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Internacional Journal of Cardiovascular Sciences. 2015;28(1):70-77
ARTIGO ORIGINAL
Segurança do Teste de Caminhada de Seis Minutos em Cardiopatas
Hospitalizados
Safety of the Six-Minute Walk Test in Hospitalized Cardiac Patients
Pryscilla Alves Ferreira1, Palmireno Pinheiro Ferreira1, Anne Karine Menezes Santos Batista2,
Fernanda Warken Rosa3
Universidade Federal da Bahia - Hospital Universitário Professor Edgard Santos - Serviço de Fisioterapia - Salvador, BA - Brasil
Secretaria de Saúde do Estado da Bahia - Programa de Residência em Fisioterapia Hospitalar - Salvador, BA - Brasil
3
Universidade do Estado da Bahia - Departamento de Ciências da Vida - Salvador, BA - Brasil
1
2
Resumo
Fundamentos: Não há respaldo na literatura para atestar a segurança da aplicação do teste de caminhada de
seis minutos (TC6M) em cardiopatas hospitalizados.
Objetivo: Identificar os efeitos adversos ocorridos durante a realização do TC6M em cardiopatas hospitalizados.
Métodos: Trata-se de estudo observacional, transversal, realizado em 30 portadores de cardiopatia que se
encontravam hospitalizados. Neles foram realizadas duas práticas do TC6M em um corredor de 20 metros. Foram
coletados a distância percorrida, os parâmetros cardiorrespiratórios e os sinais de intolerância ao esforço físico.
Os efeitos adversos identificados em ambas as práticas foram classificados em: não cardiopulmonares e
cardiopulmonares, sendo neste último grupo, subdivididos em não graves e graves.
Resultados: Observaram-se efeitos adversos nas duas práticas do TC6M em 15 (50,0%) pacientes, sendo
identificados: artralgia em membros inferiores (MMII), palpitação dispneia, dessaturação, tontura, náusea,
hipotensão, bradicardia e dormência em membro superior esquerdo. Dos 30 pacientes, identificou-se em 4 (13,3%)
pacientes efeitos adversos do tipo grave, sendo os 4 (100%) portadores de hipertensão arterial sistêmica (HAS) e
3 (75,0%) também com diagnóstico de insuficiência coronariana (ICO) e dislipidemia (DLP).
Conclusão: No TC6M, foi identificada uma baixa frequência de eventos adversos graves em pacientes cardiopatas
sob condição de hospitalização a partir de dois dias da sua admissão.
Palavras-chave: Segurança do paciente; Cardiopatias; Caminhada
Abstract (Full texts in English - www.onlineijcs.org)
Background: There is no evidence in the literature to attest the safety of the six-minute walk test (6MWT) in hospitalized cardiac
patients.
Objective: To identify adverse events during the course of the 6MWT in hospitalized cardiac patients.
Methods: This is an observational, cross-sectional, conducted in 30 patients with heart disease who were hospitalized. Two 6MWT
practices were carried along a 20-meter corridor. The distance traveled, the cardiorespiratory parameters and signs of intolerance
to physical exertion were collected. The adverse effects identified in both practices were classified as non-cardiopulmonary and
cardiopulmonary, and in the latter group, divided into non-serious and serious.
Results: Adverse effects were observed in both 6MWT practices in 15 (50.0%) patients, and the following were identified: lower
limb (LL) arthralgia, palpitation, dyspnea, desaturation, dizziness, nausea, hypotension, bradycardia, and numbness in the left arm.
Of the 30 patients, 4 (13.3%) patients presented severely adverse effects. All of the 4 (100%) patients had hypertension (SAH) and
3 (75%) were diagnosed with coronary artery disease (ICO) and dyslipidemia (DLP).
Conclusion: In the 6MWT, a low frequency of serious adverse events was found in cardiac patients hospitalized two days after
admission.
Keywords: Patient safety; Heart diseases; Walking
Correspondência: Pryscilla Alves Ferreira
Rua Augusto Viana, s/nº - Canela - 40110-060 - Salvador, BA - Brasil
E-mail: [email protected]
DOI: 10.5935/2359-4802.20150010
Artigo recebido em 02/08/2014, aceito em 28/01/2015, revisado em 11/02/2015.
