LUIZ FILIPE RIBEIRO DOS SANTOS
Pró-Reitoria de Graduação
Curso de Letras
Trabalho de Conclusão de Curso
ASSASSIN’S CREED:
UM LINK ENTRE A INTERNET E O NEOLOGISMO
Monografia apresentada ao curso de graduação
em Letras Inglês e Literaturas de Língua
Inglesa da Universidade Católica de Brasília,
como requisito inicial para obtenção do Título
Autor:deThiago
daLetras.
Silva N. Cordeiro
Licenciado em
Orientadora: Prof.ª MSc Rosângela de Nazareth Sousa Costa
Orientador: Professor Doutor Wiliam Alves
Biserra
Brasília - DF
2013
THIAGO DA SILVA N. CORDEIRO
UM LINK ENTRE A INTERNET E O NEOLOGISMO
Monografia apresentada ao curso de
graduação em Letras – Português e suas
literaturas da Universidade Católica de
Brasília,
como
requisito
parcial
para
obtenção do Título de Licenciado em
Letras.
Orientadora: Prof.ª MSc Rosângela de
Nazareth Sousa Costa
Brasília
2013
Monografia de autoria de Thiago da Silva N. Cordeiro, intitulada “UM LINK
ENTRE A INTERNET E O NEOLOGISMO”, apresentada como requisito parcial para
a obtenção do grau de Licenciado em Letras – Português e suas literaturas da
Universidade Católica de Brasília em ____/____/____, defendida e aprovada pela
banca examinadora abaixo assinada:
_________________________________________________________
Profª MSc Rosângela de Nazareth Sousa Costa
Orientadora
Curso de Letras - UCB
_________________________________________________________
Professor Doutor Wiliam Alves Biserra
Curso de Letras - UCB
_________________________________________________________
Prof.ª MSc Vera Lúcio Cordeiro da Conceição
Curso de Letras - UCB
Brasília
2013
Dedico este trabalho à memória de meu
pai, Amaro Cordeiro do Nascimento.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por estar sempre em minha vida e iluminar o meu
caminho, sempre mostrando saídas quando aparecem obstáculos;
À minha orientadora, Rosângela, por me auxiliar com sua genialidade neste
trabalho;
À minha irmã, Wânia, por ser minha inspiração e modelo a ser seguido, à
minha família, por me dar amor e ser o meu porto seguro,
E ao meu amigo Luiz Filipe, por me ajudar neste trabalho e compartilhar
comigo as aflições da elaboração de um TCC.
“No português contemporâneo falado no
Brasil, as terminologias científicas e
técnicas constituem a maior fonte de
criatividade léxica.” – Ieda Maria Alves
RESUMO
Referência: CORDEIRO, Thiago da Silva N. Um Link Entre a Internet e o
Neologismo. 2013. p. 40. Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em
Letras – Português e suas literaturas, pela Universidade Católica de Brasília – UCB,
Brasília, 2013.
Este trabalho consistir-se-á de uma pesquisa acerca dos processos de criação das
palavras, desde seus processos básicos até o fenômeno conhecido como
neologismo. Dentro desse fenômeno, o estrangeirismo, processo de criação de
palavras por meio de empréstimos de outros idiomas, será alvo de nossos estudos.
Veremos também que, assim como as palavras são geradas, elas também podem
ser extintas pelo próprio falante. Analisaremos, então, como a internet pode ser uma
rica fonte do processo de neologismo.
Palavras-chave: Neologismo. Estrangeirismo. Arcaísmo. Internet. Neologismo
morfológico.
ABSTRACT
This paper researches the process of word creation, since its basic process until the
phenomenon known as neologism. Inside this phenomenon, the foreignism, a word
creation process using borrowed ones from another languages, is the target of the
study. It states that words can be both created and extinguished by the speaker. It is
analysed how internet can be a rich source to the neologism process.
Keywords: Neologism. Foreignism. Archaism. Morphological Neologism.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Internauta usando to tweet ............................................................ 28
Figura 2: Brasileiro usando a expressão "twittar" ......................................... 29
Figura 3: Verbo "deletar" presente em blog .................................................. 30
Figura 4: Vários exemplos de neologismo em um único post de um blog .... 31
Figura 5: Verbo "logar" na 3ª pessoa do singular do pretérito imperfeito ..... 32
Figura 6: Charge irônica da internet cria neologismo ................................... 33
Figura 7: Neologismo em uma rede social "morta" ....................................... 34
Figura 8: Neologismo que une "orkut" com o sufixo -eiro ............................. 35
Figura 9: O caso da função print................................................................... 36
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................. 11
1
O BERÇO DAS PALAVRAS ................................................................. 13
2
DO NEOLOGISMO E SUAS VARIAÇÕES AO ARCAÍSMO ................ 20
3
2.1
ESTRANGEIRISMO ........................................................................ 22
2.2
O CEMITÉRIO DAS PALAVRAS .................................................... 25
OCORRÊNCIAS DE NEOLOGISMO NA MÍDIA ELETRÔNICA ........... 28
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................... 37
REFERÊNCIAS ............................................................................................ 39
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como tema a discussão acerca das ocorrências de
neologismo da Língua Portuguesa no âmbito da Internet e contextos eletrônicos.
Discutiremos os conceitos de neologismo sintático, neologismo semântico e
neologismo morfológico, buscando definições e exemplos na mídia da Internet.
Primeiro discutiremos as relações do processo de formação de palavras,
baseando-nos nos pressupostos de Basílio (2001), Cunha (1979), Cegalla (2000) e
Ferreira (2011), construindo, dessa maneira, os alicerces que sustentam as
estruturas que constituem as palavras.
Mais adiante, analisaremos parâmetros e definições de neologismo, usando
as contribuições de Alves (2007), Bechara (2010) e Biderman (2001), passando
pelos conceitos de estrangeirismo de Alves (2007) e Bechara (2010) e pelas
considerações de Houaiss (2007) acerca desse tema. Porém, apresentar exemplos
utilizados por esses linguistas não será nosso único interesse.
Também será alvo de nosso estudo entender como surgem os vocábulos
novos em nossa língua, como se dá esse processo de criação, suas razões e
finalidades. Será de fundamental importância o entendimento desse processo para
que possamos considerar, em nossa conclusão, todos os fatores que contribuem ou
fazem parte do fenômeno linguístico que é o neologismo.
