IMUNIDADE SOBRE OS TEMPLOS DE QUALQUER CULTO: ALCANCE E FINALIDADE JULIENE FALCÃO PEIXOTO Pós-graduanda em Direito e Processo Tributário pela PUC-GO [email protected] Orientadora Esp. Mercia M. Lisita RESUMO Desde a Antiguidade existiam imunidades, porém estas não eram criadas pelo ordenamento jurídico, eram concedidas segundo o interesse dos soberanos. A Constituição Federal de 1988 prevê o benefício fiscal da imunidade tributária, que consiste na não incidência dos impostos, constitucionalmente prevista. A imunidade pode ser específica ou genérica, conforme a abrangência da proibição de tributar, se relativa a um único ente político e a um tributo específico, ou não. Também pode ser objetiva, quando recai sobre um bem, ou subjetiva, quando recai sobre uma pessoa. A imunidade subjetiva sobre os templos de qualquer culto alcança não apenas o templo em si, mas a instituição religiosa, abrangendo as atividades fins da entidade, ainda que indiretamente. Esta imunidade possui finalidade não política, por proteger direito fundamental, porém podemos dizer que também possui finalidade política, para se evitar embate entre Estado e “Igreja”. O conteúdo foi verificado através dos métodos dedutivo e compilatório, mediante pesquisa teórica garantindo ampla abordagem do tema. Palavras-chave: 1. Imunidade tributária. 2. Templos de qualquer culto. 3. Interpretação ampla. INTRODUÇÃO O objetivo do trabalho é explicar o alcance da imunidade tributária sobre os templos de qualquer culto, explicitando que a imunidade prevista pela CF/88 busca proteger a liberdade de crença e o exercício do culto. Para melhor compreensão do instituto da imunidade tributária, será apresentada a origem histórica deste benefício fiscal, ressaltando que era concedido de forma arbitrária e não pelo ordenamento jurídico. Diversos autores conceituam o instituto da imunidade tributária, enquanto benefício fiscal de não incidência tributária, constitucionalmente previsto. Além disso, as imunidades tributárias podem ser classificadas quanto à amplitude, quanto à explicitude e ao modo de incidência. Com a apresentação do conceito e classificação do instituto, das imunidades tributárias, será então abordado o tema da imunidade tributária sobre os templos de qualquer culto, prevista no art. 150, inciso VI, “b”, da CF/88. O alcance desta imunidade merece uma interpretação extensiva, com relação à palavra “templos”, como será abordado, tendo em vista a previsão do art. 5°, VI, da Constituição Federal de 1988, cláusula pétrea, que garante a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos e a proteção aos locais de culto e suas liturgias. As instituições religiosas abrangem todas aquelas que praticam de forma coletiva os cultos religiosos, ritos e as crenças, como o Cristianismo, Budismo, Islamismo, Judaísmo, etc. Assim, não será discutida a forma de exercício de cada religião, muito menos julgado se tais práticas são consideradas religião ou não. A imunidade consiste numa competência negativa dos entes políticos de não tributar a instituição religiosa, quando no exercício de suas atividades essenciais e até mesmo no de outras atividades que visam à manutenção da entidade religiosa e do exercício do culto e liturgias. O parágrafo 4°, do art. 150, da CF/88, defini uma limitação à imunidade sobre os templos de qualquer culto, porém o Supremo Tribunal Federal aplica a este dispositivo constitucional uma interpretação extensiva, desde que não gere a concorrência desleal e que vise o investimento na atividade religiosa. Serão apresentados casos concretos, nos quais a imunidade sobre templos de qualquer culto é aplicada, destacando a finalidade do Estado de preservar o direito à liberdade de culto e crença e de não entrar em conflito com as instituições religiosas. Para demonstrar essa realidade para a sociedade será utilizado o método dedutivo e compilatório, através de análises jurisprudenciais, coleta de informações acerca de paginas na internet, referências teóricas publicadas em livros sobre o tema, doutrinas e pesquisas bibliográficas. Esta metodologia garantirá ampla compreensão da previsão constitucional da imunidade tributária sobre os templos de qualquer culto, ou melhor, sobre as atividades das instituições religiosas, assim como posterior análise crítica de toda a abordagem. 1 ORIGEM DAS IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS Para compreender-se o conceito de imunidade e a finalidade deste benefício fiscal atribuído à determinada pessoa, é necessário conhecer a origem deste benefício. A palavra “imunidade” vem do latim immunitas, immunitatis, e em português tínhamos immunidade, até que a reforma ortográfica luso-brasileira modificou para "imunidade". O significado da palavra é “ser ou estar livre de”, “dispensado de”, “resguardado de ou contra”, “incólume”, “liberado”, etc., conforme definido por João de Freitas Guimarães em seu Vocabulário etimológico do direito (p.150). Ou ainda, conforme Bernardo Ribeiro de Moraes (1998, p. 105), a palavra “imunidade” é composta pela palavra munus, que significa cargo, função ou encargo, e pelo prefixo in que indica negação, daí o significado sem encargo, livre de encargos. Importante ressaltar a consideração feita por Ricardo Silva (disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/xmlui/bitstream/handle/2011/16922/Imunidade_Templos_Qualquer _Ricardo_Silva.pdf> Acesso em 23 jul. 2012): a imunidade tributária é hoje o corolário da evolução histórica de um privilégio, oriundo do Estado Feudal, que, em decorrência das espantosas lutas sociais travadas especialmente nos séculos XVIII e XIX, transformou-se numa garantia constitucional, destinada a preservar e a incentivar a atividade de relevante interesse coletivo de certas pessoas descriminadas no Texto Constitucional. Na Antiguidade e na Idade Média, a imunidade era vista como um privilégio, considerando-se que havia diferentes classes sociais, os soberanos preocupavam-se em beneficiar seus próprios interesses, a imunidade era concedida aos amigos dos soberanos e aos que os seguiam. Porém, com o fim da diferenciação de classes, a imunidade passou a ser concedida com base no interesse social e político do Estado. (FARIA, 2002). Alguns fatos históricos contribuíram para a implantação da imunidade tributária no Brasil, o principal fato foi o da independência do Brasil Colônia em relação a Portugal, que obteve diversos motivos históricos dentre eles o surgimento da tributação (FARIA, 2002). Outro fato histórico foi a Conjuração Mineira de 1789, na qual fora exigido o pagamento dos impostos que estavam em atraso, mantendo-se os privilégios de determinadas classes e também a cobrança abusiva de impostos (FARIA, 2002). Após um século, com a Proclamação da República Federativa do Brasil e a instauração do Regime Federativo do Brasil, foram fixados regras e princípios jurídicos do Estado de Direito, não mais prevalecendo a imunidade como um privilégio de determinadas classes, conforme interesse dos soberanos, e sim conforme a ordem jurídica (FARIA, 2002). Assim, as primeiras efetivas imunidades tributárias no Brasil, nasceram com a Constituição da República do ano de 1891 e o fenômeno de não incidência foi sendo alterado, referindo-se a diversas situações e obtendo diversos Textos Constitucionais. A imunidade era tratada de acordo com as convicções políticas e econômicas de suas épocas e este instituto permanece até os dias atuais, com a Constituição Federal de 1988, baseando-se no interesse social, e não no intuito de privilegiar alguns, ou ao menos, é o que se espera do Poder Constituinte. (FARIA, 2002). 1.1 Conceito de Imunidades Tributárias Sobre o conceito de “imunidade tributária”, serão apresentados diversos doutrinadores com suas exemplares definições. Hugo de Brito Machado conceitua brilhantemente este instituto (2011, p. 285286): Imunidade é o obstáculo decorrente de regra da Constituição à incidência de regra jurídica de tributação. O que é imune não pode ser tributado. A imunidade impede que a lei defina como hipótese de incidência tributária aquilo que é imune. É limitação da competência tributária. Nesse sentido, é importante destacar que imunidade é a não incidência da norma tributária, constitucionalmente qualificada ou prevista, e que consiste na limitação da competência tributária dos entes tributantes (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). Outro conceito enriquecedor é o de Deusmar José Rodrigues (2010, p.119): Para nós, e mantendo-nos fiéis ao caminho que pretendemos percorrer, as imunidades são previsões constitucionais que vedam a instituição e, em decorrência disso, a cobrança de imposto, taxa e contribuição, por motivos políticos inerentes à pessoa, objeto ou ato. Claro está que as imunidades habitam somente o texto constitucional e nenhuma outra norma jurídica é hábil para consagrá-la. O assunto liga-se a questão da competência tributária. As imunidades são uma limitação ao poder de tributar dos entes políticos, além dos princípios constitucionais tributários, e encontram fundamentos políticos diversos, conforme a pessoa, objeto ou ato, a que se aplicam. O tributo é a máquina que faz o Estado funcionar, pois é com sua arrecadação obrigatória que o Estado possui recursos financeiros, para fornecer a sociedade elementos básicos para a sobrevivência como saúde, segurança, educação, moradia etc. (MARTINS, 2001). Apesar disso, o Estado prevê em sua Carta Magna o instituto da imunidade, para proteger alguns valores políticos, religiosos, educacionais, sociais, culturais e econômicos, fundamentais à sociedade brasileira. (MARTINS, 2001). O mestre Luciano Amaro (2003, p.148) conceitua imunidade dizendo que: A imunidade tributária é, assim, a qualidade da situação que não pode ser atingida pelo tributo, em razão de norma constitucional que, à vista de alguma especificidade pessoal ou material dessa situação, deixou-a fora do campo sobre que é autorizada a instituição do tributo. A imunidade tributária é definida por muitos doutrinadores como a não incidência constitucionalmente qualificada, pois coloca uma determinada situação fora da incidência de uma regra de tributação e as hipóteses de imunidade estão previstas no texto constitucional e, é chamada de qualificada, pois, não é uma circunstância simples de não incidência, e sim, determinada circunstância, na qual a situação deixa de ser definida como hipótese de incidência ou o ente político deixa de exercer a competência atribuída, conforme entendimento de Alexandre Machado de Oliveira (Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7865> Acesso em 24 jul. 2012). 