ESPAÇO PEDAGÓGICO: REFLEXÕES SOBRE A INDISCIPLINA NA ESCOLA
Simone Maria Alves de Lima
Profa. Dra. Carmem Lucia Artioli Rolim (Orientadora)
Terezinha Rodrigues de Souza Diógenes (Colaboradora)
Programa de Pós-Graduação em Educação – UFT
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq
Escola Municipal de Tempo Integral Luiz Nunes de Oliveira
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Resumo
O presente trabalho é fruto de uma investigação empírica de cunho qualitativo que teve por objetivo conhecer o
trabalho dos espaços pedagógicos, constituídos legalmente no ambiente escolar e a inter-relação que esses
mantêm com alunos, pais e professores a partir de atividades e ações criativas. Enfocamos o termo criatividade a
partir da perspectiva histórico cultural, neste trabalho evidenciamos, portanto, organização escolar, a partir de
um experimento realizado pelo serviço de orientação educacional de uma escola do campo no município de
Palmas, Tocantins. Como metodologia utilizamos a observação participante, e como recursos, observação,
entrevista, recolha e análise de documentos, registros e fotos. Trata-se de uma experiência desenvolvida na
Escola de Tempo Integral Luiz Nunes, pela orientadora educacional Terezinha Rodrigues com a colaboração de
pais, alunos e professores, o projeto intitulado “Disciplina Nota 10” tem como objetivo trabalhar a questão
disciplinar dos alunos da educação infantil ao nono ano e fundamenta-se principalmente na disciplina, não pela
punição, mas pela reflexão da ação e na interação social. O projeto teve inicio em 2007, permanece ativo e tem a
cada necessidade, construído novos instrumentos ou reestruturados os anteriores, como resultado é possível
pontuar que os espaços pedagógicos funcionam como apoio fundamental no processo de ensino e aprendizagem,
bem como, na formação social dos sujeitos. Que a ação colaborativa contribui significativamente para soluções
de problemas de indisciplinas, que ações criativas podem retirar da escola a visão de disciplinadora por meio de
punições e tornar esse ato mais educativo, reflexivo, corroborando para um ambiente mais harmônico em que o
pensar/refletir se constitui na retomada da ação e melhoria das relações.
Palavras Chave: Espaços Pedagógicos. Indisciplina na Escola. Ação e Criatividade.
Introdução
O presente trabalho é fruto de uma investigação empírica de cunho qualitativo que
teve por objetivo conhecer o trabalho dos espaços pedagógicos, e as possíveis contribuições à
prática docente e nas soluções de problemas conflitantes vivenciados no interior da escola. O
interesse surgiu inicialmente com a proposta do V Fórum Internacional Inovação e
Criatividade (INCREA), PPGE/UFT e a partir da leitura de Franco (2012), que ao fazer uma
abordagem sobre a contribuição da pedagogia às práticas docentes chama a atenção para a
contribuição dos pedagogos e espaços pedagógicos, ainda pelo convívio/atividade profissional
dessa pesquisadora com os referidos espaços em escolas municipais em Palmas – TO, onde
esses constituídos legalmente atuam nos serviços de supervisão e orientação educacional entre
outros, destacam-se por enfrentar opiniões divergentes quanto às capacidades e desempenho
nos serviços prestados, com isso surge os questionamentos: Os espaços pedagógicos
constituídos legalmente e presentes no cotidiano escolar colaboram para solução de
problemas? De que forma e quais ações marcam a atividade dos profissionais que atendem
nesses espaços, e destacam-se como uma ação colaborativa e inovadora na articulação
ensino/aprendizagem ensino/inter-relação, escola/família? Com o objetivo de responder os
questionamentos buscamos no contexto municipal algumas ações criativas, realizadas por
supervisores e/ou orientadores. Enfocamos o termo criatividade na perspectiva histórico
cultural, como resultado foi evidenciado, portanto, a criatividade da organização e ação dos
espaços pedagógicos, a partir de um experimento realizado pelo serviço de orientação
educacional de uma escola do campo no município de Palmas, Tocantins. Como metodologia
utilizamos a observação participante, e como recursos, entrevista, recolha e análise de
documentos, registros e fotos. Trata-se de uma experiência desenvolvida na escola Municipal
de Tempo Integral Luiz Nunes, pela orientadora educacional Terezinha Rodrigues com a
colaboração de pais, alunos e professores, o projeto intitulado “Disciplina Nota 10” tem como
objetivo trabalhar a questão disciplinar dos alunos da educação infantil ao nono ano e
fundamenta-se principalmente na disciplina, não pela punição, mas pela reflexão da ação e
pela interação social. O projeto teve inicio em 2007, permanece ativo e tem a cada
necessidade a construção de novos instrumentos ou reestruturação dos anteriores, como
resultado é possível pontuar que os espaços pedagógicos funcionam como apoio fundamental
no processo de ensino e aprendizagem, bem como, na formação social dos sujeitos. Que a
ação colaborativa contribui significativamente para soluções de problemas de indisciplinas,
que ações criativas podem retirar da escola a visão de disciplinadora por meio de punições e
tornar esse ato mais educativo, reflexivo, corroborando para um ambiente mais harmônico em
que o pensar/refletir se constitui na retomada da ação e melhoria das relações.
