB (1978). Especialização em Educação Inclusiva pela Fundação Francisco Mascarenhas – Faculdades Integradas de Patos (2009). [email protected] **Pedagoga,Mestre em Educação Especial, Profa.da UFPB/CE/DHP (Orientadora) [email protected]. ***Pedagoga (UFPB), Psicopedagoga, Mestre em Educação (UFRN), Profª.da FIP e FACISA. [email protected] 2 uma preocupação em apoiar a comunidade universitária em geral, na defesa dos direitos humanos, através de iniciativas que forneçam as condições adequadas ao bom aprendizado no ambiente acadêmico e/ou fora dele. Observou-se no turno noturno, em sua maioria, constituído de alunos e alunas que trabalham em expediente integral, muitas vezes com situação financeira difícil, sem poder pagar a cuidadores para ficarem com seus filhos em casa, eram obrigados a trazê-los para a sala de aula. “... no centro do processo pedagógico devem estar no eixo, aqueles que mais têm seus direitos essenciais negados: os pobres e as vítimas da injustiça estrutural”. (ZENAIDE; DIAS, 2001, p.238). Com o propósito de manter a qualidade do ensino/aprendizagem e apoiá-los em seus direitos fundamentais, elaborou-se um projeto de extensão, criando um espaço alternativo para acolher essas crianças. A forma mais viável foi a organização de um espaço lúdico instalado num ambiente do Núcleo de Educação Especial - NEDESP, do Centro de Educação - CE, da UFPB. “As atividades lúdicas fazem parte da vida do ser humano e, em especial, da vida da criança desde o início da humanidade”.(SANTOS, 2004, p.57) Os procedimentos metodológicos utilizados por professores e técnicos para desenvolver as ações com crianças de 03 a 11 anos, incluem várias atividades lúdicas, o que deu origem ao nome Brinquedoteca. Segundo Cunha (1988, p. 411) a Brinquedoteca “É um espaço criado com o objetivo de proporcionar condições, as mais favoráveis, para que a criança brinque: é um lugar onde tudo estimula a ludicidade”. Criada em 2003, a Brinquedoteca do CE tem recebido, meninos e meninas, filhos de alunos dos vários cursos noturnos e de funcionários da instituição, respeitando as suas diversidades. Dentre essas crianças, algumas apresentavam alterações de comportamento, sendo que uma delas, diagnosticada com transtorno invasivo do desenvolvimento (CID 10-autismo). Diante desta realidade, foi necessário a construção de um espaço lúdico inclusivo que atendesse a legislação vigente das políticas públicas inclusivas asseguradas na Constituição Federal 1988. Este artigo apresenta o relato de como se deu o processo de construção da brinquedoteca inclusiva da UFPB. 2 Espaço lúdico da brinquedoteca 2.1 O lúdico através dos tempos A palavra “lúdico” vem do latim “ludus” que significa “jogo”. 3 Desde as mais remotas épocas que os homens desenvolvem atividades lúdicas. Observase nas inscrições e desenhos das cavernas registro de pessoas jogando, dançando, se divertindo, brincando com objetos vários e por vários motivos. “Os indivíduos se divertiam e brincavam, com vários objetivos a serem cumpridos, de tal forma que algumas brincadeiras eram e ainda são consideradas uma preparação para a luta, a disputa, a batalha; muitas civilizações utilizavam essa prática para exercitar seus soldados enquanto outras a usavam como rituais de dança ou de passagem”. (BEZERRA; ALBUQUERQUE, 2000, p.45-46). Significando, originalmente “jogo” a palavra “ludus” ao longo do tempo passou a ser entendida como atividades lúdicas de maneira geral. Segundo LUCKESI, “... as atividades lúdicas são aquelas atividades que propiciam uma experiência de plenitude, em que nos envolvemos por inteiro”. Para Santo Agostinho “o lúdico é eminentemente educativo no sentido em que constitui a força impulsora de nossa curiosidade a respeito do mundo e da vida, o princípio de toda descoberta e toda criação”. Uma epígrafe de Piaget (1988) mostra que “a atividade lúdica é o berço obrigatório das atividades intelectuais da criança, sendo por isso, indispensável à pratica educativa”. A formação lúdica possibilita ao educador conhecer-se como pessoa, saber de suas possibilidades, desbloquear resistências e ter uma visão clara sobre a importância do jogo e do brinquedo para a vida da criança, do jovem e do adulto. (SANTOS, 1997; KISHIMOTO, 1999). Portanto, diante do que foi exposto, compreende-se o lúdico como a diversão, sem a preocupação de cumprir obrigações, o lazer, o jogo, a brincadeira espontânea, que desde o princípio da humanidade fazem parte da evolução do ser humano. É a atividade básica para a aprendizagem. 