A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐ mercadoria? Resumo O objetivo do texto é compreender o fenômeno da privatização do ensino superior que tem transformado a democratização da educação, enquanto bem público, em um processo de mercantilização do ensino e num rentável instrumento de negócios pelos empresários da educação. Para darmos conta disso, o texto está dividido em três partes: na primeira faremos uma retrospectiva histórica do processo político da educação superior no Brasil a partir das duas últimas décadas; na segunda parte nos concentraremos em problematizar a educação como “mercadoria” e suas implicações para os empresários da educação; e, por fim, traremos a questão da universidade enquanto bem público, ameaçada pelas “mãos” da iniciativa privada. Palavras‐chave: Educação Superior; Educação‐mercadoria; Bem público; Mercantilização. Francieli Nunes da Rosa Universidade de Passo Fundo [email protected] X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.1 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa Considerações iniciais O artigo expõe os interesses conflituosos no Brasil entre a preocupação de uma educação de ensino superior pautada como bem público e de outro os interesses pela burguesia de serviços educacionais, representada pelos empresários, no que tange as finalidades e organização do ensino superior. A análise indica que as atuais transformações da educação superior brasileira são, em grande parte, de interesse do capital em direcionar o ensino superior em, literalmente, mercadoria. Contudo, os interesses de ambos os lados não são convergentes e, nesse sentido, terminam por desaguar no Estado, impondo a ele a decisão de comprometer a educação ou como bem público ou como mercadoria. Neste sentido, o objetivo do texto é compreender o fenômeno da privatização do ensino superior que tem transformado a democratização da educação, enquanto bem público, em um processo de mercantilização do ensino e num rentável instrumento de negócios pelos empresários da educação. Para darmos conta do objetivo proposto, cabe‐ nos uma pergunta problema para o artigo, que é: no atual cenário das tendências políticas em que a iniciativa privada tece “panos” para o ensino superior e os modelos de expansão tornam‐se coadjuvantes deste processo, como pensar a universidade como bem público? Deste modo, o texto está dividido em três partes: na primeira faremos uma retrospectiva histórica do processo político da educação superior no Brasil a partir das duas últimas décadas; na segunda parte nos concentraremos em problematizar a educação como “mercadoria” e suas implicações para os empresários da educação; e, por fim, traremos a questão da universidade enquanto bem público ameaçado pelas “mãos” da iniciativa privada. Processo político da educação superior no Brasil nas últimas duas décadas O ensino superior brasileiro passou por expressivas mudanças em sua morfologia (forma e estrutura) há pouco mais de trinta anos. Veremos algumas dessas mudanças a partir de uma reconstrução histórica feita por Marilena Chauí em seu livro intitulado Escritos sobre a Universidade (2001). Em 1931 o modelo universitário do Estatuto era X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.2 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa parâmetro legítimo de organização do ensino superior no país, por mais que ele desse conta de um aglomerado de faculdades isoladas pautadas na transmissão. No início dos anos de 1960, contavam‐se mais ou menos cem instituições de Ensino Superior, em sua maioria de pequeno porte, voltadas basicamente para a transmissão do conhecimento. Essas instituições orientadas para a reprodução objetivavam uma classe de estudantes voltada para a elitização do ensino, cultivando assim, um ethos1 institucional abrigando menos de cem mil estudantes predominantemente do sexo masculino. No ano de 1968 a Reforma Universitária2 voltou‐se basicamente para melhorar o ensino e a estrutura das instituições federais. Porém, nesta estrutura ancorada pela reforma, a expansão que deveria ser entendida como democratização do ensino passou ser uma aliada nas mãos dos mercadores da educação (neste cenário, é que começa entrar a educação entendida como negócio3). Os elementos produtores do antigo modelo coexistiam com as forças históricas que já delineavam o novo estágio de acumulação capitalista e no período que se iniciou no pós‐guerra até os anos 1970, o 1 Esta palavra significa "Ciência da conduta", ela teve a sua origem na palavra grega "ethos" que significa os hábitos adquiridos na comunidade em que se vive. A palavra latina "morës" tem o mesmo significado de "ethos"; dela surgiu à palavra "moral". Portanto, ética e moral são sinônimos. A Ética, enquanto "Ciência da conduta", pesquisa os modos como as pessoas se comportam em uma determinada