Quem são mais Favoráveis às Concessões Oferecidas por Práticas
Organizacionais em prol da Diversidade: os Homens ou as Mulheres?
Autoria: Jamille Barbosa Cavalcanti Pereira, Darcy Mitiko Mori Hanashiro
RESUMO
O artigo objetivou analisar o posicionamento dos homens e das mulheres em relação às
crenças sobre concessões oferecidas por práticas organizacionais em prol da diversidade. Tais
crenças foram sistematizadas e categorizadas em quatro dimensões: justiça social, obtenção de
ganhos, discriminação reversa e estigma. Para isso, foi construído e validado um instrumento,
tendo como referência as escalas de atitudes de Eddy e Burky (2004); Davis e Smith (2003);
Tougas e Veilleux (1991); Beaton e Tougas (2001) e os estudos de Heilman, Block e Stathatos
(1997), além de uma pesquisa qualitativa. A amostra foi composta por grupos de 117 homens e
295 mulheres representantes de duas empresas privadas provenientes de filiais presentes em 18
cidades das cinco regiões do país. Os resultados confirmaram a hipótese de que, sob a perspectiva
da justiça social, os homens são mais favoráveis às concessões oferecidas por práticas
organizacionais em prol da diversidade do que as mulheres. No entanto, esses mesmos resultados
não confirmaram as demais hipóteses de que homens ou mulheres sejam mais ou menos
favoráveis a essas concessões diante das crenças voltadas para a obtenção de ganhos, a
discriminação reversa ou o estigma. A parcialidade foi imperativa, muito embora, numa visão
mais especifica dos que compõem esses grupos, perceba-se que as mulheres com deficiência e
homens negros tenham apresentado atitudes mais favoráveis a essas concessões do que os demais
grupos. A partir desse estudo, entende-se que futuras investigações sobre as especificidades de
gênero e sobre as crenças subjacentes às atitudes diante de concessões oferecidas a diversidade
sejam necessárias para compreender as razões pelas quais três das hipóteses elaboradas a partir de
uma construção teórica não foram confirmadas.
Introdução
A diversidade da força de trabalho está se tornando cada vez mais evidente no mundo, no
entanto, essa expansão vem sendo vislumbrada como um dos desafios globais mais importantes
para os líderes organizacionais (MOR BARAK, 2005). Por um lado há dilemas sobre que modelo
de gestão adotar para que essa diversidade alcance efetividade nas organizações (BOND e PYLE,
1998). Por outro, há uma dificuldade de conseguir adesão dos indivíduos às práticas formais ou
informais que criam oportunidades aos diferentes grupos sociais subrepresentados nas
organizações, mesmo entre os que possam se beneficiar por elas (KIDDER et al., 2004;
RICHARD e KIRBY 1997; KELLEY e MICHELA, 1980).
Em meio a esses desafios, esse artigo se propõe a apresentar um estudo sobre as
diferenças de atitudes diante de práticas organizacionais, formais e informais, que criam
concessões (oportunidades, condições e/ou benefícios) em prol da diversidade considerando-se a
dimensão de gênero. Em um primeiro momento apresenta-se um modelo teórico que contempla
essas atitudes sob duas dimensões: 1) a das atitudes favoráveis (de aceitação) e atitudes
desfavoráveis (de rejeição) como tendências psicológicas avaliativas; e 2) a dos sujeitos dessa
aceitação ou rejeição considerando-se as dimensões de gênero (homens e mulheres). Em um
segundo momento, revelam-se dados empíricos sobre a predominância e as diferenças dessas
atitudes em um contexto organizacional brasileiro, bem como, as diferenças das mesmas, ao
considerar a dimensão de gênero associada às de raça e de ser ou não pessoa com deficiência.
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O Conceito de Diversidade e as Teorias de Base
Os estudos de diversidade na literatura encontram-se dispersos e sob diferentes teorias de
base. Adotando o conceito de diversidade de Cox (1994, p.6) como sendo uma “representação,
em um sistema social, de pessoas com diferentes identidades grupais que têm significações
culturais distintas”, fica claro a noção de identidade grupal como aspecto central nesse conceito.
A identificação física e cultural com um determinado grupo social significa a consequente não
identificação com outros grupos.
O contato intergrupal pode ser entendido como “qualquer aspecto da interação humana
que envolve indivíduos percebendo a si mesmos como membro de uma categoria social ou sendo
percebido por outros como pertencentes a uma categoria social”(TAYLOR e MOGHADDAN,
1994, p.6). Esse estudo adota como base teórica algumas teorias de relações intergrupais como a
da identidade social (TAJFEL, 1982), a Teoria da Privação Relativa de STOUFFER,
SUCHMAN, DEVINNEY, STAR e WILLIAMS (1949) e a Teoria do Conflito Realístico
(SHERIF, 1966).
A idéia básica da teoria da identidade social é que a categoria social na qual um indivíduo
percebe pertencer (grupo de trabalho, time de futebol, escola, etc.) provê uma definição de quem
a pessoa é em termos de definir características da categoria – uma auto-definição, que é parte do
auto-conceito. (HOGG; TERRY, 2001, p.3). Teoria da Privação Relativa, por sua vez, procura
explicar como os membros de grupos em desvantagem podem agir para melhorar sua situação,
comparação de uma pessoa com membros de outro grupo de identidade, resultando num
sentimento de relativa privação, das vantagens em poder social que o outro grupo possui
(TORRES; PÉREZ-NEBRA, 2004). A Teoria do Conflito Realístico é uma teoria econômica que
assume que as pessoas atuam na busca de seu auto-interesse e que o conflito é causado pelas
pessoas direcionando-se para maximizar suas próprias recompensas ou de seu grupo em
detrimento os interesses de outros grupos (SHERIF, 1966).