Neste trabalho, apresentaremos conceitos e exemplos de neologismo
morfológico, sintático e semântico, mas manteremos nosso foco no neologismo
morfológico, especialmente sua ramificação denominada estrangeirismo e suas
ocorrências
na
internet.
Também
discorreremos
sobre
arcaísmo
e
aportuguesamento, uma consequência do estrangeirismo.
O conceito de neologismo é razoavelmente relativo, uma vez que essa
relatividade existe até mesmo quando refletimos sobre a relação do que é novo e do
que é velho. Um mesmo objeto pode ser considerado por alguém como velho e por
11
outra pessoa como novo, e talvez nenhuma delas possa provar que está correta e a
outra errada. Por essa razão, consideraremos como neologismo não apenas as
palavras que não constam no Vocabulário Oficial da Língua Portuguesa – VOLP,
tomaremos como exemplo qualquer palavra que seja no mínimo razoavelmente
nova, cuja origem ainda está viva em nossa memória recente (no que se refere a
neologismo morfológico) ou que tenha sido criada após a popularização da internet.
No que diz respeito ao arcaísmo, iremos conhecer o cemitério das palavras,
pois assim como as palavras nascem, elas também podem morrer na língua, se
deixarem de ser usadas.
Esta monografia se dividirá em três capítulos. O primeiro mostrará uma base
sobre formação de palavras e como se dá esse processo de acordo com diferentes
autores. O segundo abordará as formas de neologismo, com foco no morfológico,
estrangeirismo e arcaísmo. O terceiro tratará da análise de neologismos em
contextos eletrônicos, aplicando conceitos vistos nos capítulos anteriores.
12
1
O BERÇO DAS PALAVRAS
Antes de começarmos a pensar nas relações de neologia, é necessário nos
mantermos estáticos um passo antes disso para então trabalharmos o conceito de
palavra, analisando a forma como se dá o processo de estruturação delas. Para
isso, Basilio, doutora em linguística pela Universidade do Texas e professora da
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e da Universidade Federal do Rio
de Janeiro, nos auxilia:
Na língua escrita, não temos problemas de definição neste eixo, e podemos
definir a palavra como qualquer sequência que ocorra entre espaços e/ou
sinais de pontuação. Estamos nos referindo, naturalmente, a sequências
possíveis na língua; uma sequência como sqwrn seria interpretada
provavelmente como um erro de datilografia, nunca como uma palavra do
português. Mas há um outro eixo em que a definição de palavra causa
dificuldades: trata-se da distinção que normalmente estabelecemos entre
duas palavras distintas e duas formas da mesma palavra. Por exemplo,
dizemos que casa e casas são duas formas da mesma palavra, mas casa e
casinhola são duas palavras diferentes. Do mesmo modo, dizemos que
falam e falamos são duas formas do verbo falar, mas falante constitui uma
palavra diferente. (BASILIO, 2001, p.11).
Basilio (2001) faz afirmações importantes com as quais podemos começar a
entender a complexidade de problematização do conceito de neologismo. Podemos
entender as dificuldades de conceituar neologismo uma vez que a neologia muitas
vezes consiste em variações de palavras já existentes, como o caso de petista,
derivada da sigla PT. Esta designa um partido político, aquela designa os seus
respectivos seguidores.
Cunha (1979) também admite ainda não haver critério para caracterizar de
forma irrevogável e plausível o próprio elemento vocábulo, uma vez que as
definições existentes não abrangem, concomitantemente, as unidades sonora,
formal, funcional e significativa.
Os morfemas são unidades mínimas que possuem significado e integram as
palavras. Para Bechara (2010), eles podem ainda ser divididos em presos e livres.
Este ocorre quando tem forma que pode surgir com vida independente no discurso;
aquele, quando ocorre o oposto.
13
Por muito tempo, segundo Basilio, as palavras foram consideradas pelos
estudiosos como elementos indivisíveis, como unidades mínimas, papel hoje
ocupado pelos morfemas. Mas com o tempo veio a nova ideia de que as palavras
podem, sim, ser dividas em segmentos menores e, portanto, esses fragmentos
também devem ser classificados.
Ainda de acordo com os estudos da autora, quanto aos elementos
constitutivos, existem dois tipos de morfemas: afixo e raiz. A raiz é o morfema
principal e que carrega sozinha a capacidade de produzir significado, isto é, por si só
ela pode constituir uma palavra. Por exemplo: na palavra goleiro, gol é a raiz. Gol é
um exemplo de palavra constituída de raiz e que não pode sofrer divisões, ela está
em sua forma pura, podendo ser modificada apenas com a soma de outros
elementos, os afixos. Basilio define afixos como os elementos que unem-se às
raízes para com elas criar variações de uma mesma palavra. Dessa forma, em
goleiro, -eiro é o afixo. Os afixos são divididos em prefixos e sufixos. Estes são
acrescentados após a raiz, como -ista em jornalista, aqueles são acrescentados
antes da raiz, como -en na palavra encabeçar.
Cegalla (2000) define os afixos como elementos secundários, na maioria das
vezes sem independência, que se agregam a um radical ou tema para formar
palavras derivadas, classificando-os como prefixos quando antepostos ao radical ou
tema, e sufixos quando pospostos.
Usando como base os estudos de Basilio (2001) e aprofundando-nos um
pouco mais nessa relação de estruturação de palavras, podemos observar que em
uma mesma palavra pode haver um complexo processo de diferentes níveis de
combinações “base + afixo”. Usemos como exemplo as palavras mito, mítico,
mitificar, desmitificar e desmitificação. Mito é uma palavra em forma pura constituída
apenas de sua raiz e designa uma narrativa simbólica de determinada cultura.
Mítico, por sua vez, apresenta o sufixo -ico, e designa um conceito ou objeto relativo
a mito. Mitificar apresenta o sufixo formador de verbo -icar, o que muda a classe da
palavra e a transforma em uma ação (o ato de tornar algo em mito). Em desmitificar,
temos o prefixo -des, que remete a um desfazer, a uma desconstrução, designando
14
o caminho reverso ao que se faz em mitificar. Por último temos, além de outros
elementos, na palavra desmitificação, o sufixo -ção acrescentado à base
desmitificar, devolvendo a palavra para sua classe original: a de substantivo, porém
em uma nova variação e significado.
