UIVERSIDADE CADIDO MEDES PÓS-GRADUAÇAO LATO SESU ISTITUTO A VEZ DO MESTRE A IMPORTÂCIA DO ASSISTETE SOCIAL A CETRAL DE PEAS E MEDIDAS ALTERATIVAS Por: Alessandra de Oliveira dos Santos Silva Orientadora Prof Mary Sue Pereira Rio de Janeiro 2009 2 UIVERSIDADE CADIDO MEDES PÓS-GRADUAÇAO LATO SESU ISTITUTO A VEZ DO MESTRE A IMPORTÂCIA DO ASSISTETE SOCIAL A CETRAL DE PEAS E MEDIDAS ALTERATIVAS Apresentação de monografia ao Instituto a Vez do Mestre – Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Psicologia Jurídica Por: Alessandra de Oliveira dos Santos Silva 3 AGRADECIMETOS Agradeço a equipe da CPMA do Fórum de Duque de Caxias pela parceria e incentivo. 4 DEDICATÓRIA A todos que lutam pela igualdade de julgamento, mas principalmente pelo acesso a Justiça daqueles que são excluídos pelo Sistema 5 RESUMO O objeto desta pesquisa é analisar o papel do assistente social na área sócio jurídica, mas especificamente na Central de Penas e Medidas Alternativas no Fórum de Duque de Caxias. A escolha temática tem por objetivo mostrar a importância do assistente social no seu processo de trabalho com o beneficiário da pena e medida alternativa, isto é, os substitutivos penais, em relação à reflexão dos seus direitos e deveres mediante a sociedade, do delito cometido, e o sistema jurídico. No decorrer do presente trabalho, mostrarei o breve histórico do Sistema Carcerário e suas implicações, o surgimento da LEP (Lei Execução Penal), relatos de apenados, e principalmente a inserção do Assistente Social dentro deste processo de trabalho. 6 METODOLOGIA A metodologia utilizada para a realização deste estudo inclui além da leitura de livros, jornais e revistas, também estudos de caso com a equipe multidisciplinar e atendimento individual com o apenado e participação como ouvinte durante os julgamentos do Fórum de Duque de Caxias, 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 08 CAPÍTULO I - O Sistema Carcerário no Brasil 10 CAPÍTULO II – Central de Penas e Medidas Alternativas do Fórum de Duque de Caxias 25 CAPÍTULO III - A importância do serviço social na Central de Penas e Medidas Alternativas (CPMA) 35 CONCLUSÃO 41 BIBLIOGRAFIA 44 INDICE 46 FOLHA DE AVALIAÇÃO 48 8 ITRODUÇÃO Identificar a origem das prisões na história da humanidade não é muito difícil, pois, se reconstituirmos o cotidiano dos homens através dos tempos, veremos que nas antigas civilizações, como na Grécia, Roma, Egito, nas grandes batalhas, os vencedores faziam dos vencidos prisioneiros, e posteriormente escravos – mas onde ficavam esses homens? Acredita-se que em um cativeiro, não a prisão que modernamente conhecemos, mas um lugar vigiado pela milícia e controlado para evitar as fugas. Nos relatos bíblicos, em várias passagens fala-se de prisão – a título de exemplo, temos a de João Batista, a do próprio Jesus Cristo, que foram presos e condenados à morte, sem contar com a perseguição a seus seguidores. Portanto, desde os tempos mais remotos, encontram-se prisões ou punições na história da humanidade. Realidade que vem seguindo o homem de acordo com o contexto histórico, variando diante das necessidades sentidas por estes de impor ordem em seu meio. Segundo Michel Focault, até o século II o mais presente nas sociedades era a punição do indivíduo em público – era o espetáculo do suplício. A partir do século XIX, a prisão assume outro caráter, explicada e justificada pela ciência jurídica, passa a ser o espaço do domínio do estado, onde os infratores são trancafiados, controlados ininterruptamente, tendo como objetivo a privação da liberdade e a transformação técnica do indivíduo. Considerada como forma de recuperação do indivíduo em todo o mundo, a realidade tem mostrado a falência do sistema em todos os seus sentidos. O individuo fica estigmatizado ao passar pelo sistema carcerário, se torna quase impossível a sua reinserção na vida social em liberdade, após vários anos de confinamento, sem um acompanhamento efetivo na área social, psicológica e médica, ao contrário do que prevê a Constituição de 1988. Esta falência leva o Estado a repensar as penas aplicadas conforme os delitos cometidos. E neste repensar, e com a entrada do modelo sócio político neoliberal no Brasil, surge os substitutivos penais, que embora contenham o aspecto punitivo, propiciam a 9 manutenção do autor da infração penal no contexto social em que estão inseridas, evitando assim a segregação e o preconceito. Nesse momento, o assistente social tem como desafio ético-político os direitos humanos não somente da população carcerária, mas de toda a população excluída socialmente, econômicamente e culturalmente, sendo este o perfil dos beneficiados pela penas e medidas alternativas, e será neste âmbito que o profissional do serviço social efetiva a sua importância no seu processo de trabalho junto a estes. Durante observação, acompanhamento e análise deste processo, é notório que permanece sem solução as relações das classes subalternas, as socialmente excluídas, com a efetividade dos seus direitos. Apesar dos avanços obtidos na Constituição de 1988, os preceitos constitucionais relativos aos direitos destes, ainda não encontram correspondência com a realidade da sociedade contemporânea, em seu cotidiano. Como veremos, este trabalho é realizado no Fórum de Duque de Caxias, na Central de Penas e Medidas Alternativas, tendo como embasamento a teoria em relação ao tema. No primeiro momento, o trabalho mostrará o breve histórico do Sistema Carcerário Brasileiro; o surgimento dos Substitutivos Penais; a Base Legal dos Substitutivos Penais; a Central Nacional de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas (CENAPA). No segundo momento abordará a visão institucional da Central de Penas e Medidas Alternativas do Fórum de Duque de Caxias; o processo de trabalho do Serviço Social na área sócio jurídica No terceiro momento mostrará a importância do Serviço Social na Central de Penas e Medidas Alternativas. 10 CAPÍTULO I O SISTEMA CARCERÁRIO O BRASIL “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:I construir uma sociedade livre, justa e solidária;II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (Constituição Federal 1988, Título I , dos princípios fundamentais,art. 3º) (1) “A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.” (lei 7.210, 11 de julho de 1984, instituída a lei de execuções penais título i, do objeto e da aplicação da lei de execução penal, art. 1º) (2) Para falar sobre a importância do Serviço Social na Central de Penas e Medidas Alternativas, é necessário compreender primeiro a dinâmica do nosso sistema carcerário brasileiro e suas conseqüências. De acordo com dados do departamento penitenciário nacional de 2007, o Brasil possui hoje uma população carcerária de aproximadamente 339.580 detentos, sendo 3.595 em medida de segurança, 112.138 em medida provisória, 41.731 em regime semi-aberto e 163.805 em regime fechado. O Brasil administra um dos dez maiores sistemas penal do mundo. Estima-se o custo mensal do preso de 3,5 salários mínimos. Porém, apesar do custo elevado, é notório à ausência do estado: prisões superlotadas, exigüidade de espaços para encarceramentos, locais escuros, fétidos, agressivos. Situações que ferem o direito humano. Juntam-se a tudo isto, a morosidade na situação processual, a péssima alimentação, a falta de assistência social, judiciária e médica. ______________________________________ 1 - Constituição Federal 1988 2 - Lei de Execuções Penais 1984 (LEP) 11 Pesquisas realizadas pela organização Human Rights Watch (3) sobre o sistema prisional, mais da metade dos presos tem menos de trinta anos; 95% são pobres, 95% são do sexo masculino e dois terços não completaram o primeiro grau (cerca de 12% são analfabetos). O crime mais comum entre os detentos é o roubo, com cerca de 35% dos detentos presos ou condenados por roubos; outros crimes comuns são furtos, homicídios e o tráfico de drogas. Podemos assim dizer, pelo perfil dos detentos acima descrito, que não há coisa mais velha na história do que suas formas de exclusão social. A pobreza e a exclusão social estão intimamente ligadas. A pobreza envolve exclusão no acesso a bens e serviços essenciais à sobrevivência. Por outro lado, o desemprego é um sintoma da exclusão do mercado de trabalho. A desnutrição, da exclusão de padrão de consumo alimentar satisfatório, o analfabetismo, a repetência, do acesso a serviços educacionais. Temos que considerar também a exclusão de representação política, do acesso à cidadania, o que ilustra que a exclusão envolve tanto elementos materiais, como não materiais e, portanto, é um conceito mais abrangente que o de pobreza Em 1984, houve a necessidade da reforma no código penal de 1940, devido este estar obsoleto em relação ao contexto social. Assim foi instituída na reforma penal a lei de execuções penais, nº. 7.210 de 11 de julho de 1984 que tem pôr objetivo efetivarmos as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado _________________________________________________ 3 - Organizações RightS Watch 2001 4 – LEP (Lei de Execuções Penais instituída pela lei 7.210, de 11 de julho de 1984) 12 A população carcerária do Brasil está distribuída em vários estabelecimentos de diferentes categorias, incluindo penitenciárias, presídios, cadeias públicas, cadeiões, casas de detenção e distritos ou delegacias policiais. A LEP (4) estabelece que as várias categorias de estabelecimentos sejam identificáveis por características específicas