2.2 O brincar Ato de divertir-se, folgar, entreter-se. É uma realidade necessária a vida de uma criança. Para Santos (2000, p. 124) brincar é: [...] um direito da criança reconhecido em declarações, convenções e leis como a Convenção dos Direitos da Criança de 1989, adotada pela Assembléia das Nações Unidas, a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990. 4 Segundo Cunha (1988), brincar é indispensável à saúde física, emocional e intelectual da criança. É uma arte, um dom natural que quando cultivado vai pouco a pouco construindo o futuro do adulto. Por muito tempo, o brincar foi considerado uma atividade sem importância. Muitas vezes, os pais, os educadores, falavam para as crianças frases rotineiras: “parem de brincar, é hora de estudar”; “em vez de estudar vocês só querem brincar”, não dando o valor devido, muitas vezes por falta de conhecimento às atividades lúdicas. Somente com os avanços da psicologia é que se reconheceu o verdadeiro valor do “brincar e do brinquedo”. Piaget, (1971), Vygotsky (1996), entre outros, observaram que as crianças passam maior parte do seu tempo brincando. É brincando que a criança desenvolve o seu censo de companheirismo, jogando com outras crianças, aprende a conviver em grupo, começa a entender certas regras do ganhar x perder, do acerto x erro e assim, consegue participar das brincadeiras de forma prazerosa. Através do jogo todas as crianças têm as mesmas oportunidades de participar e compreender a si mesmas e ao mundo que as cercam. 2.3 O brinquedo e as brincadeiras 2.3.1 Brinquedo – Objeto que serve para divertir, entreter, adestrar, ensinar e educar. O brinquedo está intimamente relacionado com a criança, em todas as faixas de idade; e, em alguns casos, inclui o próprio adulto. (ENCICLOPÉDIA ABRIL, 1971, p.634). O brinquedo, em geral, está diretamente relacionado à infância. No brinquedo se vê sempre a imagem de uma criança. A criança deve explorar o brinquedo de forma espontânea, mesmo que o resultado não seja o esperado. O importante é observar a linha de pensamento e o que representa de forma que usando a criatividade possa fazer as coisas por elas mesmas, descobrindo e compreendendo. Quando isso acontece a ludicidade estará presente em todos os momentos. 2.3.2 Brincadeiras – Segundo CALDAS AULETE, brincadeira é a ação de brincar, divertimento, folgança. Nas palavras de Wajskop (1995), a brincadeira consiste num fato social, espaço privilegiado de interação, atividade cuja base genética é comum à arte; uma atividade voluntária, consciente e organizada. Na perspectiva Vygostskyana, brincadeira é coisa séria, pois brincando as crianças representam aquilo que mais gostariam de ser, isto é, um constante faz-de-conta. Dessa maneira, as maiores aquisições de uma criança são adquiridas no brinquedo. (BATISTA, MORENO, PASCHOAL, 2004, p. 110 -11,). 5 A brincadeira expressa a forma como uma criança reflete, ordena, desorganiza, destrói e reconstrói o mundo a sua maneira. É também um espaço onde a criança pode expressar de modo simbólico suas fantasias, seus desejos, medos, sentimentos agressivos e os conhecimentos que vai construindo a partir das experiências que vive. (PIAGET, 1968, p.20). Os jogos e brincadeiras infantis são atividades que possibilitam a aprendizagem de várias habilidades. O importante é permitir que a imaginação da criança possa fluir, exercitar suas potencialidades. 