Tendo os exemplos de afixos citados anteriormente como base, podemos
perceber que o prefixo não muda a classe gramatical da palavra. Para reforçar essa
ideia, vamos pensar no caso da palavra bater, classificada como verbo. Mesmo que
acrescentemos os prefixos -com e -de, formando as palavras combater e debater,
respectivamente, todas essas são classificadas como verbos, pois a incidência de
prefixos não caracteriza mudança de classe gramatical, já que o papel do prefixo é o
de tão somente ressemantizar a base já existente.
Por sua vez, o acréscimo de sufixos a palavras pode gerar mudança
gramatical. Sufixos possuem uma carga semântica que é efetivada ao unir-se com
as palavras. Vejamos como exemplo o sufixo -vel, o qual é formador de adjetivos na
língua portuguesa. Se unirmos a palavra amar (verbo) com o sufixo -vel, teremos
amável, um adjetivo que designa pessoa a quem se pode amar.
Basilio (2001) nos alerta para que passemos a compreender a formação de
palavras não apenas como uma sequência matemática de morfemas, mas sim como
um complexo processo de disposição de bases com afixos, podendo estes ser
localizados antes ou depois de cada raiz.
Existem ainda outros processos de formação de palavras, como em
cachorro-quente, palavra formada por duas bases. Temos ainda casos como
desanimar, formação parassintética, com acréscimo simultâneo de prefixo e sufixo.
Consoante Basilio (2001), radical é o termo usado na morfologia para
designar uma base, enquanto tema é o nome que se dá a uma base seguida de uma
vogal temática, mas, basicamente, esse termo é utilizado apenas no processo de
estruturação de formas flexionadas.
15
Atualmente, a língua portuguesa é constituída de aproximadamente 400 mil
palavras. Esse extenso e rico vocabulário recebeu contribuições das mais variadas
línguas. Vejamos os exemplos a seguir.
Palavra
Idiomas de origem
Sambódromo
Quimbundo (língua africana) + grego
Abajur
Francês
Blitz
Alemão
Chiclete
Náuate (língua falada pelos astecas)
Samurai
japonês
Pizza
Italiano
Pindaíba
Tupi
Fonte: FERREIRA, Mauro. Aprender e praticar gramática. São Paulo: FTD,
2011, p.196.
Segundo Ferreira (2011), se pensarmos o processo de formação de
palavras, podemos dividi-las em três grupos: primitivas, derivadas e compostas. As
primitivas são aquelas que não se formam de outras já existentes no idioma; as
derivadas são as palavras que têm sua formação baseada em uma única outra
palavra (ou radical) já existente; e as compostas são aquelas formadas por duas ou
mais palavras já existentes. Porém, existem também palavras que são,
simultaneamente, compostas e derivadas, como porto-alegrense (Porto + Alegr[e] +
ense).
Então, é a partir principalmente de palavras primitivas que criam-se outras
por diferentes formas de derivação ou composição. Esses processos serão
mencionados a seguir, consoante aos estudos de Ferreira.
Ferreira aponta que derivação é o processo que dá origem a uma outra
palavra a partir de uma única palavra existente na língua.
16
Derivação prefixal ou prefixação: inútil > in (prefixo) + útil (palavra primitiva);
desligar > des (prefixo) + ligar (palavra primitiva). Outros exemplos: relembrar,
infeliz, apolítico, bípede, compor. Existem palavras que se formam por derivação
prefixal a partir de outras que já são formadas por prefixação: descobrir >
redescobrir.
Derivação sufixal: ruazinha > rua (palavra primitiva) + (z)inha (sufixo);
jardinagem > jardim (palavra primitiva) + agem (sufixo). Outros exemplos:
novamente, ligação, cabecear, lavável, capitalista.
Derivação prefixal e sufixal é uma junção das duas últimas mencionadas
anteriormente. É o caso de “infelicidade” > in (prefixo) + feliz (palavra primitiva) +
dade (sufixo).
Derivação parassintética: apaixonar > a (prefixo) + paixão (palavra primitiva)
+ ar (sufixo); esfriar > es + frio + ar; emudecer> e + mud[o] + ecer; enraivecer (en +
raiv[a] + ecer).
Uma importante consideração que Ferreira (2011) faz é a respeito de como
distinguir parassíntese de derivação prefixal. Para isso, basta eliminar o prefixo e/ou
sufixo da palavra em estudo e fazer a seguinte observação: Se, com pelo menos
uma das eliminações, a palavra ainda fizer sentido, trata-se de uma derivação
prefixal e sufixal (infelizmente - in = felizmente). Se, pelo contrário, com a eliminação
do sufixo ou prefixo, a palavra não fizer sentido, trata-se de uma derivação
parassintética (anoitecer - a = *noitecer, anoitecer - ecer = *anoit).
Voltemos agora aos tipos de derivação consoante Ferreira (2011).
Derivação imprópria é o processo que muda uma palavra de sua classe
gramatical usual para uma outra classe, sem que se altere a sua forma. É o caso de
quando “nascer”, usualmente verbo, torna-se substantivo quando acrescido de artigo
definido: “O nascer de uma nova era.”.
Derivação regressiva, segundo Ferreira (2011), é o processo que forma
substantivos indicadores de ação, pela adição das vogais -a, -e ou -o ao radical de
17
verbos terminados em -ar ou -er. É o caso de invento > inventar: invente + o; e
venda > vender: vend + a.
Ferreira (2011) apresenta também o processo de formação de palavras
através da composição. Vamos, por meio dos estudos do autor, mencionar
algumas das principais formas de composição. Para isso, vamos usar as palavras
“pontapé” (ponta + pé) e “planalto” (plano + alto). Ambas são formadas por
vocábulos que já existem em nossa língua, mas, na primeira, não houve alteração
nas duas palavras formadoras do processo de junção, caracterizando composição
por justaposição; enquanto na segunda, “plano” perdeu o “o”, gerando um vocábulo
novo por meio de composição de aglutinação.
