176 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR ITINERÁRIOS TURÍSTICOS Capítulo VI INOVAÇÃO DAS TRADIÇÕES ALIMENTARES Maria Manuel Valagão Joana Gomes da Silva Inovar não significa reinventar tudo; é também e sobretudo, partir do existente, repor em jogo, de outra forma, saberes-fazer, conhecimentos, recursos, estruturas, e reconsiderar o papel dos agentes. (LEADER, A Os Cadernos do Observatório Europeu n.º 2, 1997) ctualmente, no quadro conceptual do desenvolvimento local, a inovação é encarada numa óptica de demonstração, divulgação e transferência de conhecimentos, com vista ao desenvolvimento de acções similares em outros contextos, valorizando os recursos e saberes existentes. Ora, um dos principais objectivos deste projecto era o de desencadear acções precursoras do desenvolvimento local. Neste sentido, tínhamo-nos proposto inovar algumas tradições alimentares, a partir do conhecimento dos saberes empíricos tradicionais relacionados com a secagem, que é uma forma tradicional de conservação alimentar. Pretendíamos induzir essa renovação nas tradições, através da criação de produtos com sabores e aromas gastronómicos novos, que tivessem viabilidade para serem aceites junto dos consumidores. Para tal, seguimos um percurso idêntico ao que é sugerido na citação em epígrafe, ou seja, partimos dos conhecimentos existentes, dos recursos e das estruturas, para valorizar o saber-fazer local 177 178 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR e criar três produtos: o piso de ervas aromáticas, os cogumelos silvestres secos e o tomate seco. Como estes produtos constituem uma novidade a nível local, torna-se indispensável tratar a questão da sua utilização culinária. Por outro lado, numa inovação alimentar, uma outra dimensão imprescindível a ter em conta é a do bemestar físico. Isto porque, nos dias de hoje, a gastronomia é indissociável das preocupações com a saúde, ou seja, com a dimensão nutricional dos alimentos, pois bons sabores, que fazem bem parece ser o lema actual. Assim sendo, neste capítulo, antes de apresentarmos sugestões de utilização culinária de cada um dos três produtos referidos como ingredientes-base, indicamos igualmente, sobre cada um deles, alguns aspectos nutricionais que nos pareceram mais relevantes e que estão estreitamente relacionados com as preocupações actuais dos consumidores, ao nível da alimentação e da saúde. INOVAR OS SABORES DA TRADIÇÃO E DA SAÚDE O carácter de novidade dos três produtos em experiência define-se fundamentalmente em relação ao contexto, às necessidades e às oportunidades daquele território. Em termos locais, a actividade relativa à secagem de tomate ou de cogumelos silvestres não existia em termos empresariais, nem é corrente na região, o que não significa que seja necessariamente nova noutros contextos, ou não esteja já a ser experimentada noutras zonas. Por exemplo, em Alcácer do Sal, foi a primeira vez que se experimentou produzir tomate seco, numa escala que possa ser adoptada e transferida para outros locais ou agentes. Nos vários eventos nacionais, promovidos para a divulgação deste produto, verificou-se que, embora não fosse bem conhecido por parte dos consumidores, a sua aceitabilidade foi bastante boa. O que se verificou com o tomate seco também ocorreu com o piso, que de igual forma, pode ser considerado um produto de alto valor acrescentado. Ao nível dos sabores, bem como da comodidade e da facilidade da sua preparação culinária, este produto foi igualmente bem aceite. Quanto aos cogumelos silvestres secos, outro dos produtos estudados no projecto, as experiências desenvolvidas à escala laboratorial permitiram promover também acções de experimentação e demonstração dos seus usos culinários. INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES Estes produtos, bem como as técnicas de conservação por nós estudadas e experimentadas, inserem-se na lógica da tradição, têm especificidades nutricionais e gastronómicas de grande actualidade, o que lhes confere um significado de oportunidade, para futuras iniciativas empresariais. Isto, porque importa que as inovações alimentares se adaptem, de algum modo, às novas necessidades sociais dos consumidores, criadas pelos horários sobrecarregados da vida citadina, propondo soluções de facilidade para o seu quotidiano alimentar, que devem e podem ser simultaneamente saborosas. Na sua essência, estas adaptações à modernidade não são mais do que a reinterpretação das tradições e representam, em si, verdadeiros potenciais de futuro, em vários sentidos. Ou seja, este tipo de produtos alimentares transformados poderão constituir formas criativas para rentabilizar um tipo de actividade a adoptar por pequenas indústrias artesanais, como complemento a outros rendimentos, como temos vindo a referir. Os resultados obtidos vieram, portanto, ao encontro do objectivo inicialmente proposto, que era o de experimentar inovações, no sentido de uma realização prática que fosse facilmente transposta para o quotidiano dos consumidores urbanos, apressados e apreciadores de uma cozinha da simplicidade. Com efeito, ao nível de produtos alimentares transformados com alto valor acrescentado, este conjunto de produtos é muito apreciado, beneficiando actualmente de nichos de mercado com grande procura. Fazem parte dos habitualmente designados produtos gourmet. Por outro lado, esta procura, à qual se associam também as ervas aromáticas condimentares (secas ou frescas), é concomitante com a importância do modelo alimentar mediterrânico, que é caracterizado sobretudo por pratos modestos/frugais e funcionais. A valorização deste modelo de consumo alimentar pretende conjugar não só a saúde com o prazer, mas também accionar formas alternativas de revitalização das agriculturas mediterrânicas. O seu retorno poderá significar não só uma forma de contribuir para a diversidade cultural e alimentar, mas também para a diversidade biológica. E, obviamente, tal como para o modelo mediterrânico, que corresponde ao que é praticado no Sul do país, os outros modelos tradicionais podem ser considerados também como saudáveis1, quando reinterpretados à luz das necessidades e das disponibilidades do quotidiano alimentar, num contexto urbano terciarizado. A característica comum a todos os modelos alimentares tradicionais é a frugalidade, no que se refere ao consumo de gorduras e de alimentos fornecedores 179 1 Foi em 1993, na primeira Conferência Internacional sobre as Alimentações Tradicionais na zona do Mediterrâneo/países do Mediterrâneo, organi- zada em Harvard, que se elaboraram uma série de guias alimentares, concebidos sob a forma de uma Pirâmide , com o propósito de reflectir a diversidade das alimentações tradicionais ao nível global, que historicamente estivessem associadas a padrões saudáveis. 