2.4 A brinquedoteca Brinquedoteca – universo lúdico onde tudo se cria e se constrói conhecimento. A brinquedoteca é um espaço para brincar. A relação da criança com o brinquedo se manifesta na expansão do seu potencial tanto no nível cognitivo quanto em nível da consciência. Esse espaço cheio de oportunidades, estimula a representação, expressão de imagens que traduz em aspectos da realidade humana. A abrangência desse espaço, possibilita refletir suas implicações na vida, ser sensível e entender que através dela se constrói um mundo melhor. É nesse espaço que se cria as condições favoráveis para se cultivar a sensibilidade, a criatividade indispensáveis à formação da personalidade plena do ser humano. A brincadeira oferece novos espaços para a exploração lúdica, pois nela, se garante o uso livre do brinquedo e do brincar, possibilita a criação de novos brinquedos no seu mundo imaginário e de brincadeiras que expressam suas representações mentais. Sobre a criança podese projetar a esperança de mudança, de transformação social e renovação ética e moral. 3. A brinquedoteca inclusiva da UFPB Conforme as informações colhidas no Projeto de extensão universitária: Brinquedoteca – Um Espaço Criativo (PAIVA; VIÑAS, 2003, p.02), este espaço surgiu a partir da observação, nas salas de aula, que um número significativo de alunos e alunas do curso noturno do Centro de Educação da UFPB, traziam seus filhos quando vinham assistir aulas, por não terem com quem deixá-los em casa. Foi observado que durante a permanência das crianças em sala de aula (mirins acadêmicos), os pais, professores e demais alunos se mostravam intranqüilos e inquietos, dada a interferência negativa no bom andamento das aulas. Muitas crianças entravam e saiam da sala 6 fazendo barulho, tirando a concentração de todos; outras quietas, cochilavam e até dormiam sobre as carteiras. As mães levavam crianças em fase de amamentação e lá mesmo davam de amamentar. (PAIVA; VIÑAS, 2003, p. 05). Estes comportamentos evidenciados prejudicando a aprendizagem dos adultos, suscitou a idéia de oferecer um ambiente seguro, agradável e sobretudo divertido para acolher essas crianças. Sensibilizada com a situação dos alunos, das crianças e dos professores, a Prof. Ms. Christina Maria Brazil de Paiva que também lecionava no turno noturno, por ocasião da matrícula realizou uma sondagem com os alunos e alunas do curso de Pedagogia pela qual foi constatada a real necessidade daqueles alunos e alunas conquistarem um espaço adequado para deixarem os seus filhos. Ocupando, na época, o cargo de coordenadora do Núcleo de Educação Especial – NEDESP, expôs o problema e toda a equipe técnica demonstrou interesse apresentando sugestões em utilizar uma das salas do NEDESP, para receber essas crianças. A partir de então elaborou-se um projeto de extensão universitária com o título de Brinquedoteca – Um Espaço Criativo, que foi aprovado pela Pró - Reitoria de Extensão Universitária –PRAC, e contemplado com um bolsista. Foram adotados os procedimentos necessários à organização da brinquedoteca: estabelecidos critérios para inscrição e seleção das crianças – faixa etária de 03 a 11 anos de idade, filhos de alunos e alunas matriculados no curso noturno e/ou funcionários da instituição; máximo de 20 crianças por noite; funcionamento de 19:00 às 22:00 horas. Foi formada uma equipe multiprofissional com pedagogo, psicopedagogo, psicólogo, assistente social, educador físico, técnico em educação, e outros profissionais do NEDESP, para planejar, operacionalizar, acompanhar as ações pedagógicas, atividades lúdicas e o atendimento especializado, quando necessário. O objetivo principal dessa ação foi o de apoiar os alunos e alunas do curso de pedagogia para que pudessem deixar seus filhos em local adequado, enquanto se encontravam em atividades acadêmicas, desenvolvendo assim, um trabalho eminentemente preventivo, evitando risco de qualquer