O Significado de Atitudes
O termo atitude é amplamente utilizado tanto na sociologia (THOMAS e ZNANIECKI,
1920) quanto na psicologia (ALLPORT, 1935; ROCKEACH, 1969; EAGLY e CHAIKEN, 1993)
para indicar a orientação seletiva e ativa do homem em face de uma situação ou de um problema
qualquer (ABBAGNANO, 1982). Quando se diz que uma pessoa tomou uma atitude se entende
que ela adotou uma determinada posição que não é neutra, ela utilizou-se de um julgamento
avaliativo sobre algo, sobre alguma coisa ou sobre alguém. Esse julgamento pode ser favorável
ou desfavorável, de fraca ou forte intensidade, ativado de imediato da memória ou de forma
remota (LIMA, 2004).
Eagly e Chaiken (1993) consagraram a definição do termo atitude como sendo um
construto hipotético e não diretamente observável. Para esses autores, a atitude trata-se de uma
variável latente explicativa da relação entre a situação em que as pessoas se encontram e o seu
comportamento. Trata-se ainda de uma inferência sobre os processos psicológicos internos de um
individuo feita a partir da observação dos seus comportamentos (verbais ou outros) ou de
simplesmente uma tendência psicológica. Por tendência psicológica entende-se um estado interior
(LIMA, 2004). Dessa perspectiva, entende-se que as atitudes são construtos que só podem ser
conhecidos quando manifestos.
2
As manifestações das atitudes dos indivíduos ocorrem por meio de três respostas
avaliativas psicológicas: a cognitiva, a afetiva e a comportamental, que podem agir sozinhas ou
pela combinação entre elas. Nesse artigo as atitudes referenciadas correspondem às cognitivas.
Diz-se que um indivíduo adota uma atitude com base cognitiva quando ele se justifica por meio
de uma apreciação do objeto, baseado em pensamentos, em idéias, em opiniões e em crenças
sobre o mesmo (ARONSON, 2002).
As Atitudes Diante das Práticas Organizacionais em Prol da Diversidade
Na literatura é possível localizar estudos sobre atitudes cognitivas diante das práticas
organizacionais, formais e informais, que criam concessões em prol da diversidade, no entanto,
eles encontram-se dispersos. A identificação de alguns deles gerou um trabalho de sistematizar e
categorizar as atitudes favoráveis e desfavoráveis às concessões oferecidas por práticas
organizacionais em prol da diversidade sob quatro categorias diferentes de crenças e relacioná-las
aos sujeitos dessas atitudes considerando-se a dimensão de gênero. O Quadro I apresenta uma
proposta de modelo.
Sujeitos sob a dimensão de gênero: homens e mulheres
Quadrante I
Atitudes
favoráveis
Atitudes
Desfavoráveis
Aceitação das concessões oferecidas à
diversidade com base na crença na justiça
social.
Quadrante III
Rejeição das concessões oferecidas à
diversidade com base na crença de que
essas concessões geram discriminação
reversa.
Quadrante II
Aceitação das concessões oferecidas à
diversidade com base na crença na
obtenção de ganhos.
Quadrante IV
Rejeição das concessões oferecidas à
diversidade com base na crença de que
essas concessões geram estigma.
Quadro I – Atitudes diante de práticas de diversidade sob a dimensão de gênero.
a) Atitudes favoráveis com base na crença na justiça social
As atitudes favoráveis de um indivíduo sob essa perspectiva são endossadas por crenças
de que há certos grupos sociais de indivíduos que são mais vulneráveis a serem excluídos que
outros (LIND e TYLER, 1988), e, portanto, esses grupos devem ser privilegiados ou favorecidos
de acordo com os recursos que têm (BEATON e TOUGAS, 2001).
As atitudes com base no escopo da justiça social são justificadas pela Teoria de
Dominância Social que ressalta a existência de uma hierarquia de importância dos grupos sociais
nas comunidades em que vivem. Ao se orientarem por essa abordagem os indivíduos crêem não
haver uma igualdade de oportunidades entre os grupos sociais e, por isso, acabam preferindo os
que estão na base da hierarquia (SINADIUS e PRATTO, 1993). Essas atitudes se encontram
representadas no quadrante I do modelo proposto.
Quando operacionalizada nesse estudo empírico, a variável atitude sob a dimensão de
aceitação com base na justiça social contemplou a crença de que o grupo de homens da amostra é
favorável às concessões oferecidas por práticas organizacionais em prol das mulheres, tendo em
vista dados que revelam a existência de diferenças de oportunidades de desenvolvimento
profissional com base no gênero.
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No Brasil, as diferenças de oportunidades entre os grupos de homens e mulheres são
apresentadas no Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça (2008), um estudo realizado entre
1993 e 2007 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA em parceira com a Secretaria
Especial de Políticas para as Mulheres- SPM e com o Fundo de Desenvolvimento das Nações
Unidas para a Mulher – UNIFEM. Nesse trabalho é possível identificar essas diferenças em pelo
menos cinco temáticas, a saber:
a) Homens e mulheres apresentam características bem distintas na entrada e permanência no
mercado de trabalho. As jovens de 16 a 17 anos apresentam taxas de ocupação
significativamente menores em relação às mulheres de outras faixas etárias. Em 2007,
somente 69,4% daquelas jovens estavam ocupadas, comparadas a 81,1% dos jovens do sexo
masculino.
b) Apesar de ter havido um aumento na proporção de trabalhadores com carteira assinada, que
pode ser percebido em todos os grupos, as mulheres seguem mais representadas no trabalho
doméstico, na produção para próprio consumo e no trabalho não remunerado, enquanto os
homens ocupam mais postos com carteira de trabalho assinada e de empregador. Por um lado,
elas apresentam as mais altas proporções no trabalho doméstico (21,4%) e na posição de
produção para próprio consumo e trabalho não remunerado (15,4%); e, por outro, as menores
proporções de trabalho com carteira assinada (23,3%) e de empregador (1,2%), ocupando,
assim, como confirmam os dados de renda, a pior posição na escala social.
