FACULDADE DE PARÁ DE MINAS – FAPAM
Curso de Direito
Vanessa Antônia Paraizo
A CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E O ORDENAMENTO
JURÍDICO BRASILEIRO À LUZ DO PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA
Pará de Minas
2011
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Vanessa Antônia Paraizo
A CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E O ORDENAMENTO
JURÍDICO BRASILEIRO À LUZ DO PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA
Monografia apresentada à coordenação de Direito
da Faculdade de Pará de Minas como requisito
parcial para conclusão do Curso de Direito.
Orientadora: Graciane Rafisa Saliba
Pará de Minas
2011
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Vanessa Antônia Paraizo
A CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E O ORDENAMENTO
JURÍDICO BRASILEIRO À LUZ DO PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA
Monografia apresentada à coordenação de Direito
da Faculdade de Pará de Minas como requisito
parcial para conclusão do Curso de Direito.
Aprovada em ____ / _____ / _____
_______________________________________________
Professora Orientadora: Mestre Graciane Rafisa Saliba
___________________________________________________
Professora Examinadora: Especialista Ana Paula Santos Diniz
______________________________________________________
Examinador convidado: Especialista Felipe Bouzada Flores Viana
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RESUMO
Este trabalho tem o objetivo de, sob forma de revisão bibliográfica, cujo tema é “As
decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos e o ordenamento jurídico
brasileiro à luz do Pacto de São José da Costa Rica”, fazer um estudo geral sobre os
direitos humanos; pesquisar sobre a Comissão Interamericana de Direitos Humanos
e a Corte Interamericana, destacando como funcionam e quando/como serão
invocadas; analisar as consequências da falta de posicionamento brasileiro diante do
dever que tal Estado assumiu com a ratificação do Pacto de São José da Costa Rica,
de adequar o seu ordenamento jurídico à normativa internacional; e também, saber
como o Brasil tem se comportado, especificamente, em relação à prisão do
depositário infiel. Diante do exposto, analisar a necessidade de uma emenda
constitucional ou mesmo de uma legislação disciplinando sobre a normativa
internacional, considerando que, desta forma, o Brasil estará fortalecendo a
jurisdicionalidade atribuída à Corte Interamericana, demonstrando maior respeito às
suas decisões.
Palavras-chave: Direitos humanos. Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Ordenamento interno brasileiro. Depositário infiel. Emenda constitucional.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................05
2 DIREITOS HUMANOS ...........................................................................................07
2.1 A Declaração Universal dos Direitos Humanos .............................................07
2.2.1 Os Direitos Humanos no Brasil ........................................................................07
2.2 Evolução Histórica dos Direitos Humanos .....................................................11
2.3 Os Direitos Humanos nos dias atuais .............................................................13
3 A CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS - PACTO DE SÃO
JOSÉ DA COSTA RICA - ........................................................................................16
3.1 O surgimento do Pacto de São José da Costa Rica ......................................16
3.2 O Pacto de São José da Costa Rica no Brasil ................................................18
3.2.1 O Pacto de São José da Costa Rica e a Emenda Constitucional Nº 045/2004
....................................................................................................................................21
4 A CORTE E A COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E A
APLICABILIDADE DAS SENTENÇAS NO BRASIL ................................................26
4.1 A Corte Interamericana de Direitos Humanos ................................................26
4.2 A Comissão Interamericana de Direitos Humanos ........................................29
4.3 Corte Interamericana de Direitos Humanos e Comissão Interamericana de
Direitos Humanos: diferenças básicas .................................................................31
5 AS SENTENÇAS DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS...34
5.1 A aplicabilidade das sentenças no Estado brasileiro ....................................34
5.2 A distinção entre sentença estrangeira e sentença internacional e a (des)
necessidade de homologação das sentenças da Corte Interamericana pelo
Superior Tribunal de Justiça ..................................................................................38
5.3 A obrigação de executar as sentenças da Corte.............................................39
5.4 Sentenças da Corte Interamericana contra o Brasil: casos reais a título
exemplificativo .........................................................................................................41
5.4.1 Caso: Damião Ximenes Lopes .........................................................................41
5.4.2 Caso: Guerrilha do Araguaia ............................................................................43
5.4.3 Caso: Maria da Penha ......................................................................................45
5 CONCLUSÃO ........................................................................................................47
REFERÊNCIAS .........................................................................................................49
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1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho versa sobre a aplicabilidade das decisões da Corte
Interamericana de Direitos Humanos no ordenamento jurídico brasileiro à luz do
Pacto de São José da Costa Rica. O referido Pacto tem como base a Declaração
Universal dos Direitos Humanos compreendendo, assim, um ideal de ser humano
livre, assegurando-lhe condições de gozar de seus direitos econômicos, sociais e
culturais, bem como de seus direitos civis e políticos.