1.2 Classificação Doutrinária das Imunidades Tributárias Para fins didáticos, a doutrina classifica as imunidades quanto à sua amplitude (genéricas e específicas), quanto ao modo de incidência (subjetiva, objetiva e mista) e quanto à sua explicitude (implícita e explícita). Segundo Fernando Lucena Pereira dos Santos Júnior, as imunidades quanto à amplitude, podem ser consideradas genéricas ou específicas. Serão genéricas, quando proibir todos os entes políticos de cobrar impostos sobre a renda, patrimônio e serviços. E serão específicas, quando se referirem a apenas um tributo e a um determinado ente político. (Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_ id=10626> Acesso em 25 jul. 2012). Já quanto ao modo de incidência, tem-se que a imunidade pode recair sobre sujeitos (subjetiva), sobre bens ou fatos (objetiva) ou ainda sobre ambos um sujeito específico e relacionado a determinado fato (mista). (Disponível em:<http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&arti go_id=10626> Acesso em 25 jul. 2012). Com relação à terceira classificação, quanto à explicitude, não se considera de grande valia, tendo em vista que em nossa Constituição Federal de 1988, não existe nenhuma imunidade implícita e que a consideração desta classificação pode induzir o intérprete da CF/88 a erros. (Disponível em:<http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&arti go_id=10626> Acesso em 25 jul. 2012). 2 IMUNIDADE SUBJETIVA DOS TEMPLOS DE QUALQUER CULTO Como visto anteriormente, a imunidade subjetiva é aquela que recai sobre um sujeito, e este é o caso da imunidade dos templos de qualquer culto, isto porque a Constituição Federal de 1988 ao prever esta imunidade, havia o condão de proteger a instituição religiosa (pessoa jurídica de direito privado) e não o templo. Este aspecto será estudado mais detalhadamente no próximo tópico: “O Alcance da Imunidade sobre os Templos de Qualquer Culto”. Além disso, a imunidade sobre templos de qualquer culto é genérica, visto que consiste na limitação do poder de tributar imposta a todos os entes políticos tributantes e se refere aos impostos sobre o patrimônio, renda e serviços. A CF/88, em seu art. 5°, elenca diversos direitos fundamentais, dentre eles está o direito a liberdade de crença, ao livre exercício dos cultos religiosos e a proteção dos locais de culto e suas liturgias, previstos no inciso VI. A imunidade dos templos de qualquer culto visa assegurar este direito fundamental, de modo a tornar viável a liberdade de crença e o exercício do culto, independentemente de qual é a religião do cidadão. De acordo com o art. 150, inciso VI, “b”, da CF/88, tem-se que é vedado a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos sobre os templos de qualquer culto. Nesse sentido é o entendimento de Roque Antonio Carrazza (2008, p.110): A Constituição garante, pois, a liberdade de crença e a igualdade entre as crenças, o que de resto, já vem proclamado em seu art. 5º, VI, e uma das formas encontradas para isto foi justamente esta: vedar a cobrança de qualquer imposto sobre os templos de qualquer culto. Assim, clara está a intenção do Constituinte em proteger, assegurar, o direito a livre manifestação de religiosidade e o art. 19, inciso I, da CF/88, ainda prevê que: Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçarlhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; Com base neste artigo da CF/88, tem-se que o Estado é laico e que o Estado deve manter-se neutro, com relação às variadas concepções religiosas, como bem esclarece Daniel Sarmento (2006, p.115): A Constituição Federal de 88 não se limitou a proclamar, como direito fundamental, a liberdade de religião (artigo 5º, inciso VI). Ela foi além, consagrando, no seu art. 19, inciso I, o princípio da laicidade do Estado, que impõe aos poderes públicos uma posição de absoluta neutralidade em relação às diversas concepções religiosas. Este princípio não indica nenhuma má-vontade do constituinte em relação ao fenômeno religioso, mas antes exprime ‘a radical hostilidade constitucional para com a coerção e discriminação em matéria religiosa, ao tempo em que afirma o princípio da igual dignidade e liberdade de todos os cidadãos’ [Jónatas Eduardo Mendes Machado. Liberdade Religiosa numa Comunidade Constitucional Inclusiva. Coimbra: Coimbra Editora, 1996, p. 347].(...) Portanto, a imunidade tributária sobre os templos de qualquer culto, que protege o direito a liberdade de crença e o direito ao exercício do culto, abrange toda e qualquer instituição religiosa. 