c) As mulheres e os negros apresentam os maiores níveis de desemprego, sendo as mulheres
negras as que se encontram em situação mais precarizada: estas apresentaram uma taxa de
desemprego de 12,4% em 2007, comparada a 9,4% para as mulheres brancas, 6,7% para os
homens negros e 5,5% para os homens brancos.
d) Em 2007, enquanto as mulheres brancas ganhavam, em média, 62,3% do que ganhavam
homens brancos, as mulheres negras ganhavam 67% do que recebiam os homens do mesmo
grupo racial e apenas 34% do rendimento médio de homens brancos. De fato, somente entre
1996 e 2007, as desigualdades de renda entre homens e mulheres se reduziram em cerca de
10%.
e) Enquanto, em 2007, 89,9% das mulheres com 16 anos ou mais anos de idade afirmavam
cuidar de afazeres domésticos, somente 50,7% dos homens o faziam. Estas diferenças são
reproduzidas nas áreas urbanas e nas áreas rurais, em todas as regiões do país. Em 2007 a
média de horas de atividades domésticas era de 30,9 para as mulheres e 11,2 para os homens.
Segundo o IPEA (2008) serão necessários 87 anos para igualar salários em torno dos
mesmos. Em 2007, a desigualdade entre homens e mulheres subiu para mais 75%. Uma pesquisa
anterior chamada “Visão do Desenvolvimento”, divulgada em 2006, pelo Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), observou que, embora as mulheres estejam
cada vez ganhando mais espaço no mercado de trabalho, a remuneração delas ainda é
comparativamente inferior à que recebem os homens nos postos com o mesmo grau de
qualificação.
Sob a constatação das diferenças de oportunidades profissionais oferecidas aos grupos de
homens e mulheres no país acredita-se que, sob a luz de crenças baseadas na justiça social, as
atitudes dos homens que compõem a amostra sejam mais favoráveis às concessões oferecidas por
práticas de diversidade do que o grupo de mulheres. Por meio dessa perspectiva operacionaliza-se
a primeira hipótese desse trabalho.
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H1: Sob a perspectiva da justiça social o grupo de homens é mais favorável às
concessões oferecidas por práticas organizacionais em prol da diversidade do que o
grupo de mulheres.
b) Atitudes de aceitação com base na obtenção de ganhos
Estudos têm arguido que as atitudes de aceitação das práticas em prol da diversidade
(especialmente as ações afirmativas) são baseadas na Teoria da Privação Relativa, segundo a qual
as pessoas sentem-se descontentes quando comparam suas posições com a de outros similares e
descobrem que elas têm menos do que elas merecem (RUNCIMAN, 1966). Esse autor ressalta
que há quatro pré-condições para a privação relativa: a pessoa não ter algo; a pessoa saber que
outra pessoa tem esse algo; a pessoa querer ter esse algo e a pessoa acreditar que obter esse algo é
real.
Segundo Runciman (1966) há dois tipos de privação relativa: a egoísta, baseada no
auto-interesse (causada pela não favorabilidade da posição social do indivíduo quando
comparado com outro, ou de membros de um grupo em relação a membros de outro grupo) e a
fraterna ou coletiva (causada pela não favorabilidade de um grupo quando comparado com outro
em maior vantagem).
A teoria de privação relativa baseada no auto-interesse costuma ser utilizada na literatura
para justificar a atitude de aceitação das práticas de diversidade por parte dos indivíduos não
beneficiados pelas mesmas (TOUGAS et al. 1991). Isso porque, um indivíduo que desenvolve
uma atitude com base no auto-interesse tenta maximizar ganhos e prevenir perdas.
Veilleux e Tougas (1989) ressaltam que reações de interesse dos indivíduos às práticas de
diversidade emanam mais dos interesses de grupos e das posições desses na sociedade do que de
preocupações pessoais, particulares. Segundo Tougas et al. (1991) as relações intergrupais
promovem estratégias para melhorar a situação coletiva dos membros de grupos sociais que estão
em desvantagem.
Em síntese, os indivíduos supostamente designados pelas práticas de diversidade
demonstram atitudes favoráveis com base na obtenção de ganhos por meio da adesão ao interesse
coletivo. Esses pressupostos caracterizam o Quadrante II do modelo proposto.
Quando operacionalizada no estudo empírico, a variável atitude sob a dimensão de
aceitação com base na obtenção de ganhos contemplou a crença de que o grupo de mulheres
apóia a obtenção de ganhos oferecida pelas organizações para compensar as oportunidades não
recebidas ou condições injustas vis à vis o grupo majoritário.
A partir dos dados da pesquisa sobre o perfil de raça realizada do Instituto Ethos (2007)
infere-se a existência de grande desigualdade entre as oportunidades de contratação e de
desenvolvimento de carreira de homens e mulheres nas quinhentas maiores empresas no Brasil.
Constatou-se que a participação feminina no quadro executivo é de apenas 11,5% e de 24,6% no
quadro gerencial. E mesmo nos níveis de supervisão e operacional a taxa de representação das
mesmas de 35% e 37% ainda é pequena, se considerarmos que as mulheres são maioria entre os
brasileiros (55%) que conseguiram atingir pelo menos 11 anos de estudos.
Os resultados anteriormente apresentados, acrescidos dos dados do Retrato das
Desigualdades de Gênero e Raça (IPEA, SPM e UNIFEM, 2008), reforçam os pressupostos da
Teoria de Privação Relativa baseada no auto-interesse, com base na qual se fundamenta a
segunda hipótese desse trabalho.
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H2: Sob a perspectiva da obtenção de ganhos o grupo de mulheres é mais favorável às
concessões oferecidas por práticas organizacionais do que o grupo de homens.
c) Atitudes de rejeição com base na discriminação reversa
As atitudes que definem esse fator são as decorrentes da percepção dos grupos de
indivíduos que não são beneficiados por práticas de diversidade. A importância em ressaltar essas
atitudes está em compreender que esses indivíduos enxergam tais práticas como uma ameaça
(BEATON e TOUGAS, 2001).