Não podemos encerrar este capítulo sem citar os quatro últimos processos
de formação de palavras que nos é interessante para este estudo neologístico. Para
isso, ainda teremos Ferreira (2011) como base:
O hibridismo ocorre quando uma palavra é formada de outras duas que já
existem e que possuem origens distintas. É o caso de “sambódromo”, na qual temos
“samba”, palavra de uma língua africana, e “dromo”, palavra de origem grega. São
dois vocábulos (ou radicais) de idiomas distintos que se juntam para formar uma
nova palavra. Podemos citar ainda a palavra “bicicleta”, na qual temos “bi”, do latim,
“ciclo”, do grego, e “eta”, do francês.
Temos também a famosa onomatopeia, um processo de formação de
palavras comum e superficialmente mencionado nos livros didáticos de ensino
fundamental. Esse fenômeno consiste na formação de uma palavra que reproduz,
por meio de imitação, um determinado som ou ruído. É o caso de “trim-trim”,
representando o som de um telefone, “bum”, representando uma batida ou colisão, e
“vrum”, representando o barulho que faz o motor de um veículo.
Ferreira (2011) apresenta, também, a sigla, processo bem conhecido que
consiste em unir as letras iniciais de palavras para formar uma nova. Temo esse
caso em Enem – Exame Nacional do Ensino Médio e ONU – Organização das
Nações Unidas.
18
A última que iremos citar é a redução vocabular, processo que elimina
parte da palavra, reduzindo o tamanho dela até o limite mínimo de forma que não
impossibilite o seu significado ou compreensão. Podemos apresentar os seguintes
casos: motocicleta > moto, apartamento > apê, telefone > fone e lipoaspiração > lipo.
Considerando todas as informações citadas até agora sobre o processo de
estruturação das palavras que formam o nosso léxico, podemos, enfim, começar a
nos aventurar no mar de possibilidades que configura o neologismo e suas
ramificações, agora munidos de uma base teórica que nos possibilita compreender
melhor o que constitui todo esse processo.
19
2
DO NEOLOGISMO E SUAS VARIAÇÕES AO ARCAÍSMO
Nenhuma língua é estável. Qualquer língua passa por transformações
através dos séculos, tanto no léxico como em sua estrutura. Novos objetos são
inventados pelo homem, novas ideologias surgem na sociedade, e faz-se necessário
o uso de palavras inéditas.
É sabido que a construção de novos vocábulos segue uma lógica, sendo
organizados de acordo com o que o sistema da língua permite fazer. O português
brasileiro tem sua origem na língua latina, e o latim é muitas vezes a fonte para a
criação de novas palavras, servindo de base com os radicais pertencentes aos seus
vocábulos.
Às palavras novas que são criadas pelo falante para a produção de um
sentido até então inexistente dá-se o nome de neologismo.
Alves (2007) define neologia como todo processo de formação de novas
palavras em uma língua, enquanto que, para ela, neologismo é o produto desse
processo de criação. A autora diz ainda que: “O neologismo pode ser formado por
mecanismos oriundos da própria língua, os processos autóctones, ou por itens
léxicos provenientes de outros sistemas linguísticos. Na língua portuguesa, os dois
recursos têm sido amplamente empregados, diacrônica e sincronicamente.”.
Já Biderman diz que:
O neologismo é uma criação vocabular nova, incorporada à língua.
Distingue-se dois tipos de neologismo: 1) o neologismo conceptual e 2) o
neologismo formal. No primeiro caso se trata de uma acepção nova que se
incorpora ao campo semasiológico de um significante qualquer. No segundo
verifica-se, às vezes, ampliação de um campo semântico através de novas
conotações que vão sendo dadas a um significante. O neologismo formal
constitui uma palavra nova introduzida no idioma. Pode ser um termo
vernáculo ou um empréstimo estrangeiro. (BIDERMAN, 2001, p.203).
Trabalharemos o conceito de estrangeirismo mais adiante. A questão é que,
além dos tipos de neologismo citados por Biderman, também podemos classificá-los
em outras categorias.
20
Quando o falante cria uma palavra nova fazendo uso de prefixos ou sufixos
da língua, ou mesmo com a fusão de palavras pré-existentes, estamos falando de
neologismo morfológico. Exemplos: biodiversidade, celular, clique, escanear,
genoma, homepage, internet, microssistema, site, transgênico, zipar. Esse tipo de
neologismo é classificado por Biderman (2001) como neologismo formal. Ela
também mostra que o neologismo pode ser uma lexia completa: coleta seletiva do
lixo, endereço eletrônico, estação de trabalho, lavagem de dinheiro, mídia eletrônica,
paraíso fiscal, ressonância magnética, teoria do caos, transmissão de dados.
Porém, quando o falante toma uma palavra da nossa língua e a utiliza em
outro contexto que não o já usual e recorrente, estamos falando de neologismo
semântico. Nesse contexto, podemos encaixar algumas gírias dos adolescentes.
Biderman (2001) apresenta exemplos que, embora já sejam dicionarizados desde
1975, vêm perdendo progressivamente seu valor geriátrico: barato, topar, grilo,
dedo-duro, careta e chapa. Hoje, dedo-duro foi substituído por cagoete e xisnove.
Outra gíria atual que pode ser considerada um neologismo semântico é o uso do
verbo ficar para designar um relacionamento rápido e sem compromisso. Exemplo:
“Quero ficar com aquela menina”. Pegar é outro neologismo semântico usado como
sinônimo de ficar. Assim como no caso dos neologismos morfológicos, os
semânticos também podem vir em uma locução, como passar o rodo, que significa
relacionar-se com uma grande quantidade de pessoas.
Já quando o interlocutor dá-se a liberdade de criar novas formas de
estruturação dos termos de uma oração, estamos lidando com neologismo
sintático. Algumas pessoas têm o hábito de usar o advérbio de negação (não) duas
vezes em uma mesma oração: “Não quero tomar banho não”. Também podemos
considerar como exemplo casos em que o falante muda a regência do verbo: “Tenho
que ir na escola hoje”. A mudança da classe morfológica de uma palavra também
pode ocorrer. É o caso de “Ganhar é bom.”. Nesse caso, ganhar, normalmente
verbo, tornou-se substantivo para ocupar a função de sujeito da oração. O mesmo
ocorre em “Os nãos da minha mãe me incomodam”, onde não aparece como
substantivo, inclusive com desinência de número.