180 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR de proteínas de origem animal, que só por si representa já um princípio básico de uma alimentação saudável. Vejamos quais as principais características do modelo alimentar mediterrânico. O QUE É O MODELO ALIMENTAR MEDITERRÂNICO? O interesse por este tipo de alimentação iniciou-se a partir da segunda metade do séc. XX. Foram então promovidos diversos estudos epidemiológicos em populações da Europa do Sul, os quais visavam perceber as razões pelas quais a incidência de doenças cardiovasculares era muito menor nestas populações do que nos E.U.A e na Europa do Norte. A longevidade também era maior naqueles países, e o modelo alimentar de referência passou a ser o da ilha de Creta, na Grécia. Por outro lado, como os hábitos alimentares de uma região correspondem, em geral, aos recursos locais em produtos da agricultura, da pesca e da pecuária, a alimentação tradicional destas regiões traduz as suas disponibilidades alimentares naturais. Ou seja, em terras de sequeiro e de parcos recursos, como são as que caracterizam estes territórios, as populações souberam tirar partido do que dispunham, com tal subtileza que as diferentes tradições alimentares mediterrânicas são hoje reconhecidas, na sua diversidade e complexidade, como modelos alimentares saudáveis. As principais características desta alimentação centram-se num consumo muito reduzido de produtos de origem animal e na abundância do consumo de alimentos de origem vegetal. Destes, destacam-se os cereais arroz e trigo e os seus derivados massas, cuscuz, pão. No interior deste grupo, o pão, integrando a já conhecida trilogia pão, vinho e azeite, ocupa um lugar de destaque. Os produtos hortícolas ocupam também um lugar de relevo neste tipo de alimentação, sendo ricos em nutrientes antioxidantes e em flavonóides, ambos protectores da saúde. Abundante é também o consumo de frutos, que são fornecedores de vitamina C e de carotenos, bem como de leguminosas secas (grão, feijão, lentilhas ) que são ricas em sais minerais e fibras alimentares solúveis. As gorduras utilizadas são sobretudo o azeite e a banha de porco, ambas ricas em ácidos gordos monoinsaturados. O consumo moderado de vinho (tinto, sobretudo) constitui igualmente um factor protector, que é característico deste tipo de alimentação. Os procedimentos de preparação culinária são simples, sendo que a utilização de ervas aromáticas constitui também um aspecto identitário destas cozinhas da Europa do Sul, muitas vezes identificadas como cozinhas dos aromas. Enfim, como todos os modelos alimentares, este só poderá ser considerado saudável, quando inserido num conjunto de outras práticas de vida saudáveis, que privilegiem a ingestão regular de água e o exercício físico. Estas características foram traduzidas numa representação gráfica em forma de pirâmide, que serve para, num rápido olhar, visualizar a proporção do consumo adequado dos alimentos, para uma alimentação saudável (vide Anexo II). INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES Ora, sabendo-se que um modo alimentar caracterizado pela frugalidade é o que mais se adequa aos estilos de vida sedentários, foi nossa preocupação adoptar os elementos da cozinha tradicional que porventura se adaptassem mais facilmente à elaboração de pratos rápidos, aromáticos, saborosos, e que correspondessem, simultaneamente, às expectativas dos consumidores, enquadrando-se, de certo modo, em modelos alimentares saudáveis. Neste sentido, e porque queríamos sugerir formas de comercialização dos referidos produtos, que lhes acrescentassem valor, criando mais-valias para os produtores, a inovação proposta estruturou-se em torno de dois elementos-base os pisos e as pastas desenvolvidos a partir de princípios, de procedimentos e de pratos da cozinha tradicional local. Começaremos, assim, por explicar o que são e como se preparam os pisos e as pastas, apresentando-se, em seguida, algumas sugestões para a sua utilização culinária. Pisos, Pestos e Pastas Porquê este título? O que têm a ver os pisos, os pestos e as pastas com a inovação alimentar? Precisamente porque estas preparações podem ser feitas à base de todos os nossos produtos e, ao constituírem uma variante ao seu modo de comercialização e ao incorporarem um significativo valor acrescentado, proporcionado pela sua transformação alimentar, podem servir de alternativas a uma pequena empresa, vocacionada para este género de produções. Passamos a explicar, então, em que consistem uns e outros. A designação de piso, tal como a de pesto, deve-se ao processo usado para obter este molho ou pasta, o qual consiste em pisar, num almofariz, todos os ingredientes, para a obtenção desse mesmo molho. Hoje em dia, será mais fácil substituir o almofariz por um copo misturador ou o equivalente, mas o procedimento reside nos mesmos princípios tradicionais. Começa-se por pisar os alhos com os coentros, juntando depois o azeite e o sal. Quanto mais frescas e tenras forem as folhas do coentro, melhor será o molho. Também é óbvio que a qualidade do azeite e do alho interfere no resultado final obtido, sendo por demais evidente a necessidade de escolher produtos de muito boa qualidade. Já o termo pesto, cujo significado literal é o de piso, é também a designação dada à pasta preparada com base nos mesmos elementos mediterrânicos, azeite, alho e sal, 181 182 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR utilizando manjericão em vez de coentros e integrando ainda, na sua composição, queijo de ovelha seco e pinhões. Quer na utilização tradicional do piso, quer na do pesto se põe em evidência a subtileza das cozinhas simples, que conseguem uma exaltação de sabores através de poucos ingredientes. Não será por acaso que um dos pratos mais conhecidos e mais emblemáticos do Alentejo é, sem dúvida, a açorda de coentros, que tem por base o piso. De igual modo, o pesto genovese, que originariamente era só utilizado para preparar um prato à base de massa (spaghetti ou linguini), tornou-se actualmente um molho cosmopolita amplamente divulgado, sendo um dos marcadores identitários da cozinha italiana. Os seus usos têm sido adaptados culturalmente e, na actualidade, é um tempero com múltiplas utilizações. Quanto às pastas, a sua designação não é tão consensual como a do piso. Aliás, actualmente é comercializada sob esta designação, e sob a designação de paté, uma miríade de produtos que se destinam sobretudo a barrar canapés. Não é deste tipo de produtos que queremos falar. No nosso caso, partimos do princípio de que o termo pasta se atribui a uma espécie de massa ou molho espesso, resultante de um conjunto de ingredientes que tradicionalmente também eram pisados num almofariz, com o qual se podia, por exemplo, temperar as carnes. Preparava-se a partir da massa de pimentão2, com alho, azeite, especiarias ou outros ingredientes adaptados ao efeito. Era a pasta utilizada para temperar as carnes de porco ou ainda a pasta de alho, azeite, sal e ervas do mato, utilizada para temperar o coelho. Estes e outros usos tradicionais das pastas serviram-nos de ponto de partida para propor algumas inovações, a partir dos produtos deste projecto, que se adaptem às necessidades de consumo actual. Com uma pasta, rapidamente se pode elaborar um prato para uma refeição. 