A importância do tema é ampliada ao averiguar os motivos de o Estado
brasileiro ter expressamente reconhecido o referido Pacto, reconhecida ainda a
jurisdicionalidade da Corte Interamericana de Direitos Humanos, comprometendose, inclusive, a se adequar ao que nele é proposto, e, ainda assim, entretanto, até os
dias de hoje, manter-se inerte quanto ao seu ordenamento interno.
A falta de posicionamento do estado brasileiro pode causar um desconforto
tanto em relação aos Estados membros que já se adequaram ao disposto no Pacto
de São José da Costa Rica, ensejando incertezas e inseguranças jurídicas aos
jurisdicionados. Considerando as hipóteses de uma Emenda Constitucional ou
mesmo de uma legislação disciplinando tal tema, o Brasil estaria fortalecendo a
jurisdicionalidade da Corte e também demonstrando maior respeito às suas
decisões.
A pesquisa realizada no presente trabalho foi básica, qualitativa, explicativa,
descritiva e bibliográfica.
Visualiza-se na presente pesquisa toda evolução dos direitos humanos, desde
o surgimento até a situação atual, incluindo as medidas necessárias à sua garantia.
O enfoque maior gira em torno do Estado brasileiro e como ele lida com essa
matéria, principalmente nos dias atuais.
Para tanto, estruturou-se o trabalho de um modo em que, primeiro abordou-se
o estudo dos direitos humanos: a Declaração Universal dos Direitos Humanos, os
Direitos Humanos no Brasil, a Evolução Histórica dos Direitos Humanos, os Direitos
Humanos nos dias atuais.
Após, preocupou-se em analisar o Pacto de São José da Costa Rica e a
Emenda Constitucional Nº 045/2004.
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Feitos esses estudos introdutórios do tema, tornou-se necessário analisar os
principais aspectos da Corte Interamericana de Direitos Humanos e da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos.
Por fim, fez-se um estudo sobre a aplicabilidade das sentenças no Estado
brasileiro, a distinção entre sentença estrangeira e sentença internacional e a (des)
necessidade de homologação das sentenças da Corte Interamericana pelo Superior
Tribunal de Justiça e a obrigação de executar as sentenças da Corte.
Considerando a característica da monografia, na graduação, principalmente,
sem, no entanto, ter a intenção de inovar, mas, tão-somente, apresentar um novo
ponto de vista, foram colacionadas sentenças da Corte Interamericana contra o
Brasil: Caso: Damião Ximenes Lopes, Caso: Guerrilha do Araguaia, Caso: Maria da
Penha.
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2 DIREITOS HUMANOS
2.1 A Declaração Universal dos Direitos Humanos
De acordo com o site da ONU (BRASIL), a Declaração Universal dos Direitos
Humanos é considerada um documento marco na história dos direitos humanos;
tendo sido elaborada por representantes de diferentes origens jurídicas e culturais
de todo o mundo, tal Declaração foi proclamada pela Assembléia Geral das Nações
Unidas em Paris, em 10 de dezembro de 1948, sendo definida como uma norma
comum a ser alcançada por todos os povos e nações.
Os direitos humanos são direitos inerentes a todos os seres humanos
independentemente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou
qualquer outra condição. Os direitos humanos incluem o direito à vida e à
liberdade, à liberdade de opinião e de expressão, o direito ao trabalho e à
educação, entre muitos outros. Todos merecem estes direitos, sem
discriminação. (NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL, 2011)
A partir da leitura do preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, percebe-se que a mesma foi confeccionada sob um enorme impacto
advindo das atrocidades cometidas durante a 2ª Guerra Mundial.
A Declaração, retomando os ideais da Revolução Francesa, representou a
manifestação histórica de que se formara, enfim, em âmbito universal, o
reconhecimento dos valores supremos da igualdade, da liberdade e da
fraternidade entre os homens, como ficou em seu artigo I. (COMPARATO,
2003, p. 223)
Segundo Piovesan (2002) “a Declaração se impõe como um código de
atuação e de conduta para os Estados integrantes da comunidade internacional”.
Essa Declaração traduz uma consagração ao reconhecimento universal dos direitos
humanos pelos Estados e, assim, consolida um parâmetro internacional para a
proteção dos direitos declarados na mesma.
2.2.1. Os Direitos Humanos no Brasil
Notadamente, a história dos Direitos Humanos no Brasil está diretamente
ligada à história das Constituições Brasileiras.
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A Constituição Imperial (1824), primeira Constituição Brasileira, apesar de
autoritária, mostrou-se liberal em se tratando de reconhecimento de direitos.
De acordo com a Constituição Imperial Brasileira de 1824, a inviolabilidade
dos direitos civis e políticos baseavam-se na liberdade, na segurança
individual e, como não poderia deixar de ser, na propriedade (valor, de certa
forma, questionável) (DIREITOS HUMANOS NA INTERNET, 2011).