21
São esses os principais tipos de neologismo, e aquele que nos interessa
neste trabalho é o morfológico. Porém, dentro dele, há uma subdivisão que também
é alvo do nosso estudo, o caso do neologismo por empréstimo de palavras de outra
língua, o estrangeirismo (ramificação do neologismo morfológico), que discutiremos
a seguir.
2.1 ESTRANGEIRISMO
Se observarmos as informações anteriores sobre os conceitos de
neologismo apresentados por Alves (2007), poderemos deduzir que o processo
neológico não acontece de forma arbitrária. Quando o sistema estrutural de uma
língua não permite ao falante criar um novo vocábulo, ele pode recorrer a palavras
oriundas de outras línguas, caracterizando em um processo denominado
estrangeirismo, presente em nossa língua há séculos. Quando os portugueses
chegaram ao Brasil, incorporaram muitas palavras do léxico indígena na língua
portuguesa, mesmo que algumas das línguas dos índios não possuíssem registro
escrito. Ora, antes desses vocábulos “emprestados” serem realmente incorporados
de tal forma em nossa língua que resultasse, de fato, em uma aceitação pelos
estudiosos como palavras do português brasileiro – o qual ainda não tinha sido
completamente moldado, requerendo ainda grande processo de transformação –
essas palavras poderiam ser consideradas como estrangeirismos.
Sobre o estrangeirismo, Alves diz:
O estrangeirismo é facilmente encontrado em vocabulários técnicos –
esportes, economia, informática... – como também em outros tipos de
linguagens especiais: publicidade e colunismo social. [...] O vocabulário
esportivo das corridas automobilísticas de Fórmula I, citado a título de
exemplo, recebe vários anglicismos. Entre eles, pole-position, a ‘primeira
posição no momento da partida’, e flying lap, uma ‘volta rápida’”.(ALVES,
2007, p.73).
Dessa forma, podemos compreender estrangeirismo como todo vocábulo
emprestado de língua estrangeira – seja ela qual for – e utilizado na língua
22
portuguesa, tanto para o propósito de alcançar um conceito, definição ou ideologia
pelos quais não se têm termos existentes em nossa língua, como para o propósito
sem argumento relevante, como é o caso de usar palavras estrangeiras para
designar-se a objetos os quais já possuem, no português, seus próprios vocábulos
referentes.
Sobre o estrangeirismo na terminologia econômica, a autora traz ainda
alguns exemplos muito interessantes (p.74):
Nos últimos capítulos da novela Vale Tudo, donas-de-casa e leigos em todo
o País acompanharam, passo a passo, o golpe tramado contra a TCA pelo
ardiloso Marco Aurélio (R. Farias), através de uma operação de leasing
(contrato de locação de equipamentos, com prazos estipulados),
desvendada por William, o regenerador. No caso, M. Aurélio contratava
ilicitamente aviões para a empresa. Eis aí um exemplo de como via
economês, mais uma expressão emprestada do inglês passa a frequentar
as conversas mais banais na vida real. Mas qualquer um que não seja do
ramo ainda deve se intrigar diante do discurso de um expert, sem nenhum
know-how, no ranking do over, overnight, dólar no black; sem entender de
joint-ventures, merchandising ou marketing é provável que fique totalmente
out. (ALVES, 2007, p.74).
Para o dicionarista Houaiss (apud ALVES, 2007, pg.74), mais que um
modismo, o estrangeirismo trata-se de “uma subserviência mental dos economistas,
derivada da extrema ignorância que têm da língua portuguesa”. Tanto o dicionarista
como Alves defendem a linha de que noventa por cento dessas palavras e conceitos
poderiam ser substituídos por termos adequados em português. É o caso de muitos
termos referentes a tecnologias digitais, como o caso de on-line, termo usado para
se referir a alguma pessoa ou algum serviço que se encontra conectado com a rede
mundial de computadores. O termo, de origem estadunidense, já foi adaptado para o
idioma espanhol: en línea. Em português brasileiro, uma tradução óbvia seria “em
linha”, mas esse termo não é usado na comunidade internáutica.
Atualmente, no ambiente virtual, tem-se usado bastante o anglicismo
mainstream para designar algo que tornou-se comum, rotineiro, tedioso e muito
usual. As pessoas que usam o termo mainstream são aquelas que fogem da
“mesmice”, procuram a novidade, e evitam a todo o custo essa “corrente principal”.
Mas por que não usar uma adaptação em português para essa expressão? A
23
ocorrência de anglicismo nesse caso é irônica, pois o uso dele está tão comum que
o próprio ato de repeti-lo tornou-se mainstream.
Browser é o termo estrangeiro para navegador de internet, leitor de
hipertextos. Porém, sua incidência é hoje menor. Tem-se usado cada vez mais o
termo “navegador”, tornando esse um caso de anglicismo que decaiu, pois o falante
encontrou uma forma cabível de adaptação para o nosso idioma.
Outro anglicismo usado há décadas no Brasil está no meio da música
country, trata-se do vocábulo cowboy, que designa a pessoa que conduz a boiada,
montada a cavalo. Em nossa língua, temos a adaptação equivalente: vaqueiro;
forma pouco usada. Além disso, conforme o Vocabulário Oficial da Língua
Portuguesa, temos a nossa própria variação de cowboy: caubói, a qual difere-se
apenas no ato da fala, caracterizando-se em um termo homófono.
Bechara também faz uma importante reflexão sobre estrangeirismo:
O emprego de palavras, expressões e construções alheias ao idioma que a
ele chegam por empréstimos tomados de outra língua, e acrescenta que
entre nós o que se deve combater é o excesso de importação de línguas
estrangeiras, mormente aquela desnecessária por se encontrarem no
vernáculo palavras e giros equivalentes. (BECHARA, 2009, p.599).
Considerando o fragmento acima de Bechara e ainda analisando o caso da
palavra cowboy podemos chegar a considerações importantes sobre estrangeirismo.