2.1 O Alcance da Imunidade sobre os “Templos” de Qualquer Culto O art. 150, inciso VI, “b”, da Constituição Federal de 1988 diz: Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) VI - instituir impostos sobre: (...);b) templos de qualquer culto; O Código Tributário Nacional de 1966, em seu art. 9°, inciso IV, “b”, também já dizia: Art. 9º - É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...); IV - cobrar imposto sobre: (...); b) templos de qualquer culto; Considerando-se a interpretação literal do dispositivo constitucional apresentado, temos que a imunidade recai apenas sobre o templo, o imóvel no qual são exercidos os cultos e liturgias. Porém, a doutrina majoritária se manifesta no sentido de que “templo” não abrange apenas o edifício onde o culto se realiza, utilizando-se de uma interpretação mais ampla, e ao mesmo tempo, levando-se em consideração a atividade fim da instituição religiosa, ainda que indiretamente. Nesse sentido é o entendimento Hugo de Brito Machado (2010, p.304): templo não significa apenas a edificação, mas tudo quanto seja ligado ao exercício da atividade religiosa. Paulo de Barros Carvalho (2010, p.240), também ressalta seu pensamento sobre o alcance desta imunidade: deve prevalecer uma exegese bem larga, atentando-se, apenas, para os fins específicos de sua utilização. Limitar a imunidade prevista no art. 150, inciso VI, “b”, da CF/88, apenas aos edifícios nos quais se realizam os cultos e liturgias seria atentar contra a verdadeira intenção do legislador constituinte, que é a de garantir a sociedade o acesso ao exercício de sua crença, religião. O entendimento do tributarista Aliomar Baleeiro (1998, p.136), também é no sentido de se considerar uma interpretação ampla: o templo não deve ser apenas a igreja, sinagoga ou edifício principal, onde se celebra a cerimônia pública, mas também a dependência acaso contígua, o convento, os anexos por força de compreensão, inclusive a casa ou residência especial, do pároco ou pastor, pertencente à comunidade religiosa, desde que não empregados em fins econômicos. Destaca-se a seguir o entendimento do Supremo Tribunal Federal, no que diz respeito ao alcance da imunidade sobre os templos de qualquer culto, esclarecendo que esta imunidade estende-se a outros bens, serviços, rendas, que estejam ligados a atividade fim da instituição religiosa, ainda que indiretamente (Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=260872> Acesso em: 30 jul. 2012.): EMENTA: Recurso extraordinário. 2. Imunidade tributária de templos de qualquer culto.Vedação de instituição de impostos sobre o patrimônio, renda e serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades. Artigo 150, VI, "b" e § 4º, da Constituição. 3. Instituição religiosa. IPTU sobre imóveis de sua propriedade que se encontram alugados. 4. A imunidade prevista no art. 150, VI, "b", CF, deve abranger não somente os prédios destinados ao culto, mas, também, o patrimônio, a renda e os serviços "relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas". (...). (STF, RE 325822 / SP - SÃO PAULO, Relator (a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, DJ 14-05-2004). Assim, considerando a intenção do legislador constituinte, a imunidade sobre templos de qualquer culto abrange todos os bens, renda e serviços, que possuem como finalidade a prática da crença, cultos. É o que a CF/88 busca garantir com a previsão deste benefício fiscal. 2.2 Não Incidência dos “Impostos” Sobre o Patrimônio, Renda e Serviços, relacionada com as “Atividades Essenciais” da Instituição Religiosa – § 4º, art. 150, da CF/88 O § 4º, art. 150, da CF/88, dispõe que: § 4º - As vedações expressas no inciso VI, alíneas (b) e (c), compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas. Os impostos sobre patrimônio, renda e serviços, compreendem respectivamente: ITCMD (Imposto sobre a transmissão causa mortis e doação), ITBI (Imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos relativos a ele), IPVA (Imposto sobre a propriedade de veiculo automotor), IPTU (Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana), IGF (Imposto sobre grandes fortunas) e ITR (Imposto sobre a propriedade territorial rural); IR (Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza); ISS (Imposto sobre serviços de qualquer natureza). Esta definição apresentada acima é feita pelo próprio Código Tributário Nacional de 1966, conforme previsto ao longo do Capítulo II ao Capítulo V. Desta forma, os impostos sobre a importação de produtos estrangeiros; sobre exportação de produtos nacionais ou nacionalizados; sobre os produtos industrializados; sobre as operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários; e sobre a circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicações (II, IE, IPI, IOF e ICMS), não estão incluídos, expressamente, na vedação constitucional de a União, os Estados, DF e os Municípios, criar e instituir impostos, sobre os templos de qualquer culto (art. 150, VI, “b”, CF/88), conforme redação do § 4º, art. 150, da CF/88. Porém, segundo a jurisprudência dominante e o entendimento do contador e especialista em Direito Tributário, Augusto Luiz de Almeida, interpreta-se este dispositivo de forma extensiva, de modo a conferir imunidade sobre os templos de qualquer culto, também no que tange ao II, IE, IPI, IOF e ICMS (Disponível em: <http://www.artigos.com/artigos/sociais/administracao/planejamento-tributario/imunidadetributaria-para-templos-de-qualquer-culto-_-parte-i-71/artigo/> Acesso em 25 jul. 2012): Se o Templo de qualquer Culto com imunidade tributária possui outras atividades relacionadas e que representem atividades essenciais e cujo resultado financeiro destas atividades sejam revertidos para a entidade religiosa, não deve haver impostos incidentes sobre estas atividades. Dito isto, é necessário definir-se o que abrange “finalidades essenciais” da instituição religiosa ou dos templos de qualquer culto, para que não