e que sirvam a tipos específicos de presos. Na prática, no entanto, essas categorias são muito mais maleáveis e a troca de presos das várias classificações entre os diversos estabelecimentos, muito maiores do que a Lei sugere. Em teoria, a rota de um preso pelo sistema penal deveria seguir um curso previsível: logo após ser preso, o suspeito criminoso deveria ser levado à delegacia de polícia para registro e detenção inicial. Dentro de poucos dias, caso não fosse libertado, deveria ser transferido para uma cadeia ou casa de detenção enquanto aguardasse julgamento e sentenciamento. Se condenado, ele deveria ser transferido para um estabelecimento específico para presos condenados. Ele talvez passasse suas primeiras semanas ou meses num centro de observação, onde especialistas estudariam seu comportamento e atitudes--entrevistando-o, aplicando exames de personalidade e "criminológicos" e obtendo informações pessoais sobre ele--para selecionar o presídio ou outro estabelecimento penal melhor equipado para reformar suas tendências criminosas. Segundo a LEP (Lei de Execuções Penais, instituída pela lei 7.210, 11 de julho de 1984) estabelecimentos para presos condenados seriam divididos em três categorias básicas: estabelecimentos fechados, isto é, presídios; semi-aberto, que incluem colônias agrícolas e industriais; e estabelecimentos abertos, isto é, casa do albergado. Um preso condenado seria transferido para um desses estabelecimentos segundo o período de sua pena, o tipo de crime, periculosidade avaliada e outras características. No entanto, se ele iniciasse o cumprimento de sua pena em um presídio, ele deveria normalmente ser transferido para um do tipo menos restritivo antes de servir toda sua pena, permitindo assim que ele se acostumasse com uma liberdade maior, de forma ideal, ganhasse noções úteis antes de retornar à sociedade. 13 A realidade no Brasil passa longe das descrições da lei. Primeiro, o sistema penal do país sofre a falta de uma infra-estrutura física necessária para garantir o cumprimento da lei. Em muitos estados, por exemplo, as casas dos albergados simplesmente não existem; em outros, falta capacidade suficiente para atender o número de detentos. Colônias agrícolas são igualmente raras, não existem vagas suficientes nos presídios para suportar o número de novos detentos, forçando muitos presos condenados a permanecerem em delegacias durante anos. O índice de reincidência tem ultrapassado a casa dos 80%. Dadas as condições subhumanas de encarceramento, sabe-se que a prisão neutraliza a formação e o desenvolvimento de valores humanos básicos, contribuindo para a estigmatização, despersonalização e prisionização do detento, funcionando na prática como autêntico aparato de reprodução da criminalidade. Os estabelecimentos penais brasileiros espalham-se por todo o país, mas estão mais concentrados nos arredores das zonas urbanas e regiões mais populosas. São Paulo, o estado mais populoso do Brasil, tem de longe a maior população carcerária. De fato, só o estado de São Paulo mantém cerca de 40% dos presos do país, uma população carcerária maior do que a da maioria dos países latino-americanos. Outros estados com significativas populações carcerárias são o Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Paraíba. Porém, quando há iniciativa do governo através das políticas sociais em áreas pobres, podemos perceber o índice de criminalidade reduzir, isto não quer dizer a pobreza acabará, mas diminuirá as oportunidades de ocorrerem crimes. Segundo a revista Veja (5): há três experiências bem-sucedidas para redução da criminalidade, uma em minas gerais e duas em São Paulo, sinalizaram um caminho para reduzir a criminalidade. Em 2002, na favela morro das pedras, a mais violenta de BH, o número de homicídios caiu pela metade em apenas cinco meses depois que o Governo do Estado usou uma escola do bairro para oferecer oficinas profissionalizantes aos jovens. ______________________________________ 5 - Revista Veja em 26.10.05 PP 66 14 O objetivo inicial era apenas educacional, mas logo se tornaram evidentes os reflexos na queda geral de criminalidade na cidade. Conforme a Central Nacional de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas (CPMA), do Ministério da Justiça, esse quadro funesto tem sido responsável pela reprodução ampliada de alguns dos efeitos mais perversos do encarceramento: I- o agravamento do déficit público; II a realocação do fundo público da área social (saúde, educação, habitação) para o sistema de justiça criminal; III a rotinização da experiência prisional e a colonização da cultura comunitária pela cultura da prisão; IV o efeito criminógeno do cárcere, tendo em vista as altas taxas de reincidência; V a destituição do direito de voto de parcelas significativas da população; e por último, porém não menos importante; VI o reforço e o agravamento das divisões sociais tendo em vista o caráter econômico e socialmente enviesado das práticas punitivas. O Brasil, na verdade, não possui um sistema penal e sim muitos. Como nos Estados Unidos e outros países, embora diferentemente da maioria dos países latinoamericanos, as prisões, cadeias e centros de detenção no Brasil são administrados pelos governos estaduais, isto é, cada um dos vinte e seis governos estaduais, assim como o governo do distrito federal, administra um conjunto separado de estabelecimentos penais com uma estrutura organizacional distinta, polícias independentes e, em alguns casos, leis de execução penal suplementares. A independência da qual os estados gozam ao estabelecer a política penal reflete na ampla variedade entre eles em assuntos tão diversos como os níveis de superlotação, custo mensal por preso e salários dos agentes carcerários. A estrutura estadual dos sistemas penais não segue um modelo rígido. Mais freqüentemente, o poder executivo estadual, que é liderado pelo governador, administra o sistema prisional através de sua secretaria de justiça, enquanto sua secretaria de segurança pública, órgão encarregado das polícias, geralmente gerencia as delegacias de polícia. (estabelecimentos denominados de cadeias públicas ou cadeiões podem recair sobre qualquer uma das secretarias). No entanto, são muitas as exceções a esse modelo. No estado de São Paulo, de forma mais notável, o sistema prisional tem sua própria secretaria, como recomendado pela LEP. No estado do Amazonas, por outro lado, até recentemente, tanto os presídios quanto as delegacias estavam sob o controle da Secretaria de Segurança Pública. 15 Com total ausência de eficiência de infra-estrutura do sistema penitenciário, é necessário vislumbrar uma medida efetiva de política pública para valorização de uma estratégia de ressocialização do individuo. O reflexo da minimização estatal e da conseqüente incapacidade de fazer frente às necessidades sociais transformou, por completo, os parâmetros precedentes de segurança e controle social da América Latina, ante a incompatibilidade entre as motivações e metas do mercado e o sistema democrático, conforme saliente Carlos Alberto Elbert. Vivemos atualmente, uma das piores crises da nossa história. Onde impera uma totalidade de problemas que passa pelo desemprego, decadência das instituições responsáveis pela educação, saúde e moradia, corrupção generalizada, descrédito nas ideologias, desrespeito ao meio ambiente e crime organizado, enfim, as mais diversas expressões da questão social. Isto tudo gera o aumento da criminalidade, que se não for tratada de maneira adequada, volta-se contra a própria sociedade, que passa a viver sob o signo do medo e da insegurança. Na busca desesperada de uma suposta tranqüilidade social, procura-se por medidas repressivas de extrema severidade e a punição penal passou a ser considerada como indispensável para a solução dos conflitos social, sendo esta uma resposta imediata totalmente inadequada. As lamentáveis condições de vida em nossas prisões, não são segredo para ninguém. O sistema carcerário brasileiro não tem cumprido seu principal objetivo, que é reintegrar o condenado ao convívio social, de modo que não volte a delinqüir. A origem etimológica da palavra "pena", do latim poena, significa castigo, suplício, mas isso não significa que os infratores devam ser desumanamente supliciados. O propósito da pena privativa de liberdade é recuperar o infrator e não torná-lo pior, sobretudo, se constatarmos que ela é uma evolução em relação ao sistema antigo de execução penal, que punia com o açoite, a mutilação e a própria morte. 16 Conforme alerta Evandro Lins e Silva “a prisão hoje perverte, corrompe, deforma, avilta, embrutece. É uma fábrica de reincidência, é uma universidade às avessas, onde se diploma o profissional do crime” Em outro plano, a imposição da pena privativa de liberdade sem um sistema penitenciário adequado gera a superpopulação carcerária, de gravíssimas conseqüências, como temos visto nas sucessivas rebeliões de presos. Sem falar, que ainda estamos longe das condições necessárias para o pleno florescimento legal dos direitos humanos. 