Metodologia
Considerando que o estudo destina-se a investigar a prática educativa e colaborativa
dos pedagogos no contexto escolar, seu desenvolvimento seguiu orientações de Bogdan e
Biklen (1994, p. 47-50), ao ressaltar que a investigação qualitativa tem em sua essência cinco
características que definem o interesse da pesquisa. A fonte direta de dados como ambiente
natural, e o investigador como instrumento principal na coleta desses dados, constituem a
primeira característica, os dados recolhidos como carácter descritivo, a segunda, os
investigadores que utilizam metodologias qualitativas, estão mais interessados no processo
que nos resultados, a terceira, a análise dos dados de forma indutiva, a quarta e o investigador
mais interessado no significado que os participantes atribuem às suas experiências do que pela
própria experiência, a quinta. Como abordagem metodológica optou-se pela observação
participante, por essa permitir o uso de materiais diversos como; observação, entrevistas,
exploração de documentos, imagens, fotos entre outros. A investigação foi realizada em uma
escola do campo do municipal de Palmas – TO. A definição do espaço escolar se deu, a partir
de consultas prévias (em caráter de enquete) realizadas junto aos técnicos da Secretaria de
Educação de Palmas, essa, solicitava aos técnicos que apontassem ações realizadas por
pedagogos “espaços pedagógicos” que se revelassem como inovadoras, surge o projeto
disciplina nota 10. Estabelecemos contato com a Orientadora Educacional responsável,
agendamos entrevista, vistamos a escola, recolhemos documentos (instrumentos) utilizados,
analisamos o projeto político pedagógico da escola. Para análise e interpretação dos dados
recorremos à teoria da atividade de Leontiev (2012), que orienta significados e sentidos sobre
a ação pedagógica, produzida pelos profissionais, em seus espaços, Com Vigotski (2009)
buscou-se evidenciar a capacidade imaginativa e criativa, Foucault (1996) fundamenta a
questão da indisciplina/disciplina e Franco (2012) e Pimenta (1988), corroboram com o
conceito e a importância do pedagogo e dos espaços pedagógicos no contexto escolar.
Espaços pedagógicos e ações criativas
A prática docente encontrar-se envolvida diretamente em todos os espaços, num
processo de interlocução dinâmico que converge em partilha de responsabilidades, em busca
de soluções de problemas, para tanto, a escola com os profissionais que a constituem se lança
em práticas e propostas, na tentativa de elucidar dificuldades inerentes ao ensino, a
aprendizagem, e relacionamentos conflitantes que tem marcado fortemente os ambientes
educacionais no início do Século XXI. Nesse sentido, a contribuição e prática pedagógica dos
pedagogos (espaços pedagógicos), assumem um papel fundamental na organização e gestão,
Franco (2012, p.31) corrobora dizendo:
[...] tenho certeza que os professores não conseguem trabalhar sem que haja esse
substrato pedagógico tecendo as intenções coletivas na escola; sem uma esfera
institucional, que chamo de espaço pedagógico, acompanhando o andamento do
projeto político da escola e funcionando como instância crítica a mediar interesses e
negociar com as esferas que dialogam continuamente com a escola (pais,
comunidade, sistema escolar).