2 Esta massa, tal como já foi referido atrás (Cap. IV), é preparada a partir do pimento encarnado, temperado de sal e seco ao sol, que depois é moído e conservado com um pouco de azeite. INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES O PISO O termo piso designa localmente a pasta preparada com coentros, alhos, azeite e sal, sobre a qual a água quente é vertida, para formar um caldo aromatizado, que é a base da açorda. Sendo também utilizado, em pequenas quantidades, para enriquecer o refogado, procedimento inicial de quase todas as preparações culinárias no Alentejo. O PESTO O termo pesto é utilizado para designar o conhecido condimento muito espesso e aromático à base de manjericão, azeite, sal, alho, pinhões e queijo, que é originário de Génova. As reminiscências deste molho situam-se já no período medieval. A actual notoriedade do clássico pesto genovese constitui um excelente exemplo de integração da tradição na modernidade. Inspirámo-nos neste pesto, para criar as inovações em torno do nosso piso. Num e noutro, a origem da sua designação está no procedimento inerente à sua confecção, que é, precisamente, o acto de pisar (pestare, em italiano) os diversos ingredientes até obter uma pasta, que será o condimento base da constituição do prato. AS PASTAS As pastas servem de condimento-base a múltiplas preparações culinárias. Com ligeiras diferenças, podemos dizer que, na sua essência, o procedimento de preparação é idêntico ao dos pisos. Tendo por base cogumelos secos ou tomate seco, os outros ingredientes indispensáveis são o alho, o azeite, o sal e as ervas aromáticas condimentares secas. Facultativos, dependendo do gosto de quem prepara e da finalidade da pasta, são o queijo seco e os pinhões. 183 184 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR Seguidamente, a título indicativo, apresentamos algumas sugestões para a preparação e utilização culinária dos pisos e das pastas. Embora as sugestões que se apresentam estejam estruturadas para serem utilizadas ao nível doméstico, elas podem também ser adaptadas ao contexto de uma indústria artesanal. Partindo do princípio de que, no quadro de futuras iniciativas empresariais, a comercialização destes produtos não poderá visar exclusivamente o mercado nacional, as sugestões para a sua utilização culinária terão que ter uma linguagem cosmopolita, perceptível por um universo de consumidores além-fronteiras. Neste sentido, sugere-se a preparação de um risotto, um prato italiano à base de arroz, facilmente adaptável pelo consumidor nacional a múltiplas preparações culinárias, semelhantes ao arroz malandrino sugerimos igualmente a preparação de uma polenta, um prato também italiano à base de farinha de milho, mais facilmente reconhecível a nível internacional, do que as tradicionais papas de milho, o xerém3 ou xarém. Acresce ainda mencionar que a preparação culinária destes pratos está actualmente mais facilitada, pois existem farinhas de milho pré-cozinhadas, comercializadas sob a designação de polenta, que se adaptam à sua preparação. Aliás, o uso da polenta pré-cozinhada está muito generalizado, principalmente ao nível dos restaurantes. Antes de apresentarmos os exemplos concretos da utilização dos três produtos contemplados no projecto ervas aromáticas e condimentares, tomate seco e cogumelos secos, damos algumas sugestões para melhorar a preparação e a conservação de pisos e de pastas. INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES SUGESTÕES PARA MELHORAR A PREPARAÇÃO E A CONSERVAÇÃO DE PISOS E DE PASTAS PREPARANDO Lavar bem as ervas e deixá-las enxugar à temperatura ambiente, até que não tenham humidade; Usar, sobretudo, folhas frescas e tenras; No caso do tomate seco e do cogumelo seco enxugar bem depois de re-hidratados; Triturar num copo misturador com os restantes ingredientes; Na confecção dos pisos, há ervas que se podem usar à vontade, sem restrições de quantidades, como, por exemplo, os coentros, a hortelã, os orégãos verdes ou os poejos. No entanto, há outras que têm que ser usadas com muita precaução, ou seja, em muito quantidades pequenas, pelo seu sabor amargo, como, por exemplo, o alecrim ou o tomilho (vide receitas exemplificativas). MELHORANDO Os pinhões (ou outro fruto oleaginoso seco, que se utilize em sua substituição, como, por exemplo, amêndoas ou avelãs) ficam sempre melhor quando levemente torrados no forno ou numa frigideira não aderente, em lume baixo, mexendo sempre até que estejam levemente corados, deixando-se depois arrefecer. Este procedimento não se aplica no caso das nozes, que a serem utilizadas ficam melhor em cru; O queijo poderá ser o de ovelha, seco, ou parmesão ralado na hora; Os alhos, quanto mais frescos melhor; O azeite deverá ser de muito boa qualidade. CONSERVANDO 3 A denominação de xerém ou xarém, refere-se ao tradicional prato algarvio, também conhecido por papas de milho ou simplesmente por papas, preparado à base de farinha de milho. Se estes produtos se destinarem a ser comercializados, exigindo, portanto, uma conservação longa, deverá seguir-se o processo de tratamento térmico indicado no Capítulo III, para o tomate conservado em azeite; Para conservar, ao nível doméstico, devem seguir-se as normas abaixo indicadas: Guardar no frigorífico em frascos esterilizados, bem secos e bem rolhados; Depois de utilizar, cobrir com uma camada fina de azeite e fechar bem o frasco para evitar a oxidação; Usar sempre uma colher limpa para tirar a porção desejada. 