natureza (acidentes, agressões, problemas de caráter emocional e social), bem como, oferecer campo de ensino, pesquisa e extensão, além de estágio supervisionado. Ao longo de seis anos de funcionamento desta brinquedoteca, observou-se que algumas crianças apresentavam condutas pouco adequadas, tais como: hiperatividade, dificuldades de aprendizagem, entre outros distúrbios de comportamento. Há cerca de 03(três) anos se acompanha uma criança que, posteriormente, foi diagnosticada como portadora de transtorno invasivo do desenvolvimento TID (CID 10 – autismo). Diante dessa nova realidade, a equipe reuniu-se para reelaborar um planejamento que pudesse melhor atender às necessidades especiais dessa criança que requer estratégias 7 educativas diferenciadas no sentido de ser integrada nas atividades e brincadeiras com as demais crianças. A primeira medida foi a criação de um grupo de estudos sobre a inclusão da diversidade, em especial, o autismo. 3.1 Inclusão A educação faz parte da construção gradativa do ser humano, favorecendo consideravelmente na formação de uma personalidade psicologicamente sadia e socialmente adequada. A inclusão social é uma meta que se pretende melhorar a vida de todas as pessoas, seja ela em situação de deficiência, ou não. O estigma da exclusão na sociedade ainda é uma barreira que afronta a dignidade humana, o direito de ir e vir no exercício de sua cidadania. Uma sociedade torna-se inclusiva quando ela experimenta um novo olhar para todo e qualquer cidadão, que busque as eficiências de cada ser, para fazê-lo crescer, evoluir, ser reconhecido como ser humano. A educação inclusiva deve envolver toda a comunidade e começa na família. O apoio, solidariedade, amor, criatividade, são algumas das estratégias de inclusão social, que permitem ultrapassar as limitações neurológicas e psicológicas existentes na pessoa em situação de deficiência. O resultado dessa combinação, da iniciativa familiar, do trabalho eficiente de profissionais especialistas e do acompanhamento educacional, possibilita o encontro de soluções para a comunicação e integração da pessoa com deficiência, e como conseqüência, sua participação, convivência, socialização, enfrentamento das questões circunstanciadas num mundo dito globalizado. A maioria dos países do mundo vem discutindo políticas públicas de inclusão de pessoas com deficiências, independente de sua origem social ou cultural. Na década de 90, com a Declaração Mundial de Educação para Todos (UNESCO, 1990) e a partir da Declaração de Salamanca (1994), Leis, Seminários, Conferências, tem provocado mudanças e transformações necessárias a uma nova postura de uma sociedade inclusiva. INCLUIR É LEI! Quando cumprida, pode-se dizer que existe uma sociedade justa e igualitária, onde todos têm os mesmos direitos. 3.2 Autismo O autismo é uma síndrome diagnosticada como transtorno invasivo do desenvolvimento (CID 10). É definido como um comprometimento da chamada tríade, ou 8 seja, as três áreas importantes do desenvolvimento: da comunicação, da interação social e da imaginação. Essa síndrome atinge o indivíduo em todas as épocas e culturas, embora ainda não tenham sido descobertas suas causas. Até os anos 70, era vista como uma psicose e, somente nos anos 90, estudos levantaram questionamentos sobre a existência de déficit cognitivos relacionados a déficit afetivo e social. (BARBOSA, 2006). Essa forma de perceber a questão do autismo vem direcionando a um acompanhamento educativo e não apenas psicológico ligado às doenças mentais. A pessoa com essa síndrome, apresenta uma dificuldade de estabelecer relações com as outras, atraso na linguagem, obsessão em manter o ambiente sem mudanças, tendência de repetir uma série de atividades ritualizadas. Existe hoje um consenso geral por parte de pesquisadores, quanto a sua educação. Para eles a educação seria um caminho para a sua evolução, por oferecer oportunidades de conviver com outras