Elaborando e executando propostas que se encaminhem de forma efetiva na solução de
problemas vivenciados em cada contexto educacional. A importância da presença desses
espaços pedagógicos (profissionais) no interior da escola justifica-se principalmente pelo fator
histórico e cultural de cada comunidade, pensando assim observa-se que cada instituição
possui suas especificidades, o que requer um pensar e um agir pedagógico elaborado
especialmente para aquela comunidade escolar, embora haja problemas gerais, que abrangem
instituições de norte a sul do país, não implica dizer que um projeto que funciona em uma
instituição aplica-se com êxito a todas, como uma receita, se assim o fosse, já não teríamos
problemas, dado a quantidade de pesquisas e projetos que buscam minimizar ou resolver os
problemas enfrentados pela escola, tanto os de cunho didático cognitivo, que envolve
estratégias de melhoria de ensino, como os de cunho social que se volta à solução dos mais
variados problemas, porém, todos se empenham a tornar a escola mais efetiva no desempenho
de sua função. Assim, buscar caminhos para a melhoria do ensino coloca-se como desafio, e
evidenciar ações que se destacam por resultados favoráveis, constitui-se um dever dos
pesquisadores que entendem que “socializar e tornar públicas as práticas induz os docentes a
perceberem que a prática não é apenas uma responsabilidade pessoal de cada docente, mas um
trabalho coletivo de pensar o contexto e recriar um modo de atuar sobre ele.” (FRANCO,
2012, p.24). “Entendemos que o fazer pedagógico, que ultrapassa a sala de aula e a determina,
configura-se como essencial na busca de novas formas de organizar a escola para que seja
efetivamente democrática” (PIMENTA, 1988, p. 55).
Os espaços pedagógicos em dada atividade ao definirem a ação e ao atribuírem
sentidos a essa, proporcionam o desenvolvimento, pois além de considerar o contexto em que
a ação está sendo desenvolvida; as palavras e as operações que a compõem, foram pensadas
para uma comunidade distinta, para elucidar ou minimizar determinada situação problema,
considerando o fato de essa ter sido planejada por um membro do grupo, que vivencia a
situação, a ação passa a ter um sentido e um significado inerente à maioria dos interlocutores
do processo. Pois como bem coloca Moysés (2012, p. 40), “o fato de o aluno não compartilhar
do mesmo nível de profundidade e amplitude de um conceito com um interlocutor pode gerar
desentendimento. É fonte de dificuldade permanente para qualquer professor conhecer o
alcance dos significados e sentidos atribuídos pelos alunos às suas palavras”, ações, seja, é
imprescindível que ambos, professor e aluno, conheçam a atividade principal, que de acordo
com Leontiev (2012, p. 68) “por atividade, designa-se os processos psicologicamente
caracterizados por aquilo a que o processo, como um todo, se dirige (seu objeto), coincidindo
sempre com o objetivo que estimula o sujeito a executar a atividade, isto é, o motivo”.
Além da clareza da atividade, a atribuição de sentidos e significados, assegura o
entendimento, é fundamental que um projeto preste-se a criatividade. Não a criatividade
artística, como normalmente a escola interpreta o termo, mas atribuindo-lhe um caráter
imaginativo na solução de problemas. Para L. S. Vigotski (2009) toda obra da imaginação
constrói-se de elementos tomados da realidade [...] e a imaginação, quando se cristaliza em
objetos ou obras, provoca alterações na realidade. Assim se os ambientes escolares são
repletos de elementos reais, são esses que determinam a ação criadora. Dentre tantos que
merecem destaque encontra-se a questão do bullying e da indisciplina.
A indisciplina e a escola
Um dos grandes desafios que a escola tende a enfrentar no Século XXI é a indisciplina
dos alunos, haja vista, os altos índices de relatos e fatos que têm culminando em tragédias nas
próprias escolas, ou que têm início nas relações sociais nessas instituições e se consumam
fora delas. Considerando a abordagem histórico-cultural que ressalta ser o homem produto de
suas relações e do contexto sociocultural em que vive, é possível apreender a indisciplina
como um fenômeno que surge nos e dos processos de relações.