185 186 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR ERVAS AROMÁTICAS CONDIMENTARES Sobre as ervas aromáticas condimentares, apresentámos, no primeiro capítulo desta obra, a recuperação de algumas variedades autóctones, com a necessária conservação e exploração num horto e a técnica a seguir para a sua secagem, no terceiro capítulo. À primeira vista, nem um nem outro aspecto parecem ser inovadores, face às práticas correntes. Todavia, para quem eventualmente pretenda reproduzir e rentabilizar este processo, existem várias componentes/ /possibilidades de inovação nele contidos, no que se refere às ervas aromáticas condimentares. Primeiro, a inovação poderá considerar-se face à diversidade de ervas condimentares que se secaram e às sugestões propostas para a sua utilização. Por exemplo a mistura de diferentes ervas secas moídas, diluídas em azeite, à qual se junta umas gotas de limão ou vinagre, constitui um excelente condimento para carnes grelhadas. Ou ainda a utilização de rosmaninho ou de alfazema para preparar sobremesas à base de frutas, e que foram por nós experimentadas e divulgadas. Contudo, a novidade mais significativa que experimentámos, relativamente às ervas aromáticas condimentares, pode ser considerada a que se desenvolveu a partir de diferentes misturas de ervas aromáticas frescas. Referimo-nos aos pisos à base de diferentes ervas, aos quais acabámos de fazer referência no ponto anterior. O interesse deste produto é, simultaneamente, gastronómico, pelos aromas e sabores que confere aos pratos, e nutricional, através dos benefícios para a saúde que o seu consumo proporciona. Por um lado, a facilidade e a comodidade da sua utilização adaptam-se às exigências de uma culinária simples e rápida. Por outro, permite a redução das quantidades de sal e de gordura habitualmente utilizadas na confecção dos pratos, substituindo-as pelos sabores e aromas das ervas aromáticas condimentares. Trata-se de um molho muito concentrado e aromático, cujo interesse, do ponto de vista nutricional, reside também no teor em antioxidantes que fornece. INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES PORQUE PRECISAMOS DE ANTIOXIDANTES? O oxigénio que respiramos é indispensável à vida, mas ele é simultaneamente tóxico, ou seja, no decurso da sua acção no organismo, produzem-se resíduos, os chamados radicais livres, que atacam os ácidos nucleicos dos cromossomas, as proteínas das células e os ácidos gordos polinsaturados das membranas celulares. Este fenómeno de lesão das células chama-se oxidação e está na origem do envelhecimento, das doenças cardiovasculares e do cancro. Contudo, o organismo é capaz de lutar contra esta oxidação graças às vitaminas C e E, ao selénio e aos carotenos, nutrientes estes que têm o poder de neutralizar os radicais livres e daí o nome de antioxidantes que lhes é atribuído. Estas substâncias não são armazenadas/conservadas no organismo, desta forma, o que não é utilizado durante aquele processo é eliminado. (Paule NEYRAT, Les Vertus des Aliments, 2000). Os pisos de ervas aromáticas condimentares Frascos de piso de ervas aromáticas Na preparação dos pisos, tal como já foi referido, retomámos a técnica usada para o tradicional piso da açorda alentejana, adicionámos dois ingredientes novos, os pinhões e o queijo seco, e criámos diferentes pisos de ervas aromáticas. Como o sabor do peixe azul, especialmente o das sardinhas, faz parte do nosso património gustativo e do património comum aos países do Sul da Europa, a título indicativo, apresentamos uma receita de sardinhas recheadas com piso, que poderá servir de exemplo para adaptar a outros tipos de peixe, ao seu gosto. Antes exemplificamos com três receitas de pisos. 187 188 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR PISO DE TRÊS ERVAS INGREDIENTES 3 chávenas de folhas de coentros 1 chávena de folhas de hortelã 1 colher de sopa de alecrim 4 dentes de alho ½ chávena de azeite 4 colheres de sopa de queijo ralado 4 colheres de sopa de pinhões torrados sal q.b. Nota: poderá substituir a hortelã por orégãos frescos INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES PREPARAÇÃO Lavar e eliminar toda a humidade das folhas, enxugando-as bem; cortá-las grosseiramente; triturar com o alho; juntar o queijo, os pinhões, o sal e um pouco de azeite e voltar a triturar; juntar o resto do azeite; homogeneizar bem. Cobrir com uma película de azeite e conservar no frigorífico em frascos bem esterilizados. Cada uma das receitas acima mencionadas dá um frasco médio de piso, que se conserva bem, durante alguns meses, no frigorífico, se tiver a precaução de respeitar as regras de utilização indicadas anteriormente. UTILIZAÇÃO PISO DE CINCO ERVAS INGREDIENTES 3 chávenas de folhas de coentros 1 chávena de folhas de poejo 1 chávena de folhas de hortelã (ou de folhas de orégão fresco) 1 colher de sopa de tomilho 1 colher de sopa de alecrim 5 dentes de alho ½ chávena de azeite 5 colheres de sopa de queijo ralado 5 colheres de sopa de pinhões torrados sal q.b. PISO DE POEJOS INGREDIENTES 3 chávenas de folhas de poejos 3 dentes de alho ½ chávena de azeite 3 colheres de sopa de queijo ralado 3 colheres de sopa de pinhões torrados sal q.b. Nota: Preparámos intencionalmente esta receita com uma quantidade de azeite proporcionalmente superior à das outras receitas, para pôr em evidência que as quantidades são só indicativas. Poderá aumentá-las ou reduzi-las de acordo com o gosto Os pisos podem ser utilizados para preparar pratos à base de massa ou à base de arroz, para finalizar um prato de carne ou um prato de peixe ou para melhorar o sabor dos guisados, caldos de legumes ou dar sabor a guisados, a caldos de legumes, ou a inúmeras outras iguarias, de acordo com a imaginação e a criatividade de quem cozinha; Diluídos numa vinagreta ou só em azeite, servem para temperar saladas e acompanhar carnes cozidas, carnes grelhadas, ou para finalizar um prato de legumes cozidos no vapor; Misturados com requeijão (rectificando os temperos com sal, pimenta e um pouco mais de azeite), obtém-se um produto final que serve, por exemplo, para barrar canapés, fazer sanduíches, etc. UM POUCO MAIS Para facilidade de utilização, deverá ter-se o cuidado de diluir o piso num pouco de caldo quente (de peixe, de carne ou de legumes), que se adeque à preparação, ou água de cozedura da massa ou ainda simplesmente água quente. Se o utilizar inicialmente, faça-o em pequenas ou pequeníssimas quantidades, adicionando-o só no fim da cozedura, depois do prato quase pronto. O essencial da receita dos pisos é sempre idêntico. Difere apenas no tipo de ervas utilizado, o que determina que uns sejam mais indicados para temperar peixes, como, por exemplo, o piso de poejos, o piso de hortelã da ribeira ou o piso de orégãos frescos, enquanto outros sejam mais indicados para temperar carnes, como, por exemplo, os pisos que incluem alecrim e tomilho na sua composição. 