1.1- O Surgimento dos Substitutivos Penais A utilização da expressão “substitutivos penais” para denominar uma categoria diferente de reação ao ilícito foi proposta por Enrico Ferri no final do século XIX para denominar as alternativas à pena carcerária. De acordo com o autor (Ferri-1999), os “substitutivos penais” deveriam ser os primeiros e principais meios de preservação da sociedade da criminalidade, com vistas à defesa social, antídotos aos fatores sociais do crime, numa categoria diferente de pena, num sistema de medidas de defesa social Consideram-se substitutivos penais: as penas alternativas que são aquelas que substituem a pena de prisão aplicada pelo magistrado, ou seja, a pena privativa de liberdade. A pena alternativa continua sendo uma pena, só que não será cumprida em presídio, mas em liberdade, em meio à própria sociedade. Os requisitos legais para a aplicação das penas alternativas encontram-se consubstanciados no artigo 44 do código penal. Já as medidas alternativas consistem em medidas de natureza administrativo-penal, ou seja, anteriores à prolação da sentença, decorrentes da transação penal e da suspensão condicional do processo. Em meados da década de 90, o modelo neoliberal chega ao meio judiciário como um novo modelo de solução de conflitos, onde propõe formas alternativas que enfatizam a solução direta e dispensa a intervenção do estado senão nos casos limites. 17 De acordo com o sociólogo francês Loic Wacquant, o aumento do estado repressor e a utilização do direito penal como fator de controle social, em substituição às políticas públicas de proteção social são características do atual modelo de encarceramento americano exportador para o resto do mundo. Tal tendência decorre da lógica do capital e da exigência de diminuição da responsabilidade social. A importação deste modelo punitivo central pelo Brasil já se percebe na legislação penal da virada do século, com a ampliação do alcance e importância do sistema penal, não apenas através do endurecimento das penas, penalização de condutas e a privatização do sistema penitenciário para fazer frente à crescente demanda de vagas nas prisões, por um lado, mas também pela apresentação dos substitutivos penais como sanções “eficazes” para acabar com a “sensação de impunidade” que assola a sociedade brasileira, com a necessidade do envolvimento comunitário para viabilizar a sua execução, numa proposta mais difusa de controle do crime. A privatização das prisões segue o ideário neoliberal do movimento lei e ordem, e, aparentemente, resolve a contradição entre a ausência de recursos para a sua manutenção e a necessidade de construção de novos presídios para fazer frente à superlotação carcerária. Hoje, apesar de inexistir lei federal que regulamente a matéria, já se inicia o processo de privatização das prisões (ou terceirização, como eufemisticamente tem sido chamado), como exemplo da penitenciária industrial e Guarapava, no Paraná, que abriga 240 presos em cumprimento de pena em regime fechado, com o custo fixo de R$ 2.500,00 mensais por preso, creditados em favor da empresa privada Humanitas – administração prisional privada ltda., cujo contrato com o governo do estado do Paraná, não foi divulgado, conforme relatório de visita dos conselhos Dálio Zippin filho e Mauricio Kuehne, publicado na revista do conselho vale salientar ainda a inauguração da penitenciária industrial de Cascavel, a segunda do gênero do país e também no estado do Paraná, no dia 22.02.2002, está com o custo fixo de R$ 2.300,00 por preso, creditados também em favor da empresa privada Humanitas. Podemos dizer que os substitutivos penais surgem no Brasil, pela primeira vez em 1984, com as leis nº. 7.209 ,de 11/07/1984, que altera o código penal e instituí a lei de execução penal., a qual embora com louváveis propósitos do legislador pátrio, não foi 18 plenamente aplicada no campo sob estudo. Entretanto com o advento da lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, introduziram-se novos institutos na área penal, denominados transação penal e suspensão condicional do processo, que fizeram com que a sociedade alcançasse a implementação das penas e medidas alternativas, sobretudo desta última, não como forma de apenação, mas como medida administrativo-penal. Tendo em vista a grande revolução processual trazida pela lei 9.099/95 em função dos seus princípios norteadores: celeridade, simplicidade, informalidade, economia processual e oralidade, e ainda dos institutos supracitados, a sociedade, através de estadolegislativo, teve que se adequar a essa nova realidade, sob pena de pôr em risco todo esse crescimento na área da justiça social. Somente em 1996, o então Ministro da Justiça, Nélson Jobim, encaminhou à Câmara dos Deputados o projeto de Lei 2.684, que resultou de amplos estudos e discussões por parte do conselho nacional de política criminal, alterando o código penal. Na exposição de motivos ele diz, "se infelizmente não temos, ainda, condições de suprimir por inteiro a pena privativa de liberdade, caminhamos a passos cada vez mais largos para o entendimento de que a prisão deve ser reservada para os agentes de crimes graves e cuja periculosidade recomende seu isolamento do seio social. Para os crimes de menor gravidade, a melhor solução consiste em impor restrições aos direitos do condenado, mas sem retirá-lo do convívio social. Sua conduta criminosa não ficará impune, cumprindo, assim, os desígnios da prevenção especial e da prevenção geral. Mas a execução da pena não o estigmatizará de forma tão brutal como a prisão, antes permitirá, de forma bem mais rápida e efetiva, sua integração social. Nessa linha de pensamento é que se propõe a ampliação das alternativas à pena de prisão". Este projeto foi transformado na lei 9.714 de 1998, que ampliou o rol de penas alternativas vigentes no sistema penal brasileiro. Em razão do exposto, no que concerne às penas e medidas alternativas à prisão foi editada a lei 9.714 (9), de 25 de novembro de 1998, que alterou o código penal, seção II das penas restritivas de direitos - artigo 43 e seguintes, que versam sobre as penas restritivas de direitos, ou seja, as penas alternativas à prisão, termo pelo qual ficaram conhecidas no meio jurídico. 19 Dentro do nosso contexto político social econômico, estes substitutivos penais se dão devido ao crescimento acelerado da violência (crime organizado, contrabando de armas, tráfico de entorpecentes); crise nas prisões ( superlotação, periculosidade e custos); das tradicionais formas de punição não estarem conseguindo atingir o objetivo a que se destinam, ou seja, possibilitar a reinserção dos apenados no convívio social e principalmente na crise fiscal do estado e na sua incapacidade financeira de arcar com o custo do preso. “uma das conseqüências da utilização dos “substitutivos penais” foi o aumento do controle social pelo sistema penal.. A adoção de alternativas à pena de prisão, ao invés de acarretar uma diminuição da incidência do sistema penal, resultou na ampliação do alcance da rede de controle social, através de um sistema disciplinar mais difuso e de calibres mais estreitos, ou seja, alargando a rede e diminuindo o calibre dos filtros do sistema penal”. (Bustos Ramirez; 1997-p91-92) No Brasil e no mundo, a preocupação com a aplicação das penas privativas de liberdade e a busca por penas substitutivas, se observa na realização de vários congressos ligados ao tema, com destaque para o IV Congresso sobre Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente, realizado em Tóquio, em agosto de 1970, e ainda o evento realizado pela assembléia geral das nações unidas, o qual resultou na aprovação da resolução 45/110, de 14 de dezembro de 1990, conhecida como regras de Tóquio, que é considerado um momento ímpar na fixação das diretrizes gerais para aplicação de sanções e medidas não-privativas de liberdade. Para que ocorra uma aplicação dos substitutivos penais, conforme o seu ideário, houve a necessidade de se pautar e de estar em sintonia com as regras de Tóquio(10), adotadas pela ONU em 1990, no qual na seção i: apresentam-se os princípios gerais, nos quais advoga-se a favor das promoções das medidas não-privativas de liberdade e por uma participação maior da comunidade, além de destacar a importância cabal da racionalização das políticas de justiça penal. Dos objetivos: quanto aos objetivos das regras de Tóquio, conforme aufere-se das regras 1.1 a 1.5, podemos resumi-los em 05: 20 1-promover o emprego de medidas não-privativas de liberdade, entendidas estas medidas em sentido lato, abrangente; 2- obedecer às garantias mínimas ofertadas a pessoa delinqüente; 3- promover uma maior participação da comunidade na administração da justiça penal; 4- promover uma maior participação da comunidade no tratamento do delinqüente; 5- estimular entre os delinqüentes o senso de responsabilidade em relação a sociedade. Importante frisar que o ideário incerto nas regras de Tóquio vai ao encontro do postulado da nova defesa social (Felippo gramática, Mark Ensel, entre outros) que, além de visar à garantia de regras mínimas para a aplicação de medidas não-privativas de liberdade, preocupa-se sobremaneira com a ressocialização do criminoso e com a proteção da sociedade durante o penoso processo ressociabilizante. Em suma, as regras de Tóquio constituem-se num instrumento internacional importante, que estabeleceu regras mínimas sobre as medidas não-privativas de liberdade, tendo por fim superar a ultrapassada visão clássica que transferia à pena de prisão o falso papel de protagonista na luta pela regeneração e pela justa punição aos delinqüentes. Conforme Valdir Sznick, a pena alternativa é aquela que, mesmo punindo, não afasta o individuo da sociedade, não exclui do convívio social e dos familiares, não impede os seus afazeres normais. A pena alternativa é uma medida punitiva e imposta ao autor da infração penal no lugar da pena privativa de liberdade. Além disso, a experiência das alternativas penais possibilitou a abertura do sistema penal brasileiro para uma perspectiva nova, em que a pena deixou de ser apenas a resposta isolada ao crime, a ser executada em uma prisão sob responsabilidade da administração pública, passando a exigir dos operadores do sistema criminal maior consciência da questão social e o envolvimento nas políticas públicas O que ficou comprovado ao longo do tempo é que somente com a punição do encarceramento, não há recuperação do infrator, porque a pena de prisão não deve servir apenas como um mero instrumento de proteção às camadas sociais, através do castigo imposto pelo estado que priva o infrator de sua liberdade. O mais grave, é que as etapas 21 seguintes, como a reeducação e a ressocialização também não acontecem, pois o estado trata com enorme descaso a vida humana que está sob sua tutela. Cabe ao estado viabilizar caminhos alternativos, os substitutivos penais, para que esses objetivos sejam alcançados. E é indispensável o apoio dos diversos segmentos da sociedade nesse caminho alternativo, para o efetivo cumprimento das diretrizes norteadoras das regras de Tóquio. 