A MÍDIA E SUA INFLUÊNCIA NAS BRINCADEIRAS DAS CRIANÇAS. Erika Milena de Souza INTRODUÇÃO n Um dos problemas causados pelo aumento do processo de urbanização é a falta de segurança, o qual limitou os espaços de recreação das crianças alterando, assim, a sua rotina de brincadeira. n Desta maneira, a criança teve que adaptar-se a brincar em espaços fechados e reduzidos, sempre sob supervisão de adultos. n De acordo com Rua (2007), os indivíduos não nascem membro da sociedade, tornam-se membros dela sociedade ao estabelecerem relações de entendimento, ao compartilharem vivências, experiências, motivações, afetos. A identidade pessoal e social é resultado de processos de interação social em que os valores, as normas, as tradições do mundo social objetivo em vivem são interiorizados pelos sujeitos, não através de processos lineares resumíveis à mera transmissão e reprodução cultural, mas por meio de processos complexos, que desencadeiam dinâmicas de recriação e transformação cultural. n Assim, as brincadeiras apresentam-se como um mecanismos de interação com os pares, sendo essenciais para a socialização das crianças. Além disso, por meio das brincadeiras a criança descobre o mundo pela ação, percepção, sentidos, liberdade, criatividade, liberdade, responsabilidade, consciência corporal e noções de corpo e espaço. n Entretanto, é crescente a substituição das brincadeiras pelo entreterimento televisivo, tendo esse meio de comunicação grande importância no cotidiano das crianças. Portanto, paulatinamente, esse eletro doméstico passou a competir com os espaços lúdicos de brincadeira, sendo que, para muitas crianças é a única fonte de entreterimento. n Nesse sentido, é importante refletir sobre a influência dos meios de comunicação sobre a vida das criança e o seu desenvolvimento psicológico, bem como a influência sobre as suas emoções, sonhos e informações que afetam de forma, positiva ou negativa, o desenvolvimento infantil. n O objetivo da pesquisa foi examinar as relações que as crianças estabelecem em suas brincadeiras com o conteúdo televisivo que assistem, seja este especificamente ou não destinado à elas, pois sabese que as crianças são assíduas expectadoras da TV Metodologia n Os dados foram coletados através das narrativas, observações, desenhos de crianças e leitura de imagem, orientando-se como uma pesquisa qualitativa (Figura 01 e 02). n Participaram desse estudo 03 crianças de 03 anos de idade, residentes na Rua Santo André – Vila Rubim/Vitória-ES. n Essas crianças brincam nesse espaço com constância. Entretanto, o uso da televisão como artefato de brincadeira é significativo. Figura 01: FIGURA 02 RESULTADO E DISCUSSÃO n n A imagem utilizada foi a reprodução da obra Coab-Santos DumontVila Velha/ES da artista plástica Ângela Gomes (figura 03). O uso dessa imagem teve como objetivo propiciar uma discussão sobre o significado da rua para esse grupo de crianças. Curiosamente, nos relatos dessas crianças sobre as brincadeiras realizadas na rua sempre existiam referência a personagens de desenhos televisivos. Narrativa de Mateus (4 anos). Dia 25/03/2009. “Quando vou na rua gosto muito de brincar de Speed Racer. [....] Essa brincadeira é assim, eu corro na frente e Murilo e Pedro correm atrás de mim.” Mateus – “Gosto de brincar de Speed Racer porque ele sempre vence a corrida. Nunca perde, os outros corredores sim.” Mateus não brinca de pega pega, mas de Speed Racer. Assim, em seu relato ele incorpora um personagem televisivo, salientando o sucesso que o personagem tem na televisão (figura 04). Figura03: Coab – Santos Dumont – Vila Velha/ES. Ângela Gomes. Acrílica sobre tela FIGURA 04: Desenho de Mateus. De acordo com o autor nessa rua ele gosta de brincar de Speed Raccer . Existe a representação dele, de Murilo e Pedro. n Assim, valores como a competição exacerbada e estar sempre em primeiro lugar são apresentados com grande relevância nesse desenho televisivo. Diante do exposto podemos inferir que, a televisão não influencia o ato de brincar, e sim, a maneira de pensar e agir. n Nas brincadeiras de corrida realizadas pelas crianças, constantemente elas se utilizam de artefatos do personagem Ben 10 para se organizarem. Além disso, o uso de roupas e outros objetos de uso pessoal com esse personagem estampado é rotineiro nestas crianças. n Durante conversas entre Murilo, Pedro e Mateus, o primeiro questiona os outros sobre o seu vestuário novo. Murilo - Vocês tem a sandália do Ben 10 ? [...] Minha mãe comprou para mim, ontem. [...] Sabe eu tenho a sandália do Ben 10, a camisa do Ben 10, a bermuda do Ben 10 e o boné do Ben 10. E