189 190 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR SARDINHAS RECHEADAS COM PISO INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES 191 COGUMELOS SILVESTRES SECOS INGREDIENTES 12 sardinhas frescas 100g de miolo de pão duro 3 colheres de sopa de sumo de limão azeite q.b. 4 colheres de sopa de piso sal q.b. pimenta preta q.b. PREPARAÇÃO Numa tigela, juntar ao miolo de pão humedecido e bem escorrido o piso diluído com o sumo de limão; homogeneizar este preparado; rectificar os temperos com sal, pimenta e um pouco de azeite. Fazer cerca de doze pequenas porções deste recheio. Dispor os filetes das sardinhas (sem escamas, sem cabeça e sem espinha), lado a lado, com o interior para cima e, se gostar, salpicar com um pouco de sal e pimenta (o piso já tem bastante sal); colocar sobre cada sardinha uma porção do preparado anterior, junto da parte da cabeça; enrolar e fixar com um palito; arrumar num tabuleiro de ir ao forno, pincelado com azeite; regar as sardinhas com azeite; cozer em forno médio durante cerca de 30 min. UM POUCO MAIS Este prato é muito simples e dietético, sem por isso deixar de ser requintado. Adequa-se a qualquer tipo de piso. Se desejar, poderá sofisticá-lo um pouco mais, juntando ao recheio os seguintes ingredientes: uma gema de ovo, 30 g de coríntios secos, duas colheres de sopa de vinagre de cidra e hortelã fresca picadinha; salpicar as sardinhas com 40 g de pinhões e com hortelã fresca, antes de irem ao forno. Conserva-se bem no frigorífico e adequa-se a ser servido frio, à temperatura ambiente. ENVIAR FOTO O FICHEIRO NÃO ABRE Cogumelos secos (Boletus spp.) Uma outra vertente de experimentação contemplada neste projecto consistiu em ensaiar o tradicional processo de secagem de cogumelos. Esta experiência incluiu a secagem das seguintes espécies: Boletus spp. (boletos, tortulhos ou míscaros) Hydnum repandum (língua de gato) Cantharellus cibarius (cantarelos) e Craterellus cornucopioides (trompeta da morte). Como já foi referido em capítulos anteriores, uma vez secos, os cogumelos silvestres adquirem aromas e sabores diferentes das mesmas variedades frescas, diversificando, assim, a sua utilização culinária e gastronómica. Constituem um produto gourmet muito procurado pelos apreciadores. Além disso, pela facilidade de preparação culinária e disponibilidade permanente, ao longo do ano, este produto adequa-se às exigências de falta de tempo para consagrar às tarefas de preparação culinária, da vida moderna. Embora a actual notoriedade deste produto se deva, sobretudo, ao seu valor gastronómico, importa considerar igualmente as suas características nutricionais. 192 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR PROPRIEDADES NUTRICIONAIS DOS COGUMELOS Os cogumelos têm sido erradamente denominados de «carne vegetal». Com efeito, em termos nutricionais, o seu teor em proteínas não excede os 2 a 5% (dependendo das espécies), o que é muito diferente do das carnes, que variam entre 15 a 25%. Todavia, aquela designação tem algum fundamento. Isto porque, apesar de conterem muito menos proteínas que a carne, os cogumelos são ricos em vitaminas do grupo B (B1, B2, B5 e B8 e vitamina B3 ou vitamina PP), nutrientes estes que habitualmente se encontram na carne e nos ovos. Em termos do seu teor em sais minerais, contêm sobretudo potássio e fósforo. São pouco calóricos: cerca de 25 cal/100 g Por outro lado, a ingestão de cogumelos confere uma sensação de saciedade, o que pode explicar-se pelo facto de a sua digestão ser lenta, devido à sua textura particular, à sua grande capacidade de absorção das gorduras de confecção utilizadas e ainda da sua riqueza em fibras (2 a 3%). (Les Vertus des Aliments, op. cit.) in Les vertus des Aliments, Éditions Solar, Paris, 2000, p.167. VITAMINA B5 OU ÁCIDO PANTOTÉNICO A vitamina B5 é um dos constituintes da coenzima A, substância esta que participa na nossa produção de energia, isto porque desempenha um papel importante, em todas as reacções metabólicas das proteínas, dos lípidos e dos glúcidos. Esta vitamina intervém igualmente na renovação das células da pele e das mucosas, no processo de cicatrização e no crescimento do cabelo. Sendo uma vitamina hidrossolúvel (tal como todas as vitaminas do complexo B), ela não é armazenada no organismo. (Paule Neyrat, Les Vertus des Aliments, Éditions Solar, Paris, 2000) COMO OS RE-HIDRATAR? Lavar rapidamente os cogumelos e re-hidratar, em água tépida. Os especialistas recomendam uma re-hidratação longa, entre uma a doze horas, a fim de obter uma água perfumada, que será utilizada para aromatizar os molhos ou outras preparações, onde se utilizam os cogumelos secos. Todavia, poderá fazer uma re-hidratação mais rápida, durante 20 a 30 minutos, utilizando água quente. INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES ONDE UTILIZAR OS COGUMELOS SECOS? Uma vez re-hidratados os cogumelos secos podem utilizar-se como qualquer outro cogumelo fresco, para confeccionar as mais diversas preparações culinárias, sobretudo como guarnição e como acompanhamento. Na sua preparação culinária, recomenda-se a utilização da água em que se re-hidrataram, para reforçar os sabores do prato. Uma vez re-hidratados e escorridos, a sua preparação culinária é idêntica à dos cogumelos frescos, como já se referiu. Adequam-se a uma infinidade de preparações, como, por exemplo, para a confecção de pratos à base de massas, à base de arroz (nomeadamente, os conhecidos risottos), gratinados, molhos, recheios de tartes, guarnições de carnes, ou pratos à base de legumes. QUANTIDADES MÉDIAS RECOMENDADAS Recomenda(m)-se 10 g de cogumelos secos por pessoa. Por exemplo, 40 g de cogumelos secos, isto é, para quatro pessoas, correspondem a uma média de 160 a 200 g de cogumelos re-hidratados, o que é adequado. Seguidamente fornecemos algumas sugestões para a utilização culinária dos cogumelos secos. As receitas que recomendamos foram preparadas com boletos. 193 194 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES PASTA DE COGUMELOS SECOS MASSA COM COGUMELOS SECOS INGREDIENTES 2 chávenas de cogumelos secos (± 60 g) 4 dentes de alho ½ chávena de azeite 5 colheres de sopa de pinhões pimenta preta q.b. (moída na hora) sal q.b. INGREDIENTES 1 chávena de cogumelos secos 500g de massa tagliatelli (ou outra a gosto!) ¼ chávena de azeite 2 dentes de alho salsa q.b. sal q.b. pimenta preta (moída na hora) q.b. queijo ralado q.b. natas q.b. (optativo) PREPARAÇÃO Começar por re-hidratar os cogumelos secos (ver instruções); eliminar a humidade, limpando bem; aquecer levemente o azeite; juntar os cogumelos e saltear em lume forte; adicionar o alho picado e aquecer levemente; se necessário, adicionar um pouco da água que ficou da maceração dos cogumelos; deixar evaporar o líquido; juntar o sal e a pimenta; rectificar os temperos; retirar do lume e deixar arrefecer um pouco. Juntar os pinhões e triturar esta mistura num copo misturador. Esta pasta não deverá ficar homogénea. Conservar no frigorífico, coberta com uma fina película de azeite, em frascos bem rolhados. Esta receita dá dois frascos pequenos de pasta. ONDE UTILIZAR ESTA PASTA? Esta pasta pode servir de base, por exemplo, para a preparação de um risotto ou de outro prato à base de arroz, de um prato à base de massa ou de uma polenta. UM POUCO MAIS A técnica