Publicado no Site Lessa Cursos • www.lessacursos.com.br O INTERROGATÓRIO E O ACUSADO NO PROCESSO MILITAR Euclides Cachioli de Lima 1. INTRODUÇÃO O interrogatório é tema bastante complexo, e amplo na matéria processual, seja ela penal, penal militar ou ainda quando se refere a questão administrativa disciplinar militar, por isso, não será objetivo deste estudo o exaurimento da matéria. Tendo como objetivo conhecer e assim compreender melhor a natureza jurídica do interrogatório, e sua aplicabilidade nas matérias já citadas. Faz-se necessário uma pequena explanação sobre a posição doutrinaria de alguns juristas, afim de, demonstrar as vertentes existentes sobre a matéria em questão, haja vista, alguns entenderem ser o interrogatório meio de prova, enquanto outros, meio de defesa, ressaltando o posicionamento daqueles adeptos da teoria do interrogatório possuir uma função dúbia, tanto é um meio de prova quanto de defesa, também conhecido como teoria “mista”. Ainda a questão do silêncio do acusado ser interpretado em prejuízo da defesa como expõe o art. 305 do Código de Processo Penal Militar. O posicionamento constitucional sobre o assunto, e os demais diplomas legais. O certo é afirmar ser o interrogatório a oportunidade do acusado fazer, de viva voz, sua autodefesa, podendo apresentar sua versão dos fatos. Como dito não se esgotará o tema, mas apenas discorrer um pouco sobre a natureza jurídica do interrogatório e suas características, já que trata-se de matéria sempre apresentada de forma modesta, entretanto, acreditamos, ser útil, ainda que de maneira resumida, o estudo para mostrar a importância do interrogatório, fomentando discussões sobre sua natureza jurídica. Publicado no Site Lessa Cursos • www.lessacursos.com.br 2. NATUREZA JURÍDICA Três são as correntes doutrinárias que estudam e definem o instituto do interrogatório, fracionando-se do seguinte modo: os que afirmam ser o interrogatório um meio de prova, pois alegam que o referido ato processual encontra-se compreendido no capítulo "Das Provas" no CPP, bem como no Titulo XV do CPPM que também trata dos atos probatórios, alegam ainda, das perguntas feitas ao acusado é possível chegar à verdade dos fatos. Sendo possível, durante o interrogatório obter a confissão, e deste modo adquirir materialidade para fundamentar a sentença condenatória. Em uma segunda corrente o interrogatório é considerado como um meio de defesa para o acusado, pois é nesse momento que ele exerce sua auto defesa, sustentando pessoalmente sua teoria sobre o fato que lhe está sendo imputado. Ao narrar sua versão, pode o acusado influenciar na decisão do magistrado, dando-lhe fatos atenuantes ou ainda excludentes. Os defensores desta ganham um forte respaldo constitucional, uma vez que direito ao silêncio é a garantia de enfoque do interrogatório como meio de defesa. O interrogado pode calar-se sem que isso possa ser usado em desfavor da sua defesa. Há ainda a corrente que considera o interrogatório como um instituto de natureza jurídica mista, podendo estar tanto para o meio de prova como para o meio de defesa. O acusado narra a sua versão sobre os fatos, neste momento pode ele articular sua defesa, ou expor fatos que ajudarão na elucidação do ocorrido, ai teremos provas, deste modo, argüindo a sua defesa, ou elucidando fatos, estará o acusado fornecendo elementos para que o magistrado formule sua convicção. E nesta ramificação é que encontramos maiores seguidores atualmente. Vejamos porém alguns dos entendimentos sobre as correntes doutrinárias apresentadas: - Ada Pelegrini Grinover (As Nulidades no Processo Penal), Tourinho Filho (Processo Penal) e Fernando Capez (Curso de Processo Penal), alegam que: o acusado podendo contar sua versão dos fatos, o seu silencio não poder ser tido como ato incriminador e ainda não ser exigido o interrogatório na lei de imprensa e nem nos crimes eleitorais, este deve ser entendido como meio de defesa e não como meio de prova. Publicado no Site Lessa Cursos • www.lessacursos.com.br - Adalberto Camargo Aranha (Da prova no processo penal), Hélio Tornaghi (Curso de processo penal) e José Frederico Marques (Processo Penal), comungam: o fado do interrogatório ser uma fonte de convicção, e estar disposto no ordenamento processual na seara das provas faz deste indiscutivelmente um meio de prova. É oportunidade de defesa, mas seu objetivo é indiscutivelmente a prova. - Júlio Fabrini Mirabete (Processo Penal), Heráclito Antônio Mossin (Curso de Processo Penal) e Vicente Grecco Filho (Direito Processual), ensinam: tem o interrogatório caráter misto, é tanto meio de prova quanto oportunidade de defesa, pois ao mesmo tempo em que o acusado apresenta sua defesa, protegendo-o, oferece ao magistrado elementos para elaboração de sentença, indubitavelmente nos casos que ocorra a confissão. Trata-se de defesa pois neste momento o acusado apresenta a “tese” de defesa, sendo um ato de instrução se faz como meio de prova. Um fato a ser exposto é a questão do interrogatório no procedimento disciplinar em especial o da Polícia Militar do estado de São Paulo, este se encontra disciplinado nas Instruções do Processo Administrativo da Polícia Militar (I-16-PM), com a ressalva feita no art. 87 do Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de São Paulo (RDPM), no qual é previsto a aplicação subsidiada do Código de Processo Penal Militar (CPPM), calando-se porém quanto o socorro ao Código de Processo Penal (CPP). 