UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉ CURSO DE DIREITO ASSÉDIO MORAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO À LUZ DOS JULGAMENTOS DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 12ª REGIÃO IARA MARIA GOEDERT São José (SC), maio de 2008 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉ CURSO DE DIREITO ASSÉDIO MORAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO À LUZ DOS JULGAMENTOS DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 12ª REGIÃO IARA MARIA GOEDERT Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientadora: Professora Giselle Meira Kersten São José (SC), maio de 2008 TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. São José, ______ de maio de 2008. Iara Maria Goedert Graduanda PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduanda Iara Maria Goedert, sob o título VALORAÇÃO DA INDENIZAÇÃO DEVIDA EM CASO DE DANO AO EMPREGADO, foi submetida em ______ de maio de 2008 à banca examinadora composta pelos seguintes professores:_________________________ aprovada. São José, ______ de maio de 2008. Professora Giselle Meira Kersten Orientadora e Presidente da Banca Professor Coordenação da Monografia e 11 Dedico este trabalho ao meu noivo Rafael por seu amor, incentivo, apoio, paciência e por ficar ao meu lado nos momentos mais difíceis da minha vida sem jamais fraquejar, acreditando no meu potencial e me incentivando todos os dias a continuar essa longa caminhada. 12 AGRADECIMENTOS A Deus, que sempre esteve comigo, por seu imenso amor e paciência, pela força concedida para vencer os inúmeros desafios da vida e alcançar esta tão almejada conquista. A minha família em especial meus pais Waldemiro e Bernadete, bem como meus tios Espíndola e Inês pelo amor, carinho, educação proporcionada, e por sempre terem acreditado em minha capacidade até em momentos que eu mesma duvidei. A minha irmã Gorete e meus irmãos Cláudio e Fernando, pelo amor despendido, pelas brigas e chamadas de atenção para a realidade. A minhas sobrinhas Karline, Anna Karolina, minha afilhada Gabrieli, bem como os amigos que tenho e levarei por toda vida, por fazerem parte desta e por me darem força para continuar. Aos amigos da faculdade em especial Marcella, Jamilly, Fabricia, Kátia, Cleomir Sandra e Robson pelo apoio, companheirismo, amizade e incentivo durante todo o curso. Em especial a minha orientadora Giselle Meira Kersten pela colaboração e dedicação neste trabalho. 13 ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS Art. – artigo CC – Código Civil CCP – Código de Processo Civil CF – Constituição Federal CLT – Consolidação das Leis do Trabalho DOU – Diário Oficial da União EC – Emenda Constitucional ed. – edição ES – Espírito Santo n. - número OAB – Ordem dos Advogados do Brasil OIT – Organização Internacional do Trabalho Org. – organizador PE – Pernambuco PCdoB – Partido Comunista do Brasil RIT – Regulamento Interno do Trabalho RO – Recurso Ordinário STJ –Supremo Tribunal Federal TRT – Tribunal Regional do Trabalho 14 SUMÁRIO Resumo......................................................................................................................IX Abstract......................................................................................................................X INTRODUÇÃO...........................................................................................................11 CAPÍTULO 1: A VALORAÇÃO DO TRABALHADOR.............................................13 1.1 BREVE HISTÓRICO DA VALORIZAÇÃO DO TRABALHADOR.........................13 1.2 O RECONHECIMENTO DA DIGNIDADE DO TRABALHADOR..........................19 1.3 DIREITOS DE PERSONALIDADE DO TRABALHADOR.....................................24 1.4 O PRINCÍPIO DO PROTECIONISMO.................................................................26 1.5 PODERES DO EMPREGADOR ..........................................................................30 1.5.1 O poder organizador..........................................................................................31 1.5.2 O poder fiscalizador...........................................................................................31 1.5.3 O poder disciplinador.........................................................................................32 1.6 O ABUSO DO PODER DO EMPREGADOR........................................................35 CAPÍTULO 2: ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO..................................................38 2.1 CONCEITO DE ASSÉDIO MORAL......................................................................38 2.2 SUJEITOS DO ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO............................................41 2.2.1 Assédio moral vertical.......................................................................................42 2.2.2 Assédio moral horizontal...................................................................................43 2.2.3 Assédio moral misto..........................................................................................44 2.3 AS CAUSAS DO ASSÉDIO MORAL....................................................................44 2.4 CONDUTAS CARACTERIZADORAS DO ASSÈDIO MORAL.............................46 2.4.1 Diferenças entre assédio moral e assédio sexual...........................................48 2.4.2 O que não é assédio moral...............................................................................51 2.4.2.1 O estresse......................................................................................................51 2.4.2.2 O conflito .......................................................................................................52 2.4.2.3 A injuria...........................................................................................................53 2.4.2.4 Imposições profissionais................................................................................54 2.5 OS EFEITOS DO ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO........................................55 CAPÍTULO 3: VALORAÇÃO DA INDENIZAÇÃO DEVIDA EM CASO DE DANO.........................................................................................................................58 15 3.1 RESPONSABILIDADE DO AGENTE CAUSADOR..............................................58 3.2 FORMAS DE REPARAÇÃO.................................................................................62 3.3 CRITÉRIOS PARA A ADOÇÃO DE VALORES PARA REPARO DO DANO MORAL.......................................................................................................................63 3.4 JURISPRUDENCIAS............................................................................................67 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................81 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS...................................................................84 Anexo.........................................................................................................................88 16 RESUMO No mundo contemporâneo não há dúvidas sobre a necessidade de ser preservar o emprego, no entanto este fator não pode servir para que se “disfarce” algumas condutas realizadas, como se fizessem parte da relação de subordinação entre empregador e empregado, visto que muitas delas podem ultrapassar as raias desta relação e se tornarem assediantes, moralmente, ao trabalhador, que, conseqüentemente irá desenvolver comportamentos ansiosos e doentios que lhe prejudicarão, não só no desempenho de suas funções laborais, mas também na sua vida social. Diante da importância deste tema, este trabalho estabeleceu como objetivo: investigar, sob a luz da doutrina e da legislação vigente, a valoração da indenização devida em caso de dano provocado por assédio moral no ambiente de trabalho. Para tanto, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, utilizando o método dedutivo. Assim, se percebeu a necessidade imediata de se normatizar, legalmente, o assédio moral no trabalho, tendo em vista que esta será uma forma de coibir tal prática, além de, evidentemente ressarcir, de acordo com critérios estabelecidos, a valoração do dano à vítima, embora nas vias jurisprudenciais este procedimento, já seja observado. 17 ABSTRACT In the contemporary world there is no doubt about the need to preserve jobs, though this factor can not be used in order to "disguise" made some pipelines, as were part of the relationship of subordination between employer and employee, since many of them may overcome the rays of this relationship and become assediantes, morally, to the employee, who consequently will develop behaviors and look forward to it doentios hinder, not only in the performance of their duties labour, but also in its social life. Given the importance of this issue, this work has as objective: to research, in the light of doctrine and the existing legislation, the valuation of compensation payable in case of damage caused by bullying in the workplace. To this end, a literature search was conducted, using the deductive method. Thus, if realized the immediate need to standardize, legal, psychological harassment at work, bearing in mind that this is a way to curb this practice, besides, of course indemnify, in accordance with established criteria, the evaluation of damage to the victim , Although in ways that procedure law, is already observed. 18 INTRODUÇÃO No mundo todo tem se percebido que o problema do desemprego vem assombrando os trabalhadores, por esta razão, muitos se submetem a condições precárias no desempenho de suas funções, seja no âmbito salutar do ambiente de trabalho, seja na segurança ou mesmo na legalidade do vínculo empregatício. Neste contexto, situa-se o assédio moral no trabalho, fenômeno que, embora traduza antigas condutas, começa a interessar os juristas diante do número de lides que têm sido levadas a Justiça do Trabalho. No entanto, a primeira dificuldade para analisar o assédio moral no trabalho situa-se na não tipificação de quais seriam os comportamentos considerados assediantes no ambiente laboral. Conseqüentemente, tal fenômeno também não é normatizado pelo ordenamento jurídico nacional, o que tem levado a muita confusão entre empregados e empregadores e até mesmo aos Tribunais, que, hoje, se fundam em algumas jurisprudências sobre o tema, no tocante, principalmente a obrigação de indenizar do empregador e a valoração devida desta indenização a vítima do assédio moral no trabalho. Diante deste cenário, este trabalho percebe a necessidade de um estudo mais detalhado do tema, sobretudo por parte dos operadores do Direito que tem por dever esclarecer os cidadãos que lhes procuram e trabalhar por uma sociedade mais justa, onde os direitos e garantias constitucionais sejam respeitados. Logo, este estudo se justifica, tendo em vista que se propõe a refletir sobre um tema que tem levado muitas pessoas a abandonarem seus empregos, sem nenhum motivo justo, a não ser o próprio sofrimento, efeito de um comportamento assediante. Assim, este trabalho estabelece como objetivo: investigar, sob a luz da doutrina e da legislação vigente, a valoração da indenização devida em caso de dano provocado por assédio moral no ambiente de trabalho. 19 Para tanto, foi realizada uma pesquisa bibliográfica através do método dedutivo, que segundo definição de Pasold, consiste “na forma de pesquisar e identificar as partes de um fenômeno, colecionando-as de modo a ter uma percepção ou conclusão geral”1. Desta maneira, foram consultados livros que enfocam a doutrina civil, trabalhista e constitucional, documentos eletrônicos e artigos publicados em periódicos da Justiça do Trabalho, bem como a legislação que vigora sobre o assunto. Com o fim de conduzir esta pesquisa, a introdução apresenta o tema, a justificativa de sua escolha, o objetivo e a metodologia utilizada para alcançá-lo. A pesquisa é composta por três capítulos. O primeiro capítulo aborda os princípios do Direito do Trabalho e os poderes do empregador. O segundo capítulo focaliza o assédio moral no trabalho: sua origem, conceituação, causas, condutas caracterizadoras e seus efeitos. O terceiro capítulo analisa o assédio moral no trabalho sob a ótica do Direito Civil pátrio, ou seja, neste capítulo são tratados temas como: dano moral, responsabilidade civil, o dever de indenizar do empregador e os critérios para a adoção de valores para reparo do dano. Cumpre salientar que também são apresentadas jurisprudências que fundamentam este dever. 1 PASOLD, César L. Prática da pesquisa jurídica. 8. ed. Florianópolis: OAB/SC, 2003, p. 103. 20 CAPÍTULO 1 A VALORIZAÇÃO DO TRABALHADOR 1.1 BREVE HISTÓRICO DA VALORIZAÇÃO DO TRABALHADOR O homem, durante muito tempo, viveu como animal predatório, precisando caçar, pescar, colher frutos e matar outros homens para alimentar-se, sendo esses seus meios de subsistência. 2 Depois, quando sentiu a necessidade de se defender dos animais ferozes e de outros homens começou a fabricar armas e instrumentos de defesa com ossos encontrados em restos de animais putrefatos, criando, assim, a primeira atividade industrial da humanidade3. Os combates travados entre o homem e seus iguais pertencentes a tribos diferentes acabavam com a morte, mesmo daqueles que somente estavam feridos, com o passar do tempo o homem passou a não mais liquidar seus prisioneiros, nascia assim o trabalho escravo4. Na Idade Antiga, o trabalho era caracterizado pela produção agrícola, a este respeito, Huberman, esclarece que: "era o trabalho na terra, cultivando o grão ou guardando o rebanho para utilizar a lã no vestuário”5. Neste período, o trabalho escravo, segundo Sussekind et al atingiu grandes proporções. Na Grécia havia fábricas de flauta, de facas e de ferramentas agrícolas, onde o único tipo de trabalho era o escravo6. 2 HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. 17. ed. Rio de Janeiro : Zahar, 1981, p. 23. HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. 17. ed. Rio de Janeiro : Zahar, 1981, p. 23. 4 HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. 17. ed. Rio de Janeiro : Zahar, 1981, p. 23. 5 HUBERMAN, 1981, p. 23. 6 SUSSEKIND, Arnaldo et al. Instituições de Direito do Trabalho. v. 1, 22. ed. São Paulo: LTR, 2005, p. 32. 3 21 Alguns destes escravos, mais tarde tornaram-se livres, porém só poderiam trabalhar nos seus ofícios habituais ou alugando-se para terceiros, no entanto tinham a vantagem de ganhar um salário. Desta maneira, estes foram os primeiros trabalhadores assalariados7. Na Idade Média, o trabalho foi modificando-se com o surgimento de atividades ligadas ao comércio e ao artesanato, ampliando a noção de trabalho organizado. Embora a agricultura ainda predominasse. Neste período, também existia a escravidão, sendo que a maioria dos escravos eram prisioneiros bárbaros e infiéis. Entretanto, esta época foi caracterizada pela servidão, ou seja, a relação entre o senhor feudal, dono das terras, e os servos, que pela troca de seu trabalho tinham direito a pequenos lotes de terra onde poderiam cultivar produtos para sua sobrevivência8. Na Idade Moderna, a escravidão continuou e foi incrementada com a descoberta da América. Somente com a Revolução Francesa a escravidão foi considerada uma indignidade e pouco a pouco foi sendo extinta. Destaca-se que o Brasil foi um dos últimos países a abolir a escravatura9. Com a Revolução Industrial, novos métodos de trabalho foram introduzidos e conseqüentemente as relações entre trabalhadores e patrões se modificaram. Lembrando que neste período, o trabalhador, na sua dignidade humana não interessava aos seus empregadores, assim observavam-se jornadas estafantes, com salários “mínimos”, que igualmente hoje, não atendem as necessidades dos trabalhadores10. Devido a estas transformações, no final do século XVIII e início do XIX começaram a surgir novas propostas para organização do trabalho que foram se adaptando ao longo do tempo, de acordo com as mudanças sócioeconômicas, evoluindo do trabalho artesanal para o trabalho industrial11. 7 SUSSEKIND, 2005, p. 32. HUBERMAN, 1981, p. 25. 9 HUBERMAN, 1981, p. 25 10 HUBERMAN, 1981, p. 26 11 SUSSEKIND, 2005, p. 32. 8 22 No Brasil, de acordo com Mascaro Nascimento, as relações estabelecidas pelo contrato de trabalho começaram a ser discutidas no âmbito do direito a partir do livro “Apontamentos do Direito Operário”, de Evaristo de Moraes, em 1905, quando este autor registrou a existência de um movimento operário e a constituição de várias agremiações. Em 1916, a Lei n. 3.071 introduziu o Código Civil com um tímido campo trabalhista12. Somente com a Constituição Federal de 1934, iniciou-se o período de prosperidade do Direito Trabalhista, que culminou no Decreto-lei n. 5.452, de 1943, onde a legislação trabalhista foi reunida e ampliada com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que dispôs sobre um sistema de proteção ao trabalhador. No início, o Estado se excluía das relações trabalhistas, todavia, logo se percebeu que seria necessário intervir para solucionar os conflitos dessa natureza, pois, segundo Martins, com a paralisação do trabalho, decorrente das freqüentes paralisações dos trabalhadores por controvérsias vinculadas a salário, jornada e condições de trabalho, acabava por se arrecadar menos impostos, além das conturbações sociais que perturbavam a ordem13. Assim, o Estado começou a ordenar a conciliação, de modo que esta era obrigatória, além de visar à volta imediata ao trabalho. No entanto, este procedimento não trouxe resultados positivos, o que levou, em pouco tempo, a uma mudança na estratégia de atuação do Estado, que passou a designar um representante para participar das negociações como mediador14. Posteriormente, o Estado passou a designar um árbitro para julgar a controvérsia que motivava o conflito, desta maneira, surgiu o Direito do Trabalho. Dorneles lembra que, diferentemente da maioria dos países, no Brasil, os direitos trabalhistas deram-se, predominantemente, por concessão estatal, sem a participação ativa dos trabalhadores, em um período em que a luta de classes 12 NASCIMENTO, Amauri M. Curso de direito do trabalho. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p.35. MARTINS, Sergio P. Direito processual do trabalho. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 32. 14 MARTINS, 2004, p. 32. 