Int J Cardiovasc Sci. 2015;28(1):70-77
Artigo Original
Ferreira et al.
Segurança do Teste de Caminhada de Seis Minutos
Introdução
Métodos
Testes de caminhada são amplamente utilizados desde
19601. Uma variedade deles é encontrada na literatura,
sendo o teste de caminhada de seis minutos (TC6M)
aquele considerado o melhor tolerado e o mais reflexivo
das atividades de vida diária porque configura um
estresse submáximo2,3.
Trata-se de um estudo observacional, transversal,
realizado na enfermaria de cardiologia de hospital
universitário federal, em Salvador, BA, entre dezembro
de 2011 e fevereiro de 2012.
A realização do TC6M pode estar associada a diversos
objetivos, principalmente: avaliação da resposta a condutas
terapêuticas; obtenção de um indicador de capacidade
funcional; e predizer morbidade e mortalidade em pacientes
com doenças respiratórias e cardiovasculares1. Com essas
finalidades, o TC6M já foi amplamente pesquisado em
cardiopatas no cenário ambulatorial, principalmente em
portadores de insuficiência cardíaca crônica (ICC)4.
No entanto, existem poucas descrições na literatura sobre
a segurança da realização do TC6M, principalmente em
pacientes hospitalizados. Gerson et al.5 avaliaram a
segurança do TC6M em 20 pacientes acompanhados
ambulatorialmente com diagnóstico de ICC refratária e
indicação de transplante cardíaco eletivo. Eles observaram
a ocorrência de dor em membros inferiores (MMII),
dispneia, precordialgia, palpitação e tontura. Estudo
realizado por Nogueira et al.6 avaliou a segurança do
TC6M em pacientes com infarto agudo do miocárdio
(IAM) e verificaram queixa de dor precordial entre os
pacientes avaliados.
Pacientes hospitalizados frequentemente experimentam
o repouso no leito e a mobilização, a princípio, pode estar
associada à hipotensão postural7. Dias et al.7 encontraram
esse evento adverso quando avaliaram pacientes
hospitalizados por síndrome coronariana aguda (SCA).
No entanto, essa avaliação não utilizou o TC6M, mas foi
feita através de uma caminhada limitada pela distância
de 50 metros. Além disso, a causa da internação numa
unidade de cardiologia, como por exemplo, por
descompensação da ICC, cirurgias, angina ou outros
motivos, podem tornar os pacientes mais suscetíveis aos
riscos associados à mobilização.
O TC6M possui poucos relatos que descrevem os seus
efeitos adversos, principalmente quando aplicado ao
paciente cardiopata hospitalizado. O conhecimento
científico mais específico quanto à segurança do TC6M
em cardiopatas poderia minimizar o aparecimento de
respostas clínicas adversas.
Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi identificar os
efeitos adversos ocorridos durante a realização do TC6M
em cardiopatas hospitalizados e apresentar as
características clínicas desses pacientes.
71
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
do Hospital Universitário Professor Edgard Santos sob
o nº 66/2011 e todos os participantes assinaram o Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido.
Amostra consecutiva de conveniência, tendo sido incluídos
no estudo indivíduos com idade ≥18 anos, portadores de
cardiopatia confirmada em prontuário médico, com
liberação médica para realização do TC6M e orientados no
tempo e no espaço. Foram excluídos do
ABREVIATURAS E
estudo aqueles que apresentaram
ACRÔNIMOS
alterações osteomioarticulares que
impossibilitassem a caminhada, que
•DLP – dislipidemia
estavam em uso de oxigenoterapia
•FA – fibrilação atrial
contínua e os que permaneceram
•FC – frequência cardíaca
internados tempo insuficiente para
•HAP – hipertensão arterial
realização da avaliação.
pulmonar
Obtida a liberação médica para
caminhar, eram coletados os dados
clínicos (diagnóstico da admissão,
comorbidades, altura, peso,
medicamentos em uso, dentre outros)
dos prontuários dos pacientes. Em
seguida, realizado o TC6M através de
duas práticas: a primeira para
familiarizar o paciente em relação à
técnica e, após 15 minutos de intervalo
e/ou retomada dos parâmetros
fisiológicos basais, a segunda prática.