da pasta aqui apresentada é a mais simples. Pode, no entanto, ser modificada, se for preparada para utilizar no momento, juntando sempre o alho muito picadinho, só depois dos cogumelos salteados. Aliás, para que os salteados adquiram o seu carácter próprio, os elementos condimentadores (alho, ervas aromáticas) deverão ser acrescentados só nos últimos minutos da cozedura. É prática corrente misturar alho e cebola nos refogados. Sugerimos que não o faça, quando preparar uma pasta para guardar, porque os sabores se anulam. Deve utilizar ou um, ou outro. No entanto, se for utilizar a pasta na hora, poderá misturar o alho e a cebola. As pastas adequam-se a uma miríade de variantes, através dos condimentos que se podem adicionar. Depende do gosto. Da nossa experiência, esta pasta de cogumelos secos fica melhor sem ervas aromáticas secas e sem condimentos que ocultem a singularidade dos sabores e aromas dos cogumelos secos. No entanto, poderá ser aromatizada com ervas frescas aquando da sua utilização, como salsa, tomilho, salvia ou coentros, para finalizar o prato. PREPARAÇÃO DO MOLHO PARA A MASSA Caso não tenha já preparada uma pasta de cogumelos secos, comece por triturar grosseiramente os cogumelos secos, já rehidratados e escorridos; salteie no azeite, em lume vivo e juntar o alho picadinho e a salsa; adicionar um pouco de pimenta preta moída na hora, sal e a água da maceração dos cogumelos; voltar ao lume e evaporar um pouco; por fim, ligar tudo com as natas. Envolver a massa cozida al dente com o molho e polvilhar com queijo seco (de ovelha) ralado. A MASSA O ponto de cozedura da massa deverá ser al dente, para que sobressaia o sabor do molho. O essencial desta prática reside no facto de que uma massa cozida al dente, retém em si um nítido sabor a farinha cozida, que vai ressaltar os sabores do molho. Não se trata de uma moda, mas sim de uma subtileza que o conhecimento empírico foi apurando para proporcionar o máximo de resultados para o paladar, através de um mínimo de elementos. UM POUCO MAIS Na preparação do molho, se for para utilizar na hora, poderá utilizar também cebola picadinha e outras ervas aromáticas frescas em quantidades mínimas, para não mascarar o sabor dos cogumelos. Se quiser preparar uma grande quantidade, deverá ter o cuidado de o fazer por partes, salteando os cogumelos em lume forte e pouca quantidade de cada vez. 195 196 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES MASSA COM COGUMELOS SECOS POLENTA COM COGUMELOS SECOS INGREDIENTES 1 chávena de cogumelos secos 500g de massa tagliatelli (ou outra a gosto!) ¼ chávena de azeite 2 dentes de alho salsa q.b. sal q.b. pimenta preta (moída na hora) q.b. queijo ralado q.b. natas q.b. (optativo) INGREDIENTES 1 chávena de cogumelos secos 1 pacote de polenta ¼ chávena de azeite 2 dentes de alho 1 cebola média salsa q.b. sal q.b. queijo ralado q.b. pimenta preta (moída na hora) q.b. natas q.b. (optativo) PREPARAÇÃO DO MOLHO PARA A MASSA Caso não tenha já preparada uma pasta de cogumelos secos, comece por triturar grosseiramente os cogumelos secos, já rehidratados e escorridos; salteie no azeite, em lume vivo e juntar o alho picadinho e a salsa; adicionar um pouco de pimenta preta moída na hora, sal e a água da maceração dos cogumelos; voltar ao lume e evaporar um pouco; por fim, ligar tudo com as natas. Envolver a massa cozida al dente com o molho e polvilhar com queijo seco (de ovelha) ralado. A MASSA O ponto de cozedura da massa deverá ser al dente, para que sobressaia o sabor do molho. O essencial desta prática reside no facto de que uma massa cozida al dente, retém em si um nítido sabor a farinha cozida, que vai ressaltar os sabores do molho. Não se trata de uma moda, mas sim de uma subtileza que o conhecimento empírico foi apurando para proporcionar o máximo de resultados para o paladar, através de um mínimo de elementos. UM POUCO MAIS Na preparação do molho, se for para utilizar na hora, poderá utilizar também cebola picadinha e outras ervas aromáticas frescas em quantidades mínimas, para não mascarar o sabor dos cogumelos. Se quiser preparar uma grande quantidade, deverá ter o cuidado de o fazer por partes, salteando os cogumelos em lume forte e pouca quantidade de cada vez. PREPARAÇÃO Preparar a polenta, seguindo as instruções da embalagem. À parte estufar levemente a cebola e o alho no azeite; juntar os cogumelos secos, já rehidratados e triturados grosseiramente, e a água de maceração dos cogumelos; deixar evaporar um pouco; rectificar os temperos; por fim, juntar as natas e o queijo ralado; homogeneizar, misturando levemente com a polenta já cozida; decorar com o resto da salsa. UM POUCO MAIS Poderá igualmente enriquecer este prato, preparando a polenta com a água de maceração dos cogumelos, ou outro caldo adequado, por exemplo, de aves ou de legumes. Se preferir, poderá substituir a salsa, por folhas de orégãos frescos ou por tomilho, em quantidades ínfimas. Se já dispuser de pasta de cogumelos secos, a elaboração deste prato torna-se muito rápida. Neste caso, na preparação do molho, poderá utilizar cebola picadinha e ervas aromáticas frescas em quantidades mínimas, para não mascarar o sabor dos cogumelos. 197 198 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR RISOTTO DE COGUMELOS SECOS INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES TOMATE SECO INGREDIENTES 1 chávena de cogumelos secos (± 30 g) 2 chávenas de arroz ¼ chávena de azeite 2 dentes de alho 1 cebola média sal q.b. vinho branco q.b. 1 colher manteiga queijo ralado q.b. natas q.b. (optativo) PREPARAÇÃO Se não dispuser já de uma pasta de cogumelos secos, comece por saltear os cogumelos, bem escorridos e triturados grosseiramente, em metade do azeite; temperar de sal e juntar um pouco da água de maceração e deixar evaporar; juntar por fim o alho picadinho. À parte, fazer um refogado leve no resto do azeite com a cebola; juntar um pouco de vinho branco e deixar evaporar; acrescentar uma pequena quantidade da pasta preparada e o arroz, salteando-o levemente nesta mistura; temperar de sal; acrescentar um pouco de água quente (ou de caldo adequado); deixar evaporar; juntar então o resto do líquido, acrescentando também o resto dos cogumelos e homogeneizar, misturando levemente no fim; adicionar uma colher de manteiga, o queijo ralado e servir. UM POUCO MAIS Ter disponível a quantidade de caldo necessária (três vezes a quantidade de arroz). No caso dos cogumelos, pode ser água com o resto do líquido da maceração. Seguir a técnica de preparação do risotto, abaixo indicada. RISOTTO A técnica do risotto consiste em ir adicionando progressivamente água ou líquido aquecido ao arroz. Inicialmente, uma concha; deixar evaporar e mexer; juntar segunda vez, mexer e deixar evaporar; por fim, juntar o líquido restante, mexendo ligeiramente até chegar ao ponto. Envolver e polvilhar com queijo de ovelha seco, ralado na hora e servir. Se preferir, poderá ligar com natas ou com um pouco de queijo mozzarela e no fim polvilhar com queijo parmiggiano, ralado na hora. O tipo de arroz que utilizámos foi o carolino, salteando-o na mistura de azeite, aromatizado com a cebola nacarada, depois do vinho branco ter evaporado. Só depois é que se adiciona a calda, que deverá estar em ebulição. Os tipos de arroz mais adequados à preparação dos risottos são ricos em amido e muito absorventes, não perdem, portanto, a consistência. 