13 23 caracterizava-se como prejudicial ao processo de transição para a era capitalista, de modo que foi mais conveniente para o próprio Estado conceder tais direitos15. Desta maneira, compreende-se a veia preservacionista do trabalhador neste ramo do Direito. Neste sentido, Dorneles acrescenta que este caráter [...] visa, mesmo que não exclusivamente, a determinar um patamar máximo de exploração da classe trabalhadora, estabelecendo, para tanto, um conjunto de direitos mínimos. Sendo um Direito próprio da era capitalista e incidindo diretamente sobre o processo de criação de valor no sistema produtivo capitalista, mais não se poderia esperar. [...] estabeleceu os limites de exploração aceitos pelos interesses hegemônicos de uma determinada sociedade, assim como do contexto sócio-político-econômico em um determinado período histórico. Devido a uma composição específica entre esses dois fatores, o capitalismo organizado restringiu a exploração da classe trabalhadora aos limites de uma regulação preservacionista16 Logo, observa-se que desde a sua origem o Direito do Trabalho buscou se traduzir numa forma de amparo ao trabalhador, partindo da premissa de que na relação trabalhista este se encontra em desvantagem com o empregador que, por sua vez, é o proprietário do capital e dos meios (ferramentas, máquinas, etc.) de trabalho. No entanto, Dorneles acredita que esta foi uma forma de simplesmente restringir a exploração da classe trabalhadora17. Todavia, Mascaro Nascimento dita que para alguns doutrinadores [...] o Direito do Trabalho cumpre uma função tutelar do trabalhador, protegendo-o diante do poder econômico, para que não seja por este absorvido; tutela que se faz mediante leis que o Estado elabora ou poderes reconhecidos aos sindicatos restritivos da autonomia individual18. 15 DORNELES, Leandro A. D. A transformação do direito do trabalho. São Paulo: LTR, 2002, p.40. DORNELES, 2002, p. 40. 17 DORNELES, 2002, p. 45. 18 NASCIMENTO, 2005, p. 66. 16 24 Em contrapartida, este mesmo autor acrescenta que ainda há aqueles que entendem que o Direito do Trabalho destina-se a coordenar os interesses entre o capital e o trabalho, ou seja, a função deste ramo do Direito não é a proteção dos trabalhadores, mas a coordenação entre o capital e o trabalho, ainda que por meio de medidas nem sempre caracterizadas como protecionistas ou tutelares19. Já, Gomes e Gottschalk conceituam Direito do Trabalho de uma forma mais objetiva como: Um conjunto de princípios e regras jurídicas aplicáveis às relações individuais e coletivas que nascem entre os empregadores privados – ou equiparados – e os que trabalham sob sua direção e de ambos com o Estado, por ocasião do trabalho ou eventualmente fora dele20. Sussekind et al afirmam que o Direito do Trabalho evoluiu lentamente, sendo necessário muito tempo para que o mundo jurídico moderno compreendesse que o trabalho não era mercadoria, nem o contrato de emprego uma simples questão de aluguel. Porém, a influência renovadora deste direito, no que tange aos seus princípios básicos, se fez sentir com assinalada rapidez21. Cumpre dizer que o Direito Constitucional e o Direito Civil foram os ramos do Direito que mais ajudaram a impulsionar os preceitos que motivaram as leis de proteção ao trabalhador. 22 O Código Civil de 1916 introduziu a matéria trabalhista, entretanto esta era ainda muito esparsa. Na Constituição Federal de 1934, o Direito Trabalhista começou a ganhar força culminando com a criação do Decreto Lei n. 5.452, de 1943, que por sua vez, estabeleceu a Consolidação das Leis do Trabalho, isto é, um diploma onde a legislação trabalhista foi reunida e ampliada, com o objetivo de proteger o trabalhador. 23 19 NASCIMENTO, 2005, p. 66. GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 9. 21 SUSSEKIND, 2005, p. 32 22 SUSSEKIND, 2005, p. 32 23 SUSSEKIND, 2005, p. 32 20 25 Diante desta perspectiva, Sussekind et al acrescentam que, embora o Direito do Trabalho seja fruto do Direito Civil, ele é autônomo, constituindo um ramo independente da ciência jurídica24. Assim, estes autores definem o Direito do Trabalho como um ramo do Direito que: [...] hoje, possui objeto próprio princípios, fonte e instituições peculiares, finalidades específicas e, até em muitos países, como no Brasil, jurisdições especiais para dirimir os dissídios que lhe concernem. Ai estão, sem dúvida, todos os elementos afirmadores de sua autonomia25. Desta maneira, é possível dizer que o Direito do Trabalho apresenta como característica a singularidade de seus métodos de criação de norma jurídica, destacando que entre a lei e os contratos de trabalho estão às convenções coletivas e as sentenças normativas como fontes específicas do Direito do Trabalho. Neste sentido, o Direito do Trabalho é um Direito em formação com mudanças e variações constantes que envolvem, algumas vezes, a perda de alguma instituição, porém com o acréscimo de outras que não estavam em seu âmbito26. Logo, percebe-se que o Direito do Trabalho, como todos os outros ramos do Direito não é estático, muito pelo contrário, ele busca se modificar (mesmo que lentamente) como o fim de atender a dinâmica da sociedade e solucionar os eventuais conflitos que possam ocorrer na complexa relação empregador e empregado. Diante deste contexto, verifica-se que o trabalho e as relações que dele se originam foram se modificando com a evolução dos tempos, chegando, hoje, a ter uma legislação própria que objetiva proteger o trabalhador das incoerências e abusos que, eventualmente possam sofrer. 24 SUSSEKIND, 2005, p. 132. SUSSEKIND, 2005, p. 133 26 RUPRECHT, Alfredo J. Os princípios do direito do trabalho. São Paulo: LTR, 1995, p. 8 25 26 1.2 O RECONHECIMENTO DA DIGNIDADE DO TRABALHADOR O princípio da dignidade da pessoa humana é um preceito constitucional inspirado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, de 10 de dezembro de 1948, em sintonia com os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, defendidos pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 178927. Martins afirma que a partir da experiência pioneira da Constituição Alemã, este princípio se espalhou por diversas outras Constituições, entre as quais, destacam-se a Portuguesa e a Brasileira28. A Constituição Espanhola consiste em um sistema de valores, entre os quais sobressai a Dignidade da Pessoa Humana. Já, na França, país em que o princípio da Dignidade da Pessoa Humana não está expresso na Constituição, ele foi reconhecido tanto pelo Conselho Constitucional quanto pelo Conselho de Estado29. Art. 1º: A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituise em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III: a dignidade da pessoa humana.30 Neste sentido, a doutrina é unânime em afirmar que a Carta Magna brasileira de 1988 é permeada por este princípio fundamental, que tem na sua efetivação a garantia do respeito e da proteção ao homem. Sarlet alerta que este respeito e proteção não se refere apenas ao âmbito de assegurar um 27 MARTINS, Flademir J. B. Dignidade da pessoa humana: fundamental.Curitiba: Juruá, 2006, p. 20. 28 MARTINS, 2006, p. 20. 29 MARTINS, 2006, p. 22. 30 Trata-se da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. princípio constitucional 27 tratamento humano e não degradante, mas, sim, numa garantia à integridade física do ser humano31. Talamini demonstra a influência do princípio da Dignidade da Pessoa Humana neste diploma através da observação32: • Da reverência à igualdade entre os homens; • No impedimento à consideração do ser humano como objeto, degradando-se a sua condição de pessoa, a implicar na observância de prerrogativas de direito e processo penal, na limitação da autonomia da vontade e no respeito aos direitos da personalidade, entre os quais estão inseridas as restrições à manipulação genética do homem; • Na garantia de um patamar existencial mínimo. Conforme Martins, o reconhecimento da Dignidade da Pessoa Humana como princípio fundamental traduz: [...] em parte, a pretensão constitucional de transformá-lo em um parâmetro objetivo de harmonização dos diversos dispositivos constitucionais, obrigando o intérprete a buscar uma concordância prática entre eles, na qual o valor acolhido no princípio, sem desprezar os demais valores constitucionais, seja efetivamente preservado33. Desta maneira, é possível perceber que os legisladores pretenderam tornar este princípio fundamental um parâmetro para a aplicação, interpretação e integração de todo o ordenamento jurídico. Corroborando com esta visão, Silva sugere que todos os direitos fundamentais estão inclusos neste princípio, sejam eles: individuais, 31 SARLET, Ingo W. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 28. 32 TALAMINI, Eduardo. Dignidade humana, soberania popular e pena de morte. Revista Trimestral de Direito Público. São Paulo, n. 11, 1995, p. 188. 33 MARTINS, 2006, p. 124. 28 econômicos, sociais e políticos. Para este autor, o princípio da Dignidade da Pessoa Humana concede a unidade aos direitos e garantias fundamentais34. Acrescentando a esta prerrogativa, Tavares assinala que a Constituição de 1988: [...] optou por não incluir a Dignidade da Pessoa Humana entre os direitos fundamentais, inseridos no extenso rol do art. 5°. Como se sabe, a opção constitucional brasileira, quanto à Dignidade da Pessoa Humana, foi por considerá-la, expressamente, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, consignando-a no inciso III do art. 1°35. Martins adiciona que a Constituição Federal de 1988 utilizou o termo "dignidade", em seu art. 1°, inciso III, e nos demais dispositivos com o fim de acompanhar o homem desde seu nascimento até sua morte, haja vista que a dignidade é um valor imanente à condição humana e identifica o homem como ser único, devendo este, ser respeitado como alguém que tem sentido em si mesmo36. Já, ao considerar a locução "pessoa humana" Martins adverte que não está se fazendo oposição à pessoa jurídica e tampouco à pessoa natural. Para este autor: [...], "pessoa humana" é qualquer ser humano, que pelo simples existir é tido como pessoa para fins de proteção constitucional. Identifica-se, portanto, a expressão "pessoa humana" com o sentido de ser humano. [...] a maior parte dos autores trabalha com uma noção descritiva do âmbito de proteção do princípio evitando, assim, elaborar um conceito específico37. Cumpre dizer que, segundo Sarlet, o princípio da Dignidade da Pessoa Humana é um fundamento de ordem moral que, tornou-se um comando jurídico com a sua adoção pela Constituição Federal de 198838. No entanto, Martins adverte que: 34 SILVA, José A Curso do direito constitucional positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 247. 35 TAVARES, André R.Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 405. 36 MARTINS, 2006, p. 115. 37 MARTINS, 2006, p. 118. 38 SARLET, 2007, p. 30. 29 [...] de nada adiantaria a simples menção ao princípio fundamental da Dignidade da Pessoa Humana se a Constituição de 1988 não garantisse um núcleo básico de direitos aos cidadãos. Em suma, temos que a unidade axiológico-normativa do sistema constitucional deve ser aferida, essencialmente, a partir de uma tábua axiológica, em cujo cerne se encontra a dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais, enquanto suas concreções históricas. 39 Diante desta perspectiva, Sarlet alerta que o princípio da dignidade da pessoa humana deve respeitar sua contextualização histórico-cultural da dignidade da pessoa humana, isto é, deve levar em consideração as especificidades culturais, que, muitas vezes, justificam atos que, para a maior parte da humanidade são considerados atentatórios à dignidade, todavia em certos cenários, são tidos por legítimos, encontrando-se profundamente enraizados na prática social e jurídica de determinadas comunidades40. Logo, observa-se que não há um conceito universal sobre a dignidade da pessoa humana, o que demonstra a sua não propriedade como um direito fundamental, expressamente descrito em atos e comportamentos. Em verdade, ainda que se pudesse ter o conceito de dignidade como universal, isto é, comum a todas as pessoas em todos os lugares, não haveria como evitar uma disparidade e até mesmo conflituosidade sempre que se tivesse de avaliar se uma determinada conduta é, ou não, ofensiva da dignidade41. Entretanto, cabe ressaltar que isso não pode ser compreendido como a exclusão do reconhecimento da dimensão axiológica, em outras palavras, dos valores presentes nos princípios e também nas regras42. Assim, este princípio constitucional é o reconhecimento de que todos detêm qualidades morais que exigem um respeito, definidoras que são de um ser único na espécie. 39 MARTINS, 2006, p. 124. SARLET, 2007, p. 50. 41 SARLET, 2007, p. 57. 42 SARLET, 2007, p. 57. 40 30 Neste tom, Tavares enfatiza que o princípio da Dignidade da Pessoa Humana encontra alguns obstáculos no campo conceitual, tendo em vista a extrema abstração que encerra que acaba permitindo diversas considerações, definições e enfoques dos mais variados43. No entanto, Sarlet lembra que diante de um caso concreto deve inicialmente: [...] sondar a existência de uma ofensa a determinado direito fundamental em espécie, não apenas pelo fato de tal caminho se mostrar o mais simples, mas acima de tudo pela redução da margem de arbítrio do intérprete, tendo em conta que em se tratando de um direito fundamental, como tal consagrado pelo Constituinte, este já tomou uma decisão prévia – vinculativa para todos os agentes estatais e particulares - em prol da explicitação do conteúdo do princípio da Dignidade da Pessoa Humana na dimensão específica e da respectiva necessidade de sua proteção, seja na condição de direitos de defesa, seja pela admissão de direitos a prestações fáticas ou normativas44. Todavia, este autor destaca que isso não significa que uma eventual ofensa a determinado direito fundamental não possa constituir também, simultaneamente, violação do âmbito de proteção da dignidade da pessoa humana, de modo que esta poderá sempre servir de fundamento autônomo, considerando que tal preceito permeia, como mencionado, o ordenamento jurídico brasileiro. Deste modo, observa-se que o princípio da Dignidade da Pessoa Humana é complexo e multidimensional. Conforme Sarlet, [...] há como sustentar, com segurança, o caráter multidimensional da dignidade da pessoa humana, considerando sua dimensão ontológica (embora não necessariamente biológica), sua dimensão histórico-cultural e sua dupla dimensão (ou função) negativa e prestacional, ao que se poderia ainda agregar a igualmente dupla dimensão objetiva e subjetiva da dignidade, na condição de princípio e norma embasadora de direitos fundamentais45. 43 TAVARES, 2003, p. 410. SARLET, 2007, p. 106. 45 SARLET, 2007, p. 61. 44 31 Outro ponto que merece destaque ao discutir o princípio da Dignidade da Pessoa Humana situa-se na divergência observada, em alguns casos, com o direito a vida: [...] o possível choque entre dignidade da pessoa humana e o direito à vida, que ocorre nas situações de doença terminal dolorosa. Evidentemente que a consideração de que o direito à vida impõe seu respeito sempre, inclusive contra a vontade do próprio interessado, será conferir prevalência a esta em detrimento da dignidade46. No tocante ao Direito do Trabalho observa-se que a dignidade da pessoa humana do trabalhador faz com que seus direitos prevaleçam, estigmatizando toda manobra tendente a desrespeitá-lo ou corrompê-lo, de alguma forma. Neste sentido, constata-se que, embora seja conflituosa a elaboração do princípio da Dignidade da Pessoa Humana, em termos de atos a serem analisados, a sua importância não é diminuída, muito pelo contrário, este é o princípio que norteou todo o trabalho constitucional dos legisladores, quando da execução deste último diploma. 1.3 DIREITOS DE PERSONALIDADE DO TRABALHADOR Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, mais especificamente o artigo 5º, inciso XLI, entre outros, se observa à tutela genérica ao prescrever que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos de liberdades fundamentais47. Art. 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] 46 47 TAVARES, 2003, p. 411. DINIZ, Maria H. Curso de direito civil brasileiro. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 117. 32 XLI: a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais Assim, de acordo com Aguiar, [...] o empregado, quando da realização de um contrato de trabalho tem assegurado, constitucionalmente, o seu direito à integridade moral, com total proteção: à imagem, à intimidade, à privacidade, ao segredo, à honra, à boa fama, à liberdade civil, política e religiosa, conforme reza a Constituição Federal48. Para Belmonte, os direitos de personalidade, também conhecidos como direitos de estado, são direitos privados de personalidade inatos, subjetivos e essenciais49. Segundo Bittar, os direitos da personalidade são: [...] os direitos reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade, previstos no ordenamento jurídico, exatamente para a defesa de valores inatos ao homem, como a vida, a rigidez física, a intimidade, a honra, a intelectualidade e outros tantos50. Este autor ainda salienta que estes são direitos dotados de proteção própria, independentemente de qualquer previsão legal, de forma que não se permite nem ao Estado e nem a particulares sua transgressão51. Para Diniz os direitos de personalidade são absolutos, por serem oponíveis erga omnes52, por conterem um dever geral de abstenção; extrapatrimoniais porque não podem ser aferidos economicamente, tanto que, se impossível à reparação in natura ou a reparação do status quo ante53, a indenização pela lesão será equivalente; intransmissíveis porque não podem ser transferidos a outrem; indisponíveis porque não estão sujeitos à disposição, salvo para admitir sua 48 AGUIAR, André L. S. Assédio moral: o direito à indenização pelos maus-tratos e humilhações sofridas no ambiente de trabalho. 2, ed. São Paulo: LTR, 2006, p. 79. 49 BELMONTE, Alexandre Agra. Danos morais no direito do trabalho: identificações, tutela e reparação dos danos morais. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 61. 50 BITTAR, Carlos A. Reparação civil por danos morais. 2 ed.São Paulo: R.T, 1994, p. 201. 51 BITTAR, 1994, p.201. 52 Locução latina que traduz contra todos, ou em relação a todos. 53 Na situação em que se encontrava anteriormente. 