1.2 - A Base Legal dos Substitutivos Penais A Legislação pertinente à aplicação das penas e medidas alternativas encontra-se no art. 5º da constituição federal quando trata da prestação social alternativa; na lei 7.209/84 sobre reforma do código penal; na lei 7.210/84 ou lei da execução penal - anexo 1; na lei 9.099/95 que dispõe sobre os juizados especiais cíveis e criminais abordando as medidas alternativas (anexo 2); na lei 9.714/98 ou lei das penas alternativas (anexo 3); e na lei 10.259/01 que dispõe sobre juizados especiais no âmbito da justiça federal (anexo 4) Os tipos de penas e medidas alternativas previstas no artigo 43 do código penal, quando descreve as penas restritivas de direito são: Prestação pecuniária: pagamento em dinheiro à vitima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, cestas básicas,etc; Perda de bens e valores: pertencentes ao condenado em favor do fundo penitenciário nacional, ressalvada legislação especial, sendo bens móveis e imóveis; e valores, títulos, ações e outros papeis que representem dinheiro; Prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas: atribuição de tarefas gratuitas ao condenado. A prestação de serviços à comunidade (PSC) consiste no cumprimento de uma hora de tarefa por dia de condenação, conforme for a pena, a ser cumprida em instituição pública ou privada, perfazendo em média sete horas semanais de trabalho gratuito em conveniada; Interdição temporária de direitos (proibição do exercício do cargo, proibição do exercício da profissão, proibição de freqüentar alguns lugares, suspensão da habilidade de dirigir veículos; 22 Limitação de final de semana: cinco horas diárias aos sábados e domingos em casa de albergado, podendo ser ministrados cursos e palestras bem como atividades educativas. Os requisitos necessários para que o condenado ou o autor do fato tenha direito uma pena ou medida alternativa são: pena privativa de liberdade não superior a 4 anos;crime sem violência ou grave ameaça à pessoa;qualquer que seja a pena se o crime for culposo, em razão de imprudência, negligência ou imperícia;não reincidência em crime doloso, que se refere àquele com intenção de se atingir o resultado ou assumir o risco de produzir o ato delitivo;verificação da culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade do condenado, bem com motivos e circunstâncias que indiquem substituição;artigos 76 e artigo 89 da lei 9099/95, e seus parágrafos, se for o caso. Os requisitos legais para a aplicação das penas alternativas encontram-se consubstanciadas no: código penal, seção ii – art. 44: as penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: i- aplicada pena privativa de liberdade inferior a um ano ou se o crime for culposo; ii- o réu não for reincidente; iii- a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. Parágrafo único – nos crimes culposos, a pena privativa de liberdade aplicada, igual ou superior a um ano, pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas penas restritivas de direitos, exeqüíveis simultaneamente. Já as medidas alternativas consistem em medidas de natureza administrativopenal, ou seja, anteriores a notificação da sentença. 1.3 - Central acional de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas (CEAPA) Mediante a necessidade de se fazer cumprir a lei, foi instituída pelo Ministro da Justiça, a CENAPA (Central de Apoio e Acompanhamento das Penas e Medidas Alternativas) 23 Em 2000, na gestão do Ministro José Gregori e da Secretária Nacional de Justiça Elizabeth Sussekind, foi instituído no Ministério da Justiça, um órgão próprio para execução do programa nacional de apoio às penas alternativas, a CENAPA – Central Nacional de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas -, porque se verificou que as penas alternativas, embora prevista na lei de execução penal (lei nº7. 910, de 1984), eram pouco aplicadas, devido à dificuldade do judiciário na fiscalização do seu cumprimento, com probabilidade de alta frustração da resposta punitiva do estado. A aplicação das penas e medidas alternativas começa avançar, com a elaboração das regras mínimas das nações unidas para a elaboração de medidas não-privativas de liberdade, as chamadas regras de Tóquio, recomendadas pela ONU em 1990, com a finalidade de se instituírem meios mais eficazes de melhoria na prevenção da criminalidade e no tratamento dos apenados Efetivamente, a Lei nº. 9.099 e a Lei 10.259, de 2001, que instituíram os juizados especiais cíveis e criminais no âmbito da Justiça Estadual e Federal respectivamente, abriram importante via alternativa de reparação consensual dos danos resultantes da infração, da mesma forma como a Lei nº. 9.714, de 1998 ampliou consideravelmente o âmbito de aplicação das penas alternativas, alcançando até mesmo os condenados até quatro anos de prisão (excluídos os condenados por crimes hediondos) e instituídos dez sanções restritivas em substituição à pena de prisão Foi nesse contexto que o conselho nacional de político criminal e penitenciária incentivou a criação da CENAPA, com objetivo fundamental de realizar as ações necessárias ao incremento da aplicação das penas alternativas em nível nacional. No primeiro momento, celebram-se convênios com os estados, para o estabelecimento de central de apoio, junto às respectivas secretarias de estado e tribunais de justiça. Os recursos fornecidos pelo ministério da justiça, por meio desses convênios, permitiram a constituição, no vários estados, de mínima estrutura física, bem como a contratação de pessoal técnico especializado, para acompanhamento e fiscalização do cumprimento da execução das penas e medidas alternativas. 24 Existem hoje centrais de apoio no distrito federal e em quase todos os estados, sendo atendidos certa de 21.560 beneficiários de penas e medidas alternativas, o que corresponde a 8,7 da população carcerária brasileira. A partir de 2001 a CENAPA com o objetivo de desenvolver o programa de penas e medidas alternativas, constituiu uma comissão nacional de apoio, composta de juízes de direito, promotores de justiça e técnicos em execução de penas alternativas, que tem por objetivo auxiliar o juízo da execução. Nos juizados especiais criminais, a equipe de apoio técnico auxiliar a promotoria de justiça. A metodologia de apoio técnico (assistentes sociais, psicólogos) é composta da concepção do monitoramento e envolve três módulos consecutivos de procedimentos técnicos: Avaliação- corresponde ao procedimento técnico que faz a análise do perfil do beneficiário e da entidade parceira. Encaminhamento- corresponde ao procedimento técnico que assegura a relação formal entre o juízo da execução, o beneficiário e a entidade parceira. Acompanhamento- corresponde ao procedimento técnico que garante a fiscalização do fiel cumprimento da pena ou medida alternativa O módulo complementar é voltado para captação, cadastramento e capacitação de entidades parceiras, ema vez que a execução das penas e medidas alternativas depende da formação de uma rede social de apoio credenciada junto ao juízo competente 25 CAPÍTULO II Central de Penas e Medidas Alternativas do Fórum de Duque de Caxias A Central de Penas e Medidas Alternativas da Comarca de Duque de Caxias no Rio de Janeiro foi instalada em 26/02/2003, abraçando o programa nacional de apoio e acompanhamento as penas e medidas alternativas à prisão, desenvolvido pelo Ministério da Justiça, esta como o próprio nome enuncia, constituem verdadeiras alternativas as penas privativas de liberdade (nos casos legalmente previstos) possibilitando assim a existência de um prognóstico de suma relevância - no qual estará inserido a relação do assistente social junto ao beneficiário ou apenado- que consistem em: 1) Numa Punição: o individuo não fica impune ao ato que cometeu, evitando também que pessoas que cometeram pequenos delitos não fossem introduzidas no sistema carcerário, e saíssem corrompidos; 2) A Inserção Social: o individuo continua vivendo no seu meio social e cumpre a pena junto a sociedade; 3) Reparação Social: a responsabilidade é dada diretamente à sociedade, esta participa do processo de ressocialização do individuo. A Central de Penas e Medidas Alternativa (CPMA) do Fórum de Duque