199 ENVIAR FOTO O FICHEIRO NÃO ABRE Tomate seco À semelhança do que acontece com as ervas aromáticas condimentares e os cogumelos secos, o tomate seco é, actualmente, considerado um produto de excelência. A actual tendência da diversificação de sabores e de aromas gastronómicos, por parte dos consumidores, faz com que, em certos nichos de mercado, caracterizados pela procura de produtos de qualidade diferenciada, este produto seja muito apreciado. Quanto à sua importância do ponto de vista nutricional, importa referir a sua riqueza em nutrientes antioxidantes, destacando-se nestes o licopeno, tal como acontece com o tomate maduro, na época do Verão. O LICOPENO É um pigmento da família dos carotenóides, que dá a cor vermelha ao tomate e cujo poder antioxidante tem suscitado grande interesse. A sua principal fonte é o tomate, embora também exista noutros frutos, como, por exemplo, na papaia e na toranja-rosa. Em relação ao tomate, a actividade do licopeno é muito maior quando este é submetido à acção do calor e em presença de uma gordura monoinsaturada, como, por exemplo, o azeite. Assim sendo, os molhos de tomate e todas as preparações culinárias com tomate cozinhado são ainda mais benéficas do que o tomate em salada. Estudos epidemiológicos demonstraram que o risco de certos cancros e de doenças cardíacas é menor em pessoas com uma taxa de licopeno elevada no sangue. (Paule Neyrat, op. cit.) 200 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES Tradicionalmente, como vimos nos Capítulos III e IV, a técnica de secagem utilizada para conservar o tomate consistia em expô-lo à acção do sol, durante alguns dias. As melhores condições de secagem observavam-se nos dias em que ao calor se associava alguma ventilação, proveniente de ventos secos. Este processo permitia a utilização culinária do tomate durante um período de tempo mais longo, conservando riqueza nutricional idêntica à que tinha na época de Verão. Tratava-se de um procedimento empírico, destinado ao consumo familiar, que apelava a rituais diários, como os que descrevemos anteriormente. Transpondo esta técnica para a actualidade, para uma escala que vise a sua comercialização, o recurso a um secador, (vide Cap. III), proporciona maior segurança quanto ao produto final e reduz a mão-de-obra necessária. Este procedimento assegura uma boa qualidade, quanto à cor, à textura, ao sabor, e proporciona um período de conservação mais longo, tal como já foi referido. Como re-hidratar o tomate seco? Para ser utilizado, o tomate seco deve ser previamente re-hidratado em água quente durante 15 a 20 minutos. Escorre-se a água e enxuga-se bem o tomate, antes de iniciar qualquer preparação. Para facilidade de utilização posterior, poder-se-á simplesmente conservá-lo em azeite, aromatizado com alho e uma erva aromática seca, como, por exemplo, os orégãos. Neste caso, depois de abrir o frasco mantenha o resto do tomate sempre bem coberto de azeite. Frascos de tomate seco, conservado em azeite aromatizado com alho e orégão Tomate já seco numa fase intermédia da secagem Onde utilizar o tomate seco? O tomate seco adquiriu, nos últimos anos, grande notoriedade, sendo considerado pelos apreciadores um ex-libris da cozinha contemporânea. Com efeito, as transformações organolépticas que ocorrem durante o processo de secagem, articulando o efeito do calor, do ar e do sal, com o tempo de secagem, conferem ao tomate aromas balsâmicos e sabores totalmente diferentes daqueles que estão associados ao tomate fresco, diversificando substancialmente as suas utilizações culinárias. Antes de ser utilizado, o tomate seco precisa de ser re-hidratado. O tomate seco utiliza-se, como qualquer outro tomate, para confeccionar as mais diversas preparações culinárias. A partir deste produto é possível elaborar uma infinidade de hors-d`oeuvres, de petiscos ou de pratos à base de massas ou à base de arroz. Nestes últimos casos, deve ter-se o cuidado de o utilizar em quantidades reduzidas e de não o deixar cozinhar muito, para manter os aromas. Para a sua utilização culinária, apresentamos algumas sugestões de receitas. 201 202 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES PASTA DE TOMATE SECO ARROZ DE TOMATE SECO INGREDIENTES 2 chávenas de tomate seco 5 dentes de alho ½ chávena de azeite ervas aromáticas secas, a gosto 5 colheres de sopa de queijo ralado (queijo seco de ovelha ou parmesão) 5 colheres de sopa de pinhões levemente torrados vinagre balsâmico (optativo) sal q.b. INGREDIENTES 1 chávena de tomate seco 2 chávenas de arroz ¼ chávena de azeite 2 dentes de alho 1 cebola média coentros q.b. sal q.b. vinho branco q.b. queijo ralado q.b. PREPARAÇÃO Começar por re-hidratar o tomate seco; eliminar toda a humidade limpando bem. Triturar juntamente com o alho, o queijo, os pinhões e um pouco de azeite; juntar um pouco mais de azeite e as ervas aromáticas secas, homogeneizando bem. Cobrir a pasta com uma película de azeite e conservar no frigorífico em frascos bem esterilizados. Quanto ao sal, deverá ter em atenção que o tomate seco, mesmo depois de re-hidratado, ainda pode ter bastante sal. No entanto, como a função desta pasta é a de tempero, o sabor ficará diluído, quando se for utilizar. Relativamente ao alho, poderá ir rectificando a gosto, à medida que for repetindo esta preparação e utilizar maior ou menor quantidade do que aquela que sugerimos. ONDE UTILIZAR A PASTA DE TOMATE SECO? Esta pasta tem múltiplas utilizações, podendo servir de base para confeccionar as receitas que temos vindo a referir (risottos, massas e polenta). Deverá ter o cuidado de a diluir num pouco de água quente, tal como os pisos, e juntar sobretudo no fim da cozedura, depois do prato quase pronto, para não alterar os aromas. É também indicada para temperar queijo fresco e/ou requeijão, para barrar canapés, sanduíches, etc. UM POUCO MAIS Para conservar esta pasta durante um período de tempo mais longo, deverá proceder ao seu tratamento térmico em frascos bem fechados, seguindo o processo anteriormente indicado (vide Cap. III) para o tomate seco conservado em azeite. PREPARAÇÃO Caso não tenha já preparada uma pasta de