33 disponibilidade em prol do interesse social; irrenunciáveis porque não poderão ultrapassar a esfera de seu titular; ilimitados porque não há um número fechado para direitos de personalidade; imprescritíveis porque não se extinguem pelo uso; e inexpropriáveis porque são inatos, adquiridos na concepção54. Aguiar ainda acrescenta que como a relação de trabalho envolve a subordinação jurídica contratual e a submissão do empregado ao empregador é constantemente confundida com a sujeição aos desmandos de quem administra a organização, o que demonstra a dificuldade de se estabelecer limites entre o direito à intimidade do trabalhador com o direito do empregador dirigir a atividade de seu subordinado55. Este autor adverte que “a pessoalidade e a subordinação, requisitos à configuração da figura do empregado, acabam por permitir situações em que o empregado venha a sofrer um dano moral relacionado à honra e à dignidade"56. Desta maneira, é possível dizer que a relação empregatícia facilita a violação dos direitos da personalidade. 1.4 O PRINCÍPIO DO PROTECIONISMO Diante de uma relação de desigualdade econômica e social, entre o empregador e o trabalhador, nasce o conceito protetivo do Direito do Trabalho. Neste sentido, Rodriguez afirma que este princípio "orienta o Direito do Trabalho, pois este, ao invés de inspirar-se num propósito de igualdade, 54 DINIZ, 2004, p. 117. AGUIAR, André L. S. Assédio moral: o direito à indenização pelos maus-tratos e humilhações sofridas no ambiente de trabalho. 2. ed. São Paulo: LTR, 2006, p. 80. 56 AGUIAR, 2006, p. 80. 55 34 responde ao objetivo de estabelecer um amparo prefacial a uma das partes: o trabalhador”57. Segundo Ruprecht, o objetivo do princípio da proteção do trabalhador é criar uma norma mais favorável a este, de maneira a ampará-lo diante das desigualdades econômicas e sociais58. O princípio do protecionismo funda-se na necessidade de uma proteção jurídica para o trabalhador, em virtude deste se encontrar em situação de desigualdade no contrato de trabalho. Logo, ele visa o equilíbrio de igualdade de condições entre os sujeitos da relação de trabalho59. Neste sentido, a realização deste princípio “implica uma violação do tradicional princípio da igualdade jurídica das partes, inclinando-se a favor de uma delas para compensar certas desvantagens”60. Martins adverte que: [...] não é a Justiça do Trabalho que tem cunho paternalista ao proteger o trabalhador, ou o juiz que sempre pende para o lado do empregado, mas a lei que assim o determina. Protecionista é o sistema adotado pela lei. Isso não quer dizer, portanto, que o juiz seja sempre parcial em favor do empregado, ao contrário: o sistema visa proteger o trabalhador61. Observa-se, assim, que este princípio norteia o Direito do Trabalho para uma postura de amparo ao trabalhador, tendo o fim de alcançar a igualdade substancial e verdadeira entre as partes (empregador e trabalhador). Diante desta visão, o legislador procura compensar esta desigualdade, limitando o direito do mais forte. Neste sentido, Jean-Jaques Rousseau defende que: O mais forte nunca é suficientemente forte para ser sempre o senhor, se não transformar sua força em direito, a obediência em dever. Daí 57 RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTR, 2000, p. 23. RUPRECHT, Alfredo J. Os princípios do direito do trabalho. São Paulo: LTR, 1995, p. 15. 59 NASCIMENTO, 2005, p.350 60 RUPRECHT, 1995, p. 9. 61 MARTINS, Sergio P. Direito Processual do Trabalho. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 73. 58 35 o direito do mais forte, direito tomado ironicamente na aparência, e realmente estabelecido em princípio. Obteremos, porventura, uma explicação dessa palavra? A força é uma potência física, não vejo qual moralidade poderá resultar de seus efeitos. Ceder à força é um ato de necessidade, não de vontade, é no máximo um ato de prudência62. Radbruch entende que, o princípio protecionista do Direito do Trabalho, não tem como objetivo constituir igualdade entre as pessoas, mas sim nivelar as desigualdades existentes, de modo que a igualdade deixa de ser o ponto de partida do direito para converter-se na meta do ordenamento jurídico63. Entretanto, para que se alcance a esperada eficácia deste princípio é necessário a sua explicitação em lei, já que possui diferentes facetas e pode atuar em diversas situações64. Cumpre ainda dizer que este princípio é exclusivo do Direito do Trabalho, observando que nos conflitos que tramitam pelo Direito Comum à lei deve ser interpretada a favor do devedor, já no Direito do Trabalho a interpretação deve favorecer o credor, ou seja, o trabalhador. Couturier acrescenta que a relação de dependência caracterizada pela subordinação é traduzida sob várias espécies de inferioridades existentes em uma relação contratual, são elas: “inferioridade-constrangimento, inferioridade-ignorância e inferioridade vulnerabilidade”. Na lógica desenvolvida pelo autor percebe-se que no contrato de trabalho, em relação ao consentimento, opera a inferioridade-constrangimento, pois, segundo o autor, a necessidade de obter um posto de trabalho remunerado lhe constrange a discutir qualquer espécie de cláusula do contrato65. Ressalta-se que a inferioridade não deve ser considerada somente como decorrência da aceitação do contrato de trabalho, mas durante toda a 62 ROUSSEAU apud RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTR, 2000, p. 20. 63 RODRIGUEZ, 2000, p. 86. 64 RUPRECHT, 1995, p. 10. 65 SILVA, Luiz P. P. Principiologia do direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTR, 1999, p. 22. 36 prestação de serviços, já que o trabalhador não poderá expor a sua vontade com liberdade. Silva adverte que a inferioridade-ignorância é o que determina a diferença entre o trabalhador e o empregador, visto que ao trabalhador, faltam “informações jurídicas que lhe permitam uma representação exata da operação de que resulta a conclusão do contrato”, deste modo, esta ignorância pode ser oriunda da incompreensão dos elementos constitutivos do regime jurídico aplicado66. A concepção de "inferioridade-vulnerabilidade", para Couturier, se origina no fato de que o contrato de trabalho implica numa venda da força física, o que incide de certa maneira sobre o corpo do trabalhador, sendo que esta visão é evidenciada por meio das regras de segurança física que fundaram a proteção ao trabalhador67. De acordo com a perspectiva de Couturier os três elementos podem atuar em intensidades diferentes no contrato de trabalho, porém sempre estarão presentes nas relações trabalhistas68. Assim sendo, Silva define o princípio da proteção “como aquele em virtude do qual o Direito do Trabalho, reconhecendo a desigualdade de fato entre sujeitos da relação jurídica de trabalho, promove a atenuação da inferioridade econômica, hierárquica e intelectual dos trabalhadores”69. Desta maneira, observa-se que o princípio da proteção do Direito do Trabalho fundamenta-se na concepção de Estado social, que protege todo o Direito e não só um ramo específico. Sendo assim, Ana Virginia Moreira Gomes preleciona que: Os direitos trabalhistas são direitos sociais e, além do reconhecimento e da defesa deferidos pelos órgãos políticos aos direitos individuais, exigem prestações possíveis positivas que caracterizam a própria forma de agir do Estado Social. Assim, há ato de proteção sempre que o Estado interfere em certos espaços 66 SILVA, 1999, p. 23. SILVA, 1999, p. 24. 68 SILVA, Luiz P. P. 1999, p. 24. 69 SILVA, Luiz P. P. 1999, p. 29. 67 37 reservados antes à sociedade, a fim de amenizar desigualdades por ela própria geradas70. Logo, como o legislador produziu normas que protegem o trabalhador, elas devem ser interpretadas e aplicadas na mesma sintonia de proteção da sua elaboração. 1.5 PODERES DO EMPREGADOR De acordo com o art. 2° da Consolidação das Leis do Trabalho, além de assumir os riscos da atividade econômica e pagar salários aos trabalhadores, o empregador também dirige a prestação pessoal dos serviços, que por sua vez deve ser a favor da "organização de trabalho alheio", em benefício da empresa, da comunidade de trabalho e do grupo social. 71 Art. 2º Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. Cumpre salientar que existe limite ao poder diretivo do empregador, ou seja, além do respeito e ética, a própria Constituição Federal, em seu artigo 170 dita que: Art. 170 - A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Neste contexto, observa-se que os limites básicos e intransponíveis ao poder diretivo empresarial são os direitos fundamentais de qualquer ser humano, como o direito à vida, à liberdade, à segurança, à propriedade, à privacidade e à igualdade. Fundada nesta perspectiva, o Direito do Trabalho apresenta os três poderes do empregador: poder de organização, poder de controle e poder disciplinar. 70 GOMES, Ana V. M. A aplicação do princípio protetor no direito do trabalho. São Paulo: LTR, 2001, p. 77. 71 MARTINS, 2005 p, 226 38 1.5.1 O poder organizador O poder de organização também conhecido como regulador permite que o empregador expeça regras para o andamento dos serviços na empresa. Cumpre salientar que estas normas se fazem conhecer através de contatos verbais ou escritos, na forma de: avisos, portarias, memorandos, instruções, circulares e comunicados internos. 72 É possível dizer de uma forma geral os Regulamentos ou Regimentos Internos das empresas são exemplos deste poder de organização. Ressalta-se que: [...] o Regulamento Interno de Trabalho (RIT) deve definir com clareza e precisão não só os procedimentos de rotina como também os direitos e deveres de cada um, a fim de eliminar, de antemão, possíveis causas de conflitos, bem como possibilitar a convergência das ações individuais para o desenvolvimento produtivo do grupo73. Neste sentido, o poder regulamentar tem um caráter preventivo, uma vez que objetiva conscientizar o empregado do seu papel na relação empregatícia. 1.5.2 O poder fiscalizador O poder de controle, ou o poder fiscalizador consiste, como o próprio nome já diz na faculdade de o empregador fiscalizar as atividades profissionais de seus empregados. 74 O poder de fiscalização compreende os mecanismos de avaliação da produtividade do empregado, de sua conduta no interior do 72 MARTINS, 2005 p, 227 AVALONE FILHO, Jofir. A ética, o Direito e os poderes do empregador. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 32, jun. 1999. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1151. Acessado em: maio/2008 74 MARTINS, 2005 p, 227 73 39 estabelecimento e, em alguns casos, quando houve patente influência direta no serviço ou na vida da empresa, de sua conduta fora dele75. Como todos os outros poderes, este poder deve sempre respeitar os direitos fundamentais do empregado, não havendo razão para a invasão de sua privacidade ou de sua intimidade pelo exercício do controle e fiscalização do empregador. 1.5.3 O poder disciplinador O poder disciplinador deixa clara a relação de subordinação entre o empregador e o empregado, onde se evidencia o dever de obediência do empregado às ordens do empregador. 76 Nesta visão, este poder permeia o exercício do poder diretivo de uma maneira geral, uma vez que através dele é possível estabelecer sanções (penalidades) para a hipótese de o empregado infringir seus deveres. São consideradas sanções: a admoestação verbal, a advertência escrita, a suspensão de até 30 dias e a despedida por justa causa77. A aplicação das sanções se funda em três propósitos78: 1. Punitivo: punir a falta cometida; 2. Educativo: prevenir possíveis faltas futuras do empregado; 3. Político: manter a ordem interna da empresa, resguardando o cumprimento das regras impostas. 75 GENRO, Tarso F. Direito do trabalho: uma abordagem crítica. 2. ed. São Paulo: LTR, 1994, p. 99. NASCIMENTO, 2005, p.216 77 NASCIMENTO, 2005, p.216 78 AVALONE FILHO, 1999. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1151. Acessado em: maio/2008 76 40 Destaca-se que as sanções propostas pelo empregador devem obedecer aos princípios éticos e morais de respeito à dignidade da pessoa humana. Logo, no Brasil são proibidas as penalidades: [...] transferência, rebaixamento, "lista negra", multa (exceto se houver previsão em convenção coletiva, só em relação a atleta profissional), redução salarial, supressão de benefícios ou qualquer manifestação supostamente decorrente do jus variandi, mas que oculte, de fato, verdadeira punição79. Além disso, importa dizer que para a punição ter validade, é necessário que seja conseqüência direta de uma específica falta cometida, isto é, é preciso ficar claro o nexo causal. Segundo Venosa, o conceito de nexo causal, nexo etiológico ou relação de causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não há como ser ressarcida. Nem sempre é fácil, no caso concreto, estabelecer a relação de causa e efeito80. Outros requisitos ainda devem ser atendidos, dentre eles a proporcionalidade que dita que a punição decorre da razoabilidade e dos ideais de ética, justiça e equidade, desta maneira deve ser proporcional ao ato faltoso: [...] aplicando-se as penas mais brandas (advertência escrita, suspensão de 1 dia) para as faltas leves e as penas mais duras para as faltas de maior gravidade. O despedimento somente deve ser utilizado para as graves transgressões disciplinares (ex.: furto, agressões físicas, embriaguez em serviço, etc.) ou reincidência em faltas leves (ex.: freqüentes faltas ao serviço, insubordinação reiterada, etc.)81. 79 AVALONE FILHO, 1999. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1151. Acessado em: maio/2008. 80 VENOSA, Silvio. Direito civil. V. 4. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 45. 81 AVALONE FILHO, 1999. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1151. Acessado em: maio/2008 41 Salienta-se que não pode haver mais de uma punição para a mesma falta. Desta maneira, faltas idênticas devem receber punições idênticas. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) preceitua que a punição deve ser imediata à falta do empregados. Neste sentido, dita que: [...] O elemento fundamental é a imediação na aplicação da sanção ao empregado, ou seja, a pena deve ser aplicada o mais rápido possível ou após o empregador ter conhecimento da falta, o que não ocorreu no caso presente, entendendo desta forma como perdão tácito [...] (TST - AIRR - 711/2005-312-06-40 - PUBLICAÇÃO: DJ 01/11/2006). Neste diapasão, segundo Nobrega, o empregador poderá perder o poder de punir quando, verificada a ocorrência de uma falta disciplinar, não atuar de forma imediata, deixando transcorrer tempo razoável entre o fato punível e o momento da aplicação da sanção que lhe é conseqüente82. Com o fim de ilustrar o poder disciplinador do empregador, abaixo segue acórdão paradigmático do egrégio Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul: Detém o empregador o poder disciplinar. Assiste-lhe o direito de punir o empregado que pratica uma falta, advertindo-o verbalmente ou por escrito, suspendendo-o ou mesmo despedindo-o, como medida extrema. Este poder, entretanto, é limitado pela noção de justiça, que pressupõe seu uso normal, podendo o empregador ser penalizado pelo abuso do poder de comando. O bom senso e o ideal de justiça indicam que deva existir uma proporcionalidade entre o ato faltoso e sua punição, aplicando o empregador as penas menos severas para as infrações mais leves e reservando o despedimento para as mais graves. (TRT 4ª R. – RO 93.010986-4 – 3ª T. – Rel. Juiz Armando Cunha Macedônia Franco – DOERS 05.06.1995; no mesmo sentido, TRT 9ª R. – RO 4.934/94 – Ac. 3ª T. 12.204/95 – Relª. Juíza Wanda Santi Cardoso da Silva – DJPR 26.05.1995; TRT 3ª R. – RO 2053/97 – 3ª T. – Rel. Juiz Antonio Balbino Santos Oliveira – DJMG 14.10.1997). 82 NÓBREGA, Airton R. Poder disciplinar do empregador e perdão tácito. Demora na sanção da conduta irregular e adoção de atos incompatíveis com o desejo de punir. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1426, 28 maio 2007. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9932. Acessado em: maio/2008. 42 Cumpre salientar que em decorrência da punição, reconhecese o poder potestativo do empregador. Explica-se que: [...] do latim potestativas,diz sobre aquele que é revestido de poder, exprime a faculdade ou o poder de que a pessoa está investida, é propriamente empregado na terminologia jurídica para designar o ato ou qualquer outra coisa, cuja prática ou execução depende, simplesmente, da vontade da pessoa, podendo, assim, ser praticado ou feito, independentemente da intervenção ou da vontade de outrem83. O poder potestativo do empregador deve ser exercido de forma moderada e respeitando limites que afastem excessos ou abusos lesivos ao empregado, acarretando-lhe um dano injusto e indevido. O exercício equilibrado do poder de punição pelo empregador, além de se prestar à sua própria proteção, minimiza os riscos de uma sanção exagerada ao empregado, resguardando a ambos84. Diante destes conceitos percebe-se que o poder diretivo do empregador, principalmente no tocante ao âmbito disciplinar deve ser exercido de forma responsável, coerente, transparente e equânime. Neste sentido, o empregador deve usar a polidez, a simplicidade, a tolerância, a temperança, a boafé, da generosidade, a gratidão, a honestidade e a solidariedade. 1.6 O ABUSO DO PODER DO EMPREGADOR A Consolidação das Leis do Trabalho possibilita ao empregado ensejar o pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho, por falta do empregador.85 Art. 483: O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: 83 SILVA, De Plácido. Vocabulário jurídico. 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 1067. NÓBREGA, 2007. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9932. Acessado em: maio/2008. 85 DOLORES, Hádassa; FERREIRA, Bonilha. Assédio moral nas relações de trabalho. Campinas: Russel, 2004, p. 104. 84 43 a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato; b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo; [...] d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato; e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama; [...] g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários. Diante deste artigo, o Congresso Nacional, objetivando a proteção laboral apresentou um projeto de lei federal, do deputado Inácio Arruda, do PCdoB, visando a introdução de mais uma modalidade de rescisão indireta, com alteração no artigo 483 da CLT.86 Projeto de Lei Federal n° 5.970/2001 Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 5.452, de 1° de maio 1943. Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O Congresso Nacional decreta: Artigo 1° - o art. 483 do Decreto-Lei n. 1.05.452, de 1° de maio de 1943 Consolidação das Leis do Trabalho, passa a vigorar acrescido da alínea "g", com a seguinte redação: Art.483 g) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele, coação mora através de atos ou expressões que tenham por objetivo ou efeito 86 RIBEIRO, Francisco. A vitimização no ambiente de trabalho. Revista Jurídica da Amatra. 17ª Região, p. 132. 