•ICC – insuficiência cardíaca
crônica
•ICO – insuficiência
coronariana
•MMII – membros inferiores
•PAD – pressão arterial
diastólica
•PAS – pressão arterial
sistólica
•SpO2 – saturação periférica
de oxigênio
•TC6M – teste de caminhada
de seis minutos
Antes de cada TC6M, o paciente permanecia sentado por
pelo menos cinco minutos enquanto recebia as instruções
para a sua realização. Depois, em ortostase, eram aferidas:
pressão arterial sistólica (PAS), pressão arterial diastólica
(PAD), frequência cardíaca (FC), saturação periférica de
oxigênio (SpO 2) e percepção subjetiva de esforço
respiratório e de MMII. Dando início ao TC6M, minuto
a minuto, foram registradas FC, SpO 2 e sinais de
intolerância ao esforço físico, como: dor, tontura, palidez,
palpitações, dispneia, etc. do paciente. Essas variáveis
eram também avaliadas caso o paciente parasse a
caminhada. Imediatamente após o final ou interrupção
do TC6M e após dois minutos de recuperação, as
variáveis da fase pré-teste foram mensuradas novamente.
Caso o paciente apresentasse qualquer sintoma ou
intercorrência grave, como: tontura importante,
bradicardia, hipotensão sintomática, dor precordial,
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Ferreira et al.
Segurança do Teste de Caminhada de Seis Minutos
dentre outros, que o colocasse em risco, estava programada
a interrupção imediata do teste, o encaminhamento do
paciente ao leito, a comunição do ocorrido à equipe
médica e de enfermagem e a realização dos procedimentos
necessários para estabilização do quadro.
A distância percorrida foi obtida ao final do TC6M.
Durante a realização do teste, o paciente caminhou por
seis minutos, num corredor de 20 metros, plano e reto,
na própria enfermaria, sob estímulos verbais padronizados
a cada minuto. O paciente era orientado a andar o mais
rápido que pudesse, não podendo correr, com
possibilidade de parada para descanso sem que houvesse
interrupção do teste3.
A identificação dos efeitos adversos foi realizada a partir
de uma avaliação subjetiva, baseada nos sinais e
sintomas; e uma objetiva ligada à monitoração
cardiorrespiratória. Como efeitos adversos relacionados
à realização do TC6M, foram considerados: queixa de
dor precordial, queda da FC, queda da PAD, aumento
da PAD >120 mmHg nos normotensos ou >140 mmHg
nos hipertensos, queda sustentada da pressão PAS
sintomática, aumento da PAS >200 mmHg, queda da
SpO 2 <90%, tontura, palidez, náuseas, sudorese,
palpitações, pré-síncope, dispneia, perda de dispositivos
invasivos, queda, dor, dentre outros que ocorressem em
quaisquer momentos das duas práticas do TC6M8.
Os efeitos adversos identificados ao TC6M foram
classificados de acordo com a sua origem em: não
cardiopulmonares e cardiopulmonares. Neste último
grupo, os efeitos adversos foram agrupados em: não
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Artigo Original
graves e graves, ou seja, aqueles que requeressem
repouso ou medidas terapêuticas imediatas.
Para monitoração da percepção subjetiva de esforço
respiratório e de fadiga de MMII foi utilizada a escala de
Borg 9. A aferição da PAS e PAD foi realizada com
esfignomanômetro digital (G-TECH®, Plymouth – USA),
utilizando as orientações contidas no respectivo manual.
A FC e a SpO2 foram obtidas através de oxímetro de pulso
(Nonin®, Providence – USA). A duração da caminhada
foi medida através de um cronômetro digital.
Os dados foram analisados pelo programa estatístico
SPSS versão 17. As variáveis categóricas foram expressas
em valores absolutos e em percentuais e as variáveis
contínuas, em medidas de tendência central e dispersão.
Resultados
Inicialmente, 49 pacientes foram incluídos no estudo,
sendo excluídos: 10 pacientes por incapacidade de
deambular, 5 porque receberam alta antes da realização
do teste, 3 por recusa e 1 pelo uso de oxigenoterapia
contínua. Sendo assim, foram incluídos na análise
30 pacientes: 9 homens e 21 mulheres.
Na Tabela 1, são apresentadas as características clínicas
dos cardiopatas analisados.