Além das informações já apresentadas, é interessante ver que o falante
simplesmente faz escolhas usando de critérios meramente pessoais: o termo
equivalente em português para cowboy é vaqueiro, mas o falante prefere o termo
estrangeiro. Nem mesmo a criação e aceitação de uma forma aportuguesada
(caubói) fez com que o brasileiro usasse o termo em sua grafia anglicista. Talvez um
dos motivos para esse tipo de incidência seja a exagerada admiração da língua
inglesa, glorificando-a e criando a ilusão de que ela é superior à nossa. É claro que
existem termos intraduzíveis (uma vez que toda tradução é uma adaptação e nem
sempre existe forma equivalente no léxico para o qual se pretende traduzir), mas
não há desculpas para preferir-se usar termos estrangeiros nos casos em que se há
sim palavras de igual valor e significado em nosso léxico.
24
2.2 O CEMITÉRIO DAS PALAVRAS
Assim como existe a possibilidade de criarem-se novas palavras, também é
possível que elas caiam em desuso quase irreversível. Chamamos esse fenômeno
de Arcaísmo. Para Coutinho (1976), Arcaísmos são formas, palavras ou expressões
antigas que já não são mais usadas.
“Consulte-se a obra de qualquer escritor antigo, e logo se encontrará uma
multidão de palavras ou expressões, cuja forma ou sentido são hoje inteiramente
desconhecidos.” (COUTINHO, 1976).
A própria cultura humana passa por transformações, hábitos são
descontinuados, produtos deixam de ser produzidos, profissões tornam-se
desnecessárias e também caem no esquecimento. Para cada situação, profissão ou
objetos interrompidos, quaisquer palavras que refiram-se a esses correm o risco de
tornarem-se arcaísmos, e geralmente é o que acontece.
Outros fatores que podem contribuir para que um vocábulo tenha esse fim
são a falta de acesso do falante àquele vocábulo – seja por falta de conhecimento
ou por não ter contato com ele – e a própria preferência do falante a usar sinônimos
ou termos que exercem a mesma função semântica.
Coutinho aponta:
As causas que determinam a arcaização dos vocábulos são:
1)
o desaparecimento das instituições, costumes e objetos: suserano,
vassalo, feudal, adail, ouvidor, comuna. anadel, almotacel, alcaide,
bucelário, catapulta;
2)
a sinonímia ou o neologismo: arleirice (astúcia), rouçar (violentar),
asinha (depressa), punçante (pungente), manda (testamento);
3)
o eufemismo ou a degradação de sentido: cornos (pontas, armas),
parir (dar à luz), drudo (amante), manceba (concubina), feder (cheirar mal),
tratante (negociante), safado (gasto pelo uso);
4)
o sentido especial: degredos (decretos), físico (médico), manha (dote
do espírito);
25
5)
a homonímia: ca (porque) por causa de cá (aqui), u ou hu (onde) por
causa de u (vogal), osso (urso) por causa de osso (tecido ósseo).
(COUTINHO, 1976, pg.212).
Sobre esse trecho é importante destacar que algumas formas, mesmo sendo
arcaísmos, ainda vivem em nossa língua através de estudos históricos, por exemplo.
É o caso de termos como feudal, vassalo e catapulta. Essas são palavras que
podem não fazer parte do nosso cotidiano, mas que sabemos o seu significado por
serem tema de estudos históricos importantes.
Outro ponto interessante é que a criação de um neologismo para um
conceito que já possua uma palavra pode transformar a palavra substituída em um
arcaísmo, como o caso de manda (testamento) mencionado pelo autor.
Peguemos como exemplo a palavra estória. Essa palavra pode ser
considerada como homônimo de história, porque podem possuir a mesma pronúncia
(dependendo da variação de pronúncia usada) e têm significados diferentes. Estória
trata-se da narração de uma história, seja ela inventada ou real: em um filme, em um
livro, etc. Já classifica, dessa forma, Houaiss (2010): história s.f. 6 - narração de
eventos fictícios ou não, narrativa, estória.
Porém, apesar da definição de estória constar em alguns dicionários, a
palavra está caindo em desuso. O falante usa o termo história para desempenhar o
papel do vocábulo que está sendo abandonado, e, não é muito difícil que alguém
que escreva a palavra estória seja repreendido “por estar errado”. Estória
provavelmente será considerada um arcaísmo em breve, ou já pode ser considerada
como um, dependendo do ponto de vista e argumentos usados para tal.
Mas tornar-se arcaísmo não é, necessariamente, a morte definitiva de uma
palavra. Existe um movimento na língua que caracteriza-se em uma tentativa de
reviver esses termos, algumas vezes, com sucesso. Tal fenômeno é chamado por
Coutinho de ressurreição do arcaísmo, e pode ocorrer tanto por parte dos autores
literários como por parte do próprio falante comum da língua.
Coutinho (1976) cita alguns termos considerados arcaicos e que passaram
por tentativas de ressurgimento: acoimar, afã, aleive, aquecer, arrefecer, aturar,
26
atroar, confortar, doesto, esmerar, estugar, fagueiro, finado, grei, incréu, lidar, lídimo,
quebrantar, sanha, sanhudo, tanger, vindita, agrura, atavio, córrego, escudar,
esgares, esmolar, esquivar, galardoar, ladear, látego, lasso, lide, louçania, poento,
pompear, queixume, realeza, sobrecenho, timoneiro. Podemos notar que hoje,
algumas dessas palavras de fato voltaram ao uso, como aquecer, confortar, e
tanger, por exemplo.
Portanto, cair no processo de arcaísmo não caracteriza o fim de uma
palavra. Assim como não existe na língua uma estabilidade que impeça qualquer
tipo de transformação, mesmo o arcaísmo está sujeito a essas mudanças.
27
3 OCORRÊNCIAS DE NEOLOGISMO NA MÍDIA ELETRÔNICA
É inegável o fato de que a Internet está em grande processo de expansão. A
língua é uma das principais ferramentas usadas nesse meio eletrônico e, devido à
difusão mercadológica de empresas estrangeiras, termos novos surgem em nossa
língua. Isso ocorre porque as redes sociais e sítios mais famosos, por exemplo, têm
sua origem nos Estados Unidos. Peguemos como exemplo o Twitter.
Em inglês, a palavra twitter equivale ao “piar” ou “gorjear” dos pássaros,
explicação óbvia ao considerarmos que o ícone do site é uma ave. Em
consequência da busca de uma praticidade na comunicação dos usuários desse
site, o falante de inglês usa as formas to Twitter e to Tweet.