de Caxias está localizada numa área no qual a concentração das expressões da questão social são “gritantes e agressivas”. Na Central de Penas e Medidas Alternativas, verifica-se mediante as estatísticas e atendimentos realizados, que a maioria das pessoas que são “beneficiadas” através das penas e medidas alternativas pela Justiça, são: pobres, negras, semi-analfabetas ou analfabetas, moradores de comunidade, desconhecedores dos seus direitos e deveres mediante a sociedade, trabalhadores informais ou desempregados, enfim: são indivíduos inseridos nas mais diversas formas de exclusão social, sendo este último o que mais agrava a reprodução das relações sociais. “além da carência ou da desigualdade de renda, deve ser considerado um conjunto de privações ou perdas resultantes do desemprego, tais como: danos psicológicos, perda de auto-estima, redução das motivações para trabalhar, desagregação dos laços familiares e da vida social, acentuação de assimetrias de gênero e de tensões raciais, aumento de doenças e morbidade.” ( Kliksberg 2000) 26 Conforme estudamos e aprendemos, não existe trabalhar o individuo de forma isolada, é necessário trabalhar a sua totalidade, para assim termos o objetivo alcançado. Para que isso ocorra, o sistema não deve trabalhar o beneficiário ou apenado de forma somente punitiva, direcionado ao delito cometido, é fundamental perceber o mesmo como individuo, sendo este possuidor de uma história de vida, de uma cultura já pré-estabelecida, como já mencionada acima. Garantindo a eles a perspectiva da universalidade dos seus direitos, devido a maioria possuir este conhecimento. Esta realidade demanda um imenso esforço por parte dos profissionais de Serviço Social, os mesmos têm que efetivar uma metodologia de trabalho que corresponda aos objetivos da pena/medida alternativa, que é a de propiciar a inserção dessas pessoas. Porém, muitas vezes o olhar do profissional de Serviço Social diverge do profissional de Direito, tendo este ponto como preocupação fundamental. Ás vezes a equipe de Serviço Social confronta-se com a própria dinâmica autoritária do judiciário, buscando assim uma aliança com o Conselho Regional de Serviço Social e conseguindo fazer valer o nosso código de ética. A CPMA de Duque de Caxias, para a execução do seu processo de trabalho, é constituída por: Juiz de Direito; Promotor de Justiça; Defensor Público; Coordenador; Assistentes Sociais; Psicólogos; Técnicos Judiciários; Oficiais de Justiça; Estagiários Tendo como objetivos: encaminhar e acompanhar a execução das penas e medidas alternativas; engendrar ações que estimulem a sociedade civil a participar dos problemas que envolvem os delitos de pequeno potencial ofensivo; constituir um arsenal interventivo voltado às necessidades do beneficiário; nortear a compreensão das penas e medidas alternativas para além da perspectiva da punição; atuar especificamente nos casos de beneficiários comprometidos com o uso/abuso de substâncias psicoativas, oferecendo condições para o não envolvimento maior com a criminalidade. As atividades desenvolvidas na Central de Penas e Medidas Alternativas pela equipe técnica são: captação de recursos comunitários objetivando a adesão ao programa de penas e medidas alternativas; grupos de recepção; entrevista inicial; entrevista de avaliação 27 psicossocial; encaminhamento à rede conveniada e acompanhamento do cumprimento das penas e medidas alternativas; visitas permanentes as instituições conveniadas com as centrais; grupos de acompanhamento de beneficiários; acompanhamento individual e familiar; grupos de reflexão específicos para beneficiários com problemas decorrentes do uso/abuso de substâncias psicoativas; atuação direta no programa das penas e medidas de limitação de fim de semana. 2.1- O Processo de Trabalho do Serviço Social na área sócio-jurídica “Exercício do serviço social sem ser discriminado, nem discriminar, por questões de inserção de classe social, genro, etnia, religião, nacionalidade, opção sexual, idade e condição física” ( Assistente Social: Ética e Direitos – 4º Ed – RJ – maio/2007 – princípios fundamentais) É no contexto de um sistema penitenciário falido e que vai de encontro a qualquer direito humano, que o serviço social constrói o seu processo de trabalho. Cabe ressaltar que o assistente social faz parte do apoio técnico junto com o psicólogo, no qual o seu processo de trabalho enquadra-se dentro de uma prática de natureza psicossocial, no entanto, no sistema judiciário não se trata de medida social e sim de sanção penal. A demanda e o produto desse trabalho são jurídicos, de natureza processual ou penal, e devem seguir o tratamento legal em todos os seus procedimentos e conseqüências. Segundo Iamamoto, o assistente social não pode ser um profissional somente executivo, é necessário desenvolver sua capacidade de decifrar a realidade e construir propostas de trabalho criativas e capazes de preservar e efetivar direitos, a partir de demandas emergentes no cotidiano. Enfim, ser um profissional propositivo Objetivando atender demandas pertinentes à instituição judiciária, os assistentes sociais, a partir de princípios e diretrizes normativas de sua área de formação, estipulam critérios, recorrem a técnicas e a uma metodologia própria, gerando, conforme salienta baptista (1992) uma produção específica de conhecimento e de maneira de agir, que se autoalimentam e se reproduzem por meio de práticas de intervenção 28 Assim, podemos dizer que através desta competência embasada, o assistente social no sistema sócio jurídico é capaz de intervir no processo de fortalecimento da identidade social do apenado e na mediação das correlações de forças que influenciam sua vulnerabilidade junto ao sistema penal, contribuindo assim, para elaboração de uma nova identidade social desses sujeitos criminalizados. Conforme Guindani (2002), ao defender um esforço de reflexão crítica sobre os sujeitos apenados, sobre suas vulnerabilidades socioculturais, não se pretende uma análise em nível puramente intelectual. Está se convencionando, pelo contrário, que a reflexão conduz a uma prática instituinte, a uma nova forma de intervenção Nestas práticas de intervenção, sendo necessário o estudo da realidade social, entendida, na perspectiva das relações sociais e na forma como vão sendo reproduzidas – objetiva e subjetivamente – em um determinado contexto sociocultural e econômico e em uma dada conjuntura histórica. Assim sendo, não se pode pensar na realidade social do individuo, sem antes refletir sobre a realidade brasileira e as relações engendradas no decorrer do seu processo histórico. O assistente social realiza entrevistas, encaminhamento, acompanhamento, articulações e, principalmente oferecem subsídios sociais à autoridade judiciária, mediante relatórios, laudos e pareceres, nos quais se destacam informações sobre a história social de vida e o comportamento desses sujeitos, sempre em parceria com os psicólogos, chamado de quadro técnico “ao estudarmos uma realidade social, o fundamental é situá-la no âmbito da relação universal-particular(...). No modo de produção capitalista – que se estrutura como universalidade – as formações materiais constituem-se enquanto particularidade, que materializam e contêm essa universalidade ‘modo de produção capitalista’.(...) Um entendimento mais refinado e complexo que eleve os aspectos únicos presentes em uma singularidade econômico-social e política, liga-se inseparavelmente à descoberta e à aplicação das leis mais universais do desenvolvimento histórico”( Mazzeo ; 1997) Na história social de vida e comportamental desses sujeitos, podemos considerar as diversas expressões da questão social ao estudá-la: pobreza, grau de subnutrição, 29 criminalidade, violência, analfabetismo etc.- acabam por fragmentar o fenômeno, mais que clarificá-lo. Acaba-se mesmo esquecendo que a pobreza é decorrência de um modo de produção que engedra a exclusão e a desigualdade social. Chega-se a inverter essa situação, entendendo pobreza e violência como violação dos direitos de “segurança” daqueles que não são excluídos socialmente. Em face do estudo desta realidade social pelo assistente social, a demanda para a sua prática profissional se dá devido o conhecimento da realidade vivida pelos principais sujeitos deste trabalho profissional no campo pesquisado: as suas particularidades, características e expressões, conforme chega ao judiciário. Isto porque as respostas emitidas não se apresentam apenas como determinantes de projetos no âmbito das condições e relações internas do trabalho, mas também enquanto reveladoras e indicadoras de projetos e políticas públicas que podem antecipar o recurso a uma medida judicial Porém, não é assim que ocorre. Na Central de Penas e Medidas Alternativas do Fórum de Duque de Caxias, verifica-se que o atendimento e acompanhamento não se aprofundam no conhecimento da realidade social dos “beneficiários” e tão pouco os direciona para projetos ou políticas públicas, não por não quererem, e sim, porque o sistema judiciário só preconiza o cumprimento dos substitutivos penais. Dentro da CPMA, a equipe técnica (assistente social e psicólogo) tem por objetivo e atividades desenvolvidas: Grupos de recepção: o grupo de recepção é composto pela equipe técnica (assistente social e psicólogo) da central de penas e medidas alternativas e tem por objetivo: realizar escuta dos beneficiários em relação ao delito cometido, e neste momento é dada