Direito Penal
Militar
Professora: Lorena Braga Raposo
Dos crimes contra a Incolumidade Pública
arts. 268 a 297, do CPM
Embriaguez ao volante
Art. 279. Dirigir veículo motorizado, sob administração militar
na via pública, encontrando-se em estado de embriaguez, por bebida
alcoólica, ou qualquer outro inebriante:
Pena - detenção, de três meses a um ano.
Tendo em vista que a ciência médica ainda sequer estabeleceu um critério
aceitável para definir qual o grau da embriaguez que se torna incompatível com a
direção dos veículos, esta na prática, em nosso país, é realizada através do Código
Brasileiro de Trânsito - CTB e das Resoluções do Conselho Nacional de Trânsito CONTRAN.
A Resolução 432 dispõe sobre a aplicação da nova Lei Seca (em vigor
desde dezembro de 2012) pelos agentes de trânsito, reafirmando, por exemplo, que
a confirmação da alteração da capacidade psicomotora do motorista em razão da
influência de álcool ocorrerá por meio de, pelo menos, um dos seguintes
procedimentos a serem realizados no condutor: exame de sangue; exames
realizados por laboratórios especializados, indicados pelo órgão ou entidade de
trânsito competente ou pela Polícia Judiciária, em caso de consumo de outras
substâncias psicoativas que determinem dependência; teste em aparelho destinado
à medição do teor alcoólico no ar alveolar, o etilômetro, mais conhecido como
bafômetro; verificação dos sinais que indiquem a alteração da capacidade
psicomotora do condutor.
Além dessas opções, a confirmação do estado alterado do condutor poderá
ser feita por prova testemunhal, imagem, vídeo ou qualquer outro meio de prova em
direito admitido. A resolução determina, no entanto, que a utilização do teste do
bafômetro deve ser priorizada pelos fiscais.
A medida acaba com a margem de tolerância de um décimo de miligrama
(0,10) de álcool por litro de ar, permitida anteriormente pelo Decreto 6.488/2008
quando o condutor soprava o bafômetro e de no máximo duas decigramas por litro
de sangue, no caso de exames.
A Lei Seca nº 12.760/2012 impôs ao CONTRAN determinar a nova
margem de tolerância, definida agora pela Resolução nº 432. Por ela, se o condutor
soprar o bafômetro e o aparelho marcar igual ou superior a 0,05 miligramas por litro
de ar ele será autuado e responderá por infração gravíssima, conforme estabelece o
artigo 165 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Já nos exames sangue a
tolerância é zero: não será permitida qualquer concentração de álcool.
A penalidade após autuação é a multa de R$ 1.915,30, recolhimento da
habilitação, suspensão do direito de dirigir por 12 meses, além da retenção do
veículo, até a apresentação de condutor habilitado.
Assim, questão que se torna discutível é se diante da definição legal do
CTB e do CONTRAN, esse critério prevalecerá para a caracterização do crime
militar congênere, ou não, o que acredito que seja razoável considerar
tecnicamente, todavia a matéria encontrará adequada solução por parte da
jurisprudência.
Perigo resultante de violação de regra de trânsito
Art. 280. Violar regra de regulamento de trânsito, dirigindo veículo sob
administração militar, expondo a efetivo e grave perigo a incolumidade de outrem:
Pena - detenção, até seis meses.
O núcleo do tipo é expresso pelo verbo violar, que significa no caso
transgredir, infringir. Consequentemente, o sujeito, civil ou militar, na direção de
veículo sob a administração militar, transgride as regras contidas no Regulamento
Nacional de Trânsito. Ocorre que, assim procedendo, ele expõe a efetivo e grave
perigo a incolumidade pública, que deve ser entendida como complexo de bens
relativos à vida, à integridade física e à saúde de um número indeterminado de
pessoas, ofendendo a coletividade como um todo. Por isso, diz-se que no caso
ocorre o perigo, comum ou coletivo, de um número indeterminado de pessoas.
Nada impede, no entanto, que ocorra perigo ou dano a bens e interesses de
particulares.
Tratando-se de crime comum, o elemento subjetivo é o dolo de perigo,
vontade de transgredir norma de regulamento de trânsito e consciência de que
acarretará perigo comum. Consuma-se o crime quando ocorre a provação do risco
à incolumidade de outrem. Agente do crime ou sujeito ativo é tanto o civil como o
militar; o sujeito passivo é a coletividade ou o Estado, bem como aqueles que
individualmente sofreram o risco a sua vida e saúde.