44 atingir a dignidade e/ou criar condições de trabalho humilhante ou degradante, abusando da autoridade que lhe conferem suas funções. Artigo 2° - § 3° do art. 483 do Decreto-Lei n. 5.452, de 1° de maio de 1943: Consolidação das Leis do Trabalho, passa a vigorar com a seguinte redação: § 3° Nas hipóteses das letras d, g e h, poderá o empregado pleitear a rescisão de seu contrato e o pagamento das respectivas indenizações permanecendo ou não no serviço até o final da decisão do processo. Artigo 3° - Acrescente-se o art. 484-A ao Decreto-Lei n.o 5.452, de 1° de maio de 1943 - Consolidação das Leis do Trabalho, com a seguinte redação: Art. 484-A -Se a rescisão do contrato de trabalho foi motivada por prática de coação moral do empregador ou de seu preposto contra o trabalhador, o juiz aumentará, pelo dobro, a indenização devida em caso de culpa exclusiva do empregador.87 Portanto, não há dúvida que na relação entre empregado e empregador deve imperar o respeito, a ética e o bem senso de ambos. No entanto, se isto não for o bastante há normativas constitucionais garantidoras de direitos fundamentais, além daquelas destinadas ao trato da ordem econômica, podem ser encontrados princípios e regras que, por seu turno, legitimam o exercício do poder de direção do empregador. 87 RIBEIRO, s/a, p. 123. 45 CAPÍTULO 2 ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO Atualmente, o assédio moral no trabalho, seja na organização pública ou privada, tem sido muito discutido por diversos setores da sociedade, dentre eles o Direito, ciência que tem por objetivo garantir os direitos do cidadão. No entanto, desde os primórdios do estabelecimento das relações trabalhistas, empregados assediados sofrem em silêncio, não podendo, de acordo com Glockner88, reagir ou denunciar as práticas abusivas de que são vítimas. Neste sentido, e diante da importância deste tema este capítulo se propõe a apresentar a conceituação de assédio moral no trabalho distinguindo-a do assédio sexual, suas causas, características, bem como seus efeitos. 2.1 CONCEITO DE ASSÉDIO MORAL O assédio moral é algo que ataca a moral da vítima insistentemente, logo, observa-se que tal tema é alvo de estudo para várias ciências sociais e humanas. Segundo Dolores e Ferreira89, o assédio moral consiste no: [...] constante clima de terror psicológico que gera, na vítima assediada moralmente, um sofrimento capaz de atingir diretamente sua saúde física e psicológica, criando uma predisposição ao desenvolvimento de doenças crônicas, cujos resultados a acompanharão por toda a vida. 88 GLOCKNER, César L. P. Assédio moral no trabalho. São Paulo: Thomson-IOB, 2004, p. 13. DOLORES, Hádassa; FERREIRA, Bonilha. Assédio moral nas relações de trabalho. Campinas: Russel, 2004, p. 37. 89 46 Desta maneira, o assédio moral, além de trazer prejuízo para a relação de trabalho, uma vez que compromete o respeito no ambiente laboral, encerra uma gama de aspectos que incidem, negativamente, na vida do trabalhador. Glockner preconiza que o assédio moral é também conhecido como hostilização no trabalho, ou assédio psicológico no trabalho, ou, também, ainda, como mobbing90, bullying91 ou harcelement92 moral93. Este autor lembra que, embora esta diversidade de termos seja usada para a mesma definição, eles não são idênticos, já que diferem na forma, em função de diferenças culturais e organizacionais dos diversos países em que o fenômeno vem sendo estudado94. Para Dolores e Ferreira, o assédio moral em um local de trabalho pode ser compreendido como95: [...] toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se, sobretudo, por comportamentos, palavras, gestos, escritos, que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, por em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho. Destaca-se que o assédio moral não se restringe ao ambiente físico de trabalho, onde a atividade laboral é desenvolvida, mas sim a todo o clima psicológico que possa surgir em razão dessa atividade do empregado assediado, embora seja imprescindível que o processo assediador seja praticado durante o exercício do trabalho96. Dolores e Ferreira alertam que o assédio moral no trabalho é “um ato perverso que traz como conseqüência o sofrimento no trabalho”97. 90 Perseguição coletiva. Chacotas e isolamento até condutas abusivas com conotação sexual ou agressões físicas. Referese a ofensas individuais. 92 Agressões sutis e mais difíceis de serem comprovadas. 93 GLOCKNER, 2004, p. 16. 94 GLOCKNER, 2004, p. 16. 95 DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 37. 96 DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 43. 97 DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 45. 91 47 Margarida Barreto foi a primeira a pesquisar o fenômeno do assédio moral no trabalho, no Brasil. Ela dita que o assédio moral é: [...] a exposição dos trabalhadores a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e éticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego98. Para Glockner o assédio moral decorre de um desvio do exercício do poder nas relações de trabalho, que tem como objetivo criar ao trabalhador um ambiente hostil, desestabilizando o trabalhador, que com medo do desemprego, torna-se dócil e menos reivindicativo. Entretanto, este autor assinala que este tipo de agressão continuada e silenciosa acaba com a saúde física e psíquica do trabalhador99. Segundo Silva, o assédio moral é um fenômeno impulsionado rumo a um objetivo previamente delineado, a demissão do trabalhador. No entanto, este autor lembra que é possível a configuração do assédio moral sem o objetivo de levar a vítima demissão, mas pelo simples prazer de manter o assediado submetido às torturas psicológicas, alimentando o espírito sádico do assediador100. O assédio moral é um fato social que ocorre em diversas áreas, expressando-se na maneira de importunar ou efetuar propostas, geralmente de forma indireta, cercando a vítima, a ponto de deixá-la seduzida e conduzi-la a agir de forma diversa daquela que teria feito espontaneamente101. Logo, é possível verificar que existe um liame entre o assédio moral e a usurpação dos direitos da personalidade, da liberdade, da dignidade e do exercício da cidadania, sendo que a prática desta violência interfere nas condições psíquicas da vítima, além de desarmonizar o ambiente de trabalho. 98 Apud DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 47. GLOCKNER, 2004, p. 16. 100 SILVA, Jorge L. O assédio moral no ambiente de trabalho. Rio de Janeiro: Jurídica Rio de Janeiro, 2005, p. 17. 101 RUFINO, Regina C. P. Assédio moral no âmbito da empresa. São Paulo: LTR, 2006, p. 42. 99 48 2.2 SUJEITOS DO ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO A Consolidação das Leis do Trabalho, nos artigos 2º e 3º, define as figuras do empregador e do empregado, respectivamente, como sujeitos da relação de emprego. Além disso, há aqueles que são equiparados, por lei, ao empregador; também, dependendo da relação que se estabelece entre os sujeitos. Nestas condições constata-se que sujeitos do assédio moral no trabalho são: empregador, colegas de trabalho e o empregado. Art. 2º: Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. Art. 3º: Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário. Cabe dizer que, segundo Hirigoyen, não existe um perfil psicológico padrão para as vítimas, mas sim contextos profissionais em que os procedimentos de assédio moral possa se desenvolver mais livremente102. Não são apenas os meios nos quais prevalecem um intenso nível de estresse e má organização, mas, sobretudo as práticas de gestão pouco claras, ou mesmo francamente perversas, que se constituem em uma autorização implícita às atitudes perversas individuais103. Neste sentido, percebe-se que não há um tipo de sujeito mais predisposto ao assédio moral no ambiente de trabalho, mas sim o próprio ambiente laboral que pode favorecer este tipo de comportamento. Entretanto, é importante a definição dos agentes/sujeitos envolvidos no assédio moral no ambiente de trabalho, quando se leva em conta o tipo de assédio moral sofrido pela vítima, visto que o assédio pode ser praticado pelo chefe imediato, empregador ou não, pelos colegas de trabalho, ou ainda pelo chefe e pelos colegas, neste caso o assédio se configura pela concordância solidária com o agressor. 102 103 HIRIGOYEN, 2005, p. 187. HIRIGOYEN, 2005, p. 187. 49 Assim, observa-se o assédio moral vertical, quando praticado pelo empregador ou seus prepostos; o assédio moral horizontal quando é cometido pelos colegas de trabalho e o assédio moral misto. 2.2.1 Assédio moral vertical O assédio moral vertical é proveniente do empregador, ou de qualquer superior hierárquico. Este tipo de assédio é o mais comum e traz efeitos graves a vítima, uma vez que atua diretamente na relação empregatícia. No assédio vertical a vítima sente-se oprimida e angustiada diante de uma possível rescisão de seu contrato de trabalho104 Neste contexto, Hirigoyen acrescenta que este tipo de assédio pode ocorrer de duas formas105: O assédio perverso, praticado com o objetivo puramente gratuito de eliminação do outro ou valorização do próprio poder; o assédio estratégico, que se destina a forçar o empregado a pedir as contas e assim contornar os procedimentos legais de dispensa; o assédio institucional, que é um instrumento de gestão do conjunto do pessoal106. A juíza do trabalho, Márcia Novaes Guedes, menciona alguns fatores que podem ser responsáveis pela prática desse tipo de assédio moral107: A competição, a preferência pessoal do chefe, porventura gozada pela vítima, a inveja, o racismo a xenofobia,108 e motivos políticos. Destaca-se que, apesar de raro, o assédio moral também ocorre nas relações trabalhistas de baixo para cima, onde um descendente ou uma coletividade pratica atos vexatórios contra o superior hierárquico. 104 HIRIGOYEN, 2005, p. 187. HIRIGOYEN, 2005, p.113. 106 HIRIGOYEN, 2005, p.112-113. 107 Apud HIRIGOYEN, 2005, p. 112. 108 Aversão a pessoas e a coisas estrangeiras. 105 50 Um chefe inexperiente pode demonstrar insegurança ao(s) seu(s) subalterno(s), tendo suas determinações desobedecidas ou hostilizadas, as quais podem evoluir num comportamento de deboche e desrespeito. A pressão dos subalternos pode levar o superior a desacreditar de sua competência e, pelo medo de levar o problema ao empregador e ser considerado inapto para o exercício do cargo de liderança, acaba assistindo o fenômeno calado o que pode ensejar numa violação na sua auto-estima109. Neste caso, a própria insegurança do “chefe” pode se tornar um campo fértil para que os subordinados o assediem moralmente. Dolores e Ferreira advertem que a relação mais comum observada no assédio moral no trabalho é a descendente ou assimétrica, na qual o assédio emana da hierarquia110. 3.2.2 Assédio moral horizontal O assédio moral também pode ser observado na forma horizontal, ou simétrica, quando o assédio é desenvolvido entre os colegas de trabalho. Dolores e Ferreira acrescentam que, geralmente ocorre quando dois empregados disputam a obtenção de um mesmo cargo ou uma promoção111. Ao considerar o aspecto cultural do assédio moral no Brasil. Hirigoyen ajuíza que112: [...] no caso brasileiro, a ausência de políticas públicas capazes de gerar um desenvolvimento calcado em justiça social, nas regiões do Norte e Nordeste, obriga a população a emigrar para o Sul e o Sudeste do país, em busca de emprego, o que toma freqüentes os casos de humilhações e assédio moral por conta do racismo e da xenofobia. Reflexo disso colhe-se no fato de que, em São Paulo, entre os assalariados, quase todo nordestino é designado de "baiano", ainda que tenha nascido em Pernambuco. Certos instrumentos de trabalho são igualmente conhecidos com a alcunha 109 RUFINO, 2006, p. 79. DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 51. 111 DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 51. 112 HIRIGOYEN, 2005, p. 113. 110 51 de "baiano", e qualquer lapso ou gafe no ambiente de trabalho é designada como "baianada". Este é um exemplo nítido do assédio moral horizontal, visto que a vítima não é respeitada pelos seus colegas de trabalho. 2.2.3 Assédio moral misto Quando ocorre o assédio moral numa relação horizontal, com a omissão e a conivência de superiores hierárquicos, tal forma é denominada mista, visto que alia o assédio descendente com o horizontal113. Hirigoyen confirma que este tipo de assédio moral ocorre quando há o assédio moral horizontal, concomitantemente com a existência do assédio moral vertical descendente. Esta autora preconiza que: Mesmo que se trate de uma história muito particular, é raro um assédio horizontal duradouro não ser vivido, depois de algum tempo, como assédio vertical descendente, em virtude da omissão da chefia ou do superior hierárquico. É ou se torna, portanto, cúmplice114. Desta maneira, parece que este tipo de assédio moral é comum no ambiente de trabalho, mesmo que ocorra de uma forma disfarçada, no que tange a omissão da chefia. 2.3 AS CAUSAS DO ASSÉDIO MORAL Glockner aponta como causas do crescimento do assédio moral no trabalho115: 113 DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 52. HIRIGOYEN, 2005, p. 114. 115 GLOCKNER, 2004, p. 18. 114 52 A economia submetida às influências de modelos de gestão administrativa que visam ao lucro e ao crescimento a qualquer preço, a precariedade das relações de emprego, a flexibilização das relações de trabalho, o ritmo impressionante da economia, o interesse por reduzir os custos de trabalho, a existência do desemprego, as manifestações da terceirização, o crescimento do setor informal; a migração continuada, a tendência à contratação por contratos a prazo determinado. Neste panorama, Dolores e Ferreira adicionam que o assédio moral no trabalho é fruto de um conjunto de fatores, tais como: “a globalização econômica predatória, vislumbradora somente da produção e do lucro, da atual organização de trabalho, marcada pela competição agressiva e pela opressão dos trabalhadores através do medo e da ameaça” 116. Neste contexto, Hirigoyen atesta que na relação de assédio há: [...] o objetivo puro e simples de eliminar-se a vítima para valorizar o próprio poder (do agressor); há, também, a finalidade de levar a vítima a pedir demissão, o que eliminaria custos adicionais e impediria procedimentos judiciais; e, ainda, há a própria gestão de empresa que incentiva e aprova o assédio moral como meio de administrar seus empregados117. Assim, percebe-se que as causas da ocorrência do assédio moral no trabalho são inúmeras, porém nelas fica clara a proposta de desrespeito ao trabalhador como pessoa e cidadão. 116 117 DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 37. HIRIGOYEN, 2005, p. 112. 53 2.4 CONDUTAS CARACTERIZADORAS DO ASSÈDIO MORAL Silva salienta que é necessário ter em mente que a conduta assediadora não se relaciona, necessariamente, com alusões ou indicações ao trabalho, visto que o foco da violência, geralmente118, [...] é qualquer ponto da vítima que possa determinar uma desestabilização desta com o ambiente de trabalho, facilitando as condutas tendentes a desqualificá-la, não só como profissional, mas também como ser humano119. Cumpre dizer que como alusões negativas estão àquelas relacionadas aos dotes físicos da vítima, ou ao seu modo de vestir, de falar, de comer ou de se comportar diante de determinados acontecimentos. De acordo com o âmbito jurídico, as condutas, que transgridem ou usurpam a dignidade de forma reiterada e vexatória, ensejam o assédio moral, acarretando a violação dos direitos primordiais da pessoa, interferindo, inclusive, em seu comportamento, em sua auto-estima, gerando prejuízos para a vítima e para toda sociedade120. Dolores e Ferreira asseveram que para a identificação precisa do assédio moral nas relações de trabalho é necessária a violação da dignidade do trabalhador por condutas abusivas desenvolvidas dentro do contexto profissional121. Além disso, é necessário que seja provada a intencionalidade do ato, ou seja, o ato ou a conduta abusiva precisa ser repetitivo e por tempo prolongado. Nesta visão, Silva acrescenta que: Primeiramente devemos ter em foco que o assédio moral não se caracteriza por eventuais ofensas ou atitudes levianas isoladas por parte do superior. Muito mais do que isto, o assédio moral somente estará presente quando a conduta ofensiva desponte como um 118 SILVA, 2005, p.12. SILVA, 2005, p. 12. 120 RUFINO, 2006, p. 42. 121 DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 43. 119 54 verdadeiro modus vivendi do assediador em relação à vítima, caracterizando um processo específico de agressões psicológicas122. Destaca-se que este autor adverte que uma só conduta isolada poderá provocar danos morais ou materiais indenizáveis, todavia o assédio moral tipifica um delito mais complexo, caracterizado por um conjunto de ações habituais que traduzem o desejo de minar a vítima, desqualificando-a123. Nesta visão, Rufino preconiza que o assédio moral pode ser identificado através da ocorrência de gestos e condutas abusivas e constrangedoras com a intenção de inferiorizar, amedrontar, menosprezar ou desprezar, ironizar, difamar, ou ridicularizar124. Risinhos, suspiros, piadas jocosas relacionadas ao sexo, ser indiferente a presença do/a outro/a, estigmatizar, fazendo adoecer pelo e para o trabalho, colocá-los/as em situações vexatórias, falar baixinho acerca da pessoa, olhar e não ver, ou ignorar sua presença, rir daquele/a que apresenta dificuldades, não cumprimentar, sugerir que peçam demissão, dar tarefas sem sentido, ou que jamais serão utilizadas, ou mesmo irão para o lixo, dar tarefas através de terceiros, ou colocar em sua mesa sem avisar, controlar o tempo de idas ao banheiro, tornar público algo íntimo do/a subordinado/a, não explicar a causa da perseguição125. No entanto, conforme Hirigoyen, o estilo específico de agressão é variável de acordo com os meios socioculturais e setores profissionais. Nos setores de produção, a violência é mais direta, verbal ou física. Entretanto, quanto mais se sobe na hierarquia e na escala sociocultural, mais as agressões são sofisticadas, perversas e difíceis de caracterizar126. Rufino alerta que, infelizmente, algumas destas condutas aparecem de forma tão corriqueira no dia-dia, que passam despercebidas, ou, simplesmente, são definidas como atos isolados de desrespeito ou "mentiras 122 SILVA, 2005, p. 15. SILVA, 2005, p. 15. 124 RUFINO, 2006, p. 62. 125 RUFINO, 2006, p. 62. 126 HIRIGOYEN, 2005, p. 18. 