a eles a “oportunidade” de recorrer à sentença, caso acreditem que estejam sendo injustiçados; esclarecer o que é a pena e medidas alternativas, e como se dará o cumprimento da mesma; marcar uma entrevista psicossocial individual. . No decorrer desta atividade, na CPMA do Fórum de Duque de Caxias, na escuta realizada, percebe-se: a indignação de alguns; o arrependimento de outros; a ignorância na lei, o delito cometido visto como “normal” devido à cultura e 30 realidade social em que vivem; e também daqueles que se tivessem que fazer novamente: fariam. Entrevista psicossocial individual: a realização da entrevista psicossocial (assistente social e psicólogo separadamente com a garantia de sigilo de informações) do condenado/autor do fato ilícito é individualmente tem por objetivo verificar o perfil do entrevistado, realizando assim um sumário social e consequentemente trabalhar a reinserção na sociedade a partir do acompanhamento e do trabalho ali a ser desenvolvido.. Após à entrevista , o beneficiário é direcionado, para o cumprimento da pena/medida, à uma instituição parceira adequado ao seu perfil. Durante este processo, foi interessante perceber aqueles que assumiam o delito cometido, aqueles que assumiam, porém não tinham consciência da lei, aqueles que tinham cometido o delito, mas não assumia e os que ali estavam, porém “supostamente” não tinham cometido o delito. Encaminhar e acompanhar a execução das penas e medidas alternativas: o encaminhamento tem por objetivo facilitar o acesso do beneficiário ao local de cumprimento da pena/ medida e o controle de sua freqüência pela entidade parceira, pela equipe de apoio e pelo órgão de execução. Antes do encaminhamento, é realizada uma entrevista psicosocial para analisar o perfil do apenado ou beneficiário e conhecimento do delito cometido, para assim encaminharmos para a instituição parceira. O acompanhamento visa verificar o cumprimento da pena/medida junto ao beneficiário, bem como promover a sua reinserção e reeducação. É realizado simultaneamente, no órgão da execução e na entidade parceira onde o beneficiário se encontra. A rotina deste processo de trabalho se dá: nas visitas de acompanhamento: que trata da verificação do cumprimento das obrigações pelo beneficiário. Durante as visitas os técnicos realizam entrevistas de acompanhamento com o beneficiário; reunião periódicas: realização de palestras e seminários visando à reinserção social do beneficiário, com o desenvolvimento de práticas profissionalizantes e educativas; reavaliação: com base na avaliação periódica, novo estudo psicossocial, realizado durante o acompanhamento, caso o técnico identifique a necessidade; declaração sobre incidente no cumprimento da medida/pena: informe nos autos sobre incidente que possam constituir descumprimento da pena/medida pelo beneficiário, se a reavaliação assim indicar; audiência de advertência: 31 momento em que o juiz caracteriza o incidente diante do beneficiário e decide sobre a manutenção ou não da pena ou medida; conversão: quando o juiz converte a pena ou medida alternativa , caracterizando o descumprimento; proposição de ajustamento / remanejamento do beneficiário: novo sumário psicossocial sugerindo o ajustamento ou o remanejamento do beneficiário, em caso de incidente que configure inadaptação ou se a reavaliação assim indicar; avaliação final: avaliação após o término de cumprimento da pena ou medida; certificação do cumprimento da pena ou medida: elaboração de parecer técnico e encaminhado ao órgão de execução para certificação do cumprimento da pena ou medida pelo beneficiário; extinção de punibilidade: o juiz determina o fim da pena ou medida e, em seguida, o processo é arquivado pela secretaria da vara ou jecrim. Visitas permanentes às instituições conveniadas com as centrais: as visitas eram realizadas com o objetivo de verificar o cumprimento do contrato de parceria realizado entre o judiciário e a instituição conveniada. Nesse momento, neste processo, atuando como estagiária e tendo como equipe o assistente social, psicólogo e às vezes o promotor público “fiscalizávamos” a rotina desta instituição. Se a mesma não estivesse dentro do cumprimento do contrato, era marcada reunião para a fortificação do objetivo, a principio proposto. Acompanhamento individual e familiar: este acompanhamento se dava, conforme a necessidade urgente do beneficiário. Durante o período do meu estágio, não houve nenhum caso a mim apresentado para acompanhamento. Grupos de reflexão específicos para homens autores de violência contra mulheres: durante o meu estágio, até então, não havia este grupo de reflexão na central de penas e medidas alternativas. Grupos de reflexão específicos para beneficiários com problemas decorrentes do uso/ abuso de substâncias psicoativas: este grupo de reflexão se dava principalmente para aqueles que tinham dependência alcoólica.. Porém, este projeto favorece tanto aqueles que foram convidados ou obrigados pela justiça como ao grupo AA (são eles que dirigem o grupo) a reinserção social. É através da externalização, do diálogo, da troca de experiência, do saber ouvir, de não discriminar, culpabilizar, enfim, da reflexão que ocorre durante esses encontros que estas pessoas procuram resgatar a vida digna que a doença do álcool, a doença 32 da desmoralização, conforme eles nomeiam, lhes privou. E caso consigam estabilizar esta doença, a grande maioria continua a freqüentar esses encontros, pois vêem neles a fortificação para continuarem nesta nova trajetória de vida e também a satisfação de ver novos “companheiros” a buscarem e conseguirem o mesmo fim. Mediante a tantos depoimentos de vida, durante a reunião, fica explicito que não adianta forçar um alcoólatra a largar o vicio, e sim, partir destes a decisão de que é preciso procura ajuda, e geralmente isto acontece quando os mesmos chegam num estágio onde perdem a família, o emprego, e principalmente a dignidade. Percebemos a importância deste momento concedido pela CPMA, pois também é através deste projeto, que o beneficiário terá oportunidade de refletir e reconstruir a sua vida social, profissional e familiar. Conforme estatísticas, no sistema carcerário, mais da metade estão presos devido ao uso de álcool, e nos hospitais (urgência) em atendimentos por acidente de trânsito, lesões por arma branca, violência doméstica entre outros. Percebe-se a necessidade de tratar está questão: álcool, como medidas preventivas e não com medidas paliativas Captação de recursos comunitários objetivando a adesão ao programa de penas e medidas alternativas: é realizada uma pesquisa preliminar, isto é, levantamento de instituições filantrópicas, entidades públicas e privadas, ong’s, órgãos públicos que possam ser credenciadas para a parceria com o órgão da execução da pena/medida, no qual é elaborado um diagnóstico institucional e a seleção da entidade que poderão receber os beneficiários que prestam serviço, fazem doações, estão com limitação de fim de semana ou em medida de tratamento; análise e pré-seleção das entidades: mapeamento e avaliação do perfil das entidades pesquisadas pela equipe de apoio técnico, preferencialmente em dupla (um assistente social e um psicólogo). Com este diagnóstico institucional é realizada uma pré-seleção com a sugestão de cadastramento de entidades; decisão: sobre as entidades que serão cadastradas junto ao juízo da execução. No caso de Jecrim, encaminhado ao promotor a fim de subsidiá-lo; cadastramento: assinatura do termo de convênio entre o órgão da execução competente e as entidades cadastradas com recebimento das tabelas de necessidades de serviços profissionais e materiais que possam ser atendidas pelos 33 beneficiários; capacitação: individualizada e encontro semestral entre as entidades parceiras, através da realização palestras/seminários visando o repasse da metodologia de apoio técnico do trabalho e conscientização das entidades quanto à qualidade do acompanhamento e da fiscalização das penas / medidas Durante a parceria é fundamental realizar palestras, seminários e visitas às entidades cadastradas, a fim de prepará-las continuamente para receber o beneficiário e fortalecer a rede social de apoio. Porém na prática do sistema, é realizado somente as visitas às entidades, tanto para um acompanhamento do beneficiário ou apenado quanto para “fiscalizar” a instituição, isto é, verificar se estão dentro das normas ditas e acordadas no termo do convênio. Segundo Stumpf (1998) “o engajamento reflexivo do prestador de serviço e conveniada gera um efeito multiplicador que alcança seus familiares, vizinhança e a própria equipe de assistentes sociais ao manterem uma atitude aberta ao aprendizado compartilhado” Quando Stumpf fala “conveniada”, quer dizer que são as instituições conveniadas que recebem este prestador de serviço para o cumprimento da pena/medida, porém é público e notório que essas mesmas instituições assumem uma tarefa do Estado, estabelecida em lei (nº. 8.742/93-loas), tomando para si o atendimento a necessidades que é dever do estado suprir e direito do cidadão ver contempladas. Enquanto por outro lado, estas “conveniadas” têm mão de obra gratuita. Nesse contexto, o trabalho realizado pelos prestadores ao cumprirem uma pena/medida expressa um ganho para os três segmentos envolvidos: ele próprio, o estado e a sociedade. Visitas permanentes as instituições conveniadas com as centrais: monitoramento do cumprimento das obrigações da entidade