crianças, num programa educacional direcionado que favoreça ao máximo o desenvolvimento de suas possibilidades, competência, equilíbrio pessoal, de forma mais harmoniosa possível, promover o bem-estar emocional e aproximá-las do mundo humano e de relações significativas (COLL, 1995). Daí se percebe a necessidade e a importância dessas crianças participarem de escolas regulares, para uma convivência integradora que possa ajudá-las na superação de suas dificuldades. Algumas características do autista: dificuldade de manter contato visual, comporta-se como se fosse surdo, rejeita o contato físico, resiste à mudança de rotina, apresenta comportamentos estereotipados, usa pessoas como ferramenta, às vezes é agressivo e destrutivo, tem atraso na linguagem e ecolalia. Compreende-se desta forma, a necessidade de um programa educacional direcionado para o desenvolvimento das possibilidades e competências dessa criança para uma inclusão em Escolas regulares e no meio social em que convive. 3.2.1 Procedimentos adotados para a inclusão Essa criança do sexo masculino chegou à brinquedoteca com a idade cronológica de 03 anos, ainda sem ser identificada com a síndrome. Ela era indiferente a tudo: não desenvolvia nenhuma relação com os objetos nem com as pessoas; não sorria, não falava, não fixava o olhar nas pessoas; olhava de forma monótona e distante e mostrava total aversão ao ser tocada. A sua relação com o ambiente se restringia exclusivamente a fazer barulho com gritos e tudo que pegava lançava ao chão. Diante desses comportamentos, passou-se a observá-la com mais 9 atenção, chegando-se a uma conclusão de que esta criança precisava ser avaliada por um profissional da saúde (neurologista). Após avaliação médica, foi detectada a síndrome do autismo e traçada uma terapia medicamentosa pelo profissional de saúde que passou a acompanhá-la psicologicamente. Elaborou-se então, um programa de prioridades a serem trabalhadas com a criança autista numa abordagem pedagógica por um profissional de experiência comprovada na área (psicopedagogo) que começou a desenvolver um processo de intervenção junto com as outras crianças não autistas, explorando a comunicação, a linguagem, o desenvolvimento da atenção e mudança no comportamento (relação com as pessoas e com os objetos, alteração motora – estereótipos, auto-agressão e rituais) e ações pedagógicas: leitura de estórias infantis musicalizadas, uso de instrumentos musicais (flauta, pandeiro). Além dos profissionais do NEDESP, participam de forma efetiva das atividades, uma aluna bolsista do PROBEX, um aluno extensionista e três alunos voluntários. Seus pais recebem orientação sempre que a criança apresenta um comportamento inapropriado, por uma ação positiva e/ou negativa, para juntos trabalharem o mesmo objetivo. O encontro dessa criança com as demais (meninos e meninas), acontece semanalmente, de segunda a quinta-feira, durante três horas/noite num mesmo espaço lúdico - a brinquedoteca. Este momento prazeroso permite a proximidade com as outras pessoas, a participação em brincadeiras (cantiga de roda, jogos motores, bola, academia, círculo). Além dessas ações, outras paralelas foram aplicadas no sentido de favorecer a receptividade e cooperatividade do grupo; orientou-se as demais crianças da necessidade dessa criança aprender a brincar (a mesma não sabia brincar), fazer amigos, se expressar, falar, precisando de ajuda e persistência quando ela não respondia prontamente ao que se propunha; ignorar os comportamentos como gritos, falar devagar na frente dela, para despertar seu interesse pela brincadeira, desenvolver habilidades sociais (como se apresentar, pedir algo ao outro, cumprimentar, na chegada e na saída). O local onde funciona a Brinquedoteca é uma sala de aproximadamente trinta metros quadrados de área, possui uma certa variedade de brinquedos, com ambientes organizados ( casa de bonecas, roupas para dramatização, ambiente de leitura, teatrinho de fantoches, local para descanso com almofadas). Numa sala ao lado as crianças assistem vídeos infantis, escutam músicas e dançam de forma descontraídas. Pretendeu-se com o funcionamento desse espaço lúdico, dar visibilidade a prática de diferentes recursos pedagógicos que pudessem produzir efeitos na convivência com a diversidade. 