NOVAS TECNOLOGIAS E A HETEROGENEIDADE DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Itamar Mazza de Farias Universidade Tuiuti do Paraná 1 – INTRODUÇÃO Com o acelerado desenvolvimento científico-tecnológico, o processo histórico atual está se caracterizando pelas grandes transformações que vêm ocorrendo em quase todo o nosso planeta. Desta forma, mudanças significativas vêm ocorrendo em todos os processos sociais. O desenvolvimento constante dos meios de comunicação tem rompido as barreiras tradicionais de tempo e espaço, fazendo do nosso planeta um sistema global, muito embora haja controvérsias a respeito. Aceitamos a posição de que não existe um desenvolvimento uniforme ou homogêneo nos processos sociais de todo o planeta. Principalmente para os países ditos “Terceiro Mundo”. Pois o acelerado desenvolvimento científico-tecnológico tem sido fator de concentração da produção e do poder de decisão, excluindo desta forma, um grande contigente desta sociedade dita “global”. Contigente este formado por indivíduos empobrecidos pelo saque das matérias primas, ocorrido com a industrialização selvagem implantada em seus países. Empresas baseadas em instalações de numerosas indústrias poluidoras, que como se sabe, têm levado conseqüências graves à grande parte do planeta. As profundas transformações sociais que vêm ocorrendo na maioria das sociedades têm trazido inovações e transformações nas estruturas produtivas e de consumo. Como conseqüência das políticas ultra-liberais, cada vez mais, insiste-se em mostrar as pessoas como consumidoras, dando-se muito mais atenção em seus direitos de consumir do que na sua condição de cidadãs e cidadãos. Sendo assim, existe uma redução das obrigações e deveres das pessoas como seres humanos e um menoscabo de suas possibilidades de ação e intervenção. “A dimensão consumista implica mover-se apenas num âmbito que permite realizar escolhas entre o que nos oferecem, não no da definição de suas necessidades e da realidade”( SANTOMÉ, P.5, 1997 ). A preocupação destas reflexões diz respeito às pesquisas, no campo educacional, que estejam voltadas para a crescente tecnificação dos processos sociais e especialmente do processo educativo. Tal preocupação vai em busca de respostas para os seguintes questionamentos: Estaria havendo no momento atual um novo renascimento da humanidade e uma redescoberta do Planeta e, também, do próprio ser humano? Este novo renascimento, essa verdadeira descoberta do Planeta pelo processo de globalização não estariam subjugados às novas formas mundiais de produção? Não estariam os novos conhecimentos que atuam sobre as novas tecnologias, impondo-lhes modificações, nem sempre benéficas, ou seja, algumas vezes brutais, segundo as condições de sua utilização? Aceitamos com SANTOS, 1996, p.18, que “a ciência se deixa claramente cooptar por uma tecnologia cujos objetivos são mais econômicos que sociais”, desta forma, considera que “ela se torna tributária dos interesses da produção e dos produtores hegemônicos”, renunciando, assim, segundo ele, a vocação de servir a sociedade. Neste sentido o saber desenvolvido pela ciência, de acordo com o exposto acima, torna-se um saber instrumentalizado, comprometido com interesses de certos grupos ou empresas e em função de conhecimentos delimitados , acabando por sofrer fragmentações, cujos resultados não são aqueles esperados e desejados, ou seja, “ a autonomia das disciplinas científicas”. Observa-se que o crescimento, seja cultural, político, social ou econômico, não ocorre de forma homogênea em todo o planeta. Logo, a evolução e a concentração econômica agrava as distâncias entre os desenvolvidos e “subdesenvolvidos”, afastando, cada vez mais, de um enfoque global e de uma visão crítica . Sendo assim, o trabalho científico sendo realizado para atender objetivos utilitários, acaba por desenvolver uma ruptura entre a teoria e a prática, levando, dessa forma, conseqüências para a própria prática pedagógica, como um todo. Na década atual vários autores têm se colocado acerca dos fenômenos acontecidos mundialmente pelo acelerado desenvolvimento dos meios de comunicação e do processo científicotecnológico, principalmente para os países , ditos “Terceiro Mundo”, como: a concentração da produção e do poder econômico, os quais têm colocado um grande contigente de pessoas da sociedade, dita “global”, na marginalização, as quais são excluídas dos bens produzidos pelo processo “científico e tecnológico”. Segundo LATOUCHE, 1996, P. 26-7, a colonização realizada pelos missionários, se perpetuou pelo Branco que ficou nos bastidores puxando os cordões. “Esta apoteose do Ocidente não é mais a presença real de um poder humilhante por sua brutalidade e sua arrogância. Ela se apoia nos poderes simbólicos cuja dominação abstrata é mais insidiosa, mas por isso mesmo menos contestável. Esses novos agentes da dominação são a ciência , a técnica, a economia e o imaginário sobre o qual elas repousam: os valores do progresso”. Argumentando ainda, que “ a técnica foi um instrumento poderoso na colonização dos corpos e dos espíritos”. II - O PROCESSO HISTÓRICO E AS NOVAS TECNOLOGIAS Acreditamos que, com as devidas reservas, não se pode desprezar a poderosa influência dos meios de comunicação e as redes informatizadas, as quais são fatores importantes e indispensáveis que entrelaçam todas as dimensões da sociedade, traduzindo-se nas questões da vida econômica, cultural, produtiva, de lazer, etc. É indiscutível que “a evolução tecnológica conduziu o desenvolvimento humano para o registro de situações que vão da memória dos relatos orais às interfaces com as memórias tecnológicas gravadas nos equipamentos eletrônicos de última geração”(KENSKI, 1998, p. 59). Pode-se afirmar que a tecnologia moderna reestruturou profundamente a consciência e a memória, impondo desta forma, uma nova ordem “nas formas tradicionais de compreender e de agir sobre o mundo” (op. cit.). No estado do processo histórico atual, com as transformações que vêm ocorrendo em nosso planeta, necessário se faz aprofundar o estudo do conceito de rede, articulando-o com o crescente desenvolvimento das tecnologias de comunicação e informação, e as naturais decorrências para o processo educacional. É a partir da segunda metade do século passado que o movimento de transformações científicas e tecnológicas se manifesta de forma mais intensa, com a invenção do transistor, PRETTO, 1999, P.75.... “deu-se o início à chamada miniaturização das tecnologias, promovendo um grande impulso em todo o desenvolvimento dos sistemas de comunicação em informação, com especial ênfase para a televisão” (op. cit.). Ressalta PRETTO que graças as novas formas de comunicação introduzidas, pode-se discutir hoje, “a televisão segmentada, a televisão interativa, o telecomputer, a automação dos sistemas informacionais, as sinergias e megafusões de grandes empresas do mercado audiovisuais e de comunicações” (0p. cit.) Neste sentido, uma única geração pode ser capaz de acompanhar o nascimento e a morte de uma tecnologia causados “pelo intenso movimento de transformações que se constituem em uma novidade histórica do mundo contemporâneo” (op. cit. p. 76). Essa evolução científica e tecnológica no mundo das comunicações tem sofrido muitas tentativas de sistematização; e a invenção do transistor e o conseqüente desenvolvimento dos sistemas computacionais neste universo. Podendo-se desta forma indicar, segundo PRETTO, três fases distintas deste desenvolvimento: - - a primeira durante a década de 70 que fez com que a informática fosse sendo gradativamente introduzida na sociedade. É o início, o momento dos sistemas centralizados; surge também, o primeiro computador de bolso, dando início a um movimento de transformação muito forte; a segunda fase do recente desenvolvimento tecnológico acontece neste contexto com a microinformática. Implantando-se assim as redes, conectando computadores em tempo real; a terceira fase, assim chamada, acontece ao longo da década de 80, “com o aumento da capacidade de análise instantânea de dados paralelamente ao barateamento dos equipamentos”. Havendo, pois, com esse aumento de processamento dos dados de pesquisa , uma maior integração dos computadores; que cada dia mais se espalhavam pelo mundo; mudando cada vez mais o cenário que deram especial impulso à história da humanidade. Com essa entrada de novos atores em cena, começa-se a falar em descentralização dos sistemas em “redes interativas, em conexões em tempo real. Esse acesso à novas tecnologias, aos novos meios de comunicação e à novas fontes de informações está produzindo mudanças significativas nos costumes das pessoas em geral. Os sistemas informativos estão produzindo uma nova sociedade. Esta nova sociedade, a qual pode-se denominar de “tecnotrônica”, “é uma organização cuja forma esta determinada no plano cultural, psicológico, social e econômico, pela influência da tecnologia e da eletrônica, especialmente no campo da computação e das comunicações” ( BRZEZINSKI, apud SANTOMÉ, 1998, p. 83 ). Vivemos, segundo IANNI, 1997, P.80, no “reino da razão instrumental, técnica ou subjetiva”, permeando progressivamente todas as esferas da vida social, em âmbito local, nacional, regional e mundial. Muito se tem discutido ( recentemente ), nas diversas áreas do conhecimento, sobre o papel que a tecnologia vem desempenhando em nosso cotidiano, bem como, nas diversas esferas da vida social. Necessário se faz ressaltar, que estas discussões não ocorrem de forma passífica ou de forma homogênea. Para MACEDO, 1997, p. 39, “ as posições assumidas na análise do tema caminham dos herdeiros do romantismo, que criticam a civilização capitalista moderna por considerá-la responsável pela destruição de padrões éticos e morais, ao extremo oposto, formado por grupos que vêem a tecnologia como mola propulsora do progresso social”. Importante, portanto, será a reflexão sobre como estas questões repercutem no campo educacional, e especificamente, no interior das escolas. Sabe-se que também aí as posições são antagônicas. Segundo a autora acima citada, existe “a resistência da maioria dos profissionais da educação em lidar com a entrada de novas