Na literatura essas atitudes são identificadas por fortes resistências de grupos de
indivíduos aos programas de diversidade, normalmente homens brancos, porque se sentem
vítimas, discriminados ou desfavorecidos em detrimento de grupos de minorias, principalmente
em períodos de recessão de empregos (FAIR EMPLOYMENT PRATICE GUIDELINES, 2004).
Essa rejeição é também denominada de “discriminação reversa”, por acreditar-se que ela gera
essa ação contra os não beneficiados pelas práticas de diversidade.
De acordo com estatísticas os grupos de mulheres e de minorias visíveis apresentam
crescimento de participação no ambiente de trabalho (JOHNSTON e PACKER, 1987;
OFFERMAN e GOWING, 1990; CARR-RUFINO, 2005). Além disso, os programas de
diversidade têm melhorado as condições de ocupações de cargos de mulheres, de minorias
visíveis e de pessoas portadoras de necessidades especiais que outrora eram ocupados
preponderantemente por homens brancos em funções de cargos de chefia, de liderança e de
direção (THOMASSON, CROSBYe HERZBERGER, 1996, apud BEATON e TOUGAS, 2001).
A rejeição às práticas de diversidade pelos homens brancos já foi constatada em muitos
estudos realizados em diferentes países, principalmente diante dos programas legais (KIDDER et
al, 2004; RICHARD e KIRBY, 1997; LECK e SAUNDERS 1996). No Brasil, não foram
encontradas publicações que ressaltam movimentos de homens contra concessões oferecidas por
práticas organizacionais às mulheres em nome da diversidade, até porque essas concessões não
são predominantes no contexto organizacional do país, mas há quem seja contrário a essa idéia
por acreditar que a não aplicação de concessões semelhantes aos homens não traz a igualdade
material. Ao contrário, desiguala materialmente homens e mulheres (BREGA FILHO e SALIBA,
2007).
O que caracteriza a discriminação reversa – e o que a torna controvertida – é precisamente
a circunstância de que o favorecimento de um grupo implica, necessária e imediatamente, a
evidente exclusão de outro. Trata-se de “um jogo de soma zero, no qual a destinação de um bem
a uma pessoa significa tirar esse mesmo bem de outra (…). É também um jogo de tudo-ou-nada,
porque os bens e as posições alocados não podem ser divididos (PETERS, apud BRANCO,
2003). Sob essa perspectiva acredita-se que dar um tratamento diferenciado a determinados
grupos de indivíduos gera motivos para o surgimento de uma discriminação reversa por parte de
outros (SOWELL, 1990).
A fundamentação teórica anteriormente desenvolvida dá suporte para a formulação do
Quadrante III do modelo proposto e fundamenta a terceira hipótese desse trabalho.
H3: Sob a perspectiva da discriminação reversa o grupo de homens é mais desfavorável
às concessões oferecidas por práticas organizacionais em prol da diversidade do que o
grupo de mulheres.
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d) Atitudes de rejeição com base no receio ao estigma
As atitudes frente às concessões oferecidas por práticas organizacionais em prol da
diversidade também podem ser de rejeição mesmo pelos grupos de indivíduos designados ou
beneficiados. Alguns estudos empíricos realizados nos Estados Unidos constataram que práticas
baseadas em preceitos legais de diversidade (Ações Afirmativas) costumam estigmatizar os
indivíduos por eles beneficiados como menos qualificados ou incompetentes, e isso, mais
atrapalha do que ajuda segundo alguns autores (HEILMAN et al.1992; NACOSTE, 1992).
As atitudes sob essa perspectiva são baseadas na crença de que os indivíduos que são
contratados com base em preceitos legais de diversidade são menos qualificados ou
incompetentes porque tais programas não atribuem a qualificação como o critério máximo para
contratá-los, como é feito normalmente (KEELEY e MICHELA, 1980). Isso pode minimizar o
potencial dos indivíduos submetidos a esses programas. Mesmo que os indivíduos tenham
competência eles não serão “vistos” por outros sob esse prisma. As atitudes de rejeição às
práticas de diversidade com base no estigma constituem o quadrante IV do modelo proposto.
Após a realização de uma pesquisa Heilman e Alcott (2001) sugerem que o estigma de
incompetência atribuído aos indivíduos beneficiados por práticas de diversidade que não
priorizam a qualificação como critério de avaliação, se origina na contratação, mas persiste
durante o desenvolvimento da carreira dos mesmos na organização. Esse estigma enviesa o
processo de tomada de decisão sobre promoções por parte dos dirigentes que os concebem como
pessoas menos qualificadas em relação a outros. Dessa forma, infere-se que o grupos de mulheres
possa vir a rejeitar concessões em prol da diversidade para não ser visto sob o estigma de menos
capaz. E sob essa perspectiva que se fundamenta a quarta hipótese desse trabalho.
H4: Sob a perspectiva da obtenção de ganhos o grupo de mulheres é mais desfavorável
às concessões oferecidas por práticas organizacionais em prol da diversidade do que o
grupo de homens.
Procedimentos Metodológicos
A construção do instrumento e o processo preliminar de validação da escala
Com a finalidade de ter um referencial inicial para a construção da escala foi realizada
vasta revisão bibliográfica exploratória de estudos sobre as atitudes dos indivíduos diante de
concessões oferecidas a diversidade (grupos de mulheres, pessoas negras e pessoas com
deficiência) por práticas decorrentes de ações afirmativas (AA) e das iniciativas organizacionais
(projetos, programas ou modelos de gestão de diversidade).
Fontes bibliográficas estrangeiras que fazem referência as atitudes dos indivíduos diante da
diversidade foram de fundamental importância, uma vez que são poucos os referenciais
brasileiros sob esse contexto. Dentre elas destacam-se: a escala de Eddy e Burky (2004) que
avalia as atitudes de aceitação e de rejeição diante das ações afirmativas e programas de
diversidade, a escala General Social Survey de Davis e Smith, (2003 apud WILSON, 2006) que
avalia a discriminação reversa; a escala de Tougas e Veilleux (1991) que avalia o interesse na
obtenção de ganhos diante de ações afirmativas; a escala de Beaton e Tougas (2001) que avalia
atitudes baseadas na crença na justiça social diante das ações afirmativas; e os resultados dos
7
estudos experimentais de Heilman, Block e Stathatos (1997), referentes à atitude de rejeição a
ações afirmativas com base no receio ao estigma.