comunidade tendo como referência padrões e valores relativos ao que é bom e ao que ruim para a comunidade como um todo e para cada indivíduo que a compõe. A Ética também pode ser definida como o estudo dos juízos, ou julgamentos, que são feitos tomando‐se como referência o "bem" e o "mal". A Ética não compõe um corpo de leis como no Direito, ela é uma práxis não escrita vivida por uma comunidade. Quando esta práxis é escrita em forma de lei, ela transforma‐se em "tekné", portanto uma lei é uma tekné. Vê‐se, portanto que a Ética estuda as pessoas em relação entre si, interagindo. "Quando o outro entra em cena surge à ética.", disse Umberto Eco. Quando alguém está sentido (estética) ou pensando (cognição) não é o caso de existir ética, mas quando alguém está se relacionando com outro e que envolve juízos de valor há ética (PHILOSOPHY, 2013b). 2 O projeto de reforma universitária (Lei n.5.540/68) procurou responder a duas demandas contraditórias: de um lado, a demanda dos jovens estudantes ou postulantes a estudantes universitários e dos professores que reivindicavam a abolição da cátedra, a autonomia universitária e mais verbas e mais vagas para desenvolver pesquisas e ampliar o raio de ação da universidade; de outro lado, a demanda dos grupos ligados ao regime instalado com o golpe militar que buscavam vincular mais fortemente o ensino superior aos mecanismos de mercado e ao projeto político de modernização em consonância com os requerimentos do capitalismo internacional. O Grupo de Trabalho da Reforma Universitária buscou atender à primeira demanda proclamando a indissociabilidade entre ensino e pesquisa, abolindo a cátedra que foi substituída pelo departamento, elegendo a instituição universitária como forma preferencial de organização do ensino superior e consagrando a autonomia universitária cujas características e atribuições foram definidas e especificadas. De outro lado, procurou atender à segunda demanda instituindo o regime de créditos, a matrícula por disciplina, os cursos de curta duração, a organização fundacional e a racionalização da estrutura e funcionamento (SAVIANI, 2010, p.6). 3 Sobre isso daremos maior ênfase no tópico seguinte do texto. X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.3 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa modelo de desenvolvimento predominante no centro da economia mundial foi denominado por muitos economistas como fordismo4. Segundo Silva Júnior (1996, p. 15) esse estágio do capitalismo mundial fordista caracteriza‐se, como um sistema econômico de acumulação intensiva de capital associada à produção e ao consumo de massa, tendo, no Estado, a instituição estratégica produtora da sincronia entre a oferta e a procura, equilíbrio alcançado através de políticas de compensação social. Esse modelo de desenvolvimento [contém] um paradigma industrial caracterizado por um elevado grau de mecanização e profunda divisão técnica do trabalho. Por um lado, a organização e o processo de trabalho, que eram a vertente produtiva do fordismo, passaram a apresentar queda de produtividade em razão da obsolescência da base tecnológica que lhes dava sustentação. Por outro, o capital invertido não produzia a rentabilidade costumeira, em um mercado cada vez menos relativo à produção em parâmetros fordistas e mais exigente. Neste sistema de divisão cada vez mais amplo a vertente produtiva estruturada a partir de uma base tecnológica de natureza “metal‐mecânica, organizada de acordo com os pressupostos tayloristas‐ fordistas, assentada em uma extrema divisão do trabalho” (SILVA JÚNIOR, 1996, p. 16) teve na articulação da “microeletrônica, da informática, da química e da genética” (Idem), seu novo padrão tecnológico para a superação da crise, através de um salto qualitativo de produtividade. Neste sentido, a nova ordem econômica mundial foi, pois, se delineando por meio da superação das contradições produzidas historicamente pelo fordismo e pode ser considerada como outra etapa do capitalismo ou como outro ciclo da mais‐valia relativa ou, ainda, como outro estágio de acumulação capitalista. Passados esses eventos oriundos da década de 1970, a de 1980 é marcada pela crise econômico‐financeira, que se reflete no Brasil através da cobrança da dívida externa5. O Estado, sujeito aos ajustes macroeconômicos impostos pelo FMI e permeado 4 Foi um termo criado por Antonio Gramsci, referindo‐se aos sistemas de produção em massa e gestão idealizado em 1913 por Henry Ford, fundador da Ford Motor Company, em Detroit. Trata‐se de uma forma de racionalização da produção capitalista baseada em inovações técnicas e organizacionais que se articulam tendo em vista, de um lado a produção em massa e, do outro, o consumo em massa. Ou seja, esse conjunto de mudanças nos processos de trabalho (semi‐automatização, linhas de montagem) é intimamente vinculado as novas formas de consumo social. Para um melhor esclarecimento deste tema, sugerimos a leitura do livro Americanismo e fordismo (2008a) de Antonio Gramsci. 