seja cometido nenhum excesso no gozo desta imunidade sobre os templos de qualquer culto. Ao mesmo tempo, interpretar um dispositivo da Constituição Federal de 1988, de forma isolada, sem considerar o espírito da mesma e sem considerar os princípios nela contidos, é um retrocesso. Ricardo Silva, que defini o termo “finalidade essencial” e, então, estabelece a interpretação do § 4º, art. 150, da CF/88 (Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/xmlui/bitstream/handle/2011/16922/Imunidade_Templos_Qualquer _Ricardo_Silva.pdf?sequence=1> Acesso em 25 jul. 12): representa um elo entre o culto e o patrimônio bem como com as rendas da instituição religiosa, consubstanciando-se nas atividades que propiciam tanto a manutenção do templo como a prática do culto, tendo como fundamento de validade o princípio maior da liberdade de culto, previsto na Constituição Federal como cláusula pétrea. É premissa básica que o sistema jurídico é um todo harmonioso, de forma que as normas que o compõem não são dispostas aleatoriamente, mas sim de forma organizada e concatenada, harmônica, inteligente, formando um sistema coerente e bem estruturado, segundo regras próprias, em decorrência de princípios que facultam ao jurista a resolução de todos os desafios que lhe são apresentados. O sentido da norma decorre principalmente dos seus elementos e da forma pelo qual foram organizados, isto é, pela sua estrutura, que sempre circunda os valores adotados como princípios. Assim sendo, é impraticável a interpretação isolada do parágrafo 4º do artigo 150 da Constituição Federal, pois sua melhor exegese decorre exatamente da sua relação com todo o sistema que consubstancia a Carta Política. Sendo assim, num primeiro momento, a imunidade aplica-se apenas ao patrimônio, renda e serviços que estejam diretamente ligados às atividades essenciais dos templos. Porém, não se pode restringir a imunidade sobre os templos de qualquer culto apenas às atividades essenciais das instituições religiosas, àquelas diretamente ligadas ao exercício do culto e liturgias. Deve-se observar que outras atividades praticadas pelas instituições religiosas, ainda que não tenham ligação direta com o exercício do culto, são indiretamente destinadas a manutenção dos templos, dos serviços religiosos etc. O doutrinador Ives Gandra da Silva Martins (1998, p. 45-48) comenta tal dispositivo constitucional: O § 4º, todavia, ao falar em atividades relacionadas, poderá ensejar a interpretação de que todas elas são relacionadas, na medida em que destinadas a obter receitas para a consecução das atividades essenciais. Como na antiga ordem, considero não ser esta a interpretação melhor na medida em que poderia ensejar concorrência desleal proibida pelo art. 173, §4º da Lei Suprema. Com efeito, se uma entidade imune explorasse atividade pertinente apenas ao setor privado, não haveria a barreira e ela teria condições de dominar mercados e eliminar a concorrência ou pelo menos obter lucros arbitrários, na medida em que adotasse idênticos preços de concorrência mais livre de impostos. Ora, o Texto Constitucional atual objetivou, na minha opinião, eliminar, definitivamente, tal possibilidade, sendo que a junção do princípio estatuído nos arts. 173, §4º e 150, § 4º, impõe a exegese de que as atividades, mesmo que relacionadas indiretamente com aquelas essenciais das entidades imunes enunciados nos incs. b e c do art. 150, VI, se forem idênticas ou aná1ogas às de outras empresas privadas, não gozariam de proteção imunitória. Exemplificando: se uma entidade imune tem um imóvel e o aluga. Tal locação não constitui atividade econômica desrelacionada de seu objetivo nem fere o mercado ou representa uma concorrência desleal. Tal locação do imóvel não atrai, pois, a incidência do IPTU sobre gozar a entidade de imunidade para não pagar imposto de renda. A mesma entidade, todavia, para obter recursos para suas finalidades decide montar uma fábrica de sapatos, porque o mercado da região está sendo explorado por outras fábricas de fins lucrativos, com sucesso. Nessa hipótese, a nova atividade, embora indiretamente referenciada, não é imune, porque poderia ensejar a dominação de mercado ou eliminação de concorrência sobre gerar lucros não tributáveis exagerados se comparados com os de seu concorrente. Pelo comentário exposto, pode-se dizer que a instituição religiosa poderá praticar atividades não essenciais ao exercício do culto, desde que eventuais lucros desta atividade sejam destinados a outras atividades fins da instituição religiosa, e desde que não crie concorrência desleal com as empresas privadas, já que a instituição religiosa é imune a impostos, e assim há uma redução no preço do bem ou serviço. Outro aspecto contido no § 4º, art. 150, da CF/88, é a limitação do benefício fiscal, imunidade, aos impostos e não aos demais tributos. Conforme previsão constitucional, a imunidade sobre templos de qualquer culto, refere-se à vedação da instituição de “impostos” sobre as atividades praticadas pelas instituições religiosas, porém a imunidade não abrange as outras espécies de tributo, como taxas e contribuições. Segundo, o advogado e especialista em Direito Tributário pela PUC-SP, Doutor Rafael Franceschini Leite, é importante destacar-se o conceito de “impostos”, para demonstrar que este é uma espécie de tributo, segundo o art. 16, do CTN, (Disponível em: <http://www.artigonal.com/direito-tributario-artigos/tributacao-sobre-templos-de-qualquerculto-imunidades-conferidas-pela-constituicao-federal-de-1988-667657.html> Acesso em 26 jul. 2012): Art. 16. Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte. Nesse sentido é a jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (Disponível em: <http://www.tjrj.jus.br/scripts/weblink.mgw?MGWLPN=DIGITAL1A&LAB=CONxWEB &PGM=WEBPCNU88&PORTAL=1&protproc=1&N=201200209576> Acesso em: 30 ago. 2012) e a do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (Disponível em: <http://www.tjgo.jus.br/index.php?sec=consultas&item=decisoes&subitem=jusrisprudenci a&acao=consultar> Acesso em: 03 ago. 2012): EMENTA: AGRAVO. IGREJA CATÓLICA. IMUNIDADE, CUSTAS E TAXA JUDICIÁRIAS. DESCABIMENTO. Trata-se de agravo de instrumento pelo qual a agravante se insurge contra a decisão que lhe indeferiu o benefício da gratuidade de justiça. Alega, em síntese, que o pedido não provém de uma eventual hipossuficiência, mas sim, da imunidade tributária que lhe foi concedida pelo ACORDO ENTRE A REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL E A SANTA SÉ RELATIVO AO ESTATUTO JURÍDICO DA IGREJA CATÓLICA NO BRASIL, promulgado pelo Decreto Federal 7107/2011. A questão submetida à apreciação cinge-se à extensão da imunidade concedida pelo art. 15 do citado acordo. A imunidade concedida refere-se aos impostos, e não a taxas, como o é a taxa judiciária e custas pelas despesas na tramitação do feito. Também o acordo, aponta a imunidade, em conformidade com a Constituição Federal, o que significa dizer que a imunidade alcança apenas o templo católico, assim como a renda e os serviços produzidos por ele, relacionados com as finalidades essenciais (art. 150 da CF). Recurso manifestamente improcedente. Seguimento negado.” (TJ/RJ, 15° Camara Civel, Agravo de Instrumento, Processo nº 001375135.2012.8.19.0000, Relator: Des. RICARDO RODRIGUES CARDOZO, DJ 10/04/12). EMENTA: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DANO MORAL E MATERIAL. PRELIMAR. INEPCIA DA PETICAO INICIAL. INCONSISTENCIA. DANO MORAL. PROVA. DESNECESSIDADE. DANO MATERIAL. COMPROVACAO. QUANTUM INDENIZATORIO. MANUTENCAO. CUSTAS PROCESSUAIS E HONORARIOS ADVOCATICIOS. AUSENCIA DE IMUNIDADE. I – (...). II – (...). III - A TEOR DO ARTIGO 333, INCISO II, DO CPC, DISPOE QUE O ONUS DA PROVA INCUMBE AO REU, QUANTO A EXISTENCIA DE FATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO DO DIREITO DO AUTOR. IV - O QUATUM ARBITRADO A TITULO DE DANO MORAL DEVE SER SUFICIENTE PARA INFRIGIR AO OFENSOR A REPROVACAO PELO ATO LESIVO, POREM NAO PODE SER EXACERBADA AO PONTO DE ACARRETAR O ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DO OFENDIDO. V - A DEMOLICAO IRREGULAR DE RESIDENCIA, DESALOJANDO A PROPRIETARIA, CONFIGURA DANO MATERIAL SUJEITO A RESSARCIMENTO. INCABIVEL A MAJORACAO OU REDUCAO. VI – A IMUNIDADE CONFERIDA AOS TEMPLOS RELIGIOSOS PELO ART. 150, VI, 'B' DA CF, E LIMITADA AOS IMPOSTOS, NAO ALCANCANDO OUTRAS ESPECIES TRIBURIAS E MUITO MENOS O CUSTEIO DE CUSTAS PROCESSUAIS E HONORARIOS ADVOCATICIOS. APELACOES CIVEIS CONHECIDAS E DESPROVIDAS. (TJ/GO, 3° CAMARA CIVEL, PROC.REC.: 146202-2/188 - APELACAO CIVEL, RELATOR: DES. ROGERIO AREDIO FERREIRA, DJ 444 de 21/10/2009). 3 A FINALIDADE DA IMUNIDADE SOBRE OS TEMPLOS DE QUALQUER CULTO A Constituição Federal de 1988, em seu art. 19, inciso I, demonstra a intenção do Estado de se afastar das atividades religiosas, no sentido de não intervir na realização dos cultos religiosos. Nesse sentido é o entendimento da advogada e especialista em Direito Tributário pela PUC-SP, Doutora Marina Vanessa Gomes Caeiro, no sentido de que os assuntos espirituais, de fé e crença, transcendem ao mundo material e terreno, daí a necessidade de separar as instituições do Estado e da Igreja. Como pode o ordenamento jurídico editado por homens restringir a manifestação da crença divina e da religião de cada cidadão? (Disponível em: <http://www.ambito- juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7774&revista_> Acesso em 26 jul. 2012). É válido outro pensamento da especialista em Direito Tributário, Doutora Marina Vanessa Gomes Caeiro (Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7774& revista_> Acesso em 26 jul. 2012): O artigo 150, inciso VI, alínea b da Constituição Federal de 1988 é a origem dessa norma imunizante que remonta à separação entre a Igreja e o Estado, consumada a proclamação da República. A Constituição de 1891 vedava o embaraço aos cultos por via da tributação em seu artigo 11, parágrafo 2º. Essa imunidade tributaria dos templos religiosos visa garantir a eficácia da diretriz constitucional da liberdade de crença e o exercício livre de cultos religiosos. Assim, a finalidade maior da imunidade tributária sobre os templos de qualquer culto, considerando seu alcance e interpretação, já estudados anteriormente, é a de zelar pela proteção ao art. 5°, inciso VI, da Constituição Federal de 1988, que visa a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, do livre exercício dos cultos religiosos e a proteção dos locais de culto e suas liturgias. Como bem destaca Marina Vanessa Gomes