foto: dreamstime.com Gestão Rever para melhorar A Comissão de Revisão de Óbitos pode identificar falhas operacionais e contribuir na elaboração de planos de ação para aprimoraraassistência Por Nanci Dainezi A taxa de mortalidade dos hospitais é um dos grandes indicadores da qualidade assistencial e precisa ser revista periodicamente para que os processos possam ser aprimorados. Uma resolução do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), de março de 2005, tornou obrigatória a implantação de uma comissão de revisão de óbitos nos hospitais. A resolução estabelece que a comissão deverá ser nomeada pelo diretor clínico da instituição, que o número de membros participantes não pode ser inferior a três, e a periodicidade das reuniões deve ser no mínimo trimestral. Entre as atribuições da comissão está avaliar a totalidade de óbitos e dos laudos necroscópicos e enviar seus relatórios ao diretor clínico e à Comissão de Ética Médica. As agências 42 Melh res Práticas acreditadoras também preconizam a implementação dessas comissões, com a criação e monitoramento de indicadores e de metas de melhorias contínuas que impactem na segurança do paciente. atuação Da ComiSSão No Hospital Paulistano, em São Paulo, a comissão se reúne mensalmente para análise dos óbitos ocorridos no mês anterior. De acordo com Alze Tavares, chefe da equipe clínica de médicos hospitalistas e do Programa de Cuidados Paliativos e membro da comissão, a instituição analisa o prontuário do paciente que foi a óbito, seus dados demográficos, tipo de admissão, equipe responsável, diagnósticos, procedimentos cirúrgicos, local do óbito, comorbi- dades, cuidados paliativos entre outras variáveis. Tavares afirma que atualmente a imensa maioria dos óbitos decorre de causas naturais. Entretanto, quando a comissão detecta uma lacuna na assistência, o setor de Qualidade é convocado para apurar os fatos. A partir daí, esse setor fica responsável por desenvolver um plano de ação e estabelece as ações corretivas. “Em todos os casos, convocamos os profissionais envolvidos na assistência para prestar esclarecimentos”, diz. Em relação aos ajustes que ainda precisam ser feitos, Tavares aponta a demora na análise dos óbitos, por conta do prontuário físico e o preenchimento incorreto da declaração de óbito. Para corrigir brechas, a comissão orienta os médicos sobre a necessidade do preenchimento correto da declaração. No Hospital Santa Paula, também em São Paulo, a Comissão de Óbitos existe desde 1992. “Quando a resolução do Cremesp foi publicada, contávamos já com 13 anos de atuação”, explicam os médicos José Paulo Cividanes e Raphel Simões Ferreira, diretor de qualidade e diretor técnico da instituição, ambos membros da Comissão. Inicialmente composta por três especialistas, a comissão hoje conta com quatro médicos de diferentes especialidades que se reúnem semanalmente para avaliação dos óbitos ocorridos na semana anterior. A análise se dá por meio de um roteiro preestabelecido que foi sendo aprimorado ao longo dos anos. Um relatório é redigido trimestralmente, e os resultados são enviados para a diretoria clínica, que os divulga para o corpo clínico. A análise é baseada nos atestados de óbitos e prontuários eletrônicos integrais dos pacientes. As variáveis analisadas são os diagnósticos inicial e final, coerência entre o atestado e a causa determinante do óbito, roteiro diagnóstico correto, evoluções médicas e de enfermagem diárias com data, assinatura e carimbo, medidas terapêuticas corretas em tempo hábil, ocorrência de acidentes ou falhas operacionais, aplicação dos protocolos institucionais nas patologias elegíveis e falha no acionamento do código amarelo em óbitos desassistidos. Em relação ao distúrbio metabólico, estabeleceu-se um protocolo: sempre que o laboratório constatar alterações fora dos limites instituídos, deverá imediatamente acionar o código amarelo Entre as principais falhas operacionais, a comissão identificou o hiato no cumprimento do protocolo de dor torácica, com retardo no tempo porta-balão preconizado pela instituição, e o retardo na correção de distúrbios metabólicos importantes, que contribuíram para o falecimento do paciente. Após análise, a comissão descobriu que os retardos no cumprimento do tempo