A análise da literatura citada anteriormente foi um procedimento adotado que tornou
possível identificar, sistematizar e categorizar duas tendências de atitudes dos indivíduos diante
de crenças voltadas para concessões organizacionais em prol da diversidade (oportunidades,
privilégios e/ou condições especiais): duas favoráveis (uma com base na justiça social e a outra
na obtenção de ganhos) e duas desfavoráveis (uma com base na discriminação reversa e outra no
receio ao estigma).
Para verificar se as dimensões de atitudes propostas no estudo eram pertinentes à
realidade brasileira, foi realizada uma pesquisa qualitativa com dois sujeitos representantes de
três grupos de diversidade (mulheres, pessoas negras e pessoas com deficiência) e com dois
sujeitos considerados não diversos (homens brancos). Esses indivíduos pertenciam a duas
empresas, uma do segmento industrial (Empresa I) e a outra do bancário (Empresa II).
Respectivamente, as mulheres ocupavam o cargo de gerente geral e de coordenadora; as pessoas
negras (dois homens) gerente financeiro e analista; as pessoas com deficiência (dois homens)
gerente de área e assistente, e finalmente, os homens brancos, gerente de área e analista.
Entrevistas em profundidade (semi-estruturadas) foram realizadas com a duração média
de uma hora e meia. Os dados obtidos da pesquisa qualitativa permitiram confirmar as dimensões
de atitudes categorizadas (justiça social, obtenção de ganhos, estigma e discriminação reversa).
Foi construído um instrumento, composto por vinte e quatro itens, seis para cada categoria
de atitudes diante das concessões oferecidas pelas práticas de diversidade, ancorados numa escala
do tipo Likert (discordo totalmente [1];, discordo [2]; discordo parcialmente [3]; concordo
parcialmente [4]; concordo [5] e concordo totalmente [6]).
Validade de conteúdo e semântica
O passo seguinte foi submeter o instrumento à análise de cinco juízes: mestres e doutores
professores na área da Administração e Psicologia, que verificaram não só o conteúdo dos itens
como a semântica dos mesmos. Cada juiz recebeu um formulário onde para cada item do
instrumento ele deveria designar notas de 0 a 10 para dois quesitos: pertinência dos itens quanto
ao conteúdo e clareza do texto. Esse formulário concedido por PORTO (s.d.). O grau de
concordância quanto à pertinência dos itens ficou acima de 80%. No entanto, grande parte dos
itens obteve escores abaixo de 50% quanto à semântica. Em decorrência desse resultado o
instrumento foi reformulado, continuando com 24 itens.
Após essa validação de conteúdo e semântica o instrumento foi aplicado a uma amostra
constituída por 167 estudantes de pós-graduação em Administração de Empresas, visando
proceder novamente a validade semântica dos itens avaliar a validade de construto do
instrumento. Foi solicitada aos respondentes uma análise de cada item quanto à sua compreensão.
Nenhuma dúvida foi colocada e houve um consentimento geral de que todos os itens estavam
claros. Em seguida, o processo de validação foi realizado por meio de três procedimentos
psicométricos: verificação dos construtos, verificação dos construtos obtidos pela análise fatorial
e verificação da rotação e interpretação dos fatores.
O processo de validação
a) Verificação dos construtos
8
Para verificar a validação de cada um dos construtos da pesquisa foi utilizado a técnica
estatística de Análise Fatorial Exploratória, pelo método Principal Axis Factoring e extrações dos
fatores pelos eigenvalues maiores ou iguais a um.
Para verificar o número de fatores obtidos três critérios foram adotados: o gráfico scree plot
(CATELL, 1966), resultado do modelo fatorial adotado e o procedimento de checar a análise
paralela (HORN, 1965), citada por Laros (2004) como sendo a comparação entre o percentual de
eigenvalues obtidos da amostra real e o percentual de eigenvalues obtidos de uma amostra
aleatória calculada a partir do mesmo número de casos, do mesmo número de itens da escala em
estudo e diante do mesmo modelo e método fatorial adotado para os dados reais.
b) Verificação dos construtos obtidos pela análise fatorial e verificação da rotação e
interpretação dos fatores
O terceiro e último procedimento adotado para a validação das escalas da pesquisa foi o de
verificar a rotação e a interpretação dos fatores. A rotação utilizada foi a Promax e optou-se por
manter os fatores com carga fatorial acima de 0,45 consideradas cargas de maior significância
prática (HAIR, 2005b). Após a realização de três rodadas houve a eliminação de quatro itens
ficando a escala com 20 itens (Tabela 1).
Tabela 1 - Matriz Fatorial das Atitudes diante de Práticas de Diversidade
Matriz Padrãoa
Fator
1
15 - As mulheres quando recebem condições especiais para o desenvolvimento de
carreira são consideradas menos competentes.
16 - As pessoas com deficiência quando recebem condições especiais para o
desenvolvimento de carreira são consideradas menos competentes.
13 - As pessoas negras quando recebem condições especiais para o desenvolvimento
de carreira são consideradas menos competentes.
20 - As pessoas negras quando favorecidas no processo de contratação são
consideradas menos capazes.
8 - As pessoas com deficiência quando favorecidas no processo de contratação são
consideradas menos capazes.
4 - As mulheres quando favorecidas no processo de contratação são consideradas
menos capazes
5 - As pessoas com deficiência não têm as mesmas oportunidades que as demais no
desenvolvimento de carreira.
19 - As pessoas com deficiência não têm as mesmas oportundiades que as demais na
contratação.