No entanto, a questão da indisciplina não surge apenas nesse século, na verdade, nesse
ela se evidencia e parece ampliar-se, porém, trata-se de uma prática que permeia a escola há
muito tempo, uma vez que nesse contexto, considera-se indisciplina as agressões físicas e
verbais, a desobediência, provocações, vandalismos entre outros. Diante de casos de
indisciplina a escola tem imputado penalidades normalmente privativas, as quais impõe ao
discente uma suspensão, transferência compulsória entre outras. Assim, ao compor uma
estrutura baseada na relação de poder, ao imputar penalidade à escola assume característica de
instituição disciplinadora que segundo Foucault (1987, p. 230):
A penalidade, a vigilância e o controle seriam então uma maneira de gerir as
ilegalidades, de riscar limites de tolerância, de dar terreno a alguns, de fazer pressão
sobre outros, de excluir uma parte, de tornar útil outra, de neutralizar estes, de tirar
proveito daqueles.
É com o propósito de romper com esse caráter disciplinador em que o uso da
palmatória se fez presente até a década de 80 do século passado, e com as formas de gestão e
de ensino pautados no autoritarismo e situações de relacionamentos conflitantes, em que
muitos se originam em fatores históricos e sociais, por tratar-se de uma instituição que
acomoda filhos de fazendeiros, trabalhadores rurais e assentados, onde as lutas e os interesses
são divergentes, que a supervisão educacional da Escola Luiz Nunes, como espaço
pedagógico atuante elabora um projeto, na tentativa de minimizar os casos de indisciplina
estabelecidos no interior da escola.
Aspectos históricos do ambiente investigado
Fundada em 1960, a escola foi construída pelos agricultores da região que
sentiam necessidade de ter uma escola para atender seus filhos, tinha caráter privado, pois
cabia aos pais pagar o salário do professor, motivo que limitava o acesso, sendo uma escola
com poucos alunos. Tendo por base uma educação tradicional caracterizava-se como uma
escola silenciosa, rígida, onde se fazia uso da palmatória e o “Dia de Argumento”, esse se
tratava do dia em que o professor verificava a aprendizagem do conteúdo semanal.
Tornou-se pública, três anos depois no dia 02 de agosto de 1963, passando a pertencer
a Prefeitura Municipal de Porto Nacional, através da Lei nº 469 de 02/08/1963. Por ser uma
extensão de outra escola do Município de Porto Nacional, recebeu o nome de Escola Irmã
Maria Aspásia, contava com uma média de 20 a 30 alunos e com um único professor que
ministrava aulas de 1ª a 4ª séries em uma sala multisseriada. Permanecendo com esse caráter
educativo de 1963 a 1980; também permaneceram as normas e o uso da palmatória e do
argumento, fato atribuído a seu isolamento e difícil acesso, onde o professor agia de acordo
com seus próprios princípios o que caracterizava a uni docência.
A criação do estado do Tocantins abre novas perspectivas e configuram
mudanças na realidade da escola, em 1990 a escola passar a pertencer ao município de
Palmas, a uma distância de 75 km da capital, é nessa nova gestão que a escola amplia o
número de salas, realiza matrículas por série e amplia o número de professores, sendo um para
cada série. Porém, depara-se com um novo problema, os professores não tinham formação,
nem mesmo haviam concluído o primeiro grau, na verdade tratava-se aqui de quem sabia um
pouco mais, ensinar quem não sabia. No ano de 1990 a Lei nº 69/90, de 30 de agosto de 1990,
alterou o nome da escola para Escola Municipal Luiz Nunes de Oliveira, em homenagem ao
primeiro professor, dois anos depois inicia o atendimento a 5ª Série, e a partir desse momento,
passa a implantar sucessivamente as demais séries do Ensino Fundamental, os professores
participaram de processos de formação pelo Projeto Cuca, um curso oferecido e custeado
pela Prefeitura de Palmas, com o objetivo de capacitar e habilitar professores teve início em
meados de 1993, e em 1995 formavam-se os primeiros professores.