tomate seco, comece por elaborá-la (vide página anterior), utilizando apenas metade da quantidade do tomate seco. Estufar levemente a cebola no azeite; juntar um pouco de água ou de vinho branco; deixar evaporar e acrescentar um pouco da pasta de tomate, deixando uniformizar ao lume, sem refogar; juntar a água necessária e, quando levantar fervura, acrescentar o arroz; temperar de sal; quase no fim, juntar o resto da pasta (diluída previamente num pouco de água quente) e do tomate seco previamente rehidratado, cortado em pedaços; adicionar o queijo; homogeneizar, misturando levemente, e decorar com o resto do tomate seco e os coentros. Este prato deve ficar tipo arroz malandrinho. UM POUCO MAIS Poderá igualmente enriquecer este prato, juntando-lhe, quase no fim, legumes aos cubos, salteados. Se preferir, poderá substituir os coentros por salsa, por folhas de orégãos frescos ou por tomilho. Neste último caso, utilizar com muita parcimónia. Se já dispuser de pasta de tomate seco e do tomate conservado em azeite, a elaboração deste prato torna-se muito rápida. Poderá prescindir do tomate seco para a decoração, mas não das ervas aromáticas frescas. Experimentámos este prato usando os procedimentos localmente utilizados para o arroz de marisco. O tipo de arroz utilizado foi o carolino. Se tiver dificuldade em obter um arroz adequado, salteie o arroz de que dispuser, à parte, com um pouco de azeite aromatizado com alho e só depois é que o adiciona à calda, que deverá estar em ebulição. Com estes mesmos ingredientes, poderá preparar um risotto (vide p. 195). 203 204 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES MASSA COM MOLHO DE TOMATE SECO FEIJÃO DE AZEITE COM TOMATE SECO INGREDIENTES 1 chávena de tomate seco ( ou pasta de tomate seco) 500 g de massa fusilli ou penne (ou qualquer outra massa curta) ¼ chávena de azeite 2 dentes de alho coentros (e/ou ervas aromáticas a gosto) sal q.b. queijo ralado q.b. INGREDIENTES 1 chávena de tomate seco 500 g de feijão encarnado cozido ¼ de chávena (0,6 dl) de azeite 1 cebola média 1 dente de alho ½ colher de chá de tomilho ½ colher de chá de colorau (ou um tomate maduro esmagado) 1 colher de sopa de coentros picados 1 pitada de noz-moscada (optativo) sal q.b. farinha q.b. vinagre q.b. PREPARAÇÃO DO MOLHO PARA A MASSA Caso não tenha já preparada uma pasta de tomate seco, comece por elaborá-la (ver técnica de preparação na p. 199), utilizando apenas metade da quantidade do tomate seco; depois aquecer o azeite e juntar a pasta, deixando-a apenas aquecer; retirar do lume e juntar a outra metade do tomate seco re-hidratado e que foi previamente cortada em pedaços pequenos; adicionar um pouco de pimenta preta e rectificar os temperos; se o molho ficar demasiado espesso, deverá juntar um pouco da água de cozedura da massa e homogeneizar; envolver a massa cozida al dente com o molho; se quiser, pode adicionar um pouco de legumes verdes salteados; por fim, polvilhar com coentros e queijo seco (de ovelha) ralado e servir. UM POUCO MAIS Sobre o ponto de cozedura da massa al dente, consultar a receita de Massa com cogumelos secos (p. 193). Para diversificar e/ou enriquecer este prato, consultar a receita Arroz de tomate seco, que se encontra na página anterior. PREPARAÇÃO Preparar um refogado leve com cebola, alho e azeite, juntando uma pitada de colorau, uma folha de louro; quando a cebola estiver translúcida, acrescentar o feijão previamente cozido; temperar com noz-moscada, coentros e tomilho; deixar estufar e rectificar os temperos; quase no fim, retirar um pouco de caldo, deixar arrefecer e diluir uma colher de farinha, com um pouco de vinagre, numa tigela, e juntar ao preparado; adicionar o tomate seco e deixar apurar. Finalizar o prato com o resto dos coentros e acompanhar com arroz branco. UM POUCO MAIS As receitas tradicionais de feijão de azeite incluem abóbora aos cubos pequenos e, nalguns casos, também batata aos cubos; quanto às ervas aromáticas, utiliza-se um pouco de coentros ou de poejos no refogado. Poderá substituir os coentros e o tomilho por manjericão e orégãos. Neste caso, deverá utilizar cominhos em vez de noz-moscada. As proporções são idênticas às da receita acima indicada. Poderá escalfar ovos para enriquecer o prato, tal como no feijão adubado (vide IV Cap.). Se preferir, poderá utilizar feijão branco em vez de feijão encarnado. Este prato poderá ser servido sobre pão fatiado, dispensando assim o acompanhamento. Neste caso, deverá ficar com bastante mais caldo do que na versão acima indicada. Nesta receita, combinámos a técnica do tradicional feijão adubado, que utiliza o procedimento dos limados (vide IV Cap.) com a do feijão de azeite. 205 206 TRADIÇÃO E INOVAÇÃO ALIMENTAR INOVAÇÃO ALIMENTAR A PARTIR DAS TRADIÇÕES BOLA COM PISO, TOMATE SECO E COGUMELOS SECOS INGREDIENTES 250 g de farinha 3 ovos 1,5 dl de leite 1,0 dl de azeite levedura q.b. sal q.b. 1 colher de chá de tomilho gordura para barrar a forma Recheio piso q.b. tomate seco q.b. cogumelos secos q.b. BIBLIOGRAFIA LEADER (1997), Cadernos do Observatório Europeu, n.º 2, Leader. NEYRAT, Paule (2000), Les Vertus des Aliments, Paris, Éditions SOLAR. TORRADO, Llorenç (2000), A Dieta Mediterrânica Conselhos, receitas e princípios práticos para a sua saúde diária, Lisboa, Ed. Temas e Debates. A nossa bola PREPARAÇÃO Juntar a farinha, o sal e a levedura; adicionar os ovos um a um, misturando levemente. Juntar progressivamente o azeite, o leite e o tomilho, obtendo uma massa uniforme. Deitar um terço desta massa numa forma de bolo inglês previamente barrada e polvilhada de farinha. Sobre esta camada colocar um pouco de piso, tomate seco re-hidratado, cortado aos pedaços, e os cogumelos secos igualmente re-hidratados e picados grosseiramente. Voltar a deitar outra camada de massa e dos ingredientes do recheio. Terminar com uma camada de massa. Se gostar, poderá salpicar com pinhões. Vai ao forno a 210º C, durante 35-40 minutos. UM POUCO MAIS Esta bola adequa-se a múltiplas ocasiões de consumo. Por exemplo pode substituir, com vantagem, os conhecidos aperitivos. Com estes mesmos ingredientes e um pouco mais ou um pouco menos, poderá confeccionar pataniscas. Parte-se do princípio que as sabe fazer. Basta adaptar a sua receita, substituindo o bacalhau desfiado pelo tomate seco rehidratado e cortadinho e/ou os cogumelos rehidratados e/ou o piso. Quando utilizar o piso, prescinda da salsa e da cebola. W. WILLETT, F. SACKS, A. TRICHOPOULOUS, G. DRESCHER, A. FERRO-LUZZI, E. HELSING et D. TRICHOUPOULOS (1995), Mediterranean diet pyramid: a cultural model for healthy eating, in Supplement to The American Journal Of Clinical Nutrition, Mediterranean diets: science and policy implications, vol. 61, number 6 (S), June 1995, pp. 1402-1406. 207