Na Tabela 2, são apresentadas as variáveis: índice de
massa corpórea (IMC), diagnóstico médico à admissão,
definição do tratamento, comorbidades, classe funcional
da ICC e medicamentos utilizados.
Tabela 1
Características clínicas dos pacientes estudados
Variáveis
Média±DP
Min
Max
Mediana
Idade (anos)
58,5±13,4
23
84
57
IMC (kg/m²)
25,1±4,6
17
35
24
Fração de ejeção (%)*
58,8±13,8
29
77
63
2,9±3,0
1
14
2
Distância percorrida no 1º TC6M (m)
295,9±81,6
160
454
293
Distância percorrida no 2º TC6M (m) †
322,8±80,4
200
473
315
Tempo entre admissão e realização do 1º TC6M (dias)
IMC - índice de massa corpórea; TC6M - teste de caminhada de seis minutos; DP - desvio-padrão; Min - valor mínimo; Max - valor máximo
(*) Considerada ecocardiografia realizada nos últimos seis meses; dado referente a 20 pacientes; (†) Dado referente a 26 pacientes.
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Segurança do Teste de Caminhada de Seis Minutos
Tabela 2
Variáveis clínicas da população estudada (n=30)
Variáveis
Diagnóstico à admissão
Comorbidades
Classe Funcional – NYHA‡
Medicamentos
n
%
ICC
20
66,7
ICO
6
20,0
BAVT*
4
13,3
HAS
21
70,0
DLP
12
40,0
Exposição ao tabagismo†
12
40,0
DM
9
30,0
HAP
9
30,0
Etilismo
8
27,0
Doença osteoarticular
6
20,0
FA
6
20,0
DRC
3
10,0
I
9
34,6
II
12
46,2
III
5
19,2
Diurético
20
66,7
IECA
13
43,3
Betabloqueador
13
43,3
Anticoagulante
11
36,7
Antiagregante plaquetário
11
36,7
Bloqueadores de canais de cálcio
9
30,0
Vasodilatador
8
26,7
BRA
8
26,7
Antiarrítmico
7
23,3
Alfa-agonista
2
6,7
ICC - insuficiência cardíaca crônica; ICO - insuficiência coronariana; BAVT - bloqueio atrioventricular total; HAS - hipertensão arterial
sistêmica; DLP - dislipidemia; DM - diabetes mellitus; HAP - hipertensão arterial pulmonar; FA - fibrilação atrial; DRC - doença renal
crônica; NYHA - New York Heart Association; IECA - inibidor da enzima conversora da angiotensina; BRA - bloqueador do receptor da
angiotensina
(*) Já submetidos à correção cirúrgica com implante de marca-passo definitivo; (†) Exposição ativa em qualquer momento da vida (atual ou
passada); (‡) Exceto os pacientes com BAVT
Na Tabela 3, são observadas as variáveis hemodinâmicas
referentes à segunda prática do TC6M.
Da população estudada, 15 (50,0%) pacientes
apresentaram efeitos adversos em qualquer uma das duas
práticas de TC6M. Sendo que 5 (16,6%) apresentaram
apenas na primeira prática do TC6M, 2 (6,6%)
apresentaram apenas na segunda e 8 (26,6%) pacientes
em ambas as práticas. Na Tabela 4, dos 30 pacientes
analisados, observou-se que 5 (16,7%) pacientes
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Segurança do Teste de Caminhada de Seis Minutos
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apresentaram efeito adverso do tipo cardiopulmonar;
11 (36,7%) apresentaram do tipo cardiopulmonar não
grave; e 4 (13,3%) pacientes apresentaram do tipo
cardiopulmonar grave. Em relação aos 15 pacientes que
apresentaram efeitos adversos, foram identificados:
artralgia MMII (33,3%), palpitação (26,7%), dispneia
(26,7%), dessaturação (13,3%), tontura e náusea (6,7%),
hipotensão (13,3%), bradicardia (6,7%) e dormência em
membro superior esquerdo (6,7%). As características dos
pacientes que apresentaram estes afeitos adversos são
apresentadas na Tabela 4.
Na Tabela 5 apresenta-se a distribuição dos eventos adversos
de acordo com as comorbidades presentes nos pacientes.
Não foram constatadas ocorrências de efeitos adversos
nos portadores de bloqueio atrioventricular total (BAVT)
em uso de marca-passo.