Figura 1: Internauta usando to tweet
Em inglês, esse caso não caracteriza-se em um neologismo, uma vez que a
palavra já existe no vocabulário da língua inglesa. Porém, para a mesma finalidade,
os usuários brasileiros do Twitter fazem a sua adaptação do termo, já que o nome
28
do site se mantém Twitter, pois trata-se de uma marca, e não é traduzida. O falante
do português faz então a seguinte adaptação:
Figura 2: Brasileiro usando a expressão "twittar"
Agora temos um caso de neologismo. Não pode ser um estrangeirismo, pois
a palavra “twittar” não existe no vocabulário de língua inglesa. Tal palavra também
não está registrada, nessa forma, no Vocabulário Oficial da Língua Portuguesa, nem
nos principais dicionários brasileiros. Trata-se de uma adaptação criada pelos
brasileiros constituída da fusão de um termo estrangeiro “twitter” com um sufixo
formador de verbo “-ar”, gerando, então, um novo vocábulo. É importante lembrar
que qualquer conceito de “novo” é relativo. Podemos considerar a palavra nova, uma
vez que o microblogging1 foi criado em 2006. Em português, “twittar” seria algo como
“piar”, não como substantivo, e sim como verbo.
Hoje, o que consta, no VOLP, é a forma tuitar, sendo esse o nosso vocábulo
correspondente a to tweet na língua portuguesa. A palavra foi registrada dessa
forma por ter sido aportuguesada para entrar nos padrões do nosso léxico. Porém, a
forma tuitar já nasce quase morta, pois pouco é usada e provavelmente será quase
exclusiva dos dicionários, pois o falante prefere as formas que mais se assemelham
1
Tipo de blog no qual os usuários fazem publicações pequenas, geralmente com até 200
caracteres.
29
com os termos estrangeiros. Será mais uma palavra com o mesmo fim que “caubói”
e “muçarela”.
Figura 3: Verbo "deletar" presente em blog
O caso do verbo “deletar” é interessante de uma forma diferente. Em inglês,
to delete significa “excluir”, ou “apagar”. Mas, com a disseminação da internet e da
informática, ao invés de fazer a tradução (perfeitamente cabível, nessa situação), o
falante de português optou por usar a palavra estrangeira e acolhê-la como um
verbo, usando-a em todas as conjugações que lhe forem convenientes. Hoje,
“deletar” consta em nosso VOLP, o qual classifica-o como verbo. Usar a palavra
delete, em sua forma original, caracteriza um estrangeirismo. Mas, a partir do
momento em que o falante aportuguesa o termo, criando variações com a junção do
sufixo formador de verbo –ar, tem-se um caso puro de neologismo.
Ferreira (2011) classifica o verbo deletar como um caso de hibridismo,
processo de formação de palavras em que há a união de radicais de mais de um
idioma para formar uma nova palavra, pois [to] delete (inglês) + ar (latim). O autor
30
também alerta sobre a dificuldade de classificar uma palavra como híbrida sem uma
consulta a dicionários especializados.
Podemos considerar não apenas a Internet como um fator decisivo para o
caso da forma “deletar”, mas a informática em geral, uma vez que, nos próprios
teclados dos microcomputadores, notebooks e afins, o botão é marcado com a
palavra delete, em sua forma original.
Figura 4: Vários exemplos de neologismo em um único post de um blog
Nessa imagem, temos um rico exemplo do assunto tratado, pois podemos
ver diferentes casos de neologismo em um único e breve texto. O título do blog
(palavra que por si só já caracteriza estrangeirismo, uma vez que já temos no VOLP
31
a forma “blogue”) já nos chama atenção: “Blogando n@ Escola”. Vamos considerar,
então, que o falante criou o verbo “blogar” a partir do termo estrangeiro. A partir daí,
criam-se facilmente formas verbais diferentes dessa nova palavra, como o gerúndio
“blogando”. Podemos notar que o radical da palavra já é escrito em destaque no site,
usando-se letras maiúsculas. A partir daí, podemos esperar nos depararmos com
diferentes variações, como “blogueiro” (aquele que bloga, o responsável pelos
textos), e “blogosfera”, um substantivo criativo e rico no aspecto semântico.
Na mesma imagem, podemos observar a palavra estrangeira post, que em
inglês seria a postagem, o texto, a mensagem do blogueiro. A preferência pelo termo
estrangeiro é quase total nesse tipo de site.
A figura mostra ainda um termo em inglês que não possui tradução eficiente:
logout, que designa o ato de desconectar-se de um sistema de autenticação de um
utilizador. Login e logout também geraram, no português, o verbo “logar” e suas
variações. Esse neologismo não consta no VOLP.
Figura 5: Verbo "logar" na 3ª pessoa do singular do pretérito imperfeito
32
Figura 6: Charge irônica da internet cria neologismo
Como estamos falando da Internet, não poderíamos nos esquecer de
mencionar as charges, que se antes faziam sucesso nos jornais, hoje também são
verdadeira febre nos blogues e redes sociais. É nessa arte humorística e irônica que
o talentoso artista Dan Piraro (2011) cria uma realidade alternativa onde os bonecos
de neve ocupam o lugar dos humanos, e vice-versa. Na charge, o membro de uma
família de bonecos de neve aponta as partes humanas que caem do céu, em uma
alusão à neve da nossa realidade, e exclama: “Está humando!”. Imediatamente
fazemos a comparação da palavra criada na charge com o verbo em gerúndio
“nevando”, pois é essa a intenção do artista. Ora, se nevar é o verbo que indica o
fenômeno natural em que cai neve, então “humar” seria um fenômeno também
natural onde caem humanos, na realidade imaginária de Piraro. Esse neologismo
não entrará nos diálogos do falante, mas pode gerar discussões e uma limitada série
de repetições por meio de comentários acerca da charge.
33
Figura 7: Neologismo em uma rede social "morta"
Aqui chegamos a um ponto interessante, algo que deve ser considerado
neste trabalho. A Internet é um meio onde o tempo é precioso de uma forma
diferente. Em um ano, a quantidade de novidades, de mudanças tecnológicas e de
transformações no ambiente virtual da Internet é assustadora. Vamos usar o Orkut
como exemplo. Essa rede social foi criada em 2004 e hoje praticamente não é mais
usada, embora ainda exista. O fato é que seu papel, hoje, é exercido pelo Facebook.