Caeiro, (Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7774& revista_> Acesso em 26 jul. 2012): O Estado não é sucedâneo a perfeição, salvo para os que admitem Hegel: logo, como homem é obra do criador, e o Estado é obra do homem, pela ordem das precedências ao Estado só cabe, ao menos, manter-se respeitosamente distante, mas bem distante, dos assuntos d’eles. Pois é historicamente provado que toda a vez que o estado interferiu, positiva ou negativamente, em assuntos que o superam, foram momentos de muita dor, sofrimento, perseguição , e injustiças; portanto, leitores, mantenham o Estado e a religião em seus devidos lugares, um cuidando dos assuntos terrenos e o outro dos assuntos divinos. Assim, a imunidade sobre os templos de qualquer culto, consagra-se numa finalidade não política, pois objetiva a proteção de um direito fundamental, protegido pela Constituição Federal de 1988. Mas, pode-se dizer que também possui finalidade política, tendo em vista o receio que o Estado possui em interferir nos assuntos religiosos e divinos, considerando a força que as instituições religiosas possuem sobre a sociedade. 4 ANÁLISE DE CASOS CONCRETOS E APRESENTAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIAS É importante destacar algumas situações fáticas, para melhor compreensão do alcance da imunidade sobre os templos de qualquer culto, apresentando o entendimento jurisprudencial. O primeiro caso é o das vendas de santos de barro, terços, camisetas etc., realizadas pela instituição religiosa. No ano de 1999, o Supremo Tribunal Federal, abriu um precedente jurisprudencial, com o julgamento do Recurso Extraordinário n° 210/251. Segue a ementa do julgamento (Disponível <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=238952> em: Acesso em: 03 ago. 2012): EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTARIO. ICMS. IMUNIDADE TRIBUTARIA. INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS. C.F. ART 150, VI, c. I – Não há invocar, para o fim de ser restringida a aplicação da imunidade, critérios de classificação dos impostos, adotados por normas infraconstitucionais, mesmo porque não é adequado distinguir entre bens e patrimônio, dado este se constitui do conjunto daqueles. O que cumpri perquirir, portanto, é se o bem adquirido, no mercado interno ou externo, integra o patrimônio da entidade abrangida pela imunidade. II – Precedentes do STF (...); III – RE conhecido e provido. (STF, RE 210/251, RELATOR: MINISTRO CARLOS VELLOSO, DJ 05/02/99). Assim, pode-se dizer que o entendimento do STF é no sentido de que a entidade religiosa, pode realizar a venda de santos de barro, terços, etc., que estará imune ao pagamento do ICMS. Conforme entendimento de Aliomar Baleeiro (1999, p.313), para a imunidade alcançar os efeitos de proteção e estímulo da atividade religiosa, deve abranger também os impostos que diminuiriam a eficácia dos serviços da instituição religiosa. Como é o caso do ICMS, que se cobrado da entidade religiosa, poderia causar sua desestabilização, visto que teria que arrecadar determinado valor ao Estado, valor este que seria destinado às atividades religiosas. Outro fator que deve-se destacar é o fato de que esta imunidade, como já visto, é subjetiva e, portanto, o benefício fiscal se dá pelo fato de ser a entidade religiosa quem realiza a venda, e não, pelo fato de o objeto ser o terço, camisetas, etc. O segundo caso, a ser analisado, é sobre a cobrança de IPTU sobre o terreno do cemitério. O STF, no julgamento do Recurso Extraordinário n° 578562, de 21/05/2008 expõe que (Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=547393> Acesso em: 04 ago. 2012): EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. IPTU. ARTIGO 150, VI, B, CB/88. CEMITÉRIO. EXTENSÃO DE ENTIDADE DE CUNHO RELIGIOSO. 1. Os cemitérios que consubstanciam extensões de entidades de cunho religioso estão abrangidos pela garantia contemplada no artigo 150 da Constituição do Brasil. Impossibilidade da incidência de IPTU em relação a eles. 2. A imunidade aos tributos de que gozam os templos de qualquer culto é projetada a partir da interpretação da totalidade que o texto da Constituição é, sobretudo do disposto nos artigos 5º, VI, 19, I e 150, VI, b. (...) (STF, RE 578562, RELATOR: MINISTRO EROS GRAU, DJ 21/05/2008). Nesse sentido, o STF entende que o cemitério de pessoas de uma comunidade, desde que não tenha fins lucrativos e que constitua uma extensão da atividade religiosa, possui imunidade tributária do IPTU. Inclusive é de se destacar um trecho do relatório do Ministro Eros Grau, neste julgamento (RE 578562): (...) No caso destes autos o cemitério é anexo a capela na qual o culto da religião anglicana é praticado, trata-se do mesmo imóvel, parcela do patrimônio, da recorrente, abrangido pela garantia contemplada no art.150. Garantia desdobrada do disposto no art. 5°, VI e 19, I, da Constituição do Brasil. A imunidade aos tributos, de que gozam os templos de qualquer culto, é projetada a partir da (i) proteção aos locais de culto e suas liturgias e da (ii) salvaguarda contra qualquer embaraço ao seu funcionamento. Da interpretação da totalidade que o texto que a Constituição é, em especial dos seus artigos 5°, VI; 19, I, e 150, VI, b, tem-se que, no caso, o IPTU não incide (...). Desta forma, o IPTU