Tabela 3
Variáveis hemodinâmicas referentes ao segundo TC6M, na população estudada
Variáveis
Pré
Pós
Recuperação
Δ Pré e Pós
Δ Pós e Recuperação
Média±DP
Média±DP
Média±DP
Mediana
Mediana
PAS (mmHg)
114,2±20,1
128,2±27,6
11,6±23,5
14,0
-11,6
PAD (mmHg)
71,3±14,2
75,6±14,2
72,5±15,1
4,2
-3,0
FC (bpm)
73,0±15,2
85,7±24,2
73,5±15,2
12,6
-12,2
8 342,9±2 212,9
11 023,0±3 804,6
8 569,8±2 411,0
2 680,1
-2 453,0
Borg R
6,3±0,6
7,9±3,6
6,4±1,2
1,6
-1,5
Borg MMII
6,5±1,6
8,0±3,4
6,7±1,6
1,4
-1,2
SPO2 (%)
97,8±0,9
97,0±3,3
97,8±1,0
-0,8
0,8
DP (mmHg.bpm)
TC6M - teste de caminhada de seis minutos; PAS - pressão arterial sistólica; PAD - pressão arterial diastólica; FC - frequência cardíaca;
DP - duplo-produto; SpO2 - saturação periférica de oxigênio
(*) Análise de 26 pacientes, pois quatro foram excluídos por não terem realizado a segunda prática do TC6M devido à ocorrência de evento
adverso grave na primeira.
Tabela 4
Efeitos adversos observados durante os TC6M
Efeitos
n
%
Não cardiopulmonares
5
16,7†
5
33,3*
11
36,7†
Palpitação
4
26,7*
3 com FA crônica
Dispneia
4
26,7*
2 com HAP
Dessaturação
2
13,3*
2 com ICC e relato de tabagismo
Tontura + náusea
1
6,7*
com HAP
4
13,3†
Hipotensão sintomática
2
13,3*
1 com ICO, DLP e HAS e
1 com ICC e HAS
Bradicardia
1
6,7*
com ICO, DLP e HAS
Dormência em MSE
1
6,7*
com ICO, DLP e HAS
Artralgia em MMII
Características dos pacientes
3 com doença osteoarticular
Cardiopulmonares
Não graves
Graves
TC6M - teste de caminhada de seis minutos; MMII - membros inferiores; FA - fibrilação atrial; HAP - hipertensão arterial pulmonar;
ICO - insuficiência coronariana; DLP - dislipidemia; HAS - hipertensão arterial sistêmica; ICC - insuficiência cardíaca crônica; MSE - membro
superior esquerdo
(*) frequência relativa aos 15 pacientes que apresentaram efeitos adversos; (†) frequência relativa aos 30 pacientes que realizaram o TC6M
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Ferreira et al.
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Tabela 5
Distribuição dos efeitos adversos de acordo com as comorbidades presentes nos pacientes estudados
HAS
(n=21)
Artralgia
DLP Exposição ao tabagismo* HAP
FA
(n=12)
(n=12)
(n=9) (n=6)
Doença osteoarticular
(n=6)
4
2
-
2
1
3
Palpitação
2
1
1
1
3
2
Dispneia
-
-
1
2
1
1
Dessaturação
2
2
2
-
-
-
Tontura + náusea
-
-
-
1
-
-
Hipotensão sintomática
2
1
-
1
1
-
Bradicardia
1
1
1
-
1
-
Dormência em MSE
1
1
-
1
-
-
Efeitos adversos cardiopulmonares
Não graves
Graves
HAS - hipertensão arterial sistêmica; DLP - dislipidemia; HAP - hipertensão arterial pulmonar; FA - fibrilação atrial; MSE - membro superior
esquerdo
(*) Exposição ativa em qualquer momento da vida (atual ou passada)
Discussão
O TC6M demonstrou ser um instrumento seguro para
avaliação de cardiopatas hospitalizados. Embora tenha
ocorrido efeito adverso em metade dos pacientes do
estudo, deve-se considerar que cada um deles realizou
duas práticas de TC6M. Além disso, foram considerados
graves apenas os eventos ocorridos em quatro indivíduos
e em todos os sinais observados houve remissão total
apenas com o repouso, sem necessidade de intervenção
médica.