Em 1994 a Prefeitura de Palmas implantou o sistema de Polos Educacionais, trata-se
de um agrupando das escolas rurais em núcleos (Escolas Polos), o objetivo desse projeto era
eliminar com a multisseriação, oferecer um ensino de qualidade e uma escola com estrutura
física digna e oferecer melhores condições de ensino para a zona rural. A escola Luiz Nunes,
passou a ser “Escola Polo” e começa a receber alunos de duas outras escolas multisseriadas,
mas é no ano de 2000 que se marca o grande avanço, com a conclusão de nível superior dos
professores, melhoria na estrutura física, criação de espaços pedagógicos e acesso a recursos
didáticos e tecnológicos. O acesso a uma graduação para os professores foi facilitado, por
meio de projeto do Governo Federal em parceria com o estado, podendo ser cursado na
modalidade à distância. Uma segunda opção foi à abertura de outras universidades na nova
capital, fator que favoreceu a qualificação de muitos educadores.
Hoje, se enquadra na posição de escola democrática, onde a gestora passou por
processo seletivo, estabelece vínculo e discussão com a comunidade escolar, em 2008 a
Resolução CME nº 18/2008, institui-a como Escola de Tempo Integral, passando a funcionar
das 8 às 16 horas de segunda a quinta-feira, neste contexto muitas vantagens podem ser
pontuadas, porém, o convívio em um tempo maior, amplia as possibilidades de conflitos, e
exige das escolas e dos educadores novas atitudes, novas propostas. Foi nesse novo contexto,
que o serviço de orientação educacional organizou o projeto Disciplina Nota 10, sobre o qual
passamos a detalhar.
Projeto Disciplina Nota 10
O projeto teve inicio em 2007 com origem na experiência da supervisora educacional,
que ao desempenhar a função de coordenadora pedagógica, por falta do serviço de orientação,
assumia também o trabalho com os discentes e a família. Ao desempenhar a dupla função
realizando atendimento a docentes e discentes, sentia a necessidade de um trabalho que
minimizasse os conflitos. No ano de 2006 a Prefeitura Municipal de Palmas institui o Serviço
de Orientação Educacional (SOE), cabendo a esse assumir o trabalho com os discentes,
considerado um grande avanço pela comunidade, no ano seguinte em 2007, a referida
supervisora, Terezinha, a convite da gestora assume o SOE, tendo por base às experiências
anteriores as quais o atendimento se respaldava em normativas do regimento escolar, com
registros de ocorrências, suspensões ou transferências compulsórias, buscou implementar no
novo espaço pedagógico algo diferente, que descaracterizasse a antiga visão de penalidade,
que substituísse o caráter disciplinador, corretivo, punitivo, por outro que surtisse efeito, que
educasse; foi com esse pensamento que o serviço de orientação educacional da referida escola
iniciou o projeto “Disciplina Nota 10”, buscando com esse, algo que convergisse em
mudanças, que não mais usasse a punição, mas que possibilitasse a reflexão da ação, algo que
conduzisse a novas atitudes e a boas interações sociais. Em volta desse pensamento elaborou
os primeiros instrumentos, uma espécie de ficha de registro em que a aluno descreve o
ocorrido; a construção de instrumentos que conduzam o aluno a relatar o conflito, ganha nesse
contexto valores fundamentais, primeiro porque retira do orientador o encargo de registrar a
ocorrência, seja, retira a visão de delegar, arbitrar, julgar a ação, ao mesmo tempo em que
repassa ao educando a responsabilidade de inferi, pensar sobre o ato para descrevê-lo. Dar-se
uma atividade em que a ação inicial possibilita a reflexão e outros encaminhamentos como:
análise do nível de escrita e leitura, uma vez que ao término da descrição, o aluno é convidado
a ler o que escreveu tal operação possibilita a análise descritiva, uma vez que o ato envolve
mais de um sujeito, é natural que cada um, ao descrever sobre o fato, o faça, sobre seu ponto
de vista, o que normalmente incide em divergências, esse momento é crucial, pois é nele que
se estabelece e se retoma o processo de relações, evidenciando o equívoco, e se tenta finalizar
o conflito. A atividade possibilita ainda a análise da escrita, com correções ortográficas e
gramaticais, assim todos que chegam ao SOE, ao término do atendimento são encaminhados
para o reforço; outro ponto importante desse projeto é que após duas passagens do aluno pelo
SOE, seja pelo mesmo motivo, ou por outro, a família é convidada a ir à escola e juntamente
com os envolvidos, gestão e supervisão, dialogam sobre o comportamento do educando que é
encaminhado para casa com outro instrumento, esse deve ser respondido juntamente com a
família. Foucault ressalta que:
Uma disciplina se define por um domínio de objetos, um conjunto de métodos, um
corpus de proposições consideradas verdadeiras, um jogo de regras e de definições,
de técnicas e de instrumentos: tudo isso constitui uma espécie de sistema anônimo à
disposição de quem quer ou pode servir-se dele, sem que seu sentido ou sua validade
estejam ligados a que sucedeu ser seu inventor. (FOUCAULT, 1996, p. 30)
Portanto, trazer o conflito para um espaço discursivo possibilita, não apenas à escola,
mas também à família na construção de valores que não realça a indisciplina, ao contrário,
eleva e enfatiza a disciplina, assim entendida, refere-se a um conjunto de parâmetros que
devem ser seguidos no contexto educativo, visando à convivência e produção escolar de
melhor qualidade.