não incide sobre a propriedade do cemitério, quando este constitui um local de realização do culto, como ocorre na religião anglicana, que utiliza o cemitério como anexo à capela, sendo uma parcela do patrimônio da entidade religiosa e não utiliza o cemitério para fins lucrativos, como outras empresas privadas o fazem. E o terceiro caso, é o que está descrito na Súmula 724 do Supremo Tribunal Federal, que prevê a imunidade do IPTU às entidades de assistência social, mesmo quando da locação do imóvel a terceiros (Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula&pagina=su mula_701_800> Acesso em: 30 jul. 2012): Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, c, da Constituição, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades essenciais de tais entidades. Esta súmula refere-se às entidades de assistência social (art. 150, VI, “c”, da CF/88), mas também se aplica às entidades religiosas, no sentido de que a entidade continuará a ter a imunidade ou não do IPTU, dependendo da finalidade ou destinação do dinheiro arrecadado com o aluguel do imóvel de sua propriedade. Nesse sentido é o entendimento do STF (Disponível <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=260872> em: Acesso em: 03 ago. 2012): EMENTA: Recurso extraordinário. 2. Imunidade tributária de templos de qualquer culto. Vedação de instituição de impostos sobre o patrimônio, renda e serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades. Artigo 150, VI, "b" e § 4º, da Constituição. 3. Instituição religiosa. IPTU sobre imóveis de sua propriedade que se encontram alugados. 4. A imunidade prevista no art. 150, VI, "b", CF, deve abranger não somente os prédios destinados ao culto, mas, também, o patrimônio, a renda e os serviços "relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas". 5. (...). (STF, RE 325822 / SP - SÃO PAULO, RELATOR: Min. ILMAR GALVÃO, DJ 14-05-2004). O intuito do legislador constituinte que prevalece é o de proteger o direito fundamental previsto no art. 5°, VI, da CF/88, como bem demonstrado, fazendo-se uso de interpretação ampla e não isolada do art. 150, VI, “b” e parágrafo 4°. CONCLUSÃO A imunidade tributária existe desde a Antiguidade, porém era concedida de acordo com os interesses dos soberanos, atualmente as imunidades existentes levam em consideração os interesses sociais ou ao menos, é nesse sentido que elas devem ser concedidas. A Constituição Federal de 1988 prevê a imunidade tributária sobre os templos de qualquer culto, em seu art. 150, VI, “b” e parágrafo 4°. A imunidade tributária implica na previsão constitucional da não incidência dos impostos previstos no ordenamento jurídico brasileiro, ou seja, consiste numa competência negativa dos entes políticos tributantes, para não tributar essas pessoas (instituições religiosas), no que tange aos impostos. A imunidade sobre os templos de qualquer culto é subjetiva, pois recai sobre a pessoa jurídica da instituição religiosa, englobando assim não só o templo, como também todas as atividades realizadas pela instituição, desde que o lucro seja investido na atividade religiosa. Desta forma, são abrangidas pela imunidade as atividades não essenciais ao exercício do culto, realizadas pela entidade religiosa, como o contrato de locação, no qual a entidade aluga um imóvel para terceiro e com a renda do aluguel investi na criação de novos templos, por exemplo. Como visto, a instituição religiosa possui imunidade com relação a todos os impostos previstos no ordenamento jurídico e não só aos impostos sobre patrimônio, renda e serviços, desde que haja o investimento na atividade religiosa. Assim, possui obrigação tributária com relação às taxas, contribuição de melhoria e contribuições especiais. A principal finalidade da concessão deste benefício fiscal é não política e abrange o direito fundamental, previsto no art. 5°, VI, da CF/88, do direito à liberdade de crença, religião e de exercício ao culto, além da proteção aos locais de culto e liturgias, que sem esta imunidade estariam ameaçados de extinção. Porém, não se pode negar a finalidade política que influenciou o Estado, a conceder imunidade às instituições religiosas através do poder constituinte originário. A finalidade política refere-se à vontade do Estado de “não contrariar” às ideias expressas pelas instituições religiosas, devido ao poder que esta entidade exerce sobre a sociedade. Além disso, ambas as entidades, Estado e “Igreja” possuem finalidades sociais diversas e uma entidade não deve contrariar a outra, sob pena de gerar um caos social. Imaginem o Estado cobrando IPTU sobre o templo? Se a “Igreja” não possui recurso financeiro para pagar este tributo, a atividade religiosa fica impedida e gera uma revolta entre os fiéis contra a atitude do Estado, daí a necessidade de se conferir a imunidade às atividades realizadas por esta entidade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, Augusto Luiz de. Disponível em: <http://www.artigos.com/artigos/sociais/administracao/planejamento-tributario/imunidadetributaria-para-templos-de-qualquer-culto-_-parte-i-71/artigo/> Acesso em 25 jul. 2012. AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 9 ed. Saraiva. São Paulo: 2003. BALEEIRO, Aliomar. 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