Neste estudo, foram encontrados 21 indivíduos com HAS
e 20 com ICC. Além disso, verificou-se entre os pacientes
uma média de fração de ejeção de 58,8% e mediana de
63,0%. Esses dados demonstram a baixa gravidade dos
pacientes estudados e a presença de ICC com função
sistólica preservada entre os participantes10.
O tempo entre a admissão hospitalar e a realização do
primeiro TC6M foi em média 2,9 dias e mediana de dois
dias, demonstrando a precocidade na avaliação do
desempenho da caminhada. Nesta pesquisa, a
variabilidade de tempo entre a admissão e a realização
do TC6M ocorreu devido à necessidade de liberação
médica para realização do teste, que acontecia quando o
paciente apresentava classe funcional ≤ III, baseada na
New York Heart Association 11. Portanto, em alguns
pacientes foi necessário aguardar a compensação da ICC
para depois realizar o TC6M, impedindo que a aplicação
do teste ocorresse logo após a admissão.
Em relação ao tempo para o início da reabilitação
cardíaca, a Sociedade Brasileira de Cardiologia recomenda
que esta ocorra ainda na fase hospitalar e que esteja
atrelada a uma avaliação funcional do paciente, sendo o
TC6M considerado uma valiosa ferramenta 11-13 .
Corroborando os resultados do presente trabalho e
reafirmando a importância de uma mensuração funcional
precoce, Dias et al. 7 avaliaram pacientes com SCA
aproximadamente dois dias após a admissão na unidade
de cuidados intensivos. No entanto, essa avaliação
ocorreu através de um teste limitado pela distância de
50 metros7. Já o TC6M, usado no presente estudo, é
limitado pelo tempo, sendo a distância percorrida pelo
indivíduo variável conforme a sua capacidade e passível
de ser usada como valor prognóstico14.
O TC6M é amplamente utilizado no meio científico e
assistencial, no entanto a segurança da sua aplicação era
pouco esclarecida, principalmente em relação aos
pacientes hospitalizados e mais vulneráveis a efeitos
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Ferreira et al.
Segurança do Teste de Caminhada de Seis Minutos
adversos do que os indivíduos em acompanhamento
ambulatorial. Dos 30 participantes deste trabalho, os
quais se encontravam assintomáticos antes da avaliação,
15 (50,0%) apresentaram efeitos adversos em qualquer
uma das duas práticas do TC6M. Este dado não
inviabiliza a realização do TC6M na prática clínica, uma
vez que a maioria dos efeitos adversos identificados não
foi considerada grave e todos tiveram reversibilidade
espontânea com o repouso. Ainda assim, ratifica-se a
importância da disponibilidade dos recursos de suporte
de vida já recomendados pela American Thoracic Society
durante a realização do referido teste3.
Dentre os efeitos adversos identificados neste estudo, os
que mais ocorreram foram artralgia em MMII, palpitação
e dispneia. Os achados deste estudo concordam com os
encontrados por Gerson et al. 5 cuja avaliação foi
direcionada para pacientes com ICC refratária e indicação
eletiva de transplante cardíaco5; com o de Nogueira et al.6
que avaliaram 25 pacientes com aproximadamente uma
semana após IAM; com a avaliação de aproximadamente
2 300 pacientes realizada por Enright et al.15 No entanto,
diferente do presente estudo, esses trabalhos não
descreveram possíveis justificativas para seus achados.
Dos 30 pacientes estudados, 4 (13,3%) apresentaram
eventos classificados como do tipo grave (hipotensão
sintomática em 2, bradicardia em um e dormência no
MSE em outro), sendo que todos eles eram portadores
de HAS e 3 (75,0%) tinham diagnóstico de ICO e DLP.
Chamamos atenção para essas três condições clínicas.
Primeiramente é importante salientar que HAS e DLP
são importantes fatores de risco para ICO. A predileção
dos efeitos adversos em relação aos pacientes
coronariopatas possivelmente ocorreu em função da
própria fisiopatologia dessa doença. A ICO se caracteriza
por um desequilíbrio entre a oferta e o consumo de
oxigênio pelo miocárdio consequente de alterações em
qualquer ponto da circulação coronariana. Mediante
situações de aumento de demanda, ocorrerão isquemias
focais e, em longo prazo, perda gradativa da eficiência
muscular cardíaca16. Em situações de maior estresse físico,
o coração pouco eficiente não é capaz de atender a
necessidade de aumento do débito cardíaco, podendo
produzir tais sintomas. Sendo assim, acredita-se que
pacientes com ICO mereçam uma atenção especial e
critérios mais rigorosos para interrupção do TC6M.