3. O ACUSADO E SEU SILÊNCIO O militar, na condição de acusado deverá ser cientificado que está desobrigado a responder as perguntas que lhe forem formuladas, vez que tal direito encontra-se garantido em nossa Carta Constitucional. No caso de mais acusados o interrogatório será feito em separado. As perguntas não deverão ser tendenciosas, ou seja, não devem ser formuladas questões com um aspecto subjetivo. Segundo a Constituição de 1988, o acusado fica desobrigado a falar, e seu silêncio não será interpretado em seu prejuízo, a Lei 10.792/03 corrigiu o equívoco constante do artigo 186 do CPP que afirmava que o silêncio poderia ser interpretado em prejuízo da defesa, para corretamente constar, no novo parágrafo único do mesmo artigo 186, que o silêncio, que não importará confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa. Infelizmente para os militares tal correção não ocorreu, deste modo ainda consta no CPPM em seu art. 305, o silencio do acusado ser interpretado em prejuízo de sua defesa. Publicado no Site Lessa Cursos • www.lessacursos.com.br Ora, se a Constituição assegura o direito ao silêncio e, na ausência de prova em contrário, determina que a presunção deve ser feita a favor do réu, é totalmente incompatível que se assegure o direito ao silêncio e seja o mesmo utilizado na formação do convencimento do juiz quando ao fato criminoso apurado. O legislador regulamentou o interrogatório em juízo alterando o Código de Processo Penal porém esqueceu de revisionar o interrogatório no Código de Processo Penal Militar. A falta de previsão expressa por parte do legislador quanto às modificações ora introduzidas pela Lei Federal nº 10.792/2003 trará um descompasso entre a legislação processual e a processual castrense, estabelecendo uma desigualdade entre os acusados perante a Justiça Militar e os acusados perante a Justiça Comum1. Tentando solucionar tais questões, o juiz-auditor (agora juiz de direito por força da E.C.45) e os juízes de direito que atuam perante as Auditorias Militares, como ocorre em outros Estados da Federação, poderão aplicar o disposto no art. 3º, do Código de Processo Penal Militar, Decreto-lei 1002 de 1967, segundo o qual, "Art. 3º Os casos omissos neste Código serão supridos: a) pela legislação de processo penal comum, quando aplicável ao caso concreto e sem prejuízo da índole do processo penal militar"2. A previsão desta norma não significa necessariamente que na Justiça Militar o interrogatório seguirá as disposições da Lei Federal n º 10.792/2003, e não o procedimento previsto nos arts. 302 usque 306 do Código de Processo Penal Militar. Não se pode esquecer que caberá ao juiz analisar e decidir sobre a aplicação de uma Lei Federal que não fez qualquer menção a Justiça Militar3. Ao acusado perante a Justiça Militar da União ou dos Estados-membros da Federação caberá por meio de seu defensor, dativo ou constituído, pleitear tratamento semelhante aos dispensado aos acusados perante a Justiça Comum, Federal ou Estadual, com fundamento no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal, e com fundamento na Lei Federal n º 10.792/2002 combinada com o art. 3 º, alínea "a", do Código de Processo Penal Militar4. 1 ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Aplicação da Lei nº 10.792/2003 na Justiça Militar . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 163, 16 dez. 2003. 2 3 4 Idem. Ibidem. Idem. Ibidem. ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Aplicação da Lei nº 10.792/2003 na Justiça Militar . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 163, 16 dez. 2003. Publicado no Site Lessa Cursos • www.lessacursos.com.br 4. CONCLUSÃO O interrogatório coroa-se como o ato de instrução realizado em todos os julgamentos onde será exaltado as finalidades de facultar ao magistrado o conhecimento do caráter, da índole do acusado; transmitir ao julgador a versão, relativa ao acontecimento, de maneira sincera ou tendenciosa, na tentativa de convencer sobre idoneidade da sua versão; é ainda o ato pelo qual o magistrado verifica as reações do acusado, ao lhe ser dada diretamente, a ciência do que os autos encerram contra ele. No tocante a questão do Procedimento Administrativo Militar, deve-se ressaltar que em nada será ferido os preceitos militares, a aplicação de novas teorias e a adequação as novas legislações, bem como o uso subsidiado de outros ritos processuais somente darão maiores amplitudes aos direitos e garantias assegurados constitucionalmente, seja para processos judiciais quanto para os de caráter administrativos, termos então uma maior harmonia do principio processual da verdade real com o já consagrado princípio constitucional do contraditório e ampla defesa. Conclui-se portanto estar correta a corrente moderna de pensamento jurídico na qual é defendido o interrogatório como possuidor de natureza jurídica mista vez que enquanto o acusado se defende, expondo sua versão sobre o fato em questão, não deixa de ministrar ao Juiz, elementos úteis à apuração da verdade, seja pelo confronto com provas existentes, seja por circunstâncias e particularidades das próprias declarações por ele prestadas. Obs.: Artigo Escrito em decorrência da conclusão de módulo, do curso de Pós Graduação em Direito Militar pela UNICSUL. Publicado no Site Lessa Cursos • www.lessacursos.com.br BIBLIOGRAFIA 01. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 8ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. 02. ARANHA, Adalberto Q. T. de Camargo. Da prova no Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. 03. ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Organização e Estrutura da Justiça Militar, Página Militar in : http://militar.com.br, 1999, p. 1-4. 04. ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Aplicação da Lei nº 10.792/2003 na Justiça Militar . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 163, 16 dez. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4616>. Acesso em: 17 abr. 2007. 05. SANTOS, Teodoro Silva. O interrogatório do acusado à luz da Lei nº 10.792/03 . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 283, 16 abr. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5104>. Acesso em: 19 abr. 2007. 06. MARQUES, José Frederico. 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