123 55 justificáveis", não se dando qualquer importância para tais manifestações127. Todavia, é necessário ter em mente que: [...] a omissão das testemunhas desatentas pode propiciar a continuidade dessas práticas perversas, de forma progressiva, o que enseja conseqüências gravíssimas sobre a saúde da vítima, tanto no aspecto físico, como principalmente no psicológico e social, acarretando o silêncio dessas, ao pensarem que, se relatarem seus dramas, não serão compreendidas128. A fase de assédio moral propriamente dita aparece quando a pessoa tomada como alvo percebe a má intenção de que é objeto, isto é, logo que a recusa de comunicação é manifesta e humilhante, quando as críticas a respeito do seu trabalho se tornam maldosas e as atitudes e palavras se tornam injuriosas129. Assim, a conscientização dos próprios trabalhadores, quanto aos seus direitos é de suma importância para banir esta violência do ambiente de trabalho. 2.4.1 A diferença entre o assédio moral e o assédio sexual Freqüentemente, verifica-se uma confusão entre os conceitos de assédio moral e assédio sexual, visto que ambos os fenômenos apresentam similitudes consideráveis, a começar com a própria denominação "assédio". No entanto, são fenômenos bem diferenciados, com impulsionadores diferentes e objetivos próprios. Em 1986, Michael Rubenstein definiu três aspectos que identificam o assédio sexual130: • Conduta física: é a mais ostensiva e ousada, podendo se manifestar através de várias ações, que variam desde o ataque direto à vítima a sutis contatos físicos; 127 RUFINO, 2006, p. 44. RUFINO, 2006, p. 44. 129 HIRIGOYEN, 2005, p. 20. 130 SILVA, 2005, p. 23-24. 128 56 • Conduta verbal: é a mais comum no assédio sexual. Através dela o assediador expressa suas propostas sexuais diretamente ou por intermédio de insinuações veladas acrescentando, também, as ameaças caso a proposta seja recusada; • Conduta não verbal: é a menos intuitiva, pois o assediador utiliza-se de ardis e subterfúgios para passar sua mensagem sexual à vítima, tais como: exibição de fotos pornográficas, prática de gestos obscenos, desenhos ou imagens de cunho sexual, bilhetes, ou qualquer outra forma que consiga incomodar a vítima em razão da conotação sexual, que possa significar uma proposta libidinosa. Nestes casos, a conotação do assédio é nitidamente sexual. Neste contexto, Silva apresenta algumas diferenciações entre o assédio moral e o sexual131. • Para que exista assédio moral necessário se faz que a conduta ofensiva seja reiterada e habitual, prolongando-se no tempo, constituindo-se em autêntico processo de agressões. Para que exista assédio sexual, somente é necessária a prática de uma conduta, desde que seja idônea e expressando os desejos do ofensor e ameaça a vítima; • O constrangimento que é imposto à vítima do assédio moral consiste em paulatinamente ir depreciando seu íntimo e desajustando sua personalidade, até conduzi-la a um total desequilíbrio. Já, o constrangimento imposto à vítima do assédio sexual consiste em impor propostas sexuais não desejadas, acabando por atingir seu íntimo em razão do temor em ser prejudicada profissionalmente; • No assédio moral as condutas são geralmente bem interligadas, exercendo um fator de agregação que irá resultar no desequilíbrio final da vítima. Essas condutas são demarcadas pela sutileza, passando isoladamente quase que despercebidas, por aqueles que estão no mesmo ambiente da vítima. Já, no assédio sexual, geralmente, as condutas são mais arrojadas e incisivas, 131 SILVA, 2005, p. 26-27. 57 sendo facilmente percebidas pelas pessoas que convivem no mesmo ambiente da vítima; • O objetivo final do assédio moral é, através do desequilíbrio gerado na vítima, eliminá-la do local de trabalho, quer seja através da demissão, quer seja por intermédio de longos períodos de licença médica. É possível, também, que o objetivo do assediador seja manter a vítima sob seu controle, satisfazendo, assim, seu espírito sádico, não havendo interesse no afastamento do assediado. No assédio sexual o objetivo final é fazer com que, através do temor da vítima de ser prejudicada profissionalmente, esta ceda aos desejos sexuais do ofensor. Cabe dizer que, embora haja diferenças entre o assédio sexual e o moral no trabalho, a força do poder disciplinar do empregador dificulta o exercício dos direitos da personalidade do empregado, “[...], mormente a respectiva postulação da reparação quando ocorre sua transgressão”132. Para Glockner, o assédio sexual é uma das formas de assédio moral mais freqüente, tendo em vista que configura uma relação de hierarquia em que o assediador, normalmente o detentor do poder ou superior hierárquico, utilizase de sua posição para constranger o subordinado ou levá-lo a se afastar de seu trabalho com todas as conseqüências que o assédio moral pode provocar na saúde física e mental do trabalhador133. A resistência da vítima ao assédio sexual pode ensejar a prática de atos moralmente perversos por parte do opressor, o qual, sentindose rejeitado, pode transformar a vida da vítima num inferno. [...] isola o assediado resistente, passa, ao mesmo, tarefas mais complicadas e o obriga a trabalhar numa jornada desumana, a fim de vingar-se da rejeição sexual134. Rufino ainda lembra que o assédio moral pode ter uma origem sexual, pois apesar do assediador, por muitas vezes, não ter coragem de expressar o assédio sexual à sua vítima, por diversos fatores, até mesmo por vergonha de sua 132 RUFINO, 2006, p. 57. GLOCKNER, 2004, p. 27. 134 RUFINO, 2006, p. 67. 133 58 opção sexual, não cerca a vítima com a clara intenção da prática de atos libidinosos135. Diante desta perspectiva, percebe-se que o assédio sexual é uma forma de ocorrência do assédio moral, o que, conseqüentemente leva a um prejuízo a vida psíquica e social do trabalhador. 2.4.2 O que não é assédio moral Ao caracterizar o assédio moral no trabalho percebeu-se que nem todas as condutas que provocam constrangimento no trabalhador podem ser consideradas assédio, neste sentido cabe distinguir alguns comportamentos. Dolores e Ferreira, nesta matéria asseveram que, embora o assédio moral possa ser considerado um sofrimento no trabalho, ele precisa ser distinguido das demais espécies, as quais, apesar de possuírem elementos comuns, com ele não se confundem. Todavia, é necessário reconhecer que, muitas vezes, tais figuras podem ser utilizadas como uma ferramenta dentro do processo do assédio moral136. 2.4.2.1 O estresse Segundo Hirigoyen, o assédio moral é muito mais do que estresse. Entretanto, cumpre enfatizar que o estresse faz parte do assédio moral, como uma das conseqüências sofridas pela vítima assediada, em outras palavras seria uma primeira fase do assédio137. Dolores e Ferreira argumentam que más condições, tanto psicológicas, como sociais, no ambiente de trabalho podem resultar em uma reação 135 RUFINO, 2006, p. 67. DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 58. 137 HIRIGOYEN, 2005, p. 20. 136 59 biológica, a qual recebe o nome de estresse, todavia este independe da ação direta de outras pessoas, podendo ser resumido em um grande cansaço138. De acordo com Hirigoyen, o estresse só se torna destruidor pelo excesso, mas o assédio é destruidor por si só, ou seja, o estresse profissional feito de pressões e exagero de tarefa múltiplas e repetitivas pode esgotar uma pessoa e mesmo levá-la a uma depressão por esgotamento139. No estresse, contrariamente ao assédio moral, não existe intencionalidade maldosa. Já no assédio moral, o alvo é o próprio indivíduo, com um interesse mais ou menos consciente de prejudicálo. Não se trata de melhorar a produtividade ou otimizar os resultados, mas se livrar de uma pessoa porque, de uma maneira ou de outra, ela incomoda. Tal violência não é útil à organização nem à boa administração da empresa140. Logo, verifica-se que, apesar do estresse trazer inúmeros malefícios ao trabalhador, ele não pode ser considerado um assédio moral. 2.4.2.2 O conflito Segundo Dolores e Ferreira, os casos de conflito se diferenciam do assédio moral porque as recriminações no primeiro são abertas, com motivos conhecidos, diferentemente do assédio, que, freqüentemente vem disfarçado e, por isso mesmo tão difícil solucioná-lo141. Estas autoras acrescentam que um conflito mal resolvido pode se tornar o assédio moral, sobretudo quando ocorre nas relações hierárquicas, “nas quais o poder de direção se transforma em um abuso do poder hierárquico e a autoridade legítima sobre um subordinado torna-se a dominação de uma pessoa”142. 138 DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 59. HIRIGOYEN, 2005, p. 20. 140 HIRIGOYEN, 2005, p. 23. 141 DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 59. 142 DOLORES; FERREIRA, 2004, p.60. 139 60 Neste contexto, Hirigoyen afirmar que o assédio moral ocorre, justamente porque nenhum conflito pode ser estabelecido143. A autora explica que: O conflito é a escalada simétrica, ou seja, uma igualdade teórica entre os protagonistas. Aceitando o conflito, reconhece-se a existência do outro como interlocutor e o pertencimento a um mesmo sistema de referência. 144 De acordo com Aguiar, o assédio moral passa a ter uma estreita relação com o conflito quando os atritos prolongam-se por tempo indeterminado e adquirem o caráter de diversidade entre as partes, com resquícios de agressão e violência psicológica. Porém, este autor lembra que nem todos os conflitos levam ao desenvolvimento do assédio moral no ambiente de trabalho145. 2.4.2.3 A injuria Segundo Hirigoyen, a gestão por injuria, evidencia o tipo do comportamento arbitrário de certos administradores sem qualquer preparo e falta de respeito, submetem os funcionários a forte pressão e violência insultando-os e injuriando-os.146 Cumpre enfatizar que esta autora alerta para a dificuldade em separar o assédio moral da gestão por injúria, haja vista que os dirigentes tirânicos às vezes fazem uso de procedimentos perversos, que podem caracterizar o assédio moral147. Dolores e Ferreira explicam que: Percebe-se que a gestão por injúria não visa a um empregado específico, mas é voltada contra todos os empregados. Nesse caso, 143 HIRIGOYEN, 2005, p. 24. HIRIGOYEN, 2005, p. 25 145 AGUIAR, André L. S. Assédio moral: o direito à indenização pelos maus-tratos e humilhações sofridas no ambiente de trabalho. 2. ed. São Paulo: LTR, 2006, p. 27. 146 HIRIGOYEN, 2005, p. 28. 147 HIRIGOYEN, 2005, p. 29 144 61 o sindicato pode resolver a questão diretamente com o empregador. Entretanto, ela pode ser usada juntamente como assédio moral148. De acordo com Leite, estes dirigentes podem estar ou não conscientes da brutalidade de suas ofensas, no entanto seu comportamento é indigno e inadmissível. Todavia, este autor adverte que só uma ação coletiva pode dar fim a ele149. Uma reação conjunta, o quanto antes, por parte dos trabalhadores para denunciar tais práticas escravagistas. Com efeito, alguns administradores manejam melhor o chicote que a carroça, submetendo o ambiente de trabalho ao império do medo. Assim, percebe-se que, embora a injuria não possa ser confundida com o assédio moral no trabalho, ela é um passo para que isto aconteça, já que gera constrangimento e tensão no ambiente de trabalho. 2.4.2.4 Imposições profissionais As imposições profissionais legitimamente decididas dentro de uma empresa não podem ser confundidas com assédio moral, no qual é imprescindível a presença de abuso. Assim, conforme exemplifica Dolores e Ferreira, transferências, mudanças de função previstas no contrato de trabalho, críticas construtivas e avaliações de trabalho, não consistem em assédio moral150. Hirigoyen ainda adverte que a expressão assédio moral vem sendo erroneamente empregada para qualificar situações que não se enquadram como tal: Por exemplo, o caso de "posições vitimárias", nas quais a pessoa tende a se colocar sempre como vítima de tudo o que ocorre. Nessa situação, muitas vezes o que se observa são falsas alegações de assédio moral. Tais alegações falsas podem ocorrer, também, em 148 DOLORES; FEREIRA, 2004, p. 61. LEITE, José R. D. Assédio moral: causas, efeitos e implicações. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região. Ano VIII, dez/2005, p. 118. 150 DOLORES; FEREIRA, 2004, p. 61. 149 62 razão de paranóia do empregado, comum em casos de mania de perseguição, ou até mesmo de má intenção151. Logo, é de suma importância para o operador do Direito identificar e conscientizar seu eventual cliente, sobre quais são os comportamentos considerados assediantes, mesmo que ainda não haja uma regulamentação oficial sobre eles. 2.5 OS EFEITOS DO ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO Os efeitos produzidos pelo assédio moral não se limitam à saúde do trabalhador, visto que os resultados atingem também a esfera social da vida do empregado, além, evidentemente, das conseqüências econômicas do fenômeno sobre o este, sobre a empresa e sobre a sociedade. Pesquisas realizadas por Hirigoyen demonstram que o processo de assédio moral quase sempre termina com a saída da vítima do emprego num estado de saúde tão debilitado, que acaba ficando sem condições físicas e mentais para se recolocar no mercado152. 36% dos casos de assédio moral a vítima é desligada da empresa; em 20% destes a pessoa é demitida devido às falhas; em 9% a demissão é negociada; em 7% é a pessoa quem pede demissão; em 1% restante, a pessoa é colocada em pré-aposentadoria153. Além disso, Dolores e Ferreira adicionam que as conseqüências ficam mais drásticas à medida que o trabalhador percebe que o mercado não absorverá uma pessoa doente e que o único meio de ela manter a sua sobrevivência e a de sua família é com o seu trabalho154. 151 HIRIGOYEN, 2005, p. 69. HIRIGOYEN, 2005, p. 120. 153 HIRIGOYEN, 2005, p. 120. 154 DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 69. 152 63 Segundo Hirigoyen, as conseqüências sobre o psiquismo são muito mais graves a partir do momento em que se toma consciência de existir um "claro objetivo de prejudicar"155. De início, é difícil de acreditar que isso seja possível e depois surgem as interrogações ansiosas: "O que foi que eu fiz para que me queiram tão mal?", e as tentativas desesperadas para alterar o quadro. Trata-se de uma ferida no amor-próprio, um atentado contra a dignidade, mas também uma brutal desilusão ligada à perda súbita da confiança que se tinha depositado na empresa, na hierarquia ou nos colegas156. É possível também, conforme Rufino, atentar que como conseqüência do assédio moral no trabalho tem-se o estabelecimento de uma conduta desestabilizada e fragilizada, o que acarreta efeitos negativos na saúde psíquica, e até física do empregado, o qual inicia involuntariamente um processo degradante e de queda de produção, além de um isolamento que pode levar a perda do emprego, e a problemas familiares e sociais, de grande monta157. Hirigoyen assevera que quando o assédio sexual ocorre em uma relação de hierarquia as conseqüências na saúde da vítima são piores, pois a dificuldade de achar uma solução tende a aumentar o estresse e a ansiedade158. Silva ainda ressalta que a vítima se afasta de seu convívio social159. A depressão, a amargura, o sentimento de fracasso e de vergonha impulsionam o assediado, como regra, a um isolamento da sociedade, não vislumbrando mais qualquer interesse em eventos ou encontros com amigos ou conhecidos. Tudo isto passa a ser uma tortura para a maioria das vítimas do assédio moral, pois temem ser apontados como fracassados ou covardes160. 155 HIRIGOYEN, 2005, p. 20. RUFINO, 2006, p. 20. 157 RUFINO, 2006, p. 61. 158 HIRIGOYEN, 2005, p. 112. 159 SILVA, 2005, p. 55. 160 SILVA, 2005, p. 55. 156 64 Logo, observa-se que os prejuízos a saúde psíquica da vítima são incalculáveis, além, evidentemente, dos danos à família, já que o isolamento, muitas vezes, acaba por vitimá-la. Em pesquisa realizada por Margarida Barreto envolvendo 870 vítimas de assédio moral, constatou-se que: [...] 100% das mulheres apresentam crises de choro, enquanto 100% dos homens nutriam idéias suicidas; dores generalizadas acometem 80% das vítimas, de ambos os sexos, sendo que depressão e distúrbios do sono são sintomas que mais de 60% das vítimas reclamam161. Além disso, percebe-se que o assédio moral gera também um clima de inquietação, medo e fragilidade que se estende à sociedade como um todo, visto que tal situação leva as pessoas a perder a confiança nelas mesmas e ao descrédito do mundo do trabalho. 161 Apud DOLORES; FERREIRA, 2004, p. 73. 65 CAPÍTULO 3 VALORAÇÃO DA INDENIZAÇÃO DEVIDA EM CASO DE DANO MORAL O dano moral descrito pelo Código Civil Brasileiro prevê primeiramente, a identificação da causa do dano e da responsabilidade civil de quem o cometeu, bem como a necessidade de indenizar do prejuízo, seja este material ou moral. Neste contexto, é possível abordar o assédio moral sofrido no ambiente de trabalho, uma vez que, objetivamente causa dano a vítima, que por sua vez, precisa ter seu direito de ressarcimento respeitado, mesmo que este não cubra totalmente o prejuízo moral que tenha causado, porém deve funcionar como um reconhecimento do direito de respeito à dignidade da pessoa humana violado. Assim, este capítulo apresenta o dano moral, a responsabilidade e o dever de indenizar do empregador e os critérios para a adoção dos valores para esta reparação. 3.1 RESPONSABILIDADE DO AGENTE CAUSADOR A responsabilidade civil decorre de um fato juridicamente qualificado como ilícito, ou seja, não desejado pelo Direito, já que é praticada em ofensa a ordem jurídica e, por conseqüência viola um direito individual subjetivo. O Código Civil de 2002 trata a responsabilidade civil em seu Título IX, capítulo I, mais precisamente no artigo 927. Art. 927: Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. 66 Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Maria Helena Diniz define que: [...] a responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar o dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela mesma responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.162 Diante desta afirmativa, observa-se que esta autora vê a responsabilidade civil como uma forma de “ressarcir” a vítima de algum eventual dano causado pelo agente, de forma que este seja obrigado a aceitar a culpa e, por conseguinte, indenizar a vítima. O objetivo da culpa é o dever violado, ou seja, ela supõe sempre a existência de um primeiro elemento, isto é, uma violação a algum direito de outrem. Neste sentido, Aguiar afirma que o assédio moral no trabalho deve ser indenizável. O assédio moral é indenizável, no plano patrimonial e moral, além de permitir a resolução do contrato, o afastamento por doença de trabalho e, por fim, quando relacionado à demissão ou dispensa do obreiro, a sua reintegração no emprego por nulidade absoluta do ato jurídico163. Fiúza destaca que embora a doutrina não seja uniforme na conceituação de responsabilidade, é unânime na afirmação de que este instituto jurídico firma-se no dever de "reparar o dano", explicando-o por meio de seu resultado, já que a idéia de reparação tem maior amplitude do que a de ato ilícito, 162 Apud PAMPLONA, Rodolfo F. O dano moral na relação de emprego. 