Fuga após acidente de trânsito
Art. 281. Causar, na direção de veículo motorizado, sob administração militar,
ainda que sem culpa, acidente de trânsito, de que resulte dano pessoal, e, em
seguida, afastar-se do local, sem prestar socorro à vítima que dele necessite:
Pena - detenção, de seis meses a um ano, sem prejuízo das cominadas nos
arts. 206 e 210.
Isenção de prisão em flagrante
Parágrafo único. Se o agente se abstém de fugir e, na medida que as
circunstâncias o permitam, presta ou providencia para que seja prestado socorro à
vítima, fica isento de prisão em flagrante.
O núcleo do tipo é expresso pelo verbo causar, que lexicamente significa
motivar, originar, produzir. No caso, o agente, dirigindo veículo a motor, sob a
gerência militar, dá causa, isto é, produz acidente de trânsito consistente em
atropelamento o colisão, choque, abalroamento com outro veículo, de tudo
resultando dano pessoal à vítima.
No entanto, a conduta do agente torna-se reprovável no momento em que
devendo e podendo socorrê-la, pois necessita de cuidados médicos, afasta-se do
local em seguida. Pouco importa que tenha causado o acidente sem culpa. Em face
a legislação penal comum, pode configurar-se a omissão de socorro. Se o agente
omite a cautela, a atenção ou diligência devidas, em situações de negligência,
imprudência e imperícia, agindo portanto com culpa stricto sensu, ocorre a
cumulação das penas.
Assim, exemplificando, se o sujeito dirigindo uma viatura sob a
administração militar, atropela alguém por imprudência, ocasionando-lhe lesão
corporal, e, em seguida afasta-se do local sem prestar socorro à vítima que dele
necessitem, responderá pelo crime capitulado no art. 281 em concurso material com
o crime de lesão corporal culposa, previsto no art. 210.
Para ocorrência da fuga, é necessário que logo após o acidente, o sujeito
retire-se do local da ocorrência, numa manifestação inequívoca de objetivá-la. Por
isso que o elemento subjetivo do crime é dolo de perigo, sendo necessário que o
sujeito tenha consciência do perigo.
A objetividade jurídica, como se viu, é a incolumidade pública. O sujeito
ativo é tanto o civil como o militar. O sujeito passivo é qualquer pessoa, também civil
ou militar.
O crime se consuma com a provocação do acidente de trânsito com vítima
e consequente fuga imediata do agente. Não há forma culposa.
Inovação na atual legislação penal militar, como consta na Exposição de
Motivos, item 19, é a novidade de que “inclui-se aí o moderno princípio da isenção de
prisão em flagrante para o agente que, na condução de veículo motorizado, presta
socorro à sua vítima, na medida das possibilidades, sem se afastar do local do fato.”
Logo, no caso, o agente, que foi surpreendido na flagrância do delito, fica
isento da lavratura do auto de prisão em flagrante, desde que ocorra o pressuposto
previsto em lei, qual seja, o prestar ou providenciar socorro à vítima.
Dos crimes contra a Administração Militar
arts. 298 a 334, do CPM
Desacato a superior
Art. 298. Desacatar superior, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro,
ou procurando deprimir-lhe a autoridade:
Pena - reclusão, até quatro anos, se o fato não constitui crime mais
grave.
No caso, o bem jurídico tutelado é a dignidade, o prestígio da
Administração Militar, que é atingido na normalidade de seu funcionamento. O
sujeito ativo é o inferior ou subordinado, ao passo que o sujeito passivo é
superior. Este, como vimos, por definição, é o “militar que, em virtude da
função, exerce autoridade sobre outro de igual posto ou graduação” (art. 24 do
CPM). Também constitui sujeito passivo o Estado, que se vê atingido com
ofensa a seu funcionário militar.
O núcleo do tipo é expresso pelo verbo desacatar, que significa ofender,
humilhar. O crime se consuma por atitudes, gestos ou palavras, que ofendam a
dignidade ou o decoro do superior. A dignidade é o aspecto interno da honra
subjetiva, o sentimento do próprio valor moral; o decoro é a consciência da própria
respeitabilidade pessoal. As expressões: cachorro, canalha, ofendem a dignidade.