5 Os anos de 1980 para a América Latina é lembrado como a década perdida, pois talvez a maior guerra X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.4 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa pela corrupção, debilita‐se em sua capacidade de investir em setores estratégicos para o desenvolvimento da indústria brasileira e o capital nacional encontra‐se voltado para as aplicações financeiras, atraído pelas altas taxas de juros praticadas pelo governo. Em face ao modelo inspirador de 1980 encontramos um Estado em construção, inspirado pelo ideário neoliberal, onde o financiamento da educação superior pareceu estar cada vez mais fora da esfera estatal. Neste período, “o ministro Luiz Carlos Bresser Pereira engendra e administra a reengenharia do Estado orientada pelo projeto político nacional, acentuadamente, em construção no país” (SILVA JÚNIOR, 1996, p. 20). Este projeto de reestruturação estatal, no que toca ao ensino superior, pareceu concretizar as orientações neoliberais quanto às restrições de gastos com as políticas sociais em geral e as políticas educacionais, em particular. A década de 1980 teve grandes acontecimentos econômico‐sociais que marcaram o ingresso do capitalismo em uma nova categoria, “o padrão de acumulação flexível” (RODRIGUES, 2007, p.10), que alavancou com a eleição direta de Fernando Collor de Mello, o qual prometera transformar o Brasil em um país de primeiro mundo. Nesta trajetória, a educação superior brasileira veio se adequando ao quadro geral das transformações socioeconômicas. Buscando assim, moldar‐se a competitividade do mercado. Cabe enfatizar aqui, que o período de recessão dos anos 1980 e as condições de funcionamento das instituições de ensino superior no Brasil ensejaram movimentos no âmbito da sociedade civil e do Estado que reivindicavam melhor qualidade na educação superior privada e pública. Neste sentido, as relações sociais, sob a hegemonia das relações capitalistas, puderam ser traduzidas no início da década de 1990 como resultantes das complexas e significativas mudanças, visibilizadas pela expressiva revolução tecnológica, as quais engendraram alterações significativas no processo produtivo e, em decorrência, no vivenciada pelos latinos fosse a dívida externa. Fome e desigualdade social foram os contributos trazidos por ela. A dívida em sua maior parte foi constituída no período militar e com o fim da ditadura o FMI (Fundo Monetário Internacional) passou a cobrar esta dívida. Segundo o que relata a história o primeiro empréstimo externo do Brasil foi obtido em 1824, no valor de 3,7 milhões de libras esterlinas e ficou conhecido como empréstimo português, destinado a cobrir dívidas do período colonial e que na prática significava um pagamento a Portugal pelo reconhecimento da independência. Depois disso o Brasil, independente, passou a ter mais e mais dívidas como em 1906, no valor de 3,7 milhões de libras, com o Convênio de Taubaté, um acordo feito com os governadores de MG, RJ e SP, que, a partir de empréstimos tomados no exterior, comprariam e estocariam o excedente da produção de café. X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.5 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa conteúdo e nas formas do processo de trabalho que se tornaram vigente. O chamado neoliberalismo que correspondeu este momento histórico em que entra em crise o Estado de Bem‐Estar (Welfare States) nos Estados Unidos ocasionado pelo excesso de poder dos sindicatos e dos movimentos operários também influenciaram diretamente a educação superior. Numa via de mão dupla6, o Estado de Bem‐Estar social, acaba excluindo “sem danos aparentes, a ideia de um vínculo necessário entre justiça social e igualdade socioeconômica”, já por outro lado, tem como consequência “desobrigar o Estado de lidar com o problema da exclusão dos pobres, pois desestabiliza os governos e inclusão de pobres e ricos é impossível” (CHAUÍ, 2001, p.32). Numa palavra, ao afastar a luta de classes e a igualdade tão desejada economicamente pelos grupos menos favorecidos, o Estado não precisa mais enfrentar o “perigoso” problema da distribuição da renda e resolve sua dificuldade “com a privatização dos direitos sociais, transformados em serviços sociais regidos pela lógica do mercado” (CHAUÍ, 2001, p.32). Para esta lógica perversa do mercado capitalista, a globalização impõe a criação de novas instituições internacionais que possam se encarregar além das políticas econômicas, das políticas educacionais tendenciosas para o ensino superior, surge então os Organismos Multilaterais7 para designar a pauta de “prioridade” de cada governo e de cada país. Neste ideário autoritário, cristaliza‐se então, a ideologia pós‐moderna do efêmero, volátil e intimista que destrói as ideias e práticas republicanas e democráticas. Num país onde a sociedade autoritária nunca conheceu de fato o Estado de Bem‐Estar social o que restou foi receber o ideal positivista imposto por governos autoritários e personalizá‐lo na educação (CHAUÍ, 2001). Nesta via de significados e descobertas, a mercadorização do ensino foi tomando espaço e se cristalizando nas instituições de nível superior e nas 6 O Estado de Bem‐Estar Social em tese deveria corrigir os excessos e efeitos perversos do Estado Providência e reformar o Estado de Bem‐Estar, tendo como agentes os indivíduos e outros órgãos, que não o Estado, criadores de riqueza. A reforma deveria reorientar o investimento social do Estado, estabelecendo um equilíbrio entre o risco, seguridade e responsabilidade, tendo como pilar o seguinte princípio: “investir em capital humano e não pagar diretamente os benefícios” A via de mão dupla que Marilena Chauí (2001, p.34) ressalta é que na teoria está bem fundamentado o “tratado”, porém, aquilo que fora colocado em prática ficou longe de ser um Estado de Bem‐Estar Social. 7 Alguns organismos multilaterais: ONU (Organização das Nações Unidas); BID (Banco Interamericano do Desenvolvimento); UNESCO (Organização das Nações Unidas para educação, ciência e cultura); OMS (Organização Mundial da Saúde); OMC (Organização Mundial do Comércio), entre outros. X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.6 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa políticas de governo. Num olhar mais aguçado sobre a mercadorização do ensino, veremos adiante como surge à educação entendida como mercadoria e como os empresários olham para a educação. A educação mercadoria e os empresários da educação Uma das primeiras manifestações do que neste artigo chamaremos “educação como negócio” foi o estabelecimento de uma parceria entre o Grupo Pitágoras e a Apollo Internacional em 2001, de um lado teríamos a 3º maior rede de ensino do Brasil e de outro, a metodologia “inovadora” da Universidade de Phoenix – EUA, respectivamente (essa parceria só se desfez quando o Grupo Pítágoras em 2006 comprou a parte do investidor internacional) (OLIVEIRA, 2014a, p.742). A ação de fundos como esse, possibilitou ao mercado da educação uma rápida expansão nas matrículas e um olhar mais aguçado dos empresários na educação, referente a isso pode citar uma das maiores transações comerciais que possibilitou inúmeras das mudanças vividas pelo ensino superior: “a aquisição em 2005, da Universidade Anhembi‐Morumbi, por parte do grupo americano Laureate” (Idem, p.744). O Banco da Pátria, administrador do principal fundo de investimentos em educação, foi o responsável pela definição estratégica de negócios da Anhanguera Educacional e proprietário por parte de seu capital que possibilitou a reorganização da Anhembi‐Morumbi nesta mega instituição de ensino. Outro fator importante em 2007 foi o lançamento de ações da Anhanguera na bolsa de valores de São Paulo seguida por mais três das grandes instituições de ensino superior (Estácio, Dom Bosco e Pitágoras), todas controladas pela Sociedade Educacional Brasileira. Finalmente em 2013, Kroton e Anhanguera anunciaram a maior fusão do mercado mundial em educação com o número de um milhão de matrículas, conforme a revista Ação Educativa (2014b). Essas transações revelam o ritmo de expansão das instituições com fins lucrativos, particularmente as sustentadas por investimentos ou ações na Bolsa de Valores. Segundo dados pela revista Exame, em 2008 o ensino privado movimentou R$ 90 bilhões, responsável por 3% do PIB brasileiro. Estes dados e dimensões evidenciam um processo bem amplo de transformação do setor educacional em atividade mercantil. Além do mais, X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.7 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa o processo de ajuste estrutural da economia mundial pelo qual vem passando o sistema capitalista nos últimos vinte anos e as mudanças produzidas vêm redefinindo o seu papel e convertendo o aparelho estatal dos países em fase de desenvolvimento em estruturas institucionais cujo objetivo primeiro volta‐se para a proteção do mercado globalizado. Neste cenário, a privatização da educação superior constitui‐se como uma das metas centrais, cuja concretização deve viabilizar um maior “acesso” ao ensino. Para tanto, torna‐se imprescindível a redução da interferência estatal na regulação dos “mecanismos que estruturam o mercado” flexibilizando‐os o máximo possível e descentralizando a prestação de serviços públicos sem, contudo, deixar de exercer a sua ação centralizadora no que diz respeito ao controle dos serviços ofertados aos cidadãos/clientes. O setor empresarial, como vimos, é o que desfruta uma posição privilegiada junto ao poder executivo federal, na tentativa de controlá‐lo politicamente e interferindo sobremaneira nos rumos da educação superior. Dentro dessa lógica, as mudanças operadas no aparelho do Estado têm levado ao fortalecimento da expansão do setor privado no campo da educação superior com nefastas consequências para o ensino e a formação dos profissionais que frequentam os cursos ofertados pelas agências formadoras. Tais empresários vêem na educação superior a principal fonte de renda para si próprios, neste sentido, há uma forte tendência das instituições superiores se tornarem efetivas empresas de ensino. Ou seja, “de comercializarem a mercadoria‐educação e, ao mesmo tempo, operarem o pensamento pedagógico empresarial no sentido de (con)formar uma força de trabalho de nível superior adequada ao télos enconomia competitiva” (RODRIGUES, 2007, p.16) na tentativa de adaptar o seu produto às demandas do capital produtivo. Em outros termos, os empresários do ensino visam ampliar seus negócios, não identificando claramente o objetivo principal posto por eles, isto é, de que a educação como processo de ensino‐aprendizagem, construção e reconstrução não é uma mercadoria. Contudo, o crescimento da iniciativa privada no campo educacional, que não acontece invisivelmente é fruto de uma política de governos democráticos que estão em sintonia com as orientações de organismos multilaterais, como, por exemplo, o Banco Mundial (BM), Confederação Nacional da Indústria (CNI), Banco Internacional de X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.8 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), Organização Mundial do Comércio (OMC), entre outras. Tal política, severamente influenciada pelos organismos ditos acima, na educação superior, pode ser sintetizada em cinco aspectos, que no entender de Rodrigues (2007, p. 18‐19) são: O primeiro deles é a “busca de abertura do setor educacional aos investimentos privados”. O segundo aspecto, de certa forma, complementa o primeiro é a “globalização dos sistemas educacionais”, ou seja, “o incentivo às universidades públicas e privadas para que se associem a instituições de educação superior de caráter transnacional”. O terceiro aspecto refere‐se “ao fortalecimento das chamadas ‘universidades corporativas’, isto é, da adoção institucionalizada, por parte de grandes empresas, de programas internos de qualificação e treinamento de sua própria força de trabalho”. O quarto aspecto salientado pelo autor tem haver com o “incentivo à educação à distância, impulsionada pelas inovações tecnológicas e apoiada na comercialização de ‘pacotes educativos’”. Por fim, a última instância da política dos organismos multilaterais indica “a transferência de recursos orçamentários da educação superior à educação básica”. Neste contexto, o corpo docente bem como, a atividade de pesquisa acaba‐se por serem relegadas a meras formalidades quando não descartadas de fato. Em outros termos, a identidade da universidade está em processo de readequação ao controle do mercado. Tal processo transforma universidades “em empresas prestadoras de serviço, isto é, fornecedoras de educação‐mercadoria” (RODRIGUES, 2007, p.22). De fato, vive‐se um momento decisivo nesse processo de mercantilização do ensino, pois basicamente quase todas as universidades que operam sob este signo, geralmente, são as que possuem maior número de matrículas, se constituindo, até mesmo, como marca empresarial em que busca inserir‐se competitivamente no mercado educacional, “para melhor produzir e distribuir sua educação‐mercadoria” (RODRIGUES, 2007, p.26). Neste pilar mercantil, a formação do professor universitário torna‐se cada vez mais reduzida a lógica do mercado, ou seja, ensinar para a praticidade. Em consonância a isso, o processo formativo, “facilita‐se” pela convicção de que a expansão da universidade dita nos anos sessenta relaxou os critérios de contratação e fez‐se entrar para o corpo docente pessoas X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.9 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa abaixo do nível de excelência e sem motivação para a investigação. O acesso de profissionais não qualificados para atuar como formador nas universidades torna‐se cada vez mais fácil, quando, por exemplo, se faz a avaliação institucional. Na área deste acesso à universidade, a maior frustração encontra‐se no objetivo a que foi dado, ou seja, ao invés de possibilitar uma democratização do ensino, há uma massificação controlada principalmente, pela “mão” do mercado. Igualmente a isso, na área da formação docente revela‐se uma deliberada desqualificação profissional. O treinamento e a capacitação de professores para trabalhar no ensino superior tornam‐se um dos segmentos mais prósperos do mercado educacional, que no entender de Boaventura de Souza Santos (2004, p.83) é “testemunhado pela proliferação de instituições privadas que oferecem cursos de capacitação de professores para as redes de ensino”. Neste sentido, a universidade é pressionada para transformar o conhecimento e os seus recursos humanos em produtos que devem ser explorados comercialmente. A posição do mercado passa ter o maior crédito dentro da instituição universitária e, nos processo mais avançados, “é a própria universidade que se transforma em marca” (SANTOS, 2004, p.87). A partir disso, cabem algumas indagações: como o professor universitário pode superar os limites impostos pela massificação do ensino? Como superar a mercadorização do ensino ou a educação mercadoria? Para isto, ressalta‐se o que será estudado no próximo tópico, ou seja, a universidade entendida como bem público, mas ameaçada pela estrutura mercantilista imposta no ensino superior. A universidade enquanto bem público ameaçada Para darmos conta da problemática sobre a Universidade como bem público ameaçada, utilizaremos como referencial teórico Boavetura de Sousa Santos e Naomar de Almeida Filho (2008b, p.15) autores do livro A universidade do século XXI: para uma nova universidade. Neste livro, são relembrados três tipos de crises que a universidade passou e que foram citadas como um presságio, o texto original era “Da ideia de universidade à universidade de ideias” publicado no livro Pela mão de Alice: o social e o político na pós‐modernidade (1997) de Boaventura de Sousa Santos. As três crises descritas no texto original pelo autor se traduzem em três conceitos: hegemonia, X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.10 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa legitimidade e institucional. O objetivo delas era mostrar que a universidade, longe de poder resolver as suas crises, tinha vindo a geri‐las de modo a evitar que elas se aprofundassem descontroladamente, recorrendo para isso à sua institucionalização e às ambiguidades do seu perfil administrativo. Tratava‐se de uma atuação ao sabor das pressões (reativa), com incorporação acrítica de lógicas sociais e institucionais exteriores (dependente) e sem perspectivas de médio ou longo prazo (imediatista). Apesar de as três crises estarem intimamente ligadas como nos afirma Santos e Filho (2008b) e só poderem ser enfrentadas conjuntamente através de vastos programas de ação gerados dentro e fora da universidade, à preocupação era que a crise institucional viesse a monopolizar as atenções e os propósitos reformistas. Outra preocupação era que a concentração na crise institucional pudesse levar à falsa resolução das duas outras crises, uma resolução pela negativa, ou seja, a crise de hegemonia, pela crescente descaracterização intelectual da universidade; e a crise da legitimidade, pela crescente segmentação do sistema universitário e pela crescente desvalorização dos diplomas universitários, em geral. A crise institucional era e é desde há pelo menos dois séculos como nos afirmam os autores, o elo mais fraco da universidade pública porque a autonomia científica e pedagógica da universidade assenta na dependência financeira do Estado. Enquanto a universidade e os seus serviços foram um inequívoco bem público que competia ao Estado assegurar, esta dependência não foi problemática. No momento, porém, em que o Estado, decidiu reduzir o seu compromisso político com as universidades e com a educação em geral, convertendo esta num bem que, sendo público, não tem de ser exclusivamente assegurado pelo Estado, a universidade pública entrou automaticamente em crise institucional. Pode dizer‐se, afirmam Santos e Filho (2008b, p.16), que nos últimos trinta anos a crise institucional da universidade na grande maioria dos países foi provocada ou induzida pela perda de prioridade do bem público universitário nas políticas públicas e pela consequente secagem financeira e descapitalização das universidades públicas. As causas e a sua sequência variaram de país para país. Neste sentido, houve uma perda de prioridade da universidade pública nas políticas públicas do Estado, antes de mais, foi o resultado da perda geral de prioridade X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.11 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa das políticas sociais (educação, saúde, previdência) induzida pelo modelo de desenvolvimento econômico conhecido por neoliberalismo ou globalização neoliberal que, a partir da década de 1980, se impôs internacionalmente. Na universidade pública ele significou que as debilidades institucionais identificadas em vez de servirem de justificação a um vasto programa político‐pedagógico de reforma da universidade pública, foram declaradas insuperáveis e utilizadas para justificar a abertura generalizada do bem público universitário à exploração comercial. Deste modo, o neoliberalismo afirmava que a universidade era irreformável (tal como o Estado) e que a verdadeira alternativa estava na criação do mercado universitário, como vimos no tópico anterior. Desta forma, o modo desregulado como este mercado emergiu e se desenvolveu são a prova de que havia a favor dele uma opção de fundo. E a mesma opção explicou a descapitalização e desestruturação da universidade pública a favor do emergente mercado universitário com transferências de recursos humanos que, por vezes, configuravam um quadro de acumulação primitiva por parte do setor privado universitário à custa do setor público (SANTOS; FILHO, 2008b, p.19). Na década de 1990 dois processos foram marcantes para a alternativa neoliberal: o desinvestimento do Estado na universidade pública e a globalização mercantil da universidade. Estas duas concepções foram as duas faces de uma mesma moeda, pois contemplaram dois pilares de um vasto projeto global de política universitária, destinado a mudar profundamente o modo como o bem público da universidade tinha sido produzido, transformando‐o num vasto campo de valorização do capitalismo educacional. Há dois níveis para se entender estas duas concepções desencadeadas acima que Boaventura e Naomar (2008b, p.21) discutem: O primeiro nível de mercadorização consiste em induzir a universidade pública a ultrapassar a crise financeira mediante a geração de receitas próprias, nomeadamente através de parcerias com o capital, sobretudo industrial. Neste nível, a universidade pública mantém a sua autonomia e a sua especificidade institucional, privatizando parte dos serviços que presta. O segundo nível consiste em eliminar tendencialmente a distinção entre universidade pública e universidade privada, transformando a universidade, no seu conjunto, numa empresa, uma entidade que não produz apenas para o mercado, mas que se produz a si mesma como mercado, como mercado de gestão universitária, de planos de estudo, de X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.12 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa certificação, de formação de docentes, de avaliação de docentes e estudantes. Nestes dois níveis, podemos compreender os primeiros resquícios da mercadorização da educação e a tendência do ensino superior em agir com duas contradições desconcertantes: “a universidade de criadora de condições para a concorrência e para o sucesso no mercado, transforma‐se, ela própria, gradualmente, num objeto de concorrência, ou seja, num mercado” (SANTOS; FILHO. 2008b, p.26). Esta contradição permitiu a transformação da universidade num serviço que se tinha acesso não por via da cidadania, mas pelo consumo, a saber, o pagamento; e, um dos instrumentos para a transformação dos estudantes em cidadãos clientes foi à eliminação da gratuidade do ensino e das bolsas, pelo financiamento estudantil, sendo pagos pelos alunos juros abusivos numa falsa ideologia como o “educação para todos”. Diante o exposto, como é possível pensar a universidade sob nova perspectiva dentro do paradigma mercadológico como bem público? Talvez a resposta fosse um “não sei”, mas de acordo com Marilena Chauí (2003, p.12) podemos pensar por duas alternativas: a formação e a democratização. Assinalaremos alguns pontos que julgam ser pertinentes para este processo. O primeiro ponto exposto pela autora é a “colocar‐se claramente contra a exclusão como forma de relação social definida pelo neoliberalismo e pela globalização” (Idem), ou seja, entender a educação superior como universal e, sendo universal, é um direito do cidadão. Também, seria optar pela firme recusa da privatização do conhecimento, impedindo a apropriação privada num bem que é público ao romper com modelos proposto pelo Banco Mundial com a pretensão de resolver problemas da educação superior, por meio da privatização do sistema de ensino. O segundo ponto é “definir a autonomia universitária não pelo critério dos chamados ‘contratos de gestão’, mas pelo direito e poder em definir suas normas de formação, docência e pesquisa” (Idem). A autonomia deve ser entendida como a autodeterminação das políticas acadêmicas de projetos e metas e ser autônoma na condução administrativa, financeira e patrimonial. Esta autonomia só será efetiva se as universidades recuperarem o poder e a iniciativa de gerir e definir suas próprias linhas de pesquisas e prioridades. X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.13 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa O terceiro fator importante é “desfazer a confusão atual entre democratização da educação superior e massificação” (CHAUÍ, 2003, p.13); o quarto aspecto é “revalorizar a docência, que foi desprestigiada e negligenciada com a chamada ‘avaliação da produtividade’, quantitativa”; atrelado a isso, está à revalorização “da pesquisa, estabelecendo não só as condições de sua autonomia e as condições materiais de sua realização, mas também recusando a diminuição do tempo para a realização dos mestrados e doutorados”; o sexto aspecto para pensar a universidade como bem público, tendo em vista o contexto mercantil, está na “valorização da pesquisa nas universidades públicas exigindo políticas públicas de financiamento por meio de fundos públicos destinados a esse fim por intermédio de agências nacionais de incentivo à pesquisa”; e, por fim, o último aspecto é “adotar uma perspectiva crítica muito clara tanto sobre a ideia de sociedade do conhecimento quanto sobre a educação permanente, tidas como ideias novas e diretrizes para a mudança da universidade pela perspectiva da modernização” (CHAUÍ, 2003, p. 15). Portanto, todos os aspectos ressaltados por Chauí nos levam a acreditar que para legitimar a universidade como bem público, é preciso pensá‐la do ponto de vista de sua autonomia e de sua expressão social e política, cuidando para não correr em busca da retrógada ideia de modernização que, no Brasil significou, em linhas gerais submeter à sociedade como um todo e as universidades públicas, em particular, a modelos, critérios e interesses que servem ao capital e não aos direitos dos cidadãos. Considerações finais Tecemos aqui, uma breve análise sobre o processo educativo do Ensino Superior brasileiro, bem como, sua historicização; a influência política de organismos multilaterais centrados numa ideologia neoliberal de educação; a entrada dos empresários nas organizações e propostas das políticas educacionais; transformação da educação em mercadoria e, por fim, a problematização baseada nas ideias de Boaventura de Sousa Santos & Naomar de Almeida Filho (2008) e Marilena Chauí (2003) sobre a nova perspectiva da universidade. Inúmeros foram os conceitos levantados e abordados para X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.14 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa pensarmos a universidade como bem público dentro da esfera/política mercantil em que vivemos hoje. De todos os problemas, o que mais indaga a pensarmos, é a proposta para uma Universidade Nova que compreenda uma popularização sem vulgarização e um acerto de contas com a dívida social da educação brasileira sem destruir o sonho de uma universidade responsável, competente e criativa. Eis a nossa proposta, sonho ou utopia, uma universidade pautada nestes três conceitos que une a valorização do meio ambiente e a cultura, com um saber competente e criativo para pensar a sociedade, educação e a convivência com o outro. Uma universidade provocadora, realista, viável, e, portanto realizável, assumindo um movimento desejante, mobilizador e histórico. Uma universidade que é possível. Por fim, uma universidade nova, “criada por um movimento a favor de um lugar; movendo‐nos em direção a este lugar; neste movimento, construímos o novo lugar, nossa protopia, a Universidade Nova” (SANTOS; FILHO, 2008, p.257). Referências CHAUÍ, Marilena. Escritos sobre a universidade. São Paulo: UNESP, 2001. _______________. A Universidade pública sob nova perspectiva. Revista Brasileira de Educação. Vol 1, nº 24. São Paulo: USP, 2003. GRAMSCI, Antonio. Americanismo e fordismo. São Paulo: Hedra, 2008. OLIVEIRA, Romualdo P. A transformação da educação em mercadoria no Brasil. Acesso em 07 abril de 2014a. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/es/v30n108/a0630108.pdf PHILOSOPHY. Estética, cognição e ética. Avesso em novembro de 2013b. Disponível em http://www.philosophy.pro.br/estetica_cognicao_etica.htm REVISTA. Ação educativa. Acesso em 07 abril de 2014b. Disponível em http://www.acaoeducativa.org.br/index.php/educacao/47‐observatorio‐da‐ X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.15 X Anped Sul A educação superior no Brasil: bem público ou educação‐mercadoria? Francieli Nunes da Rosa educacao/10004823‐fusao‐das‐empresas‐kroton‐e‐anhanguera‐pode‐criar‐maior‐ instituicao‐privada‐de‐ensino‐do‐mundo RODRIGUES, José. Os empresários e a educação superior. São Paulo: Autores Associados, 2007. SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós‐ modernidade. São Paulo: Cortez, 1997. SANTOS, Boavetura de Sousa; FILHO, Naomar de Almeida. A universidade do século XXI: para uma nova universidade. Coimbra: PDF, 2008. SAVIANI, Demerval. A expansão do ensino superior no Brasil: mudanças e continuidades. Revista Poíesis Pedagógica. V. 8, n.2, 2010, pp 4‐17. SILVA JÚNIOR, João dos Santos dos Reis.Tendências no ensino superior diante da atual reestruturação do processo produtivo no Brasil. (Org.). CATANI, Afrânio Mendes. In: Universidade na América Latina: tendências e perspectivas. São Paulo: Cortez, 1996. SANTOS, Boaventura de Souza. A universidade do Século XXI. São Paulo: Cortez, 2004. X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.16