No presente estudo observou-se ainda que 6 (66,7%) de
9 pacientes com algum grau de HAP tiveram sintomas
relacionados ao baixo débito cardíaco, como: tontura,
náuseas, hipotensão sintomática e dormência no membro
superior esquerdo (MSE). O baixo débito cardíaco
poderia levar à síncope e queda da própria altura, embora
esse evento adverso não tenha sido observado nesta
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Artigo Original
pesquisa. Sabe-se que a HAP pode se instalar
silenciosamente em consequência de doenças cardíacas17.
O seu sintoma mais comum é a intolerância ao esforço,
devido ao baixo débito cardíaco, cuja característica é o
caráter progressivo, sendo indicativa de disfunção
ventricular direita secundária17. Síncope e pré-síncope
também podem estar presentes17. Além dos sinais e
sintomas citados, os pacientes podem apresentar ainda
dor precordial e esta costuma ser sinal de isquemia
subendocárdica do ventrículo direito por redução do
fluxo e da pressão de perfusão coronariana17. Assim,
acredita-se que pacientes com HAP mereçam também
uma atenção especial durante o TC6M e critérios mais
rigorosos para sua interrupção.
Como a regulação do débito cardíaco frente a um esforço
físico ocorre a partir de mecanismos que permitem
adaptação inotrópica e cronotrópica18, no presente
estudo, acreditava-se na possibilidade da ocorrência de
picos hipertensivos durante o esforço de alguns
portadores de marca-passo. Entretanto, nenhum evento
adverso dessa natureza foi observado nos pacientes que
usavam esse dispositivo.
Gerson et al.5, na avaliação da segurança do TC6M em
pacientes com indicação de transplante cardíaco, fizeram
uso de avaliação eletrocardiográfica nos seus voluntários
durante a realização do teste. Considerando-se que esse
trabalho confirmou o TC6M como uma avaliação segura
do ponto de vista eletrocardiográfico, optou-se então por
não fazer uso desse tipo de monitoração nos pacientes, a
fim de reproduzir o TC6M com os instrumentos de
avaliação cardiorrespiratória mais usados na rotina clínica.
O número limitado de pacientes admitidos na enfermaria
onde foi realizada a pesquisa no período do estudo não
permitiu uma análise inferencial. Embora esta unidade
possua 15 leitos, existe uma baixa rotatividade de
pacientes. Sugere-se a realização de novas pesquisas com
tamanho amostral maior, possibilitando testar
estatisticamente as hipóteses aqui apresentadas.
Amplamente discutida e motivo constante de cobrança
nos processos de acreditação hospitalar, a segurança do
paciente é uma questão abrangente e envolve vários
aspectos de uma instituição. Isso porque a assistência
terapêutica frequentemente está associada a danos
secundários, de modo que é essencial reconhecer,
minimizar ou eliminar os riscos a que os pacientes estão
expostos19.
Assim, os resultados aqui apresentados permitirão ao
fisioterapeuta identificar o grupo de indivíduos mais
suscetível a eventos adversos e respaldar com mais
segurança sua avaliação. Reafirma-se que é condição
básica para realização do TC6M em indivíduos
Int J Cardiovasc Sci. 2015;28(1):70-77
Artigo Original
hospitalizados a liberação do paciente pelo médico
responsável, e a avaliação e a execução apropriada do
teste pelo fisioterapeuta.
Conclusão
No TC6M, foi identificada baixa frequência de eventos
adversos graves em pacientes cardiopatas sob
condição de hospitalização a partir de dois dias da sua
admissão.
Ferreira et al.
Segurança do Teste de Caminhada de Seis Minutos
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.
Vinculação Acadêmica
O presente estudo representa o trabalho de conclusão de
curso (TCC) de Pryscilla Alves Ferreira em Residência
Multiprofissional Hospitalar em Saúde do Hospital Universitário
Professor Edgard Santos da Universidade Federal da Bahia.
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