Outras como: burro, ignorante, ofendem o decoro.
No caso, portanto, o subordinado não visa atingir a dignidade ou o decoro
do seu superior, mas sim debilitar a sua autoridade.
O crime se consuma com a prática da ofensa, ou seja, no momento e lugar
em que o subordinado pratica o ato ofensivo ou profere palavras ultrajantes e o
superior toma conhecimento. Tratando-se de crime formal, são irrelevantes as
consequências do fato.
Agravação de pena
Parágrafo único. A pena é agravada, se o superior é oficial general ou
comandante da unidade a que pertence o agente.
No caso, o Conselho de Justiça deve observar o art. 73 do CPM, que
dispõe:
”Art. 73. Quando a lei determina a agravação ou atenuação da pena sem mencionar
o quantum , deve o juiz fixá-lo entre um quinto e um terço, guardados os limites da
pena cominada ao crime.”
Tratando-se a vítima de oficial general ou comandante da unidade a que
pertence o agente, entendeu o legislador que maior se torna a ofensa à disciplina,
ao respeito a seus superiores. Daí a majoração.
Desacato a militar
Art. 299. Desacatar militar no exercício de função de natureza militar ou em
razão dela:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, se o fato não constitui outro
crime.
No caso do artigo, o sujeito passivo não é superior do sujeito ativo.
Corresponde ao art. 331 do Código Penal que dispõe: “Desacatar funcionário
público no exercício da função ou em razão dela”.
O dispositivo prevê 02 hipóteses: na 1ª, é necessário que a ação
ocorra quando o militar esteja no exercício da função, praticando ato relativo
ao ofício, isto é, aquele que se compreende dentro de suas atribuições
funcionais ou regulamentares. Na 2ª hipótese, o desacato ocorre em virtude
da função, não estando o militar no exercício da atividade funcional.
Consequentemente, não há de se condizem respeito com sua atividade
funcional.
Desacato a assemelhado ou funcionário
Art. 300. Desacatar assemelhado ou funcionário civil no exercício de função
ou em razão dela, em lugar sujeito à administração militar:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, se o fato não constitui outro
crime.
O sujeito ativo é tanto o militar como o civil, conforme dispõe o art. 9º, III,
alínea b, segunda parte, in verbis: “ em lugar sujeito à administração militar, contra
militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil”. Convém lembrar que o
art. 9º do CPM dispõe as hipóteses consideradas crimes militares. Ressalta-se ao
final que não mais subsiste a figura do assemelhado em face do atual regime
estatutário a que estão sujeitos os funcionários civis.
Desobediência
Art. 301. Desobedecer a ordem legal de autoridade militar:
Pena - detenção, até seis meses.
O núcleo do tipo é expresso pelo verbo desobedecer, que significa não
atender, não aceitar a ordem legal de autoridade militar. Tutela o dispositivo o
prestígio da Administração Militar representada pelo funcionário militar que age em
seu nome. No caso, resguarda-se o princípio da autoridade militar, que não deve ser
ofendido.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa militar ou civil. O sujeito passivo é
o Estado, titular da normalidade da atividade administrativa militar. No caso, não
deixa de ser também ofendida a autoridade militar, que expediu a ordem legal. Por
esta, deve-se entender aquela compreendida entre as atribuições funcionais ou
regulamentadas da autoridade militar. A consumação ocorre no momento da ação
ou da omissão ilícita.
Vejamos uma decisão neste ínterim:
“Comete o crime de desobediência o soldado que se recusa a entrar em
forma para o rancho” (Apel. 16.539, ac. 23-7-49, DJ 5-9-49, p. 2.633).
Ingresso clandestino
Art. 302. Penetrar em fortaleza, quartel, estabelecimento militar, navio,
aeronave, hangar ou em outro lugar sujeito à administração militar, por onde seja
defeso ou não haja passagem regular, ou iludindo a vigilância da sentinela ou de
vigia:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, se o fato não constitui crime mais
grave.