2. ed. São Paulo: LTR, 2004, p. 26. 163 AGUIAR, 2006, p. 83. 67 por conter hipóteses de ressarcimento de prejuízo sem que se cogite da ilicitude da ação164. Desta maneira, observa-se que a responsabilidade é necessariamente uma reação provocada pela infração a um dever preexistente, sendo necessário que a obrigação exista e derive, por sua vez, de qualquer fator social capaz de criar normas de conduta. Cabe dizer que: Na hipótese não estiver prevista na lei ou no regulamento, haverá ainda o dever indeterminado de não lesar a ninguém, princípio este que, de resto, acha-se implícito no art. 186 do Código Civil que não fala em violação de "lei", mas usa de uma expressão mais ampla: violar "direito"165. Segundo Gonçalves, o artigo 186 do Código Civil de 2002 consagra uma regra universalmente aceita, ou seja, todo aquele que causa dano a outrem é obrigado a repará-lo. Neste sentido, este dispositivo estabelece que166: Art. 186: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Assim, a violação de um direito, mesmo sem alegação de prejuízo ou comprovação de um dano material emergente, pode, em certos casos, impor ao transgressor a obrigação de indenizar. Gonçalves aponta quatro elementos essenciais para se configurar a responsabilidade civil167: • Ação ou omissão: a lei prevê que qualquer pessoa que, por ação ou omissão, venha a causar dano a outrem deverá ser responsabilizada, sendo que esta responsabilidade poderá derivar de ato próprio, de ato de terceiro que esteja sob a guarda do agente, e ainda de danos causados por coisas e animais que lhe pertençam; 164 FIUZA, Ricardo. Novo código civil comentado. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 819. GONÇALVES, Carlos R Responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 37. 166 GONÇALVES, 2006, p. 32. 167 GONÇALVES, 2006, p. 32-34. 165 68 • Culpa ou dolo do agente: o dolo pode ser entendido como ação ou omissão voluntária e a culpa como negligência e imprudência, isto é, o dolo consiste na vontade de cometer uma violação de direito e a culpa, na falta de diligência, sendo o primeiro uma violação deliberada, consciente, intencional, do dever jurídico; • Relação de causalidade: é a relação de causa e efeito entre a ação e a omissão do agente e o dano verificado, de modo que sem esta relação não há como indenizar. Assim, mesmo que houver o dano, mas sua causa não estiver relacionada com o comportamento do agente, inexiste a relação de casualidade; • Dano experimentado pela vítima: sem a prova do dano, ninguém pode ser responsabilizado civilmente. O dano pode ser material ou simplesmente moral, ou seja, sem repercussão na órbita financeira do ofendido. O Código Civil consigna um capítulo sobre a liquidação do dano, ou seja, sobre o modo de se apurarem os prejuízos e a indenização cabível. A inexistência de dano é óbice à pretensão de uma reparação, aliás, sem objeto. Salienta-se que a exigência de um fato "voluntário" na base do dano exclui do âmbito da responsabilidade civil os danos causados por forças da natureza, bem como os praticados em estado de inconsciência, mas não os praticados por uma criança ou um demente168. Neste sentido, tem-se que basta a ação ou a omissão ser controlável ou dominável pela vontade do homem, para que seja considerado um ato voluntário. Além disso, importa dizer que a responsabilidade por omissão é constatada quando existe o dever jurídico de praticar determinado fato e que fique demonstrado na sua prática, que o dano poderia ter sido evitado169. Diante destes pressupostos, observa-se que a responsabilidade civil pode ser configurada quando se comprova a existência do dano, seja este por ato ilícito, ou violador de qualquer direito de terceiro, ou por 168 169 GONÇALVES, 2006, p. 34. GONÇALVES, 2006, p. 34. 69 omissão, o que leva ao entendimento sobre a necessidade e a obrigação legal de ressarcir a vítima do dano. 3.2 FORMAS DE REPARAÇÃO Segundo Fiúza, o dever de reparar surge, em regra geral, de atos ilícitos, diante dos quais é necessária a demonstração da culpa, em sentido largo, do lesante, e, em caráter excepcional, por força de disposição legal expressa ou de risco na atividade do agente, de atos lícitos, os quais geram aquele dever com base no fato de o agente ter colocado em ação forças que são fontes de perigo e de potenciais danos para outrem170. A Constituição Federal de 1988 no seu artigo 5°, inciso X dispõe sobre o dano moral e seu devido ressarcimento à vítima. O Código Civil também deixa clara a necessidade da reparação do dano moral, em seus artigos: 186 e 927. Art. 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Art. 186: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 927: Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Desta forma, observa-se que para o ordenamento jurídico pátrio, comprovado o dano à vítima terá que ser ressarcida seja pelo dano moral ou pelo material. 170 FIUZA, 2003, 821. 70 Diante do assédio moral no trabalho, é possível salientar a posição de Fiúza que admite que no Direito positivo a teoria da culpa é uma realidade com a qual deve coexistir a teoria objetiva, tendo em vista às vezes em que a desigualdade econômica ou social entre o agente e a vítima traz a necessidade de abolir qualquer indagação sobre a subjetividade do lesante, bastando simplesmente o dever de indenizar171. Neste sentido, o dever do empregador de indenizar está explicito nos casos de assédio moral no trabalho, seja até mesmo quando ocorre o assédio moral horizontal, uma vez que o inciso III, do art. 932 do Código Civil de 2002 prediz: Art. 932: São também responsáveis pela reparação civil. [...] III – o empregador ou o comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em relação dele. Logo, a vítima de assédio moral no ambiente de trabalho deve ser indenizada, em quaisquer dos casos que tenha sido comprovado o assédio. 3.3 CRITÉRIOS PARA A ADOÇÃO DE VALORES PARA REPARO DO DANO MORAL Nos itens anteriores se constatou que para existir a necessidade de indenizar deve ser comprovado o dano e a responsabilidade civil de quem o praticou, assim, segundo Venosa: A indenização, por mais ampla que seja, nunca equivale à obrigação assumida, nem ao valor perdido, mas serve de lenitivo e diminuição do sofrimento da vítima, ofendida em valores morais ou patrimoniais. Na indenização, procura-se, com ou sem contrato, tanto quanto 171 FIUZA, 2003, p. 820. 71 possível, colocar as coisas no estado anterior, devendo o juiz zelar para que isto ocorra172. A fixação de um valor para a indenização pelo dano moral deverá alcançar, aproximadamente, a extensão do dano, observando o bom senso e a proporcionalidade da culpa, da gravidade do dano e do nível sócio-econômico do lesante. O Código Civil de 2002 dita que: Art. 944: A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização. Fiúza adverte que este dispositivo é insuficiente no tocante à reparação do dano moral, visto que este normalmente resulta da violação de um direito da personalidade, logo não é passível de medição o dano173. No entanto, é possível dizer que o critério para a fixação do dano material é o cálculo de tudo aquilo que o lesado deixou de lucrar e do que efetivamente perdeu, já que o evento danoso interrompe a sucessão normal dos fatos, deste modo é possível perceber que a vítima de assédio moral precisa ser ressarcida, visto que muitas vezes é obrigada a se afastar do trabalho, em outras palavras, ela deixa de ganhar, portanto, mais uma vez fica clara a necessidade de ser indenizada. Fiúza ainda lembra que: [...] a reparação de danos deve provocar um novo estado de coisas que se aproxime tanto quanto possível da situação frustrada, ou seja, daquela situação que, segundo a experiência humana, em caráter imaginário, seria a existente se não tivesse ocorrido o dano174. VENOSA, Silvio S Direito civil: responsabilidade civil. v. 2. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 493. FIUZA, 2003, p.841. 174 FIUZA, 2003, p. 941. 172 173 72 Bittar ressalta a existência de dois critérios que devem ser utilizados para a fixação do dano moral: a compensação ao lesado e o desestímulo ao lesante. Inserem-se nesse contexto fatores subjetivos e objetivos, relacionados às pessoas envolvidas, como a análise do grau da culpa do lesante, de eventual participação do lesado no evento danoso, da situação econômica das partes e da proporcionalidade ao proveito obtido com o ilícito. 175 Nesta ótica, a reparação do dano moral deve ter em vista possibilitar à vítima de assédio moral no trabalho a satisfação compensatória do dano (leia-se também constrangimento) sofrido, além do desestímulo a novas práticas assediantes, como acrescenta Fiúza: “iniba comportamentos anti-sociais do lesante ou de qualquer outro membro da sociedade”, isto é, a indenização deve servir de advertência ao lesante e a sociedade de que não se aceita o comportamento assumido ou o evento lesivo176. Sobre esta matéria, Venosa adverte que somente não há o dever de indenizar quando não for constatada uma conduta injurídica, antijuridicidade, de modo que para haver a indenização, o agente responsável deverá ter praticado uma conduta contra o Direito contratual ou contra a dignidade da pessoa humana. No entanto, não existe um critério formal predeterminado.177 Assim, cabe ao juiz tanto a definição da forma, como a extensão da reparação cabível, sendo que certos parâmetros, estabelecidos em lei, devem servir-lhe para nortear seu julgamento e evitar o estabelecimento de indenizações simbólicas, que nada compensam à vítima e somente servem de estímulo ao agressor.178 Entretanto, cumpre salientar que mesmo com a obrigação de indenizar processada e julgada há, ainda sempre a obrigação moral de sanar o dano, embora este não constitua vínculo jurídico. Neste contexto, Diniz acrescenta que: 175 BITTAR, 1999, p. 221. FIUZA, 2003, p. 842. 177 VENOSA, 2004. p. 492. 178 FIUZA, 2003, p. 842. 176 73 O dever moral, embora não constitua um vínculo jurídico, não deve permanecer totalmente alheio ao direito no momento de seu espontâneo cumprimento, pois a ordem jurídica o tomará irrevogável, conferindo a soluti retentio ao que recebeu a prestação a título de liberalidade, de modo que quem a cumpriu não terá direito de reclamar restituição, alegando que não estava obrigado ao seu adimplemento. 179 Cumpre dizer que quanto ao assédio moral no trabalho não há uma regulamentação nacional que possa guiar os operadores do Direito no que se refere à indenização, todavia o Código Civil atua preceitua que: Art. 946: Se a obrigação for indeterminada, e não houver na lei ou no contrato disposição fixando a indenização devida pelo inadimplente, apurar-se-á o valor das perdas e danos na forma que a Lei processual determinar. Além disso, há a necessidade de se ressarcir à vítima dos danos causados a sua saúde que, como já mencionado, é afetada pela conduta repetitiva que determina o assédio moral. Neste item o Código Civil reza que: Art. 949: No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido. Diante desta disposição, Fiúza acrescenta a necessidade de reparação dos danos morais, frutos de ofensa à integridade física, ou seja, um direito da personalidade, pelo qual se tutela a incolumidade do corpo e da mente.180 Bittar adiciona que: O dano moral dispensa a prova do prejuízo em concreto, sua existência é presumida, por verificar-se na "realidade fática" e emergir da própria ofensa, já que exsurge da violação a um direito da personalidade e diz respeito à "essencialidade humana". Essa presunção é adequada à natureza do direito lesado, no caso a integridade física, que compõe a personalidade humana, de modo a 179 180 DINIZ, 2004, p. 62. FIUZA, 2003, p. 848. 74 surgir ipso facto181 à necessidade de reparação, sem que haja necessidade de adentrar o psiquismo humano.182 Ainda importa salientar o dever de indenizar a vítima do assédio moral no trabalho quando aos danos provocados por injuria, difamação e calúnia. Art. 953: A indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido. Parágrafo único. Se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, eqüitativamente, o valor da indenização, na conformidade das circunstâncias do caso. Fiúza lembra que é necessária a reparação dos danos por violação à honra, que é direito de personalidade, composto por dois aspectos: objetivo, enquanto consideração social e, subjetivo, quanto à auto–estima da vítima183. 3.4 ENTENDIMENTO JURISPRUDÊNCIAL Para contextualizar, colaciona-se a seguir alguns entendimentos exarados pelo Tribunal Regional do Trabalho do Estado de Santa Catarina – 12ª Região, desde maio de 2007 até maio de 2008, sobre alguns aspectos abordados em todo o trabalho. Restringiu-se a pesquisa a este tribunal para demonstrar o que tem sido decidido em nosso Estado há pouco mais de um ano, objetivando, contudo, atualizar o conhecimento jurídico sobre o tema proposto. No acórdão nº 6129/2007, proferido no RO nº 4743-2006-02812-00-2, do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho, a Autora da ação reclamou o pagamento de indenização por danos morais decorrentes do assédio sexual sofrido 181 Pelo mesmo fato. BITTAR, 1999, p. 208. 183 FIUZA, 2003, p. 855. 182 75 pelo preposto184 que a ameaçava de despedi-la caso não cedesse aos seus interesses sexuais. Uma testemunha, também empregada da empresa ré da ação, presenciou o fato ocorrido num hotel em que estavam hospedados para a execução de um trabalho fora da sede da empresa. Não só a empregada assediada sexualmente fora ameaçada, bem como a testemunha também o foi moralmente sob a forte ameaça de perda de seus empregos. Embora o assédio tenha sido praticado pelo preposto, a empregadora foi condenada ao pagamento do adicional compensatório do dano sofrido. Nestes termos, transcreve-se: ASSÉDIO SEXUAL. DANO MORAL. Comprovado nos autos o ato do preposto da ré, que atenta contra a dignidade, a moral, a honra e a imagem da empregada, tentando obter, em face de sua condição de superior hierárquico, vantagem sexual, configurado está o assédio sexual, que autoriza o deferimento de indenização por dano moral, nos moldes dos arts. 5º, X, da CRFB, e 186 e 927 do CC. (grifo nosso)185 De outra forma, em outra decisão, confirma a ilicitude de ato praticado também por um preposto que para se prevalecer de outro subordinado apalpou-lhe partes íntimas na troca de roupas durante a jornada de trabalho. Comprovado nos autos, inclusive pelo registro de Boletim de Ocorrência, foi imediatamente despedido. Além do dano causado pelo desrespeito à intimidade, foi veiculado o fato entre os demais colegas de trabalho que passaram a zombá-lo periodicamente mesmo fora da sede da empresa. É o acórdão de nº10525/2007 proferido no RO 3819-2005-032-12-00-0. Para fins de elucidação das incidências de condenação ao pagamento de indenizações por danos morais, conveniente se faz a transcrição de 184 Pessoa designada pelo empregador para exercício de cargo de gestão ou que assume responsabilidades sobre alguns atos que deveriam ser praticados diretamente pelo empregador. Os atos pelo preposto praticado comprometem o seu proponente. 185 Todos os acórdãos foram tirados do Tribunal Regional do Trabalho do Estado de Santa Catarina 12ª Região. 76 alguns acórdãos que fazem a previsão da reparação por danos morais decorrentes dos acidentes de trabalho186 sofridos pelos empregados. Em fatídico dia, o empregado sofreu acidente de trabalho numa máquina de propriedade da empregadora, perdendo parte da mão durante a execução de sua atividade laboral. Além da inequívoca responsabilidade da empregadora na prática do ato ilícito e na reparação, entendeu o referido Tribunal Trabalhista que a fixação do valor para compensação do dano sofrido não seja ínfimo a ponto de desestimular a mudança das práticas administrativas ilícitas do empregador e ao mesmo tempo, que este valor não seja exagerado para não causar o enriquecimento sem causa da vítima. Assim, transcreve-se: INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAL E ESTÉTICO. CARACTERIZAÇÃO. No direito positivo brasileiro, a respeito da responsabilidade do agente pela indenização do ato por ele praticado ou a que deu causa, o suporte encontra-se no art. 186 do Código Civil. Nesse contexto, a procedência do pleito indenizatório não pode prescindir da comprovação do dano, da conduta imputável ao empregador, na modalidade culposa ou dolosa, e do nexo de causalidade. Presentes tais requisitos, em razão da constatação de ter o empregado sofrido acidente de trabalho, pela operação de máquina de alto potencial lesivo, sem qualquer treinamento, ocasionando-lhe a amputação parcial de um dedo, exsurge o dever de reparação pelo empregador. E: DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. FIXAÇÃO DO QUANTUM. Na fixação do quantum indenizatório dos danos moral e estético, deve o Juiz atentar para dois parâmetros: primeiro que o valor não seja muito baixo, a ponto de não estimular que medidas administrativas sejam tomadas pelo empregador, a fim de evitar a repetição do evento danoso; segundo, que o montante não seja demasiadamente elevado, evitando-se, assim, o enriquecimento sem causa do lesado. ACIDENTE DE TRABALHO. PENSÃO MENSAL. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO. NÃO-CABIMENTO. Não há falar em instituição de pensão mensal em favor do acidentado quando a lesão não lhe causou incapacidade para 186 Acidentes de trabalho são os acidentes sofridos pelos empregados no local de trabalho, no trajeto casatrabalho-casa e por equiparação, as doenças do trabalho e doenças profissionais. 