parceira e da forma de acolhimento e adaptação do beneficiário. Durante as visitas, os técnicos (assistente social e psicólogo) realizarão entrevistas de acompanhamento com o representante da entidade 34 CAPÍTULO III A IMPORTÂCIA DO ASSISTETE SOCIAL A CETRAL DE PEAS E MEDIDAS ALTERATIVAS Conforme o código de ética profissional, dos princípios fundamentais do Serviço Social: “ampliação e consolidação da cidadania, considerada tarefa primordial de toda 35 sociedade, com vista à garantia dos direitos civis sociais e políticos das classes trabalhadores”. Será através do Código de Ética, na trajetória profissional, que o Assistente Social sempre está inserido na prestação de serviços assistenciais, voltando sua ação de forma prioritária às necessidades sociais e garantia de direitos das classes subalternas. E é na efetivação de direitos, no acesso à justiça e na restituição de cidadania dos sujeitos das classes subalternas que o serviço social na central de penas e medidas alternativas pode ser compreendido como espaço de permanentes desafios para a ação profissional Será neste espaço de permanentes desafios, imprescindível enxergar o Serviço Social não como mero assistencialismo, que mantêm ou aumentam a dependência da dinâmica contemporânea, e sim, do profissional como instrumento de acesso a garantia dos seus direitos e a reflexão crítica dos deveres também, vislumbrando assim, a possibilidade de uma nova elaboração da identidade sócio cultural e sócio educativa desses indivíduos criminalizados. Na CPMA no Fórum de Duque de Caxias, é visível a percepção da necessidade de mudanças solicitadas pelos beneficiários, através de toda uma reflexão crítica, conforme acima mencionada, realizado pela equipe técnica para a reinserção do beneficiado na sociedade. Porém, por muitas vezes, o profissional não é detentor dos instrumentos e organizações eficazes para tal efetivação, melhor dizendo: não se tinha políticas públicas associadas à reinserção do beneficiário a sociedade, como: cursos de capacitação, escola, empregos... Enfim., o assistente social , neste momento e em quase todos, tem que ser o profissional conforme mencionou Yamamoto, o mesmo tem que ser propositivo, ter instrumentos para o enfrentamento das novas expressões da questão social e não um mero executor de tarefas, pois o estado e a sociedade exigem do beneficiário está reinserção, mas não dão os instrumentos para tal. Somente acontece quando a sociedade de certa maneira se vê ameaçada na sua segurança, e a partir de então pressiona o estado para a adoção de alguma política pública. Mas em momento algum, se vê os direitos desses cidadãos violados, o único direito que eles têm é o não direito. Segundo Barbosa: 36 “a questão do acesso à justiça deve ser considerada em seu duplo sentido. No sentido estrito, o acesso à justiça se dá via judiciário, referindo-se à oportunidade de o sujeito procurar a defesa de seus direitos através de um procedimento judicial. No sentido geral, refere-se às condições de participação dos sujeitos no processo econômico, político e social” (Barbosa, 1984) Posso dar como exemplo, um caso, no qual realizei o atendimento: fui solicitada para realizar uma entrevista psicossocial individual com um beneficiário. No decorrer da entrevista, qual foi a minha surpresa e indignação ao perceber que o entrevistado na verdade não deveria estar sendo encaminhado para cumprir uma prestação de serviços à comunidade, e sim, perante a justiça, deveria estar mediante o delito cometido, no sistema carcerário! Enfim, o suposto “beneficiário” relatou que estava cumprindo condicional, e denunciaram que ele estava armado dentro da sua residência. Ocorreu a batida policial, e em vez de retornarem com ele ao sistema penitenciário, por quebra da condicional, simplesmente o levaram a um “novo julgamento” para assim cumprir a pena alternativa de prisão. O fato é que a justiça neste momento não vê o individuo na sua totalidade, e sim, de forma isolada. Utilizando-se da punição, como forma de satisfação do cumprimento da lei perante a sociedade. É neste momento que se retifica o tratamento de acesso à justiça, desigual a população excluída. Não ocorreu preocupação e interesse da história de vida e realidade do indivíduo. Ocorreu sim, um delito, e sendo assim é necessário dar resposta à sociedade. Conforme vimos, a rota de um preso pelo sistema penal deve ser: logo após ser preso, o suspeito criminoso deve ser levado à delegacia de polícia para registro e detenção inicial. É neste processo que deveria se dar a efetividade, eficácia e cumprimento da lei. O sistema tem a obrigação de ter o registro de antecedentes criminais. Para assim, conforme a situação, direcionar para o fim competente. E neste caso acima citado, este processo simplesmente não existiu. Enfim, não há observações das determinações legais e os direitos previstos. Segundo Junca: 37 ‘o espaço brasileiro parece se dividir, compondo-se, de um lado, por ilhas de exclusão, onde são mantidas as classes perigosas e, de outro, em cenário privilegiado, onde a riqueza se protege, recorrendo a uma série de aparatos de seguranças. Praças cercadas, condomínios fechados, porteiros eletrônicos separam ostensivamente dois mundos, e, mais que isso, espera-se que os excluídos, as chamadas classes perigosas, se mantenham em determinadas áreas, numa segregação espacial, que desloca o foco de análise para as forma de controle e repressão” No momento, o serviço social vem legitimando-se como uma prática fundamental no campo jurídico e a importância de seu trabalho vem se ampliando com a prática de universalização e a crescente discussão dos direitos humanos e sociais da população, bem como com a necessidade de maior compreensão dos processos em que se expressam as práticas e as relações sociais. Será nas relações sociais que o assistente social terá a prática exercida, devido à cultura existente na vida dos beneficiários, é necessária a desconstrução e construção de uma nova identidade. Durante o grupo de avaliação final do cumprimento da pena/medida alternativas na CPMA do Fórum de Duque de Caxias, percebe-se que os beneficiários reproduziam as suas relações sociais conforme a sua realidade. Segundo Yamamoto: “a reprodução das relações sociais é a reprodução da totalidade do processo social, a reprodução de determinado modo de vida que envolve o cotidiano da vida em sociedade: o modo de viver e de trabalhar, de forma socialmente determinada, dos indivíduos em sociedade.” (2004: 72) Conforme o depoimento da beneficiária (23 anos, negra, semianalfabeta, solteira, trabalhadora informal) no grupo de avaliação, ela tinha queimado a mão da filha de 03 anos com a colher quente como forma de educar. 38 O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no seu artigo 13, considera crime maus-tratos às crianças e adolescentes. Porém, está realidade é muito mais complexa. Esta jovem beneficiária menciona que durante a sua educação infantil, ela obteve tratamento igual ou senão pior dado por ela a sua filha de 03 anos. A mesma relatou que ela e seus irmãos eram educados sem diálogo, que sua mãe enrolava fio descampado na sua cintura para dar choque, como forma de castigo. E a beneficiária nos diz “isso nunca matou a mim ou aos meus irmãos, foi esta educação que eu tive e que os meus amigos também tiveram” A mesma discursa que até então, ela tinha uma visão de educação, não sabia o que era diálogo, sendo assim como poderia ter com a filha. Vimos nesta dinâmica, à reprodução da cultura da violência, isto é, uma cultura própria, que estimula e ratifica atos violentos como algo "natural". Como podemos culpabilizá-la se não foi permitido a ela, outro conceito de educação. Houve necessidade de um acompanhamento psicológico e social para levá-la a refletir e aprender um novo modelo, a construção de uma nova cultura de educação. A beneficiária finaliza o seu depoimento na avaliação final dizendo que hoje é uma nova mãe, que a partir do acompanhamento da equipe técnica (assistente social e psicólogo) ela pôde perceber e aprender um modelo de educação totalmente contrário ao que ela estava aplicando na relação com sua filha.. Hoje ela conversa em vez de bater na filha, quando chega nervosa do trabalho não desconta na filha, entre outros aprendizados. “a rearticulação sociais implica o processo de compreensão do problema à luz das trajetórias do sujeito, a discussão e implementação de seus direitos de cidadania, a prática da participação nas decisões que lhe digam respeito, a mais ampla informação sobre as condições e alternativas de mudança do cotidiano, a busca do reconhecimento das redes em que convive e das relações de opressão, discriminação e intolerância que sofre” (Faleiros, 1999) “os benefícios de um trabalho conjunto nesses serviços atinge todo o universo jurídico institucional, possibilitando o aprimoramento de suas ações, proporcionando um novo entendimento das questões de natureza jurídico-social, 39 contribuindo para uma ordem jurídica mais efetiva. Contudo, a população-alvo é a maior beneficiada, à medida que, no exercício de sua cidadania, encontra resposta a suas demandas na luta por seus direitos”. (Chuairi 2006), Outro atendimento realizado, me deixou estarrecida mediante a aplicação da medida alternativa aplicada pelo delito cometido frente à cultura e realidade do beneficiário (79 anos, analfabeto; trabalhava desde os 05 anos na roça, aposentado com o valor mínimo; provedor da família sem conseguir atender as necessidades básicas desta). Foi denunciado por ter em casa, animais silvestres encarcerados, isto é, pássaros engaiolados. Pela lei de crimes ambientais 9.605/98, IBAMA é crime. A medida alternativa aplicada foi o pagamento de 04 cestas básicas para o ato ilícito praticado. Na entrevista social, o beneficiário relata que até então, não era conhecedor da lei do IBAMA sempre teve pássaros e não conseguia entender o que tinha mudado. Mediante este relato, verifica-se que a justiça anda de mãos dadas com o estado: máximo para o capital e nada para as políticas públicas Será em momento como este, que o assistente social irá intervir junto à justiça. Porém não deixando de cumprir a medida aplicada pela justiça. Apresentamos relatório ao Ministério Público, relatando a impossibilidade financeira deste beneficiário cumprir a medida aplicada. Solicitei a conversão para cesta de higiene e limpeza. Após análise, o ministério público deferiu a solicitação. Enfim, é necessário considerar a complexidade sócio, econômico e cultural da vida desses indivíduos, respeitando-os como sujeitos de direitos, não os reduzindo a uma mera medida jurídica, colaborando desta forma para o reencontro de sua dignidade e de sua cidadania. Esses casos relatados permitem-nos perceber a importância do Serviço Social no sistema sócio jurídico. 