porta-balão ocorriam sempre no período noturno e em finais de semana, quando o atendimento era prestado pela equipe de hemodinamicista e enfermagem específica, cumprindo plantão à distância. Apurou-se, então, que o deslocamento delas até o hospital tornava difícil o cumprimento do tempo estipulado em função da distância a que se encontravam. Como ação corretiva, estabeleceu-se uma escala de sobreaviso médico e de enfermagem, composta por um médico e uma enfermeira, com o propósito de identificar quais profissionais se encontravam mais próximos do hospital para o atendimento da ocorrência. Em relação ao distúrbio metabólico, estabeleceu-se um protocolo: sempre que o laboratório constatar alterações fora dos limites instituídos, deverá imediatamente acionar o código amarelo. Sem obRigatoRieDaDe Em Sergipe, ao contrário do estado de São Paulo, não existe a obrigatoriedade da comissão de revisão de óbitos. No Hospital São Lucas (HSL), em Aracaju, o gestor médico de cada setor (CTI, Alas de Internação, Emergência e Centro cirúrgico) Melh res Práticas 43 “Conseguimos fazer com que os colegas se sintam mais integrados ao serviço e conscientes de que são monitorados desde a entrada do paciente até o preenchimento do atestado de óbito” fica responsável pela análise de todos os óbitos. Se for detectada fragilidade na assistência, a equipe responsável é convocada para esclarecimentos. Jerônimo Araújo, gestor médico das alas de internação do HSL, conta que 100% dos prontuários de pacientes que vieram a óbitos são avaliados, levando em consideração variáveis como tempo de diagnóstico, abordagem terapêutica, cumprimento dos protocolos assistenciais, intercorrências e linha de cuidado. Uma das principais falhas operacionais detectadas a partir da análise dos óbitos, segundo Araújo, é a quebra da linha de cuidado, embora afirme que a acreditação venha aprimorando constantemente os processos. Araújo conta que a adesão aos protocolos, tais como o Protocolo de Sepse e de Prevenção de TEV, por exemplo, tem melhorado com ações educativas. “Conseguimos fazer com que os colegas se sintam mais integrados ao serviço e conscientes de que são monitorados desde a entrada do paciente até o preenchimento do atestado de óbito”, diz. Entre as falhas assistenciais identificadas, Araújo cita o disparo tardio dos protocolos e a não detecção precoce de deterioração clínica. Como ação corretiva, a comissão instituiu o Alerta Paciente Crítico, que envolveu enfermagem e médicos, e o Alerta Instabilidade, realizado pela enfermagem. Foram instituídos indicadores tais como taxas de adesão a protocolos (Sepse, AVC, Profilaxia de TEV), tempo porta-balão, tempo porta-ECG, tempo de liberação de exames entre outros. Nos hospitais Santa Joana e Memorial São José, de Pernambuco, a Comissão de Revisão de Óbitos nasceu da necessidade de analisar as causas dos óbitos nas instituições, explica Érica Mota de Sousa Batista, coordenadora médica do Same (Serviço de Arquivo Médico Estatístico). “Todos os prontuários dos óbitos são analisados pelo Same, depois pelas Comissões de Óbito, por meio de um checklist que avalia as causas, desfecho e eventos relacionados ao falecimento”, diz Érica. “Como variáveis, utilizamos o óbito por infecção, o desfecho (evitável, não evitável e inconclusivo), o óbito antes de 24 horas ou após, a taxa de mortalidade infantil, entre outros. Todas as mortes são avaliadas por setor”, diz. Para a coordenadora, é preciso repensar os óbitos evitáveis e desenhar planos de ação para que outros pacientes não sofram o mesmo dano. MP Como eStRutuRaR uma ComiSSão De ÓbitoS • Envolver a equipe clínica, de preferência de diferentes especialidades • Criar um impresso padrão • Criar um banco de dados • Estabelecer reuniões periódicas com a comissão • Estudar todos os casos de forma minuciosa e em curto prazo • Identificar todos os óbitos • Criar um fluxo de recolhimento dos prontuários para análise multidisciplinar • Definir método de análise (ex: checklist) • Definir os indicadores a serem monitorados • Definir como será a tratativa do desfecho dos óbitos Fontes:EricaMotadeSousaBatista,coordenadoraSameHospitalSantaJoanaeHospitalMemorialSãoJosé,eAlzePereiradosSantosTavares,chefedaequipeclínicadoHospitalPaulistano 44 Melh res Práticas