77 o trabalho. (Acórdão-3ªT nº 7553/2007 RO 00275-2006-05012-00-8). Em outro caso semelhante, a mesma Terceira Turma do Tribunal Trabalhista em RO 00560-2006-003-12-00-1, Acórdão nº 8958/2007 decidiu pela condenação ao pagamento de indenização por danos morais porém motivou-o de outra forma, pela gravidade da conduta danosa e da lesão praticada ao empregado bem como a capacidade financeira da vítima e de quem causou a referida lesão. Transcreve-se: ACIDENTE DE TRABALHO. PENSIONAMENTO E DANOS MORAIS. LIMITES DE FIXAÇÃO. I – A pensão devida pelo empregador ao empregado em casos de acidente de trabalho, quando consolidada lesão de caráter permanente e incapacitante, não pode ser compensada com benefício previdenciário, em virtude de possuírem distintas naturezas jurídicas. II – Por visar ao ressarcimento da perda salarial experimentada com a inabilitação prematura, o pensionamento decorrente da responsabilidade civil deve estar limitado ao tempo em que o empregado, presumivelmente, perderia sua capacidade natural para o trabalho. III – A doutrina tem relacionado diferentes critérios de arbitramento do dano moral, entre os quais se destacam a gravidade da conduta danosa e da lesão, assim como a capacidade financeira da vítima e do ofensor. Esses elementos que deverão ser observados pelo magistrado na árdua tarefa de quantificar a compensação financeira devida a quem teve violada sua esfera extrapatrimonial. No caso em exame, o empregado com apenas 29 anos de idade sofreu inúmeras lesões, ocasionando não a perda da capacidade laboral mas tão somente a sua redução permanente. Para compensação, o Juízo atribuiu a condenação ao pagamento de uma indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais). Se comparado com o valor do salário recebido à época, de R$ 653,92 (seiscentos e cinqüenta e três reais e noventa e dois centavos), com certeza, houve compensação da perda da capacidade laboral, porém não promoveu o enriquecimento ilícito do empregado. Um aspecto não abordado durante o trabalho por não ser o objetivo do mesmo, mas que, não prejudicando a pesquisa feita, torna-se imprescindível citá-lo, refere-se ao prazo prescricional do ingresso da ação para 78 pleitear a reparação dos danos morais causados em decorrência dos atos praticados na relação de trabalho. Frisa-se que o instituto da prescrição é processual e consiste na perda do direito de mover o estado-juiz para julgar uma lide e conceder a paz social decorrente da mesma. Após a promulgação da Emenda Constitucional nº 45187 que alterou o texto original da Constituição da República Federativa do Brasil, a Justiça do Trabalho passou a ser competente exclusivamente para julgar ações que pretendem a reparação dos danos morais decorrentes das relações de trabalho. Conforme já explanado no presente trabalho, além da Constituição da República Federativa do Brasil, a legislação civil é a fundamentação para reparação dos danos morais sofridos pelos trabalhadores. Surge, então, uma discussão acerca do prazo prescricional, se utilizado o trabalhista ou civil. Neste sentido, transcreve-se algumas decisões sobre o tema em voga: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. PRESCRIÇÃO. FONTE DO DIREITO MATERIAL. CODIGO CIVIL. Estando o pedido de indenização por dano moral decorrente de suposto ato ilícito praticado pela empresa apoiado em norma prevista no Código Civil, aplica-se-lhe a prescrição civil, e não a trabalhista. (Acórdão-3ªT RO 004492007-010-12-00-4). Some-se: DANO MORAL. PRESCRIÇÃO APLICÁVEL. Ainda que o instituto da prescrição se justifique pela necessidade de pacificação social - evitando receios intermináveis de ações judiciais - não pode ele, paradoxalmente, implicar ofensa à própria segurança jurídica, esta, senão, um resultado, é uma manifestação da aludida pacificação. Assim, não pode a parte ser penalizada por critério diverso de contagem do prazo prescricional daquele que se aplicaria na Justiça Comum, onde o feito foi ajuizado em conformidade com o ordenamento jurídico vigente à época. Deve, ao contrário, ter a certeza jurídica de que, lá e cá - já que competência não se confunde com prescrição - a regra seria a mesma. (Acórdão-3ªT 13648/2007 RO 03647-2005-003-12-00-0) 187 Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: (...) VI - as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho; http://www.senado.gov.br/sf/legislacao/const/ 79 Finalmente, chega-se ao objetivo do trabalho, o de esclarecer, na medida do possível, a possibilidade de reparação ou compensação de danos morais decorrentes da prática de assédio moral nas relações de trabalho bem como os critérios de fixação dos valores das indenizações a serem pagas em favor da vítima de referido ato ilícito. No acórdão nº 12083/2007, proferido pela 1ª Turma do Tribunal Trabalhista no RO nº 03226-2006-031-12-00-9, empregados eram submetidos à prática de atos vexatórios promovidos pelos empregadores nos quais diariamente, após a conferência das metas que deveriam ser atingidas com as vendas dos produtos da empregadora, se não as atingissem, eram trancados em salas cujas divisórias eram de vidro e eram vistos por todas as pessoas que por ali passavam e os reconhecia como sendo aqueles que não haviam cumprido com sua obrigação laboral. Além disto, determinava a realização de abdominais sobre uma mesa e a ingestão “de bebida quente e vencida”. Equipara-se este ato praticado pelo empregador como de uma professora de escola básica que põe seu aluno de castigo em um canto da sala. Entende que assim está condicionando-o a não praticar mais atos irregulares, porém ao mesmo tempo está divulgando o ato praticado por seu aluno a todos os demais, causando-lhe constrangimento. DANO MORAL. ASSÉDIO MORAL. PUNIÇÃO QUE ATINGE A DIGNIDADE DA PESSOA E O VALOR DO TRABALHO HUMANO. FIXAÇÃO DE INDENIZAÇÃO. Indubitavelmente que a instabilidade emocional gerada no empregado submetido a práticas punitivas que maculam a sua dignidade e o valor do seu trabalho implica dano moral. Obviamente, a obrigatoriedade na participação de reuniões de caráter punitivo nas quais o empregado é submetido a constrangimento e embaraço perante seus colegas de labuta configura assédio moral. Nesses casos é até mesmo presumível a privação do seu bem-estar, com evidente menoscabo espiritual e perturbação anímica, haja vista o constrangimento, a humilhação e outros sentimentos negativos. Nessa situação se vê o trabalhador privado da saúde integral do corpo e da mente e tem reduzida ou eliminada, ainda que temporariamente, a sua capacidade produtiva. Transcreve-se outro acórdão em caso análogo: 80 DANO MORAL. LIMITE DO PODER DE MANDO. ASSÉDIO MORAL. É compreensível que o empresário vise ao lucro. É com este objetivo que se lança no mercado e investe capital. Mas isto não lhe dá o direito de exigir dos seus colaboradores – subordinados - a prática de atos humilhantes e constrangedores. O empresário extrapola o seu poder de mando no momento em que exige uma competição acirrada em busca de resultados, deixando de respeitar os limites individuais de cada um daqueles que coloca sob o seu comando hierárquico. Ac.- (1ªT-Nº5010/2007 RO 08353-2005037-12-00-1). De outro modo, o Acórdão-1ªT 5069/2007, do RO 08448-2005-036-12-00-9, sobre o assédio moral aduz que para a sua configuração, necessário se faz o preenchimento dos seguintes requisitos: prova do ato ilícito, do nexo causal e do dano sofrido. Neste caso, além da insistente cobrança do preenchimento de metas, o empregado, com certo padrão, gerente bancário, era submetido ao cumprimento rotineiro de trabalhos de menor importância como carregar armários e galões de água. In verbis: ASSÉDIO MORAL. OFENSA À NORMA JURÍDICA DO EMPREGADOR MANTER UM AMBIENTE LABORAL SAUDÁVEL. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. É dever jurídico da empresa manter o meio ambiente do trabalho saudável, seja no plano físico, seja no psicológico. Constitui ato ilícito do empregador conduta que fere direitos da personalidade do empregado, através de ações representadas por exigência abusiva de metas, com pressão psicológica e ameaça de dispensa, bem como a transferência de agência, onde passou a desenvolver atividades de menor importância e complexidade, diversas das inerentes à função de gerente, como carregar armários e trocar galões de água. Tal procedimento revela o nítido objetivo de inviabilizar a permanência do empregado na empresa após a extinção do setor de expansão, impelindo-o a pedir demissão. Da mesma forma, o Acórdão proferido pela 1ªTurma, de Nº 5681/2007 no RO 06411-2006-014-12-00-0, previu a reparação dos danos morais sofridos pelo empregado: DANO MORAL. ASSÉDIO MORAL. PRÁTICA DE ATIVIDADES DITAS “MOTIVACIONAIS” QUE ATINGEM A DIGNIDADE DA PESSOA E O VALOR DO TRABALHO HUMANO. FIXAÇÃO DE INDENIZAÇÃO. Indubitavelmente 81 que a instabilidade emocional gerada no empregado que se recusa de participar de reiteradas práticas chamadas de “motivacionais”, que maculam a dignidade da pessoa e o valor do trabalho humano (dança, performance, ranking dos piores, uso de fantasias, etc.), ou que delas participa contrariamente à sua vontade interior implica dano moral. Obviamente, a obrigatoriedade na participação das “brincadeiras” nem sempre é explícita, pois, no mais das vezes, é subliminar, dissimulada e engenhosa, fazendo com que o empregado não queira se sentir excluído ou relegado pelo grupo de trabalho, e surge pelo próprio constrangimento e embaraço a que é submetido perante seus colegas de labuta. Nesses casos é, até mesmo, presumível a privação do bem-estar da pessoa, com evidente menoscabo espiritual e perturbação anímica, haja vista o constrangimento, a humilhação e outros sentimentos negativos. Nessa situação se vê o trabalhador privado da saúde integral do corpo e da mente e tem reduzida ou eliminada, ainda que temporariamente, a sua capacidade produtiva. A problemática jurídica principal que originou a presente pesquisa monográfica são os critérios utilizados pelo Poder Judiciário para a fixação do quantum indenizatório nas ações de indenização por danos morais, em razão da ausência de legislação que regulamente a matéria. Neste sentido, colhem-se as seguintes decisões: DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. CRITÉRIO PARA FIXAÇÃO. A reparação justa do dano moral é matéria das mais complexas e difíceis de se mensurar. Para a fixação da indenização por dano moral é necessário considerar a posição funcional da autora, a repercussão da ofensa, as circunstâncias fáticas da causa, a gravidade e a extensão do dano e as condições econômicas do réu. (Ac – 2ª T – nº 10494/2007 – RO 05800-2003-001-12-85-1) E, mais: DANOS MORAIS. VALOR DA INDENIZAÇÃO. O dano moral, com a aparência do duplo caráter, reparatório e pedagógico, deve ser aquilatado com razões prudentes e critérios que não venham a ocasionar o enriquecimento dos lesados nem a ruína do ofensor. Os parâmetros que se estabelecem e estão consagrados na doutrina e na jurisprudência majoritárias radicam na condição econômica dos lesados e do ofensor, no dano em si, na intensidade com que a dor se manifesta e no 82 grau de culpa do ofensor. (Ac – 1ª T – nº 9928/2007 – RO 00879-2006-038-12-00-0). No julgado em comento ambos os recursos, principal e adesivo, versam sobre o valor da indenização por danos morais e materiais. Houve a majoração do valor fixado a título de danos materiais referentes ao tratamento das despesas médicas. A culpa do Banco/empregador restou caracterizada pela demora na implantação de programa de prevenção de doenças ocupacionais e também pela forma como lidar com o problema da autora “atribuindo sua incapacidade laborativa a falta de motivação ou fingimento”. A decisão levou em conta o caráter pedagógico posto que problemas semelhantes ocorrem com vários empregados ao banco. Levou em conta também a hipossuficiência por se tratar de um Banco versus um trabalhador comum. Esses critérios para a majoração foram os da indenização por danos morais de 19.000,00 para 38.000,00 acrescidos de 5.000,00 referentes às despesas médicas, totalizando a condenação em 43.000,00. O julgado a seguir trata de recurso ordinário visando a majoração do quantum arbitrado a título de indenização por danos morais e a condenação dá-se ao pagamento de honorários advocatícios. O julgamento mantém a sentença, com fundamento teoria da responsabilidade subjetiva, levando em consideração os requisitos previstos no artigo. 186, do Código Civil, quais sejam, o dano, conduta culposa ou dolosa do empregador e nexo de causalidade entre ambos. A decisão considerou inequívoco o dano, restou comprovado o comprometimento da saúde do empregado. Levou em conta a desídia do empregador por não haver tomando as precauções de higiene e segurança no ambiente de trabalho, expondo o empregado a riscos ocupacionais sem fornecimento dos equipamentos de proteção individual – Equipamento de Proteção Individual. A decisão ressaltou que a legislação brasileira “não adota critério tarifado” para a sua “fixação” devendo considerar a repercussão do valor da indenização no patrimônio do lesado, o grau de dolo ou culpa do empregador, o seu porte, tem como o caráter pedagógico, que consiste em adotar as medidas 83 necessárias para eliminar e prevenir os problemas causadores do dano. Modificou a sentença apenas no que tange ao valor da indenização fixado, reduzindo-o por julgar que a indenização originária privilegiada o enriquecimento sem causa, devendo prevalecer os demais critérios anteriormente citados. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VALOR FIXADO. Em relação ao "quantum" da indenização por dano moral, a legislação brasileira não adota critério tarifado para a sua fixação. Leva em conta sua repercussão no patrimônio ideal do empregado lesado, o seu meio social, a duração da ofensa, o dolo ou grau de culpa do empregador, o seu porte e o caráter pedagógico, com o intuito de pressioná-lo a adotar as medidas tendentes a eliminar e/ou a prevenir o problema que originou o dano. (Acórdão 3ª T – RO 02697-2008-003-12-00-0) A decisão a seguir trata dos recursos ordinários. O primeiro visa a obtenção da majoração da indenização fixada e o pagamento dos honorários advocatícios. O recurso do reclamado pugna pela improcedência do pedido, sob a alegação de ter tomado todas as precauções legais visando a saúde do trabalhador, requerendo a redução do montante fixado. A decisão entendeu evidenciados os nexos de causalidade e a culpa do empregador, a teor do dispositivo no artigo 186 do Código Civil e inciso XXVIII do artigo 7º da Constituição da República Federativa do Brasil, com base na prova pericial. O trabalho realizado na empresa contribui diretamente para o surgimento da doença em razão das condições de trabalho a que estava submetido: posturas incorretas, movimentos repetitivos sem rodízio de tarefas, exigência de produtividade e pausas e ginástica laboral insuficientes. Ressalta-se que o autor foi mantido nas mesmas condições de trabalho mesmo após o surgimento dos primeiros sintomas da doença. O julgado considerou correta a condenação à indenização por dano moral na sentença, contudo apreciando as causas anteriores que poderiam ter contribuído para a doença do autor, o grau da lesão sofrida, a sua reversibilidade e a ausência de incapacidade total para o trabalho, reduziu o valor de indenização fixada em primeiro grau, de 20.000,00 para 10.000,00, atualizados monetariamente a partir da data do julgamento. 84 RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. QUANTIFICAÇÃO DA INDENIZAÇÃO. Na quantificação da indenização devida a título de dano moral, o magistrado deve considerar as circunstâncias do caso concreto, entre as quais se destacam a existência de concausa, o grau da lesão sofrida, sua reversibilidade e a ausência de incapacidade total para o trabalho. Tais fatores, entre outros possíveis, devem ser sopesados no arbitramento de indenização condizente com o princípio da razoabilidade. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA SUCUMBÊNCIA. LEIS ESPECIAIS. Não vigorando o critério de sucumbência no processo do trabalho para fins de crédito honorário, o instituto aplicável é o de assistência judiciária, conforme leis específicas e orientações jurisprudenciais (Súmulas nos 219 e 329 do E. TST), cujos requisitos, para o deferimento, devem ser integralmente satisfeitos. Tal entendimento consolidado não sofre qualquer alteração ante o disposto no art. 389 do novo Código Civil, inaplicável ao processo trabalhista.(Acórdão 3ª T – RO 10172005-008-12-00-2) Em outro acórdão, a empresa Brasil Telecom S/A recorreu visando a reforma da sentença de primeiro grau. Requereu a exclusão da condenação por danos morais sob o argumento de que não se comprovou o dano alegado. A turma recursal entendeu que o direito a reparação civil pela ocorrência de acidente de trabalho encontra-se resguardado pelo artigo 7º da Constituição da República Federativa do Brasil, e o artigo 186 do Código Civil. Para ensejar a responsabilidade do empregador é concomitante do dano, conduta dolosa ou culpa e nexo de causalidade. A perícia concluiu a existência de nexo causal direto entre o trabalhador da reclamante e a enfermidade que diz acometê-la. Vislumbra-se do respeitado acórdão que a culpa resta evidente em caso como o de doença ocupacional, uma vez que advém da omissão do empregador na adoção de medidas preventivas suficientes para evitar o dano. Em relação à prova do dano, colhe-se da doutrina que, provado o fato, provado está o dano. Quanto ao arbitramento da indenização observou-se não apenas a necessidade da vítima, mas também a responsabilidade do réu e sua 85 viabilidade econômica, a gravidade e a extensão do dano, procurando equacionar o princípio necessidade/possibilidade. O valor arbitrado ao título de indenização por dano moral fora reduzido para 5.000,00, pois os trabalhos da autora favoreceram o surgimento da doença. Entretanto não excluindo o fato de que a ré contribuiu para o agravamento do quadro. Outro acórdão apresentado trata de recurso ordinário interposto por Perdigão Agro Industrial SC e recorrido Jaime Francisco Lagni, que objetivou a reforma da decisão do juízo a quo, no que se refere a pensão mensal e indenização por danos morais. Asseverou a recorrente a necessidade de haver prova de culpa do empregador na ocorrência do dano, alega que as doenças constatadas pelos peritos não são de origem ocupacional, mas sim degenerativas, sustenta por fim a inexistência de prova da culpa do empregador do evento danoso, da mesma forma afirma que inexistiu qualquer dano a moral do empregado. Em se tratando de valor da indenização, esclarece o recorrente que deve ser fixado com as circunstâncias do caso, a gravidade do dano a intensidade da culpa, situação do lesante e do lesado não podendo causar enriquecimento ilícito, razão pela qual pugna pela improcedência da ação. Quanto ao dano moral sustenta o recorrente que o autor não demonstrou dano a sua moral capaz de ensejar a condenação. O M.M. juízo do Egrégio Tribunal da 1º região concluiu que o trabalho junto a ré configura nexo de concausidade no desenvolvimento da patologia da autora. Vislumbra-se ainda da respeitável decisão do nobre julgador que a ré não demonstrou que tomou todas as precauções para evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais a ponto de excluí-la da responsabilidade. Entendeu