23 - As pessoas negras não têm as mesmas oportunidades que as não negras no
desenvolvimento de carreira.
9 - As pessoas negras não têm as mesmas oportunidades que as não negras na
contratação.
11 - As pessoas negras não recebem as mesmas condições que as não negras para o
desenvolvimento de carreira.
24 - As práticas de diversidade são discriminatórias quando criam condições favoráveis
para o desenvolvimento de carreira para as pessoas negras.
6 - As práticas de diversidade são discriminatórias quando privilegiam a contratação de
pessoas negras.
17 -As práticas de diversidade são discriminatórias quando criam condições favoráveis
para o desenvolvimento de carreira para as mulheres
12 - As práticas de diversidade são discriminatórias quando privilegiam a contratação de
mulheres.
22 - As práticas de diversidade são discriminatórias quando privilegiam a contratação de
pessoas com deficiência.
18 - Deve haver práticas de diversidade que criem condições favoráveis para o
desenvolvimento de carreira para as pessoas negras.
21 - Deve haver práticas de diversidade que criem condições favoráveis para o
desenvolvimento de carreira para as mulheres.
7 - Deve haver práticas de diversidade que reservem vagas para as mulheres.
3 - Deve haver práticas de diversidade que reservem vagas para as pessoas negras.
2
3
4
,831
,745
,727
,710
,697
,499
,784
,747
,658
,655
,632
,819
,745
,633
,609
,522
,778
,753
,675
,567
Método de Extração: Principal Axis Factoring.
Método de Rotação: Promax with Kaiser Normalization.
a. Rotação convergiu em 6 interações.
O estudo da fatorabilidade mostrou a existência de 290 (50,4%) correlações
significativas entre as variáveis de um total de 576. O KMO (Kaiser-Meyer-Olkin) foi de 0,837 e
o Teste de esfericidade de Bartlett - (qui-quadrado aproximado = 1960,396; p<0,01). A matriz da
9
anti-imagem indicou correlações satisfatórias entre 0,792 e 0,883. O percentual de variância
explicada pelo instrumento foi de 63,78%. Os três procedimentos adotados para a extração de
fatores indicaram os mesmos números de fatores para a escala, ou seja, quatro fatores. Portanto,
a escala foi validada, confirmando-se as dimensões levantadas na literatura e verificadas na
pesquisa qualitativa. A escala foi intitulada Escala de Atitudes diante de Práticas de Diversidade EAPD. Ver Tabela 1.
Amostra da pesquisa final
A amostra utilizada na validação final da escala constituiu-se de 412 indivíduos, sendo
117 homens e 295 mulheres. Do total, 155 pertenciam à empresa do setor industrial e 257 de
empresa do setor bancário, provenientes de dezoito cidades dos cinco estados do Brasil. A
primeira empresa é uma multinacional de origem holandesa, possuía à época da pesquisa
aproximadamente 4000 empregados. Vem desenvolvendo práticas formais de diversidade
voltadas para as mulheres, desde 2003, tais como programas de sensibilização para as diferenças,
estabelecimento de meta de aumento do número de mulheres e asiáticos em cargos executivos
(pelo menos 10%), comitês para mulheres e acompanhamento no desenvolvimento de carreira. A
segunda empresa, de origem brasileira, possuía aproximadamente 800 empregados espalhados
em 38 agências nas principais cidades brasileiras. Vem desenvolvendo práticas de diversidade em
torno do cumprimento da Lei de Cotas para deficientes. Na indústria pesquisada o método de
amostragem foi não probabilístico com retorno de 3,9%. Na segunda o critério adotado foi o
censo, ou seja, o instrumento foi encaminhado para toda a população, com retorno de 32%.
Procedimentos
Os questionários foram respondidos em site específico. O instrumento validado no préteste foi aplicado na amostra final de acordo com os mesmos procedimentos e indicou
fatorabilidade. Novamente, as quatro dimensões foram confirmadas. Três itens com cargas
fatoriais abaixo de 0,45 foram sucessivamente eliminadas (itens 1, 6 e 18), ficando a escala final
com 17 itens.
O fator 1 representa a dimensão estigma, com percentual de variância explicada de
28,57%. e alpha de Crombach de 0,909. As três cargas fatoriais mais altas referem-se à crença de
que as mulheres, as pessoas negras e as pessoas com deficiência são consideradas menos
competentes ao receberem concessões para o desenvolvimento de carreira.
O fator 2 representa a dimensão justiça social e apresentou percentual de variância
explicada de 21,42%. e um alpha de Crombach de 0,824. As cargas fatoriais referem-se à atitude
de aceitações das concessões oferecidas às pessoas com deficiência e as pessoas negras com base
na crença de que elas não têm as mesmas oportunidades que as demais diante das práticas
organizacionais referentes ao desenvolvimento de carreira e contratação.
O fator 3 representado pela dimensão obtenção de ganhos, ficou com alpha de Crombach
0,837 e percentual de variância explicada de 7,65%. As cargas fatoriais mais altas referem-se à
crença de que deve haver práticas de diversidade que criem condições favoráveis para o
desenvolvimento de carreira para as pessoas negras e para as mulheres
O fator 4 representado pela dimensão discriminação reversa com alpha de Crombach
0,817 e percentual de variância explicada de 5,79%. As cargas fatoriais mais altas referem-se à
crença de que as práticas de diversidade são discriminatórias quando criam condições favoráveis
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para a contratação e para o desenvolvimento de carreira das mulheres e das pessoas negras, o que
não acontece com as pessoas com deficiência.
Análise dos dados
Com o intuito de ganhar sensibilidade da amostra em relação às respostas fornecidas à
escala de atitudes cognitivas diante da diversidade (EAPD) foi realizada inicialmente uma
estatística descritiva. A média foi a medida central adotada para verificar a predominância de
respostas dos grupos de homens e mulheres diante de cada um dos itens da escala. Os resultados
obtidos referentes às quatro dimensões de atitudes concentraram-se, em sua maioria, na faixa de
rejeição parcial (3.0 à 3.9) ou aceitação parcial (4.0 à 4.9) em relação a diversidade (Tabela 2) .