4. Resultados alcançados 10 A soma de esforços da instituição, da família, da comunidade universitária, possibilitou respostas positivas no comportamento dessa criança, mediadas pelas ações pedagógicas ali desenvolvidas. Com a implementação dessas ações, já se percebe um certo grau de independência pessoal – lanchar com o grupo, lavar as mãos, usar o banheiro para satisfazer suas necessidades fisiológicas (antes fazia na sala), manusear livros infantis, organizar o ambiente após as brincadeiras. Criou-se um vínculo de afetividade e amizade, tanto por parte das crianças como dos profissionais envolvidos na brinquedoteca, eliminando resistências existentes ou distinção a sexo, faixa etária ou qualquer diferença. As outras crianças criam momentos divertidos para que essa criança participe cada vez mais das brincadeiras. Mesmo assim, ela ainda necessita de um monitoramento permanente em todas as suas manifestações comportamentais. 5. Considerações finais Em todo o processo de construção do espaço lúdico inclusivo, buscou-se criar um ambiente acessível, facilmente compreendido oportunizando trabalhar as diferenças, fortalecendo o espírito de cooperação e de integração entre as crianças, potencializando a capacidade intelectual, emocional e motora, com ênfase a sensibilidade de cada uma delas, podendo tornar evidente a idéia de que todos podem brincar juntos. A brinquedoteca vem correspondendo aos objetivos de acolher os filhos e filha dos alunos e alunas do CE e de outros Centros, de maneira significativa, estimulando às crianças brincarem livremente, dando-lhes oportunidades de conviverem com a diversidade e desenvolverem-se como pessoas autônomas. A convivência com a criança autista propiciou trabalhar uma dinâmica diferente num espaço lúdico inclusivo onde todos brincam e aprendem a conviver com a diferença em várias dimensões, linguagem, comportamento e o ato de brincar. Esta experiência foi relevante no sentido de aprender juntos como integrar uma criança autista com as outras crianças e com os adultos, no processo de aprendizagem de valores: respeito mútuo, verbalização, regras de convivência, hábitos higiênicos e organização do ambiente. A brinquedoteca tornou-se um espaço rico para a experiência da cultura lúdica a ser vivenciada por futuros educadores, mediadores e brinquedistas, direcionada ao processo de aprendizagem da criança. A experiência comprovou que ações simples, práticas, uso de brinquedos de baixo custo, podem ser realizadas mesmo em espaços reduzidos. Essas ações associadas a outras de caráter 11 pedagógico, proporciona momentos participativos, integrados, aptos a promover a interação e aprendizagem na vida da criança. A atividade lúdica desperta para a vivência da sua própria infância e escolaridade. Resgata a memória da infância vivida pelos adultos quando estão criando as brincadeiras. No espaço lúdico dessa Brinquedoteca, vem se cumprindo uma função importante, a de se trabalhar a criança com TID (autismo) e oferecer as condições necessárias para o seu ingresso futuro numa sala de aula regular de ensino. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Anne. Ludicidade como instrumento pedagógico. Disponível em: <http://www.cdof.com.br/recrea 22.htm.> Acesso em 12 maio 2009. In Aprender Brincando: o lúdico na aprendizagem autora. Juliana Tavares Maurício. ALMEIDA, Paulo Nunes de. Educação lúdica: técnicas e jogos pedagógicos. São Paulo: Loyola, 1994. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 6023: informação e documentação: elaboração: referências. 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