vocês ? Pedro – Eu tenho isso tudinho. Ganhei de aniversário “onti”. Murilo – Mas eu tenho mais do que você, porque eu tenho o relógio, e você não tem. Pedro - Mas minha mãe vai comprar, tá!Você vai ver, amanhã eu vou ter um. n Percebemos que a televisão exerce grande influência nas representações dessas crianças, além de ser utilizada como fonte de lazer, ela algumas vezes apresenta-se como exemplo a ser copiado. n Lisboa e Pires (2004) citado por Souza e Cardoso (2008), vêem isto, como uma questão do mundo capitalista, que a TV além de passar seus programas, oferece ao povo uma grande variedade de produtos lindos a serem usufruídos, sendo chamado de indústria cultural, que fornece bens de consumo a cada seguimento social, ou seja, esses bens de consumo são feitos para todo tipo de pessoa, utilizando a mídia como uma grande vitrine para esses produtos. n Pedro ao desenhar a brincadeira que gosta de realizar com seus amigos, apresenta 03 ilustrações as quais denomina Tom (ele), Jerry (Murilo) e o cão (Mateus). Todos brincando de modo harmonioso, atrás desse desenho há três representações de porta, a qual ele esclareceu com sendo as portas das casas deles (figura 03). n O desenho representado por Pedro possui como personagem um gato (Tom), um rato (Jerry) e um cão (Sam). Constantemente, esses personagens travam perseguições, onde Tom persegue Jerry, esse utiliza-se de artimanhas para se defender de Tom, além disso Sam constantemente tenta proteger Jerry de Tom. Ressaltamos que, em pouco episódios esses personagens apresentam-se de modo harmonioso (figura 05). San (Mateus) Tom (Pedro) Figura 05: Representação de Pedro sobre sua brincadeira na rua. Jerry (Murilo) n Embora Pedro seja receptivo as mensagens veiculadas pela TV, ele as recria conforme a sua experiência em um processo de troca de conhecimentos. Portanto, ele incorpora o que vê e ouve de maneira criativa, retirando o que lhe interessa naquele momento (Figura 06). Pedro: Aqui também é eu, Murilo e Matheus, aqui está a estelinha que caiu do céu no lago. Pesquisadora: Mas, que estrelinha é essa Pedro ? Pedro: A estrelinha da história que a tia contou na escola, hoje. Você não sabe de nada mesmo, hein ! Figura 06: Desenho de Pedro, representação de Tom (ele), Jerry (Murilo) e San (Mateus) juntamente com a estrelinha que caiu do céu. n Para Vygotsky (2007) a linguagem é um signo por meio do qual as crianças se socializam, ela também desempenha um papel importante facilitando a formação de conceitos. n Ao analisarmos a linguagem de alguns desenhos animados, verificamos que, corriqueiramente, palavras como vencer, ação, força são difundidas. Além disso, ações que representam esses mesmos valores são muito presentes. n Assim, a mídia participa da constituição de sujeitos e subjetividades na medida em que produz imagens e significações, enfim, saberes que de alguma maneira se dirigem à "educação“ das pessoas, ensinando-lhes modos de ser e estar na sociedade em que vivem. CONCLUSÃO n Percebe-se que, a TV tem influenciado o lúdico das crianças, não de um modo em que os elementos sejam diretamente apropriados por elas e reproduzidos em seu cotidiano, mas formando mentes consumidoras de ideologias, as quais se perpetuarão nesses futuros adultos. n Assim, é fundamental refletir sobre a influência dos meios de comunicação sobre a vida da criança, sobre o seu desenvolvimento psicológico, bem como a influência sobre as suas emoções, sonhos e informações que afetam de forma, positiva ou negativa, o desenvolvimento infantil. n Além disso, é necessário refletir a importância da família e da escola como instituições educativas, onde a criança possa entender os significados dessas ideologia, e ultrapasse o nível da consciência ingênua e atinjir o nível da consciência crítica BIBLIOGRAFIA n COELHO, Glaucilene do Nascimento. Brincadeiras na favela: A constituição da infância nas interações com o ambiente. In: VASCONCELLOS, Vera Maria Ramos; SARMENTO, Manuel Jacinto (orgs). Infância (in) visível. São Paulo. Junqueira e Marin editores, 2007. 173-203. n RUA, Maria Adelaide. Infância em territórios de pobreza: os fales e sentires das crianças. In: VASCONCELLOS, Vera Maria Ramos; SARMENTO, Manuel Jacinto (orgs). Infância (in) visível. São Paulo. Junqueira e Marin editores, 2007. 173-203. n SOUZA, Thiago Cardoso de Souza; CARDOSO, Ana Lúcia. A influência da mídia televisiva no movimenta-se das crianças em tempo livre na escola. http://www.cds.ufsc.br/pet/SEF2008/anais/trabalhos/orais/thiago.pd f. Acesso: 30/03/2009. n Vigotsky, L.S. A formação social da mente. 7ª edição.São Paulo: Martins Fontes, 2007.