Terça-feira, 26 de agosto, 2014 Brasil Econômico 31
EDSON SANTOS
HUGO FILARDI
Deputado Federal e presidente da Frente Parlamentar
Mista em Defesa da Indústria Marítima Brasileira
Sócio do Siqueira Castro — Advogados e mestre em
Direito Processual Civil na PUC/SP
A indústria naval e o
caso do Estaleiro EISA
Falta bons argumentos
nas decisões liminares
A dimensão social de qualquer empresa não é uma simples
equação em que as variáveis são fórmulas contábeis ou mecanismos administrativos. É necessário considerar o aspecto
humano implicado no trabalho e nas riquezas produzidas, assim como o real potencial de desenvolvimento, tanto econômico como político, do entorno em que ela se estabelece.
Sem isto, nunca se consegue ultrapassar a visão parcial e incompleta de que um empreendimento é a soma dos seus resultados financeiros.
O inconformismo da sociedade civil com a instabilidade das
decisões judiciais não está relacionado à possibilidade de variáveis interpretações normativas, mas sim com a ausência
de explicação clara e exposição dos motivos que ensejaram a
construção dos provimentos jurisdicionais. Ao magistrado
não é permitido esconder as verdadeiras razões que fundaram seu livre convencimento, devendo as decisões ser previamente justificadas. Sendo assim, as decisões não podem
ser apenas impostas, mas claramente pautadas.
Sob esse prisma —realista e abrangente — devemos contemplar a presente situação do Estaleiro Ilha S.A.
(EISA), que, devido a um conjunto de
equívocos na gestão dos seus últimos
dois anos e com consequências diretas na geração de capital de giro, chegou a um impasse cuja resolução é hoje vital para o Rio de Janeiro. O fato é
bastante significativo: no exato momento em que a indústria naval se recupera, cerca de 3,5 mil funcionários
do EISA podem perder os seus empregos. Na prática, trata-se de uma mão
de obra qualificada que pode migrar
para o exterior, gerando mais um fator decisivo para o quadro de recessão que se avizinha.
Por isso que um tema relevante é
da apreciação de provimentos jurisdicionais de urgência sob o prisma do
conceito de discricionariedade judicial, ou seja, o de aplicar mais do que o
texto das leis nas decisões prolatadas e
englobar todo o contexto suscitado pelas partes envolvidas. As liminares em
sede de mandado de segurança e em
reclamação constitucional, os provimentos cautelares e antecipação de tutela são exemplos de decisões ágeis autorizadas pelo sistema normativo através de um regime de ponderação entre os interesses de celeridade e efetividade da tutela jurisdicional em confronto ao exercício do contraditório e
da ampla defesa. Evidentemente, existem requisitos legalmente previstos
para que essa modalidade de decisão
de urgência e excepcional seja proferida pelos magistrados para salvaguarda dos direitos tutelados em Juízo.
Cerca de R$ 40 milhões já
foram viabilizados junto a
investidores internacionais,
graças à iniciativa do
acionista majoritário do
Synergy Group,
controlador do EISA
Com as perspectivas do pré-sal e
várias encomendas de novos navios,
torna-se fácil perceber que a resolução do problema de caixa do EISA é
de interesse não apenas da empresa,
mas do setor como um todo, assim como das autoridades em condições de
intervir. Os números espelham a realidade: com 27 encomendas que totalizam US 1,6 bilhão, o EISA precisa levantar cerca de R$ 200 milhões para
arcar com custos salariais atrasados e
dar novo fôlego ao capital de giro. A
desproporção entre esses números indica claramente que, caso o empresário assuma suas responsabilidades e
haja compreensão política e boa von-
tade de agentes financeiros e das empresas ligadas ao setor, o problema pode ser resolvido.
Cerca de R$ 40 milhões já foram
viabilizados junto a investidores internacionais, graças à iniciativa do acionista majoritário do Synergy Group,
controlador do EISA. Mas, se porventura o referido acionista oferecer alguns de seus múltiplos ativos como
garantias de empréstimo, a coisa pode ter resolução bem mais rápida. Importante é destacar que não há capitalismo sem risco, nem entes públicos
que se eximem de suas responsabilidades sociais. Neste contexto, cabenos lembrar do paradoxo que seria fechar um estaleiro com várias encomendas. Independentemente do período eleitoral, é preciso haver uma
solução já, em benefício de todos.
Muitos trabalhadores do EISA —
que precisam sustentar as suas famílias — sinalizaram preferir a demissão se o problema dos salários não se
resolver em breve. Isto seria uma catástrofe para a economia e, neste ponto, não custa lembrar que, além de
uma gestão equivocada, a situação
atual foi gerada, em parte, porque alguns clientes não conseguiram honrar os pagamentos ao EISA.
Em síntese, nenhuma empresa está livre de passar por situações imprevistas, sobretudo quando parte
do seu faturamento provém de clientes externos. Seja como for, nessas
horas, é imprescindível colocar na
balança a sua importância para economia local e o benefício social que
gera.
Com todos esses dados no horizonte, é possível ter uma melhor compreensão da natureza do problema e,
por conseguinte, das medidas para resolvê-lo.
Não é demais afirmar que
não basta ao Judiciário
produzir decisões rápidas.
Torna-se necessária uma
motivação robusta para
demonstrar o caminho
mental percorrido pelo juiz
Contudo, mostra-se corriqueira a
ausência de justificação na prolação
de tais provimentos jurisdicionais de
urgência sob a frágil assertiva de que
essas decisões estariam dentro de
uma zona de discricionariedade dos
magistrados. O Tribunal de Justiça do
do Rio de Janeiro, inclusive, editou súmula no sentido de não rever decisões
de deferimento ou indeferimento de
provimentos antecipatórios, a não ser
em situações teratológicas ou contra a
prova constante nos autos.
Não é demais afirmar que não basta ao Poder Judiciário produzir decisões rápidas. Torna-se necessária
uma motivação robusta para demonstrar o caminho mental percorrido pelo juiz e sua tendência ideológico-jurídica empregada na elaboração dos
provimentos judiciais solicitados.
É preciso dizer que torna-se nula
de pleno direito a decisão judicial que
indefere ou defere o pedido de antecipação de tutela sob a argumentação
de estarem ou não presentes os requisitos legais. O jurisdicionado precisa e
tem o direito de saber quais os fundamentos fáticos passíveis de enquadramento aos ditos requisitos legais autorizadores ou de recusa para a prolação
de decisão sobre a tutela de urgência.
Justamente por ser a tutela de urgência possível em decorrência de
ponderação clara entre os princípios
da celeridade e do devido processo legal, os magistrados somente poderão
deferi-la em situações estritamente
emergenciais e em que haja extenuante explicação dos motivos fáticos e jurídicos decorrentes da decisão judicial. Não só a cláusula do due process
of law, mas também o princípio da
inafastabilidade da tutela jurisdicional e o próprio Estado Democrático de
Direito asseguram que os jurisdicionados participem e compreendam os rumos tomados nas decisões judiciais.
Os juízes possuem um dever constitucional de justificar seus atos, devendo atuar ativamente como transformadores do regime de Estado que se
impõe pela força para o sistema que
consagra a participação popular livre
e que busca um Poder Judiciário aberto para a promoção dos direito e garantias fundamentais, esses últimos tão
claramente difundidos.
Presidente do Conselho de Administração Maria Alexandra Mascarenhas
Diretor Presidente José Mascarenhas
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