ainda que tais circunstâncias conduzam à manutenção do dever de indenizar. Explicitou o magistrado que os requisitos para a fixação do valor do dano são: à gravidade do dano, o grau de culpabilidade da empresa e a situação econômica do responsável pelo dano. Incluiu também na valoração da 86 culpabilidade a circunstância de tramitarem diversas razões nessa justiça do trabalho, visando a indenização decorrente de acidente do trabalho. DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO DO VALOR. O valor da indenização por danos morais deve atentar a três condições: a gravidade do dano, o grau de culpabilidade e as condições patrimoniais do causador do dano, porquanto sua finalidade não é apenas reparatória, mas, sobretudo, pedagógica. (Ac. 3ª T – RO 00266-2006-012-1200-0) Carga Expert Rodovias Transporte e Comércio de Cereais LTDA e Rosa M T C recorreram da sentença que deu parcialmente o pedido. De ofício fora julgado competente a justiça do trabalho para dirimir o conflito ora existente. Restou decidido quanto a prescrição o descabimento da aplicação da prescrição trabalhista de dois anos, bem como a aplicação do Código Civil de 2002, pois o infortúnio ocorreu em 1995 devendo ser aplicado o previsto no Código Civil de 1916 ou seja a prescrição vintenária. Salientou o nobre magistrado que não corre prescrição contra menores. Quanto à indenização por danos morais o acórdão deixou claro que não há dúvidas da existência de nexo de causalidade entre a função desempenhada pelo ex empregador e o acidente em que foi vítima. Diante das provas carreadas aos autos vislumbrou-se que a ré agiu com culpa como causa concorrente para acidente por pressionar o seu motorista a cumprir o prazo de entrega, ocasionando o acidente que levou o trabalhador a óbito. A jurisprudência deste tribunal tem como regra que o valor da indenização por danos morais deve ser suficiente para o mínimo sofrimento ocasionado pelo ato ofensivo devendo observar para a fixação do valor, a extensão do dano o patrimônio do ofensor e a situação pessoal do ofendido, deve-se levar em conta também o caráter punitivo da medida coibindo a reiteração da conduta ilícita do demandado sem permitir o enriquecimento ilícito pela vítima, razão pela qual negou provimento ao recurso da ré inclusive quanto à redução de valor da indenização. DANO MORAL. PEDIDO DE MAJORAÇÃO NEGADO. AUSÊNCIA DE DISPARIDADE ENTRE A LESÃO SOFRIDA E 87 A FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO OCORRIDA. A legislação pátria não oferece objetivamente critérios para a quantificação do valor correspondente à indenização por danos morais. No plano jurisprudencial, tem-se entendido como regra que o valor da indenização por danos morais deve ser suficiente para minimizar o sofrimento ocasionado pelo ato ofensivo, devendo ainda ser observados, para a fixação do montante, a extensão do dano, o patrimônio do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Deve ser levado em conta o caráter punitivo da medida e, ainda, coibir a reiteração da conduta ilícita do demandado, sem permitir, contudo, o enriquecimento ilícito pela vítima. DANO MORAL. VALORAÇÃO. O ordenamento jurídico nacional rejeita tarifação para a indenização por danos morais, prevalecendo o sistema aberto onde deve ser considerada a ofensa perpetrada, a condição cultural, social e econômica dos envolvidos, o caráter didático-pedagógico-punitivo da condenação e outras circunstâncias que na espécie possam servir de parâmetro para reparação da dor impingida, de modo que repugne o ato, traga conforto ao espírito do ofendido e desencoraje o ofensor à nova violação. (Ac. 2ª T – 4515/2007 – RO 00774- 2006-023-12-00-2) A empresa Melânia Schervinski de Souza interpôs recurso ordinário contra sentença proferida pelo juiz da 2º Vara do Trabalho de Chapecó, tendo por objeto a reforma do julgado que deferiu parcialmente os pedidos da exordial condenando a recorrida a pagar indenização por dano moral, equivalente a quinze salários mínimos. Os juízes da primeira turma recursal majoraram o valor da indenização de danos morais para 50.000,00 (Cinqüenta Mil Reais) sob fundamento que a finalidade pedagógica da indenização por danos morais deve considerar a capacidade econômica da empresa objetivando que a sanção imposta sirva como incentivo para a adoção de medidas preventivas para a tutela da saúde do empregado relataram ainda que a integridade física seja direito personalíssimo da pessoa e sua violação deve representar medidas repressivas e compensatória destinada a intervir nas escolhas empresariais quanto ao meio laboral. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. FINALIDADE SANCIONATÓRIA. FIXAÇÃO DO VALOR. A sanção jurídica tem por finalidade principal interferir nas escolhas das pessoas (naturais e jurídicas), a fim de que ajustem suas condutas ao comportamento previsto na norma jurídica. Uma vez praticado o ato contrário ao direito (ato ilícito), a sanção passa a ter 88 finalidade reparatória, no caso do dano material, e finalidade compensatória e pedagógica, no caso de dano moral. Assim, a fixação da indenização por dano moral deve ser em valor suficiente para interferir nas futuras escolhas da empresa, adequando-se ao comportamento previsto no ordenamento jurídico, caso em que a capacidade econômica do agressor é determinante, tendo como parâmetros secundários à intensidade da agressão, a gravidade do dano, a repercussão pessoal e social, dentre outros. A fixação do valor da indenização por dano material considera tão-somente o reflexo econômico do dano, cujos critérios não podem ser utilizados no caso de dano moral. (Ac 1ª T – 11479/2007 – RO 007612005-038-12-00-1) 89 CONSIDERAÇÕES FINAIS Na análise dos principais aspectos do assédio moral, observouse, preliminarmente, que o trabalho é fruto da necessidade de subsistência e que o direito do trabalho, por sua vez é uma criação recente que surgiu em 1884 como conseqüências da industrialização e do trabalho assalariado. Cabe ressaltar que imprescindível se resguardar o direito do cidadão assediado, no que se refere à Constituição Federal, diploma máximo do país, visto que os princípios mais fundamentais são esquecidos nos casos de assédio moral no trabalho, isto é, a dignidade da pessoa humana de ter um tratamento digno e a igualdade, sem discriminação. Assim, percebe-se que as condutas que determinam o assédio moral agridem frontalmente a legislação pátria, sem contar nos direitos da personalidade, também considerados constitucionais, que são desrespeitados, como por exemplo, o direito a integridade física e moral. Sobre o assédio moral nas relações de emprego entende-se que é um dos problemas mais sérios enfrentados pela sociedade atual, fruto de um conjunto de fatores, tais como a Globalização econômica predatória, vislumbradora somente da produção e do lucro, e a atual organização de trabalho, marcada pela competição agressiva e pela opressão dos trabalhadores através do medo e da ameaça. Esse contraste clima de terror psicológico gera na vítima assediada moralmente, um sofrimento capaz de atingir diretamente sua saúde física e psicológica, criando uma pré disposição ao desenvolvimento de doenças crônicas, cujos resultados a acompanharão por toda a vida. O assédio moral nada mais é do que a freqüente prática de condutas abusivas que violam a dignidade da pessoa humana, de forma humilhante e degradante, sendo uma forma de agredir moralmente o trabalhador, que pode, muitas vezes, trazer conseqüências irreversíveis. Uma vez destruída a condição psicológica de um individuo muito difícil será restituir-lhe através de valores pecuniários sua vida normal. 90 Constata-se que o assédio moral é uma agressão, por vezes disfarçada, e, portanto muito difícil de buscar as provas, os sujeitos, a caracterização do dano, porém isso não tem impedido que os magistrados decidam à favor da vítima assediada quando verificada a ocorrência do assédio. É imprescindível fazer distinção entre o assédio moral do stresse, do conflito, da injúria, bem como das imposições profissionais, pois estas situações podem fazer parte do ambiente de trabalho não se caracterizando como assédio moral. Verifica-se que o assédio moral embora carente de legislação é considerado espécie do gênero dano moral, por ferir um bem extrapatrimonial, possibilitando a vítima a reparação e indenização. Entretanto, embora não haja uma regulamentação específica, e conseqüentemente uma “punição” adequada prevista na lei, a jurisprudência consultada nesta pesquisa é unânime em associar o assédio moral ao dano moral e por analogia aplicar a penalidade do dever de indenizar, no caso do empregador ao empregado. Desta maneira, o que se constata é a urgência em regulamentar tal fenômeno, já que isso auxiliaria, não só a indenizar a vítima, mas principalmente a coibir o comportamento ilícito, uma vez que se saberia que seria punido. No tocante ao dano moral sublinhou-se a sua previsão constitucional de difícil conceituação. Trata-se, na verdade, de prejuízo que afeta a alma, a intimidade, o âmago da pessoa; dano capaz de gerar dor, desgosto e sofrimento. Sobre o estudo do problema proposto no presente estudo, ainda se percebe que não há um consenso e nem uma valoração exata possível para se quantificar o quantum deverá ser indenizado pelo empregador, visto que o dano moral refere-se a algo intangível imensurável concretamente, estima-se, frequentemente, no constrangimento que a vítima sofre. Ressalta-se ainda a necessidade deste valor ser arbitrado diante da premissa de caráter punitivo e preventivo, no que tange ao empregador. 91 No exame dos critérios para a fixação da valoração da indenização observa-se principalmente as particularidades do caso concreto, a extensão do dano experimentado pela vítima, o grau de culpa do agente e as condições financeiras das partes envolvidas no litígio. Desta feita, conclui-se enfim, que em face da ausência de requisitos previamente estabelecidos em lei, à jurisprudência fixou os critérios acima identificados para o arbitramento da indenização por danos morais. Frisa-se a importância da aplicação do princípio da razoabilidade no momento da valoração da indenização, que seja justa adequada e capaz de reparar o dano moral suportado pela vítima. 92 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA AGUIAR, André L. S. Assédio moral: o direito à indenização pelos maus-tratos e humilhações sofridas no ambiente de trabalho. 2. ed. São Paulo: LTR, 2006. AVALONE FILHO, Jofir. A ética, o Direito e os poderes do empregador. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 32, jun. 1999. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1151. Acessado em: maio/2008. BELMONTE, Alexandre A. Danos morais no direito do trabalho: identificação, tutela e reparação dos danos morais trabalhistas. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. BITTAR, Carlos A. Reparação civil por danos morais. 2 ed.São Paulo: R.T, 1994. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Brasília, Senado Federal, 2001. BRASIL, Código Civil. Lei n. 10.406/2002. 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São Paulo: Atlas, 2004 96 ANEXO Acórdão-2ªT RO 02881-2005-007-12-00-5 12359/2007 DANO ordenamento tarifação MORAL. jurídico para a VALORAÇÃO. nacional indenização O rejeita por danos morais, prevalecendo o sistema aberto onde deve ser considerada a ofensa perpetrada, a condição dos cultural, envolvidos, o social e econômica caráter didático- pedagógico-punitivo da condenação e outras circunstâncias que na espécie possam servir de parâmetro para reparação da dor impingida, de modo que repugne o ato, traga conforto ao espírito do ofendido e desencoraje o ofensor a nova violação. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de RECURSO ORDINÁRIO, provenientes da 1ª Vara do Trabalho de Lages, SC, sendo recorrente JUVENIL DOMINGOS DOS SANTOS e recorrida MADESERV INDÚSTRIA, COMÉRCIO E SERVIÇOS LTDA. Da sentença das fls. 154-166, que julgou procedente em parte o pedido, recorre o autor a este Tribunal. Nas suas razões de inconformismo das fls. 178-185, afirma que a recorrida teve responsabilidade em 97 relação à causa do acidente que sofreu, visto que o fato ocorreu devido à falta de iluminação existente no local do acidente. Assevera, ainda, que a informação da CAT em relação ao acidente de trabalho é inverídica, pois a perícia médica realizada comprova que a lesão é mais grave do que o relatado. Quanto ao valor atribuído à indenização por danos morais devido à agressão física, diz que ela deve atender às necessidade do ofendido e aos recursos do ofensor, de modo a não ser demasiado alto para quem paga e insignificante para quem recebe. Assim, requer o conhecimento e o provimento do recurso, no duplo efeito, para que a demandada seja condenada ao pagamento de uma indenização por danos morais por acidente de trabalho e que o valor da indenização por danos morais por ter sofrido agressão física seja majorado. Contra-razões não são ofertadas. Na continuidade, sobem os autos a esta instância revisora. É o relatório. V O T O Conheço do recurso, pressupostos legais de admissibilidade. M É R I T O pois superados os 98 Efeitos devolutivo e suspensivo O autor postula que o recurso seja recebido no duplo efeito, ou seja, devolutivo e suspensivo. Não lhe assiste razão, pois o art. 899 da CLT prevê que os recursos terão efeito meramente devolutivo, salvo nas hipóteses previstas em lei, permitida a execução provisória até a penhora. Para essa matéria, trago o seguinte aresto: SENTENÇA NORMATIVA. EXEQÜIBILIDADE. Os direitos assegurados através de sentença normativa são exeqüíveis, ainda que exista recurso pendente de julgamento, desprovido art. 6º de da conseqüência, haja efeito Lei a n. vista que esse suspensivo, 4.725/65. decisão nele apelo "ex Por é vi" do via de proferida gera efeitos "ex nunc". Outrossim, a jurisprudência tem admitido o mandado de segurança como remédio processual cabível para a concessão do efeito suspensivo, quando a efetividade imediata da sentença trouxer violação a direito líquido e certo do recorrente. Verifica-se que na hipótese a violação decorre não da sentença, mas da denegação do efeito suspensivo ao recurso. Contudo, no presente caso, busca o autor a concessão ao recurso de um efeito que ordinariamente não 99 possui e para o qual não existe qualquer condição extraordinária. Dessa forma, nego provimento ao recurso, na matéria. Indenização por danos morais. Acidente de trabalho Busca o recorrente o recebimento de uma indenização por danos morais devido à culpa do empregador por ter sofrido um acidente de trabalho, já que o local de labor estava com pouca iluminação. Não merece guarida a pretensão. É fato incontroverso que o autor sofreu acidente de trabalho (lesões na perna esquerda) pelo fato de ter sido “atropelado” por uma empilhadeira. Por usa vez, o laudo médico concluiu às fls. 113-116 que: “1. há nexo técnico de causa para o acidente de trabalho que resultou na mancha hipercronica na face lateral externa do tornozelo esquerdo; 2. não são observadas seqüelas funcionais/laborais e 3. dano estético mínimo”. Já o documento da fl. 42, CAT, descreve no item 43 que o acidente de trabalho ocorreu por imprudência do acidentado que não se afastou do trajeto da máquina, pois não teve reação para se afastar, fato que lhe ocasionou entorse no tornozelo esquerdo com escoriações (item 60). 100 O autor, no seu depoimento da fl. 91, afirmou que “estava ajudando a carregar a estufa um dia à noite, e por falta de iluminação o depoente ficou procurando a chave para acender a luz e não achou, e veio uma máquina empilhadeira da ré e pegou o depoente, que o operador da empilhadeira, ‘Tatu’, não viu o autor...”. Por sua vez, a testemunha da fl. 127 é imprestável para a solução da celeuma, visto que ela não viu o acidente. Ora, diante desses fatos, não há provas de que a culpa do acidente foi do empregador, ônus do autor que não se desincumbiu, nos termos do art. 818 da CLT c.c. o art.333, inc. I do CPC. Ademais, o autor também não impugnou a CAT agregada à fl. 42, onde consta que a culpa pelo acidente de trabalho foi do obreiro por sua negligência, já que não saiu da frente da empilhadeira. Dessa forma, nego provimento ao apelo, no particular. Majoração do valor da indenização por danos morais referente à agressão física O apelante objetiva a majoração da indenização por danos morais por ter sofrido agressão física na ocasião que retornou do afastamento previdenciário e uma semana depois voltou para receber, tendo registrado o fato em boletim de ocorrência, tudo sob o argumento de que empregador é uma empresa com potencial econômico elevado. o 101 Por ausência de contestação específica, o Juiz de primeiro grau reconheceu a existência do dano moral sofrida, porém atribuiu-lhe baixo caráter ofensivo, forte em decisões precedentes deste Egr. Regional. Não lhe assiste razão. A objetivamente critérios correspondente à legislação para indenização a por pátria não quantificação danos oferece do morais. valor No plano jurisprudencial, tem-se entendido como regra que o valor da indenização por danos morais deve ser suficiente para minimizar o sofrimento ocasionado pelo ato ofensivo, devendo ainda ser observados, para a fixação do montante, a extensão do dano, o ofendido. patrimônio Deve ser do levado ofensor em e a situação conta o caráter pessoal do punitivo da medida e, ainda, coibir a reiteração da conduta ilícita do demandado, sem permitir, contudo, o enriquecimento ilícito pela vítima ou seus herdeiros. Assim, sentença (R$ 1.500,00) é entendo que expressivo e o valor fixado harmoniza-se com na a intensidade da culpa (agressão física) e a situação financeira do ofensor, pois promove um conforto ao sofrimento ao autor, além de conferir caráter educativo à ré. Ademais, ante o princípio da imediatidade, pois cabe ao Juiz de primeiro grau o contato direto com as provas, nego provimento ao recurso nesse tópico. Por todo o exposto, nego recuso, na forma da fundamentação expendida. provimento ao 102 Pelo que, ACORDAM os Juízes da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região, por unanimidade, CONHECER DO RECURSO. No mérito, por igual votação, NEGAR-LHE PROVIMENTO. Mantido o valor da condenação fixado em 1º grau. Custas na forma da lei. Intimem-se. Participaram do julgamento realizado na sessão do dia 25 de março de 2008, sob a Presidência da Exma. Juíza Sandra Marcia Wambier, os Exmos. Juízes Maria Aparecida Caitano e Hélio Bastida Lopes. Presente o Exmo. Dr. Roque Perottoni, Procurador do Trabalho. Florianópolis, 22 de abril de 2008. HÉLIO BASTIDA LOPES Relator Jaime