O Projeto assume um formato de triangulação, onde a aprendizagem (a mudança de
atitudes) é construída no contexto escolar e envolve (aluno-professor-família), cabendo ao
aluno à reflexão, a apropriação e a reconstrução dos processos de relações, a escola e a família
entregam esse processo como mediadoras da atividade, a qual se distingue como
objeto/motivo a mudança de comportamento. Leontiev (2012) expõe que o envolvimento
intenso do sujeito naquilo que ele realiza, é o que garante o aprendizado, partindo desse
princípio pode-se apreender que o envolvimento do aluno na ação é o que viabiliza a mudança
de atitudes e tem contribuído para minimizar o índice de indisciplina na escola.
Considerações Finais
O contexto escolar é o lugar onde se efetivam processos de aprendizagens cognitivas,
também onde o aluno aprende a conviver, a partir de um processo de comunicação e interação
social. Cabe, então, a escola, dotar o aluno de experiências e vivências significativas que
contribuam para a aprendizagem e o desenvolvimento, a partir de uma construção coletiva e
colaborativa que envolva todos os seguimentos da comunidade escolar. Nesse sentido, os
espaços pedagógicos, com suas atitudes e projetos viabilizam a escola e seus atores, melhorias
quanto à aprendizagem e o relacionamento interpessoal, além de agirem como interlocutores
em inúmeras operações que envolvam a atividade educativa. Assim, como resultado da
investigação é possível pontuar que os espaços pedagógicos funcionam como apoio
fundamental no processo de ensino e aprendizagem, bem como, na formação social dos
sujeitos. Que a ação colaborativa contribui significativamente para soluções de problemas de
indisciplinas, que ações criativas podem retirar da escola a visão disciplinadora por meio de
punições e tornar esse ato mais educativo, reflexivo, corroborando para um ambiente mais
harmônico em que o pensar/refletir se constitui na retomada da ação e melhoria das relações.
Referências
BOGDAN, R.; BIKLEN, S. Investigação qualitativa em educação. Porto: Porto Editora,
1994.
FOUCAULT, M. Vigiar e Punir. Trad. Raquel Ramalhete. 27. ed. Petrópolis: Vozes, 1987
__________, M. A Ordem do Discurso. Trad. L. F. de A. Sampaio. São Paulo: Loyola,
1996.
FRANCO. Maria A. S. Pedagogia como ciência da educação. São Paulo. Cortez, 2012.
LEONTIEV, A. N. Uma contribuição à teoria do desenvolvimento da psique infantil. In:
VIGOTSKI, L.S. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Universidade
de São Paulo, 2012.
MOYSÉS, L. Aplicações de Vygotsky à educação matemática. 11º ed. Campinas, SP:
Papirus, 2012.
PIMENTA, S. G. O pedagogo na escola pública. São Paulo: Loyola, 1988.
VIGOTSKI, L. S. (2009). Imaginação e criação na infância. (A. M. B. Smolka, Trad.). São
Paulo: Ática
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