É lá onde a maioria dos internautas estão agora.
Se a Internet muda tão rápido, neologismos como o da imagem não apenas
caem em desuso, mas tornam-se também tão obsoletos que provavelmente só
serão objetos de estudo da língua na diacronia2 ou na sincronia e, em breve, seus
registros da rede serão inacessíveis. Então, qual o sentido em se registrar palavras
como tuitar se, daqui alguns anos, provavelmente não haverá mais Twitter?
Considerando o neologismo “orkutar”, também podemos refletir sobre a
seguinte questão: Por que o falante não faz algo parecido com o Facebook? A
resposta é imediata: mera questão estética. Em inglês, algo como facebooking
funcionaria, mas, em português, facebookar não soa bem. O falante, ao criar
2 “É sincrônico tudo quanto se relacione com o aspecto estático da nossa ciência, diacrônico
tudo que diz respeito às evoluções.” (SAUSSURE, 2006, pg.96).
34
palavras, faz escolhas e comparações, não apenas no que se refere à estrutura do
nosso léxico, mas também faz opções relacionadas ao que soa belo e funcional em
uma palavra.
Figura 8: Neologismo que une "orkut" com o sufixo -eiro
Nesse caso, temos um neologismo morfológico que consiste da união da
palavra “Orkut” com o sufixo -eiro, que costuma indicar “aquele que exerce
determinada no função”. Semanticamente, orkuteiro seria aquele que usa o orkut,
como qualquer outro membro da rede social mencionada.
35
Figura 9: O caso da função print
Por fim, temos o caso do neologismo printar, que trata-se do ato de capturar a
imagem da tela do computador, celular, ou outro aparelho eletrônico. Podemos
perceber que, no caso, não há outro termo que pudesse substituir o neologismo
criado, uma vez que trata-se de uma ação muito específica do ambiente digital, e
portanto, mais uma vez, o falante usou dos elementos linguísticos que ele tinha
acesso: o nome da tecla, em inglês: PrintScreen Sys Rq, retirando a forma print + o
sufixo formador de verbo -ar.
Podemos concluir, então, que o falante faz escolhas quando se depara com
situações que requerem palavras que não existem em sua língua. Ele usa, para
suprir essa necessidade, recursos como: a forma estrangeira da palavra, como link,
e usa o termo nas situações em que ele pode ser utilizado. Mas, quando a
necessidade se dá por usar o termo em classes gramaticais diferentes, ele sai do
estrangeirismo para criar uma palavra nova, como linkar. A partir daí, pode nascer
ainda uma forma aportuguesada da palavra: lincar. E, desde que o uso do termo
seja constantemente difundido e não seja parte de elementos temporários da
internet, como sites específicos, não pode-se prever o desuso de tais palavras.
36
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Então sabemos que o falante cria novas palavras na língua para atender a
determinadas necessidades, sejam elas de diálogo, ou como forma de arte, ou
simplesmente para adaptar um termo estrangeiro, que pode ter tradução adequada
ou não em nosso idioma. Isso caracteriza o fenômeno que denominamos de
Neologismo Morfológico.
Um ponto interessante a que chegamos é que o falante cria neologismos em
um processo de comparação com o léxico que ele já possui acesso. Não é preciso
ser letrado para criar um novo vocábulo. O falante realiza esse processo de
formação de palavras mesmo que não seja letrado ou que não saiba o que é um
sufixo ou um afixo. É um processo natural e que faz parte da língua.
Os vocábulos passam, muitas vezes, por diferentes processos linguísticos
até tornarem-se palavras com certa estabilidade e frequência de uso para os
falantes. Um termo em estrangeiro pode ser usado repetidamente pelos falantes de
português, caracterizando estrangeirismo, e, em seguida, pode ser aportuguesado e
tornar-se uma nova palavra, sendo neologismo puro, ou mesmo um caso de
hibridismo, caso um radical de um idioma junte-se a um sufixo de outro, por
exemplo.
Quando uma palavra cai em desuso, temos o fenômeno arcaísmo, que nada
mais é do que outro processo de transformação e, como tal, não é necessariamente
definitivo; é possível, então, que o termo volte a ser usado, em um resgate da
palavra ao uso na língua.
Quem faz a língua é o povo. Nenhuma língua é estável, todas passam por
processos de transformações que atravessam os séculos, e não é diferente com o
português. Não podemos prever como estará o léxico do português brasileiro daqui
a duzentos anos. Ele poderá se expandir a um nível inimaginável.
37
Mais imprevisível que a língua é a Internet. O que será de redes sociais
famosas hoje como Twitter e Facebook daqui a cinco anos? Que novos termos
estrangeiros oriundos da Internet poderão ser criados e em seguida tornar-se-ão
obsoletos?
Não
é
difícil
prever
que
outros
termos
estrangeiros
serão
aportuguesados, novas palavras serão criadas e registradas, para logo depois
serem ignoradas pelo próprio falante. Os gramáticos não ditam as regras, não
controlam a língua, eles apenas podem fazer registros. O papel de transformar a
língua é do falante, seja ele letrado ou não.
38
REFERÊNCIAS
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portuguesa. 5. ed. Rio de Janeiro: Global, 2009.
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atualizada pelo novo Acordo Ortográfico. - Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2010.
BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2009.
BIDERMAN, Maria Tereza Camargo. Teoria lingüística. 2.ed. São Paulo: Martins
Fontes, 2001.
CEGALLA, Domingos Paschoal. Novíssima gramática da língua portuguesa. São
Paulo: Editora Nacional, 2000.
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Livro Técnico, 1976.
CUNHA, Celso Ferreira da. Gramática da língua portuguesa. Rio de Janeiro:
Fename, 1979.
FERREIRA, Mauro. Aprender e praticar gramática. São Paulo: FTD, 2011.
HOUAISS, Antônio. Minidicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro:
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SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de lingüística geral. 27.ed. São Paulo: Cultrix,
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39
IMAGENS
http://deixandomelhordemim.blogspot.com.br/2011/12/deletei-da-minha-vida.html
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http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=18560519
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Acesso em 23 out. 2013.
http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=45606102
Acesso em 23 out. 2013.
40
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Thiago da Silva N. Cordeiro - Universidade Católica de Brasília