tecnologias na escola; de outro, os mirabolantes projetos oficiais, que apresentam a tecnologia como a grande redentora dos problemas da área”(op. cit.). No entanto, a revolução tecnológica não deve ser percebida apenas como uma fonte de melhoria da eficiência técnica, “mas como criadora de novas oportunidades, de novas profissões e de novos serviços para as pessoas. Não se trata apenas de um assunto tecnológico; basicamente é um grande desafio político, cultural, econômico e social” (SANTOMÉ , p. 89). É neste sentido que estamos caminhando com esta discussão. III – NOVAS TECNOLOGIAS VERSOS NOVAS APRENDIZAGENS Não se pode negar que atualmente, os meios de comunicação, bem como, a informática estão a exercer uma grande pressão no sentido de alteração dos processos sociais, bem como, nos processos educativos. Tanto na educação informal como na educação escolarizada. A educação a longa distância, desenvolvida através de variados e bons programas é um fato incontestável. Se, a revolução tecnológica está se refletindo nas diversas esferas sociais, o campo educacional não é uma exceção. Existem posições antagônicas e saudosistas. Uns defendem o velho manual didático como único instrumento de objetivação do trabalho pedagógico. Outros advogam o uso do velho quadro-negro com seu inseparável acompanhante pó-de-giz , como asseguradores, também, da antiga profissão do magistério. E há outros, ainda, que defendem a entrada da informática no interior da escola, apenas como a renovação da tecnologia escolar. A experiência no interior da prática pedagógica nos tem demonstrado que muitos educadores tem reagido às novas tecnologias através de críticas ferrenhas , indignados pelos gastos exorbitantes do poder público na aquisição de novas tecnologias sem o devido levantamento de prioridade das necessidades, bem como, sem o devido preparo à utilização de novos instrumentos. Para MACEDO, a “resistência dos educadores às tecnologias educacionais pode dever-se aos interesses subjacentes às políticas públicas que envolvem as tecnologias educacionais, normalmente consumidoras de vultosas somas transferidas do poder público para a iniciativa privada”( op. cit., p. 40 ). Segundo alguns autores, no caso em questão, citamos VILLA, 1998, p.36, “muitas das críticas à introdução de novas tecnologias, seja no que se refere aos processos pedagógicos ou no que se refere aos meios de trabalho docente, estão no fundo animados por uma leitura geral pessimista do papel da técnica no mundo moderno”. É inegável a importância da relação entre currículo e tecnologia. A informática, atualmente, está a exercer pressão no sentido de alteração dos processos de ensino. Porém, na nossa opinião, se utilizada apenas como uma tecnologia isolada, será apenas uma tecnologia a mais a ser introduzida no processo escolar. Não se pode, também, deixar de se refletir sobre o perigo de se pensar dois tipos de cidadania: uma através de uma escola fornecendo conteúdos desenvolvidos dentro de nova cultura tecnológica, atendendo aos apelos e as necessidades do industrialismo. Educação está, para uma clientela de classe média-alta; e outra escola para uma clientela de menor poder aquisitivo. Na etapa atual de desenvolvimento, a escola tem a necessidade de se modernizar e a obrigação de instrumentalizar os seus alunos para operar a informática. De introduzir novas tecnologias nos seus currículos, buscando familiarizar os seus alunos nesses novos meios, preparando-os não apenas para a pura competição no mercado de trabalho, mas, principalmente, para torná-los cidadãos e cidadãs competentes, instrumentalizados por um saber que os levem a conhecer e questionar a sua realidade; que os preparem para a participação de uma vida mais rica, com maior capacidade de produção, além de maior participação democrática. No sentido, acima exposto, a implantação de novas tecnologias no processo pedagógico da escola deverá ser mediatizada e dialetizada pelos fins que a educação pretende atingir e não apenas pela utilização de novas tecnologias com fins em si próprias. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, Fernando José. Educação e informática: os computadores na escola. 2ed.São Paulo: Cortez, Coleção: Polêmicas do Nosso Tempo-N.19, 1988. IANNI, Otávio. Teorias da globalização. 4ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1997. LATOUCHE, Serge. A ocidentalização do mundo: ensaios sobre a significação, o alcance e os limites da uniformização planetária. 2 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. MACEDO, Elizabeth Fernandes de. Novas tecnologias e currículo.In:__MOREIRA, Antonio Flávio B. (Org.), 4ed. Currículo: questões atuais. Campinas-SP. Papirus, 1997. SANTOMÉ, Jurjo Torres. Globalização e interdisciplinaridade- o currículo integrado. Porto Alegre – RG, Artes Médicas, 1998. SANTOS, Milton. Metamorfose do espaço habitado. 4ed. São Paulo: Hucitec, 1996. VILLA, Fernando Gil. O professor em face das mudanças culturais e sociais. In: __VEIGA, Ilma Passos. (Org.). Caminhos da profissionalização do magistério. Campinas SP: Papirus, ps. 2747, 1998.