Outro dado relevante foi o de não haver entre os indivíduos pesquisados nenhum
posicionamento claro de aceitação às concessões oferecidas por práticas de diversidade
(média > 5.0). No entanto, há entre eles um posicionamento claro de rejeição (média < 3.0) tanto
dos homens quanto das mulheres às concessões oferecidas às pessoas negras e às próprias
mulheres (itens 2, e 5).
No que diz respeito ao posicionamento das mulheres, na média, elas têm um
posicionamento claro de rejeição às crenças de que as pessoas negras não têm as mesmas
oportunidades que as não negras no desenvolvimento de carreira e de que deva haver práticas de
diversidade que criem condições favoráveis para o desenvolvimento desse grupo social. Esse
posicionamento nos homens é o de uma rejeição parcial.
Tabela 2 – Estatística Descritiva das atitudes diante de crenças voltadas a práticas de diversidade
Após o levantamento de dados descritivos outros procedimentos foram utilizados para
verificar quem é mais favorável as concessões oferecidas por práticas de diversidade, que
sustentam as quatro hipóteses levantadas nesse estudo. Esses foram realizados por meio de testes
não paramétricos, uma vez que as variáveis não apresentaram uma distribuição normal. Diante
das variáveis de gênero (masculino e feminino) foi utilizado o teste de Mann-Whitney. E para
verificar as dimensões de gênero associadas às dimensões de raça e de ser ou não pessoa com
deficiência foi utilizado o Teste de Kruskal Wallis (ambos disponíveis no programa SPSS (versão
13). O grau de significância adotado foi de p < 0,05.
Hipótese H1
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A hipótese H1 parte do pressuposto de que, sob a perspectiva da justiça social, o grupo de
homens é mais favorável às concessões oferecidas por práticas organizacionais em prol da
diversidade do que o grupo de mulheres.
Os dados obtidos do teste de Mann-Whitney (ver Tabela I) revelaram que há diferença de
atitudes diante de práticas de diversidade entre os grupos de homens e mulheres considerando-se
as crenças baseadas na justiça social (p = 0,042).
O ranque das médias de respostas de concordância às atitudes de aceitação às concessões
oferecidas à diversidade com base na justiça social revelou-se maior no grupo dos homens (M =
225,43) do que no de mulheres (M = 198,99). Com isso, confirma-se a hipótese H1. No entanto,
ao analisar os resultados obtidos referente às diferentes identidades de homens e mulheres da
amostra considerando-se as dimensões de raça e de ser ou não pessoa com deficiência os
resultados obtidos não se mostraram os mesmos. Ou seja, os dados revelaram que não são todos
os homens e nem todas as mulheres que avaliam essas práticas da mesma forma. Há diferenças
significativas entre os que compõem o grupo dos homens e das mulheres (p = 0, 032).
O ranque das médias de respostas de concordância às atitudes de aceitação às concessões
oferecidas à diversidade revelou-se maior nas mulheres com deficiência (M = 292,1), nos homens
negros (M = 258,9), nas mulheres negras (M = 231,7) e nos homens com deficiência (M = 225,5).
Esses foram os quatro grupos sociais de indivíduos que mais concordaram com as concessões
organizacionais oferecidas em prol da diversidade. O que não acontece com os grupos de
mulheres da raça amarela (M = 140,1) e mulheres de raça branca (M =195,0) que apresentam,
inclusive, uma menor concordância das práticas de diversidade com base na justiça social do que
o grupo de homens brancos (M = 224,3).
Hipótese H2
A hipótese H2 parte do pressuposto de que, sob a perspectiva da obtenção de ganhos, o
grupo de mulheres é mais favorável às concessões oferecidas por práticas organizacionais do que
o grupo de homens. Para verificá-la foram realizados os testes estatísticos não paramétricos de
Mann-Whitne.
Os resultados revelaram que há diferenças de atitudes das concessões oferecidas por
práticas organizacionais em prol da diversidade com base na crença na obtenção de ganhos. No
entanto, o grupo de homens é mais favorável do que de mulheres (p = 0,015). Com isso, os dados
não confirmam a H2.
O ranque das médias de respostas de concordância às atitudes de aceitação às concessões
organizacionais oferecidas à diversidade com base na obtenção de ganhos revelou-se maior no
grupo dos homens (M = 229, 1) do que no grupo das mulheres (M = 197,5).
Ao analisar os resultados obtidos referente às diferentes identidades de homens e
mulheres da amostra considerando-se as dimensões de raça e de ser ou não pessoa com
deficiência os resultados obtidos revelaram que não há diferenças significativas entre o
posicionamento das diferentes mulheres e dos diferentes homens considerando-se as dimensões
de raça e de ser ou não ser pessoa com deficiência (p = 0,082).
Hipótese H3
A hipótese H3 parte do pressuposto de que, sob a perspectiva da discriminação reversa, o
grupo de homens é mais desfavorável às concessões oferecidas por práticas organizacionais em
prol da diversidade do que o grupo de mulheres.
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O teste estatístico de Mann-Whitney revelou que não há diferença significativa de atitudes
diante de práticas de diversidade entre os grupos de mulheres e de homens tomando por base as
crenças de que as concessões oferecidas por práticas de diversidade geram a discriminação
reversa (p = 0,201). Com isso, os dados não confirmam a H3.
Ao analisar os resultados obtidos do teste estatístico de Kruskal Wallis referente às
diferentes identidades de homens e mulheres da amostra considerando-se as dimensões de raça e
de ser ou não pessoa com deficiência os resultados obtidos mostraram-se os mesmos (p = 0,588).
Hipótese H4
A hipótese H4 parte do pressuposto de que o grupo de mulheres é mais desfavorável às
concessões oferecidas por práticas organizacionais em prol da diversidade com base no receio ao
estigma do que o grupo de homens.