40 COCLUSÃO A todo o momento escutamos o discurso de que o apenado deve ser ressocializado, reinserido ou até reeducado para viver em sociedade. Mas, a verdade é que aquele que precisa ser ressocializado nunca foi socializado, sempre viveu a margem da sociedade. Então, como fazer para reinserir alguém que, na realidade, nunca esteve inserido no meio social, que não tem acesso aos seus direitos conforme Constituição 88? O perfil dos criminosos no nosso sistema carcerário são os excluídos socialmente 41 Sabemos que a exclusão social “marginaliza”, leva o individuo a prisão. E nesse momento ele não será mais o excluído, e sim um fora da lei. Então ele passa da condição de um cidadão portador de direitos e deveres para um devedor para com a sociedade. Ainda que os direitos estejam garantidos nas leis do país, a violação destes é visto de forma agressiva quando se trata dos sujeitos que podemos dizer que são os excluídos socialmente, e podemos dizer que é a massa da sociedade e do sistema carcerário É fácil para a sociedade, ao se ver ameaçada na sua segurança pública, pedir atitude do governo, atitude esta que não levará a inclusão do excluído, que poderia se dar através das políticas sociais, mas sim de trancafiá-los em algum lugar, para que essa segurança não seja ameaçada. Assim, a realidade do nosso sistema carcerário é deprimente: não tem mais vagas, ao contrário, encontra-se superlotado; não reintegra o individuo e sim o torna mais marginalizado; e principalmente: a violação dos direitos humanos como lei vigente. Surgem assim, os substitutivos penais, devido à prisão não estar conseguindo alcançar o seu objetivo: que é a reinserção do individuo na sociedade. São aquelas que substituem a pena privativa de liberdade, continuará sendo uma pena, mas não será cumprida no presídio e sim em liberdade, em meio ao convívio social. Mas vale lembrar que os substitutivos penais não são aplicados a qualquer tipo de crime, estes estão consubstanciados no art. 44 do código penal brasileiro. Para o jurídico e sociedade, essas penas devem ser aplicadas a fim de proteger o que resta da dignidade daquele que pouco ou nenhum perigo oferece a sociedade, aqueles que cometeram delitos de menor potencial ofensivo e, portanto, podem ser punidos de forma a não onerar tanto o estado e não entrar em contato com outros presos considerados de alta periculosidade. Porém são medidas adotadas que não dão resposta à questão central: o nosso sistema carcerário é composto por excluídos. Todos estes, deveriam ter o mesmo direito, e 42 não criar alternativas para amenizar a situação daqueles que é considerado menos perigoso para a sociedade. Mas sabemos também que o surgimento dos substitutivos penais, não se dá somente pelos itens acima mencionado, mas principalmente pela entrada do modelo político neoliberal, na década de 90. Modelo este que traz consigo implicações políticas, econômicas, sociais e culturais para a classe trabalhadora, implicações estas que têm afetado adversamente o mundo do trabalho, a legislação social e trabalhista, constituindo uma sociedade que tem como marca as desigualdades sociais, está o tratamento dados aos que ousam, praticando algum tipo de delito penal, desobedecer ao ordenamento legal de controle social imposto pelo estado, ou seja, a lei. Este tratamento invariavelmente acarreta, de imediato, penas de prisão, quando o delito é praticado contra o patrimônio e que o pratica é das classes subalternas no qual o estado se torna mínimo para as políticas sociais e máximas para o capitalismo. Enfim, é neste âmbito que os beneficiários da central de penas e medidas alternativas se encontram. Eles têm que cumprir uma pena, que tem por objetivo a sua reinserção na sociedade, mas em nenhum momento o estado dá está oportunidade , através das políticas públicas. Os beneficiários não têm a sua vida modificada nos aspectos: socialpolítico e econômico. Com isso, cada vez mais, o assistente social vê a sua demanda de prestação de serviços aumentada, isto se dá devido o nosso público alvo se vê mediante o aumento da sua pauperização. A universalização dos direitos sociais está somente “escrita” na lei maior, mas no nosso cotidiano ela não existe. O assistente social atua nesse espaço de ausência de futuro do cidadão possuidor de direitos e deveres. Levando os beneficiários a fazerem uma análise critica da sua posição mediante a sociedade. Análise está, que o leva a querer e fazer valer os seus direitos e também deveres de cidadão dentro de uma sociedade que não o enxerga. Sociedade esta, que não dá o direito de uma vida digna aos excluídos, pois cada vez mais a concentração de renda é voraz, cada vez mais os excluídos são excluídos. 43 O nosso papel como profissional é intermediar essa relação individuo, justiça, sociedade e estado. Segundo Barbosa: “a questão de acesso à justiça deve ser considerada em seu duplo sentido. No sentido estrito, o acesso à justiça se dá via judiciário, referindo-se à oportunidade de o sujeito procurar a defesa de seus direitos através de um procedimento judicial. No sentido geral, refere-se às condições de participação dos sujeitos no processo econômico, político e social ( Barbosa, 1984:61) O assistente social, assim, constitui um profissional importante para a reconstrução da cidadania dos beneficiários da central de penas e medidas alternativas de Duque de Caxias, que será feita através da consciência política e da participação efetiva na luta que se trava para a construção de uma sociedade mais igualitária a universalização dos direitos previstos na constituição. Nessa perspectiva, elabora, executa programa e projetos em sua área, dentro dos princípios éticos fundamentais da profissão, percebendo o beneficiário das penas e medidas alternativas como sujeito de direitos e deveres que apresenta demandas emergentes que requerem estabelecimento de uma política integral de assistência. BIBLIOGRAFIA AZEVEDO, Mônica Louise – Penas Alternativas a prisão – ed. Juruá -2005 CBCISS – Debates Sociais, Exclusão Social, ovas e Velhas Formas , nº58 Rio de Janeiro, 2001 CENAPA (Central Nacional de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas), Manual de Monitoramento das Penas e Medidas Alternativas, brasileira2002 ELBERT, Carlos Alberto. A Sociedade, a violência e o direito penal. Porto alegre: Livraria do Advogado, 2000 44 FAVERO, Eunice Terezinha, MELAO Magda Jorge Ribeiro, O Serviço Social e a Psicologia no Judiciário: construindo saberes, conquistando direitos – São Paulo, Ed. Cortez, 2005 IAMAMOTO, Marilda V, CARVALHO de Raul- Relações Sociais e Serviço Social no Brasil 16º edição, Ed. Cortez 2004 IAMAMOTO, Marilda V. O Serviço Social na Contemporaneidade: trabalho e formação profissional -8ºed.-2005 JORNAL GAZETA DO POVO - A privatização dos presídios brasileiros de 21.02.2002, p 8. LINS E SILVA, Evandro. O salão dos passos perdidos. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1998 MAZZEO, A.C. Estado e Burguesia no Brasil: origens da autocracia burguesa. SP: Cortez, 1997. OLIVEIRA, Edmundo. Políticas Criminais e Alternativas à Prisão. Rio de Janeiro: Forense, 1996. Revista do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça, Brasília, n 14, jul / dez. 2000 . 45 ÍNDICE FOLHA DE ROSTO 2 AGRADECIMENTO 3 DEDICATÓRIA 4 RESUMO 5 METODOLOGIA 6 SUMÁRIO 7 46 INTRODUÇÃO 8 CAPÍTULO I O SISTEMA CARCERÁRIO NO BRASIL 1.1 – O SURGIMENTO DOS SUBSTITUTIVOS PENAIS 1.2 – A BASE LEGAL DOS SUBSTITUTIVOS PENAIS 1.3- CENTRAL NACIONAL DE APOIO E ACOMPANHAMENTO AS PENAS E MEDIDAS ALTERNATIVAS 10 16 21 22 CAPÍTULO II CENTRAL DE PENAS E MEDIDAS ALTERNATIVAS 25 2.1 - O PROCESSO DE TRABALHO DO SERVIÇO SOCIAL NA ÁREA SÓCIO JURIDICA 27 CAPÍTULO III A IMPORTÂNCIA DO SERVIÇO SOCIAL NA CENTRAL DE PENAS E MEDIDAS ALTERNATIVAS (CPMA) 35 CONCLUSÃO 41 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 44 ÍNDICE 46 FOLHA DE AVALIAÇÃO OME DA ISTITUIÇAO: INSTITUTO A VEZ DO MESTRE – PÓS GRADUAÇÃO TÍTULO DA MOOGRAFIA: A IMPORTÂNCIA DO SERVIÇO SOCIAL NA CENTRAL DE PENAS E 47 MEDIDAS ALTERNATIVAS AUTORA: ALESSANDRA DE OLIVEIRA DOS SANTOS SILVA DATA: 27/07/2009 AVALIADA POR: COCEITO: