RECRUTAMENTO ALVEOLAR NA SÍNDROME DO DESCONFORTO
RESPIRATÓRIO AGUDO (SDRA) ATRAVÉS DA PRESSÃO EXPIRATÓRIA
POSITIVA FINAL (PEEP) EM VENTILAÇÃO MECÂNICA (VM) RESUMO
O objetivo do presente estudo foi revisar, através de artigos científicos, as possibilidades de
recrutamento alveolar através da ventilação mecânica, em pacientes com Síndrome do
Desconforto Respiratório Agudo (SDRA). Foram analisados os efeitos da pressão expiratória
positiva final (PEEP), associada a valores de volume corrente (VC), destacando os efeitos
benéficos e deletérios desta técnica, assim como as formas de se encontrar o valor da PEEP
ideal com o intuito de aperfeiçoar cada vez mais os parâmetros ventilatórios, diminuindo a
mortalidade destes pacientes. Com base nos estudos analisados, conclui-se que ainda há
controvérsias em relação aos valores da PEEP e a melhor estratégia ventilatória a ser aplicada,
já que, o valor da PEEP, apenas para efeito protetor alveolar é diferente da PEEP para
recrutamento.
ABSTRACT
The objective of the present study was to revise, through scientific goods, the
possibilities of alveolar recruitment through to mechanical ventilation, in patients with Acute
Respiratory Distress Syndrome (ARDS). The effects of the positive end-expiratory pressure
(PEEP) were analyzed, associated to you value of tidal volume (VC), detaching the beneficial
and deleterious effects of this technique, as well as the forms of meeting the value of ideal
PEEP with the intention of improving the ventilator parameters more and more, reducing the
mortality of these patient ones. With base in the analyzed studies, it is ended that there are still
controversies in relation to the values of PEEP and the best ventilator strategy to be applied,
since, the value of PEEP, just for alveolar protecting effect it is different from PEEP for
recruitment.
INTRODUÇÃO
Apesar dos avanços nos cuidados gerais de terapia intensiva, as dramáticas alterações
na fisiologia respiratória fazem com que pacientes com SDRA continuem apresentando
mortalidade bastante alta. Isso explica a necessidade de cada vez mais estudos com o intuito
de melhorar este quadro.1,2 A SDRA é caracterizada por um quadro de insuficiência respiratória
aguda, devido a uma intensa resposta inflamatória pulmonar, que ocorre frente a agentes
agressores diversos diretos como aspiração, infecção pulmonar difusa, quase afogamento,
inalação de gases tóxicos, contusão pulmonar, ou indiretos como, sepse, politrauma,
intoxicação por drogas, pancreatite, embolia gordurosa, entre outros. Em geral, este quadro
está relacionado à dificuldade ventilatória pulmonar e conseqüente piora na oxigenação e troca
gasosa alveolar, devido às alterações que se caracterizam por hipoxemia grave refratária à
administração de oxigênio, com presença de shunt intrapulmonar, aumento do espaço morto
fisiológico e áreas com atelectasias, caracterizando infiltrado radiológico difuso. Isto, devido à
diminuição do surfactante, substância responsável pela permanência dos alvéolos abertos, por
possuir função tensoativa, e assim os alvéolos colapsados necessitam de maior pressão para
se reabrirem. Em relação à mecânica respiratória, há redução da complacência pulmonar e
aumento do trabalho respiratório.3,4
Tais características fazem com que esses pacientes necessitem de suporte ventilatório
mecânico, a fim de se tentar reverter este quadro. Seu tratamento, principalmente com relação
aos níveis de pressão expiratória positiva final (PEEP) e de volume corrente (VC) têm sido
bastante estudado e motivo de importantes controvérsias na terapia intensiva, por ainda não
possuir um consenso na literatura, baseado em parâmetros completamente eficazes para este
tratamento, principalmente quando se põe em discussão o recrutamento alveolar. Porém, a
PEEP, que é um recurso encontrado na maioria dos ventiladores artificiais, até então é
considerada uma das melhores modalidades de tratamento nas lesões pulmonares agudas,
pela capacidade da reabertura de vias aéreas previamente colapsadas, melhorando as trocas
gasosas, quando aplicada de maneira adequada.3 No entanto ainda há uma dificuldade em
encontrar o valor ideal para a condição pulmonar da SDRA em cada paciente, sem que cause
uma hiperdistensão alveolar, a qual pode ser prejudicial ao paciente.
Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi analisar criticamente os efeitos das
manobras de recrutamento alveolar através da ventilação mecânica convencional, destacando
os valores da PEEP, por meio de uma pesquisa baseada principalmente em artigos do
medline.
Principais alterações ventilatórias na SDRA
Conforme o American – Europen Consensus Criteria (AECC), a SDRA é definida de
acordo com quatro alterações, que são: início agudo e súbito de severo desconforto
respiratório; presença de infiltrados bilaterais na radiografia frontal de tórax; ausência de
hipertensão atrial esquerda, com uma pressão capilar pulmonar menor que 18mmHg ou sem
sinais clínicos de insuficiência cardíaca esquerda; e hipoxemia severa, com relação pressão
parcial de oxigênio / fração inspirada de oxigênio (PaO2/FiO2) menor que 200, ou seja, menor
do que a normalidade, sem considerar a aplicação de FiO2 ou de PEEP.3,4,5,6,7 Este distúrbio
faz com que haja dificuldade na oxigenação e troca gasosa alveolar, bem como a diminuição
da complacência pulmonar, devido à desigualdade na relação ventilação – perfusão, fazendo
com que haja regiões mal ventiladas (shunt) e regiões mal perfundidas (espaço morto). Devido
à falta do surfactante, ocorre um aumento da tensão na superfície alveolar e um colapso
alveolar, resultando em hipoxemia.15 Além da alteração na produção de surfactante e do
distúrbio ventilatório, essa injúria pulmonar também pode provocar edema pulmonar devido à
alta permeabilidade provocada pelo processo inflamatório agudo.2
Desse modo, esses pacientes necessitarão de ventilação mecânica invasiva, com a
finalidade de reverter este quadro, aplicando uma pressão positiva nas vias aéreas, objetivando
a reabertura dos alvéolos colapsados, melhorando a oxigenação pulmonar.
A Ventilação Mecânica na SDRA
Já há algum tempo na literatura, se preconiza que pacientes com SDRA devem receber
suporte ventilatório baseado em baixo volume corrente (entre 4 a 6 ml/kg) e PEEP mais
elevado (em torno de 10 cmH2O ou mais) ou acima do ponto de inflexão da curva pressãovolume (P/V), ocasionando uma hipercapnia permissiva, a qual é favorável, pois com o
aumento do CO2, sendo um vasodilatador, mantém as áreas pulmonares ainda íntegras
abertas. Pacientes ventilados com VC baixo (até 6 cmH2O) comprovadamente, apresentam
redução da mortalidade, em relação a pacientes tratados com VC alto (em torno de 12
cmH2O).6,8,9 As pressões nas vias aéreas devem limitar-se para níveis abaixo de 35 cmH2O,
com o uso de ventilação com modo pressão-controlada (PCV). A freqüência respiratória deve
ser fisiológica, analisando sempre a gasometria, com uma FiO2 mantida o mais baixo possível,
com limite até 60%. É comprovado que isto diminui a mortalidade e previne barotrauma em
pacientes com SDRA. O uso destes parâmetros é considerado como uma estratégia protetora
dentro da ventilação mecânica.4,7,8,9 Além disso, esta estratégia é capaz de reduzir os níveis de
mediadores inflamatórios no pulmão e na circulação sanguínea, e diminuir a mortalidade na
SDRA em comparação com uma estratégia de ventilação convencional.4
Com relação às manobras de recrutamento alveolar, estas consistem em insuflações
sustentadas para abrir as unidades alveolares colapsadas e são atualmente, utilizadas como
mecanismos coadjuvantes à VM durante a SDRA. Porém, alguns dados sugerem que tais
manobras diferem quanto ao seu efeito, dependendo do tecido pulmonar lesionado e do uso de
várias combinações de VC e PEEP. A associação do PEEP ideal com uma ventilação cuja
pressão de pico não seja superior a 40 cmH2O sugere uma proteção alveolar, onde os alvéolos
recrutados se manteriam abertos durante todo o ciclo respiratório.10
Contudo, ainda são necessários cada vez mais estudos com relação às medidas de
PEEP, que permanece controversa10, para se recrutar alvéolos já colapsados, e não apenas
como prevenção, que é o que a maioria dos estudos com ventilação protetora em SDRA
mostram como resultado, ou seja, a mortalidade realmente pode diminuir com a aplicação de
PEEP com efeito protetor, mas a grande lacuna é encontrar um valor de PEEP que não apenas
previna novos colapsos, mas que também recrute alvéolos já colapsados, diminuindo ainda
mais a mortalidade desses pacientes.9 Portanto, vários estudos têm surgido na literatura
mundial, com o intuito de aperfeiçoar ainda mais esses parâmetros, a fim de diminuir cada vez
mais a mortalidade desses pacientes com SDRA, principalmente quando se diz respeito aos
valores de PEEP.
Pulmões com SDRA precisam de altas pressões para obter uma expansão, devido à
insuficiência de surfactante nesses pacientes, ao contrário de pulmões sadios que necessitam
de menores pressões, devido à alta tensão que o surfactante impõe nos alvéolos. A ventilação
mecânica protetora, ou seja, com PEEP em torno de 15 cmH2O e baixo VC (em torno de 6
ml/Kg), pode reduzir a mortalidade em adultos com SDRA, pois minimiza a resposta
inflamatória da doença.7 Isso se explica devido a resultados baseados em evidências que
apenas estudos que aplicaram PEEP maior que 15 cmoH2O demonstraram uma redução da
mortalidade, pois previne colapso repetitivo dos alvéolos. A exemplo de que a PEEP deve ser
alta, o estudo de Vianna et al11 mostrou uma pesquisa, onde pulmões com SDRA receberam
reposição de surfactante com a finalidade de melhorar a oxigenação, porém com aplicação de
PEEP baixa, ou seja, de 4 cmH2O e volume corrente de 10ml/Kg, obtendo até uma melhora na
oxigenação pela aplicação do surfactante, mas resultando em lesão pulmonar aumentada,
provavelmente porque a PEEP inadequadamente baixa foi insuficiente para estabilizar os
alvéolos, durante a expiração. É o que alguns autores também podem deduzir.9,12 Também foi
possível constatar no estudo de Richard12 , o efeito da PEEP, o qual, na aplicação de baixo VC,
houve uma redução na saturação de O2, e este, quando associado a um valor de PEEP
elevado, promoveu uma melhora na oxigenação alveolar.
Brower13, em seu estudo comparativo com aplicação de baixo valor de PEEP, em torno
de 8 a 12 cmH2O e alto PEEP, em torno de 14 a 20 cmH2O, constatou que a diferença de
mortalidade nos dois grupos testados não foi significante. Mas, comparando estudos de alto VC
e alta pressão de platô com estudos de baixo VC e baixa pressão de platô, houve uma
significativa diminuição da mortalidade no segundo caso. No entanto, talvez possa se afirmar
que realmente o VC deve ser baixo, independente do valor da PEEP, para pacientes com
SDRA, assim como a pressão de platô.
Alguns estudos mais recentes9,13,14 relatam que a aplicação de pressão positiva através
da pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP), de 35 a 40 cmH2O, com duração de 30
a 40 segundos, tem um bom efeito de recrutamento em alvéolos colapsados. Esta manobra é
realizada com associação de PEEP estável, em torno de 10 cmH2O, podendo ser dividida em
séries, em torno de três repetições, com intervalos de aproximadamente dois minutos. Porém
seu efeito é eficaz em processos agudos de SDRA, ou seja, em estágios de fibrose já não é
mais possível o recrutamento. Contudo, sabe-se que altas pressões nas vias aéreas podem
prejudicar o paciente hemodinamicamente. No estudo de Brower13, houve uma tentativa de
recrutar o pulmão com aplicação de CPAP de 35 a 40 cmH2O por 30 segundos, mas o
aumento da oxigenação ainda foi insignificante, já que o principal objetivo era o incremento da
relação PaO2/FiO2. Talvez este seja o caminho para novas perspectivas para o tratamento de
pacientes com SDRA, assim como o motivo para a realização de mais estudos nesta
modalidade CPAP, aperfeiçoando cada vez mais os parâmetros, com a finalidade da melhora
da sobrevida desses pacientes, assim como a diminuição da mortalidade.
De acordo com Rouby e Goldstein2, em lobos pulmonares inferiores, os quais são menos
ventilados naturalmente, talvez seja necessário a aplicação de uma PEEP de 50 cmH2O para a
reabertura dos alvéolos colapsados, porém, existe o grande risco de hiperdistensão. Sendo
assim, em toda evidência científica existem os prós e os contras, o que faz com que haja cada
vez mais estudos com a mesma finalidade, que é a diminuição da mortalidade desses
pacientes.
Quanto ao modo ventilatório, geralmente se aplica volume controlado ou pressão
controlada. Para tal escolha deve-se avaliar qual o melhor método. Alguns estudos recentes
têm mostrado que o método mais adequado é o ciclado a pressão, que é a ventilação
controlada a pressão (PCV), com volume corrente baixo, em torno de 5 a 6 cmH2O e alto valor
de PEEP (maior que 10 cmH2O)7,9. De acordo com Haitsma e Lachman9, a aplicação de
volume controlado pode levar à elevada pressão nas vias aéreas nestes pulmões, os quais
estão enrijecidos devido à doença, e não previne injúria pulmonar, talvez podendo até agravála, quando colapsos repetidos de tecido pulmonar não são prevenidos. E com a utilização da
PCV, é possível um melhor controle tanto da pressão inspiratória, quanto da pressão
expiratória, talvez otimizando a ventilação, podendo prevenir a lesão pulmonar induzida pela
VM.15 Antoniazzi e colaboradores16 também concordam com este fato, relatando que a lesão
pulmonar induzida pela ventilação mecânica é um fenômeno muito mais volume-dependente
do que pressão-dependente. Porém, quando se usa a ventilação controlada à pressão, as
pressões nas vias aéreas precisam ser adaptadas para cada pulmão, com a finalidade de
permitir uma ventilação suficiente, sendo um pré-requisito para a eliminação adequada de
CO2. Portanto é menos lesiva do que a controlada a volume.
Os efeitos da PEEP
A PEEP promove uma melhora na oxigenação e permite a ventilação com uma baixa
concentração inspirada de O2 (FiO2) em pulmões com SDRA, pois previne colapso alveolar
completo, não deixando que os alvéolos colabem no final da expiração2,5. De acordo com
Antoniazzi et al16, parece haver um consenso geral de que o valor total de PEEP para impedir
esse colapso, situa-se entre 9 a 20 cmH2O. É o que Guinard et al27 também puderam perceber
em seu estudo, quando aplicaram PEEP em torno de 12 cmH2O em pacientes com SRDA,
havendo uma melhora na PaO2, diminuindo a hipoxemia. Porém, a diminuição da mortalidade
ainda não é satisfatória.
Esta melhora da oxigenação é devida ao aumento da capacidade residual funcional
(CRF), provavelmente por prevenir o fechamento das vias aéreas e recrutar previamente
alvéolos não ventilados. Malboisson e colaboradores18 comprovaram esta teoria, através de
análise em tomografia computadorizada, quando, na aplicação de PEEP de 15 cmH2O em
pacientes com SDRA, observaram um aumento na CRF, assim como na PaCO2. Sendo assim,
em sua aplicação, é esperado o aumento da PaO2 e uma diminuição do shunt intrapulmonar. A
CRF aumenta devido a três efeitos, que são; distensão das vias aéreas e alvéolos; prevenção
de colapso alveolar durante a expiração; e recrutamento de alvéolos colapsados, preservando
a integridade alveolar durante todo o ciclo respiratório.2,4,17
Durante uma injúria pulmonar aguda e dependendo da severidade da doença, a PEEP
pode alterar a complacência do pulmão devido ao recrutamento alveolar, e com uma aplicação
excessiva de altos níveis de PEEP pode resultar em hiperdistensão alveolar. Por isso, existem
critérios da escolha da PEEP ideal, como o cálculo da curva pressão/volume (P/V) que também
será abordada.2,17,19
Em certos pacientes com SDRA, a PEEP produz melhora na troca gasosa, porém em
outros pacientes, a PEEP pode produzir mudanças equivocadas e prejudiciais, freqüentemente
combinado com reduções do débito cardíaco, assim como o aumento da pressão abdominal e
à predisposição ao barotrauma, explorando a distribuição de ventilação e perfusão durante a
ventilação mecânica, e tem sido mostrado que sua aplicação é acompanhada de redução do
fluxo sanguíneo em regiões insuficientemente ventiladas dos pulmões. Porém, também pode
abolir regiões de shunt, redistribuindo o fluxo sanguíneo de regiões com alto shunt para regiões
com a relação ventilação/perfusão muito baixa. Assim, a PEEP diminui o número de unidades
com shunt, aumentando o número de unidades adequadamente ventiladas e perfundidas. Seu
efeito também poderá fazer com que diminua um possível edema pulmonar, que pode estar
ocorrendo devido ao aumento da permeabilidade nesses pulmões, translocando este edema
das vias aéreas e alvéolos para o espaço intersticial perivascular.2,17
Os possíveis efeitos na distribuição ventilação/perfusão das manobras de recrutamento
na SDRA mais recentes, talvez com a aplicação de CPAP de 30 a 40 cmH2O por 30-40
segundos, associada à PEEP, são, a redução do shunt, alargamento da dispersão da
distribuição da ventilação e um aumento do espaço morto. A diminuição do shunt pode ser
explicada pela reabertura de alvéolos colapsados com redistribuição do fluxo sanguíneo
pulmonar de áreas extremamente lesadas (shunt), para unidades alveolares pobres ou
normalmente ventiladas, pela queda do débito cardíaco e pelos efeitos combinados desses
dois mecanismos.4
Alguns estudos podem mostrar que em pulmões com SDRA, ventilados com PEEP
baixa, ou seja, abaixo do ponto de inflexão da curva P/V, tiveram severa formação de
membrana hialina, enquanto que os pacientes submetidos à aplicação de PEEP alta, ou seja,
acima do ponto de inflexão da curva P/V, obtiveram menores danos ao pulmão.2,13,17
Grasso et al20, analisaram, em pacientes com SDRA, o efeito de baixo PEEP (em torno
de 9 cmH2O) e de alto PEEP (ao redor de 16 cmH2O), e no entanto, o segundo grupo obteve
recrutamento alveolar significante e aumento na PaO2/FiO2. Já no primeiro grupo, o
recrutamento foi mínimo e a oxigenação não obteve melhora. Apesar do recrutamento com
PEEP de 16 cmH2O ter sido significante, pode não ter surtido efeito em todos os alvéolos, mas
contribuiu para a melhora da oxigenação destes pacientes.
Halter e colaboradores21 analisaram o efeito de uma manobra de recrutamento em
porcos, nos quais foi aplicada pressão de pico de 45 cmH2O, PEEP de 35 cmH2O por 1
minuto. Após este recrutamento, um grupo continuou sendo estabilizado com PEEP de 5
cmH2O e o outro grupo com PEEP de 10 cmH2O. Concluíram que tal manobra abriu um
significante número de alvéolos. Após a manobra, em ambos os grupos observou-se uma
melhora na oxigenação, porém os alvéolos estabilizados com PEEP de 10 cmH2O foram mais
estáveis significativamente. A manobra com PEEP alta talvez tenha resultado em dano
pulmonar induzido pela ventilação mecânica. Em comparação, Kloot et al22, quando aplicaram
PEEP de 20 cmH2O em cães, os pulmões foram provavelmente recrutados por completo, já
com PEEP de 10 cmH2O houve apenas um aumento na PaO2. Desta maneira, pôde ser
provado que um alto nível de PEEP recrutou muitos alvéolos, mas estes dados talvez seriam
mais satisfatórios se ambas as pesquisas fossem realizadas com humanos, porém, deve-se ter
cautela, pois poderia ter sido prejudicial como foi com os animais. No entanto, em relação à
PEEP com efeito estabilizador, ou seja, protetor, em torno de 10 a 20 cmH2O é garantido em
humanos na maioria dos artigos analisados, apesar de nem sempre surtir efeito na diminuição
da mortalidade.15
Concluindo, o principal efeito da PEEP é manter as unidades alveolares que foram
previamente colapsadas, recrutadas, pois o volume é distribuído para mais alvéolos, o pico de
pressão nas vias aéreas é reduzido e a complacência é aumentada.17 Mas ainda, talvez sejam
necessários mais estudos para investigar os efeitos de manobras mais recentes, como a do
CPAP, que vem, atualmente se destacando quanto ao seu efeito, porém ainda duvidosa quanto
aos
seus
efeitos
prejudiciais.
À procura da PEEP ideal através do cálculo da curva pressão/volume (P/V)
No estudo de Rylander et al23, pacientes com SDRA foram submetidos à ventilação
mecânica com volume corrente de 8 a 10ml/Kg, FiO2 de 50% e PEEP de 5 cmH2O, sem que
houvesse a obtenção do cálculo da curva P/V, obtendo como resultado, pulmões
insuficientemente ventilados ou não ventilados. Contudo, pode-se dizer que este valor de
PEEP foi insuficiente para manter as vias aéreas abertas, assim como o recrutamento de
alvéolos, para a obtenção de uma melhor oxigenação. Deste modo, sabe-se que pulmões com
SDRA devem receber uma PEEP mais alta.
Na fase inicial da SDRA, há um aumento da histerese pulmonar e a parte inferior da
curva P/V sofre uma inflexão ao qual implica presença de alvéolos colapsados. Estes alvéolos
podem ser novamente recrutados se uma PEEP for ofertada, porém, esta deverá ter um valor
suficiente para abrir os alvéolos sem hiperdistendê-los. Sendo assim, primeiramente é
necessário calcular a curva P/V para definir corretamente o valor da PEEP a ser aplicada, é o
que diversos estudos baseados nesse tema têm determinado.3,9,14,19,24-28 Os principais objetivos
da realização rotineira das curvas P/V na SDRA seriam calcular e monitorizar a complacência
estática do sistema respiratório ao longo da evolução da doença, e verificar a presença de um
ponto de inflexão utilizando-o, estabelecendo o valor ideal de PEEP, e também averiguar a
presença de um ponto de inflexão superior, o adotando com o objetivo de evitar uma
hiperdistensão alveolar, ou seja, detectando o limite da PEEP.25 O momento em que o pulmão
é recrutado, é representado através de um ponto localizado acima do ponto de inflexão inferior
da curva. Quando ocorre este recrutamento, observa-se que a curva se desloca para cima e
para a esquerda.6
O cálculo da curva P/V se dá à beira do leito, para uma melhor praticidade, em
ventiladores que possuem visualização do gráfico da curva. Este cálculo deve preceder a curva
P/V, utilizando-se o envelopamento máximo pulmonar, o que consiste na manutenção da
insuflação pulmonar em torno de 30-40 cmH2O, mantida por alguns segundos em pulmões
normais. Nos casos de pulmões com SDRA, serão necessárias pressões mais altas, ao redor
de 50-60 cmH2O por um curto período de tempo, sem ocorrência de efeitos deletérios.4 Apesar
disto, Bigatello et al28 ainda citam que mesmo em pulmões com SDRA, o limite da PEEP é de
30-35 cmH2O, como uma medida de cautela. Dessa maneira, observa-se que este valor ainda
não está totalmente definido na literatura.
Este método de cálculo da curva P/V é preconizado, provavelmente, como medida de
fidedignidade e segurança na aplicação da PEEP, para o recrutamento e proteção alveolar,
apesar de ainda existirem Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) com precárias condições para
o manuseio desse tipo de tecnologia, principalmente em algumas regiões de nosso país.
Na pesquisa de Vieira25, foram analisadas diferentes técnicas de realização da curva
P/V com intuito de descobrir o melhor método de seu cálculo. No entanto, independente das
técnicas usadas, bem como suas vantagens e desvantagens, um ponto em comum existente
entre elas é o fato de que exigem tempo e métodos detalhados. Porém, deve-se investigar o
melhor método através de outras análises de estudos, específicos para este tema, os quais
também têm muita importância, para a melhora da sobrevida desses pacientes que sofrem de
SDRA.
Villagra e colaboradores29 analisaram o efeito da aplicação por 15 minutos, de pressão positiva
final com efeito protetor, ou seja com valor de PEEP acima do ponto de inflexão inferior da
curva P/V e uma pressão de pico de 50 cm H2O, e concluíram que a manobra não teve uma
repercussão significativa na melhora da oxigenação. Talvez este estudo possa ser repetido,
mas aumentando-se o tempo de aplicação da PEEP, para uma melhor avaliação quanto à
melhora da oxigenação.
No estudo de Mazzonetto e Dragovasac24, foi calculado o PEEP ideal de duas
maneiras, sendo uma através de medidas de complacência estática e saturação sanguínea de
oxigênio, e a outra através de cálculo da curva P/V, onde, no primeiro método, o VC foi fixado
em 5 cmH2O, já o segundo consistiu em aplicar volumes correntes aleatórios, registrando a
pressão de platô adquiridas em cada nível de volume, e a PEEP foi aplicada dois pontos acima
do primeiro ponto de inflexão da curva. Em ambas as técnicas, anotou-se os valores finais de
PaO2 e PaCO2. Todos os pacientes foram ventilados com modalidade volume-controlado.
Observou-se que não houve prevalência de um método sobre o outro, no que diz respeito à
melhora da oxigenação sanguínea dos pacientes submetidos aos dois métodos de cálculo de
PEEP ideal. Com relação à ventilação, houve um aumento de PaCO2 após a aplicação dos
dois métodos, mas com valores ainda aceitos na literatura. No método de cálculo através da
curva P/V era esperado um aumento da PaO2, o que não ocorreu significantemente, pois foi
pressuposto que ao utilizar-se a PEEP em um valor acima do ponto de inflexão, obter-se-ia um
número maior de unidades alveolares recrutadas, proporcionando melhora na oxigenação
sanguínea. Talvez se deva repetir o estudo, utilizando ventilação com modalidade controlada à
pressão (PCV) e não a volume, para se analisar novos resultados.
A seguir, pode ser observado, para uma melhor ilustração, o exemplo de um gráfico da
curva P/V, retirado do artigo de Rickling1, com os valores correspondentes da PEEP. O ponto
de inflexão superior significa o momento em que o pulmão está sendo recrutado e o limite do
valor da PEEP (Figura 1).
Figura 1: Plotagem da curva P/V com volume
partindo de 400 ml e com incremento de
PEEP, partindo de 0 para 25 cmH2O e
decremento, de 25 para 0 cmH2O. A junção
inferior da curva significa o ponto de inflexão
inferior (momento do início do recrutamento),
e a junção superior significa o ponto de
inflexão superior da curva (momento do limite
de hiperdistensão alveolar).1
CONCLUSÕES
É certo que quanto mais alto os valores de PEEP, maior o recrutamento alveolar, porém
o valor em cmH2O deve ser estipulado da melhor maneira possível, através do cálculo da
curva P/V. A maioria dos estudos analisados demonstraram um valor de PEEP mais ameno, ou
seja, entre 5 a 20mH2O, caracterizando mais uma estratégia protetora do pulmão, ou seja, de
prevenção do colapso, promovendo estabilidade alveolar, do que realmente uma significante
reabertura de alvéolos já colapsados. Os poucos artigos analisados, os quais apresentaram
aplicação de PEEP alto, ou seja, entre 20 e 50 cmH2O, realmente puderam demonstrar o
recrutamento efetivo, porém, estes níveis de pressão podem ter efeitos prejudiciais ao
paciente, como hiperinsuflação, hiperdistensão, podendo ocasionar até barotrauma nas vias
aéreas, assim como distúrbios hemodinâmicos sérios. Sendo assim, devem ser analisados e
experimentados mais estudos com o mesmo objetivo, ou seja, de definir um protocolo mais
próximo possível da efetividade do recrutamento alveolar, assim como da proteção pulmonar
para que não haja efeitos colaterais prejudiciais a estes pacientes, sem deixar de ressaltar que
cada paciente tem sua particularidade em relação a cada tratamento. Sendo assim, em
conclusão, sempre estaremos à procura do melhor tratamento possível para a SDRA, assim
como, o melhor valor de PEEP a ser aplicado, ou então, avaliando também outras estratégias
de recrutamento e seus diversos efeitos, como a manobra com CPAP, por exemplo, com a
finalidade de diminuir cada vez mais a mortalidade desses pacientes.
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Trabalho realizado por:
- Papaleo L. C.1, Dornellas A. C. M.2
* Artigo de Revisão realizado como avaliação
de conclusão de curso de Pós-graduação em
Fisioterapia Pneumofuncional, na Central de
1. E-mail: [email protected]
cursos da Universidade Gama Filho (UGF), São
Paulo, junho/2006.
2. E-mail: [email protected]
Fonte: FisioWeb (http://www.wgate.com.br/fisioweb/) 
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recrutamento alveolar na síndrome do desconforto respiratório agudo