O teste estatístico de Mann-Whitney não revelou diferenças estatisticamente significativas
de atitudes entre os grupos de mulheres e homens (p = 0,09 5). Logo, a H4 n~ao foi confirmada.
Ao analisar pelo teste de Kruskal Wallis as atitudes das diferentes identidades de homens e
mulheres da amostra considerando-se as dimensões de raça e de ser ou não pessoas com
deficiências o resultado também não apontou diferenças significativas
Discussão dos Resultados
As discussões presentes estão endereçadas preponderantemente àquelas hipóteses do
modelo teórico não comprovadas nesse estudo, pois há uma argumentação teórica respaldada em
diferentes teorias de relações intergrupais que as fundamentam. Assim, no mínimo há uma
curiosidade para entender os resultados obtidos em nossa realidade organizacional.
Por que o pressuposto de que o grupo de mulheres seria mais favorável às concessões de
diversidade com base na crença de obtenção de ganhos foi rejeitada, evidenciando que os homens
são mais favoráveis? A literatura é ambígua nesse aspecto, tanto mostrando que os indivíduos
(minorias) em busca de seu auto-interesse seriam favoráveis a tais práticas (TOUGAS et al.,1991)
como alguns estudos empíricos que não evidenciam essa favorabilidade (KINDER, 1986). Os
resultados da pesquisa podem revelar um sentimento de relativa privação por parte do grupo de
mulheres, quando comparado ao mainstream, homens brancos, em função das vantagens sociais
que o outro grupo possui.
O grupo de homens não são mais desfavoráveis às práticas de diversidade que as
mulheres, na crença de discriminação reversa. Por quê? Talvez, no Brasil, o fato de as políticas
de diversidade possuírem uma conotação central nas pessoas com deficiência e, ainda, se
encontrar em estágio pouco desenvolvido, os homens não percebem ainda a ameaça proveniente
do grupo de mulheres ou outras “minorias”. Além desse fato, não se pode negar a existência do
teto de vidro que dificulta a mobilidade das mulheres para posições hierárquicas mais estratégicas
nas organizações e os estereótipos que cercam tal progresso (PIZA, 2000). Talvez um estudo
longitudinal, daqui para a frente, possa nos revelar a evolução de uma atitude de discriminação
reversa mais acentuada, à medida em que esse teto de vidro é quebrado e mulheres, possam
deixar de pertencer ao exogrupo de “minorias” e ser considerada e reconhecida como elemento
do endogrupo. O modelo de cinco estágios de relações intergrupais de Taylor e McKirnan (1984)
explicitado na obra de Taylor e Mogaddham (1994) pode prover uma estrutura conceitual para
compreender as estratégias requeridas dessa mobilidade do grupo de “minoria” para o grupo da
“maioria”, não numérica, mas de poder e status.
13
Finalmente, as mulheres não apresentaram atitudes desfavoráveis às concessões de
diversidade por receio ao estigma. Na mesma linha do comentário anterior, acredita-se que a
carência de políticas de diversidade podem revelar que o estímulo que o grupo de mulheres
recebem no desenvolvimento de carreira ainda é tênue para gerar nelas o sentimento de estigma
de incompetência.
Importa considerar que uma das organizações (indústria) vem desenvolvendo políticas de
diversidade há alguns anos, ao passo que a instituição financeira ainda carece de políticas
formais.
Considerações Finais
Os resultados da pesquisa aos revelarem que há diferença entre as atitudes dos homens e
das mulheres diante das concessões oferecidas por práticas organizacionais em prol da
diversidade, quando essas são baseadas em crenças na justiça social e na obtenção de ganhos, dão
margem para indagações e discussões importantes.
Afinal, há entre as mulheres no contexto organizacional brasileiro uma categorização entre
aquelas que se sentem diversas (mulheres com deficiência e negras) e as que se percebem
similares aos homens em termos de oportunidades profissionais recebidas no contexto
organizacional (mulheres brancas e amarelas)? Ou será o comportamento dessas últimas um
mimetismo desenvolvido em relação aos homens para poder quebrar as barreiras do glass cealing
conforme revelaram os estudos de Hanashiro e Godoy (2004). É interessante observar que ao
revelarem que as mulheres foram menos favoráveis do que os homens às concessões oferecidas
por práticas de diversidade, os dados da pesquisa não dizem que elas rejeitam claramente essas
práticas. A situação de parcialidade nesse caso foi imperativa. O que isso quer dizer? Será que
para as mulheres a crença de que essas concessões geram o estigma de incompetência é maior do
que a crença na justiça social?
Aliás, a não confirmação das diferenças de atitudes baseadas nas crenças de que as
concessões oferecidas à diversidade geram uma discriminação reversa ou o estigma aos
beneficiados foi uma surpresa, principalmente por perceber entre os respondentes uma falta de
convicção clara a respeito do assunto. Esse dado dá margem para inferir que ambas as crenças
ainda são frágeis na realidade brasileira, mas compreensíveis pelo fato de não haver ainda no país
uma tradição de políticas de diversidade. Por outro lado, não será essa uma expressão
dissimulada? Uma expressão inócua, em cima do muro, típica de quem não quer se comprometer,
seja pelo medo da intimidação ou do constrangimento, ou por simplesmente não querer assumir
uma rejeição latente a qualquer oportunidade que possa ser oferecida a quem não as teve?
Inicialmente, pensou-se na proposição de um modelo teórico para o entendimento das
atitudes diante concessões realizadas em prol da diversidade. Criou-se uma escala para mensurar
suas dimensões teóricas. A falta de comprovação empírica das três hipóteses leva a uma
constatação de que houve uma tentativa de construção teórica que requer aprofundamento e
aprimoramente, devendo ser analisada à luz da nossa realidade cultural e da experiência das
empresas no que tange às iniciativas de diversidade.
Contudo, acreditamos que os resultados aqui apresentados contribuem para um avanço
nos estudos de diversidade que tanto carecem de evidências empíricas
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