O núcleo do tipo é expresso no verbo penetrar, que significa invadir,
introduzir-se. Entendeu o legislador tratar-se de delito de desobediência a uma
ordem geral, cuja objetividade jurídica constitui a Administração Militar, em particular
“da desobediência”. Em regra, todo lugar sujeito à administração militar é dotado de
local destinado a entrada e saída de pessoas. Ora, no momento em que o sujeito
penetra em lugar sujeito à administração militar por onde seja defeso ou não haja
passagem regular, atingindo astuciosamente e seu ingresso torna-se clandestino. É
necessário que o agente aja às ocultas.
O delito se consuma com a entrada concreta do agente, com o corpo
inteiro. Trata-se de delito instantâneo.
Inobservância de lei, regulamento ou instrução
Art. 324. Deixar, no exercício de função, de observar lei, regulamento ou
instrução, dando causa direta à prática de ato prejudicial à administração militar:
Pena - se o fato foi praticado por tolerância, detenção até seis meses; se
por negligência, suspensão do exercício do posto, graduação, cargo ou função, de
três meses a um ano.
O núcleo do tipo é expresso pelo verbo “deixar” de observar (omitir-se em
cumprir). No caso, o sujeito ativo, em regra o militar, podendo ser o civil quando
empregado na Administração Militar, no exercício de sua função, deixa de cumprir o
seu dever funcional, seja por tolerância ou negligência, de tudo resultando ato
prejudicial à administração militar. O texto fala tolerância, que significa
condescendência; fala em negligência, que significa descuido.
O delito se consuma com o efetivo prejuízo à administração militar
resultante da omissão do agente. O ato prejudicial à administração militar significa
aquele que realmente foi eficaz para comprometer, impedir ou dificultar o regular
funcionamento da Administração Militar, como por exemplo, o oficial que na função
do serviço de “oficial de dia”, por negligência, deixa de acionar o “plano de
chamada” da tropa, após receber ordens de seus superiores no sentido de mantê-la
de prontidão.
Violência arbitrária
Art. 333. Praticar violência, em repartição ou estabelecimento militar, no
exercício de função ou a pretexto de exercê-la:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da correspondente à
violência.
O núcleo do tipo é expresso pelo verbo praticar que significa exercer. Punese a prática da violência empregada contra a pessoa. A violência deve ser arbitrária,
isto é, não permitida em lei, portanto ilegítima e acima de tudo arbitrária. Essa
violência é manifestada através de vias de fato, como tapas, empurrões, pontapés,
etc. Ocorrendo lesões corporais ou homicídio haverá acúmulo de sanções em face
do preceito sancionador que dispõe a respeito da cominação e penas.
Exige ainda o dispositivo que a violência seja exercida em repartição ou
estabelecimento militar, bem como o sujeito tem que estar no exercício da função ou
a pretexto de exercê-la.
O delito se consuma com a prática de violência, consistente em vias de
fato, lesão corporal, etc. O sujeito ativo só pode ser o militar no exercício da função
ou a pretexto de exercê-la. O sujeito passivo é o Estado, primeiramente;
secundariamente, a vítima de violência.
Tipo Penal
Dispositivo Legal
Artigo
Núcleo do Tipo
Principal
Peculato
Art. 303, CPM
Apropriar-se de dinheiro, valor
ou qualquer outro bem móvel,
público ou particular, de que
tem a posse ou detenção, em
razão do cargo ou comissão, ou
desviá-lo em proveito próprio ou
alheio:
Apropriar
Concussão
Art. 305, CPM
Exigir, para si ou para outrem,
direta ou indiretamente, ainda
que fora da função ou antes de
assumi-la, mas em razão dela,
vantagem indevida:
Exigir
Corrupção
Passiva
Art. 308, CPM
Receber, para si ou para
outrem, direta ou indiretamente,
ainda que fora da função, ou
antes de assumi-la, mas em
razão dela vantagem indevida,
ou aceitar promessa de tal
vantagem:
Receber
Corrupção Ativa
Art. 309, CPM
Dar, oferecer ou prometer
dinheiro ou vantagem indevida
para a prática, omissão ou
retardamento de ato funcional:
Dar, oferecer,
prometer
Prevaricação
Art. 319, CPM
Retardar ou deixar de praticar,
indevidamente, ato de ofício, ou
praticá-lo contra expressa
disposição de lei, para
satisfazer interesse ou
sentimento pessoal:
Retardar, deixar de
praticar.
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Direito Penal Militar Professora: Lorena Braga Raposo