A primeira Constituição Republicana (1891) instituiu a manifestação direta
para a eleição de deputados, senadores, presidente e vice-presidente da República
além de abolir a exigência de renda como critério para exercer direitos políticos.
Entretanto, essa mesma Constituição determinava que mendigos, analfabetos e
religiosos não poderiam exercer tais direitos políticos.
Mesmo com algumas contradições, pode-se entender que a primeira
Constituição republicana “ampliou os direitos humanos, além de manter os direitos já
consagrados pela Constituição Imperial”.
A reforma constitucional de 1926 não atendeu, de forma plena, a exigência
daqueles que entendiam que a Constituição de 1891 não se mostrava adequada à
real instauração de um regime republicano no Brasil.
Com a Revolução de 1930 os Direitos Humanos foram deixados de lado.
O Congresso Nacional e as Câmaras Municipais foram dissolvidos, a
magistratura perdeu suas garantias, suspenderam-se as franquias
constitucionais e o habeas corpus ficou restrito à réus ou acusados em
processos de crimes comuns. (DIREITOS HUMANOS NA INTERNET, 2011)
Diante dos fatos não foram poucos os insatisfeitos que se rebelaram dando
início a Revolução Constitucionalista de 1932, fazendo com que o governo provisório
nomeasse uma comissão a fim de elaborar um projeto de Constituição.
A Constituição de 1934 respeitou os Direitos Humanos e vigorou durante mais
de 3 anos, até a introdução do chamado “Estado Novo” (1937) que introduziu o
autoritarismo no Brasil.
Constituição de 1934 estabeleceu algumas franquias liberais, como por
exemplo: determinou que a lei não poderia prejudicar o direito adquirido, o
ato jurídico perfeito e a coisa julgada; vedou a pena de caráter perpétuo;
proibiu a prisão por dívidas, multas ou custas; criou a assistência judiciária
para os necessitados (assistência esta, que ainda hoje, não é observada
por grande parte dos Estados brasileiros); instituiu a obrigatoriedade de
comunicação imediata de qualquer prisão ou detenção ao juiz competente
para que a relaxasse, se ilegal, promovendo a responsabilidade da
autoridade coatora, além de várias outras franquias estabelecidas. Além
dessas garantias individuais, a Constituição de 1934 inovou ao estatuir
normas de proteção social ao trabalhador, proibindo a diferença de salário
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para um mesmo trabalho, em razão de idade, sexo, nacionalidade ou
estado civil; proibindo o trabalho para menores de 14 anos de idade, o
trabalho noturno para os menores de 16 anos e o trabalho insalubre para
menores de 18 anos e para mulheres; determinando a estipulação de um
salário mínimo capaz de satisfazer às necessidades normais do trabalhador,
o repouso semanal remunerado e a limitação de trabalho a oito horas
diárias que só poderão ser prorrogadas nos casos legalmente previstos,
além de inúmeras outras garantias sociais do trabalhador. A Constituição de
1934 não esqueceu-se também dos direitos culturais. Tratava-se de uma
constituição que tinha como objetivo primordial, o bem estar geral. Ao
instituir a Justiça Eleitoral e o voto secreto, essa constituição abriu os
horizontes do constitucionalismo brasileiro, como bem ensina Herkenhoff
(Curso de Direitos Humanos, pg. 77), para os direitos econômicos, sociais e
culturais. (HERKENHOFF citado por DIREITOS HUMANOS NA INTERNET,
2011)
Nesse período denominado “Estado Novo” os Direitos Humanos foram tão
reduzidos que praticamente não existiam, foram suspensas quase todas as
liberdades a que o ser humano tem direito.
Esse período de violações vigorou durante quase oito anos.
É interessante ressaltar que enquanto alguns autores não estabelecem
diferenças entre “direitos humanos” e “direitos fundamentais” outros doutrinadores
não os caracterizam como sinônimos, fazendo importar a existência de algumas
diferenças entre ambos.
Ingo Wolfgang Sarlet (2001) delimita claramente a diferença entre os dois
citados conceitos:
Cientes da ausência de um consenso até mesmo na esfera terminológica e
conceitual, acabamos por optar pela terminologia “Direitos Fundamentais”,
aderindo à fórmula adotada pelo Constituinte (na epígrafe do Título II de
nossa Carta), que, por sua vez, se harmoniza com a tendência identificada
no constitucionalismo mais recente, principalmente a partir da Lei
Fundamental da Alemanha, de 1949. Além disso, cumpre frisar o caráter
anacrônico e substancialmente insuficiente dos demais termos
habitualmente utilizados na doutrina nacional e estrangeira, visto que, ao
menos em regra, atrelados a categorias específicas do gênero direitos
fundamentais. Ademais, sustentamos ser correta a distinção traçada entre
os direitos fundamentais (considerados como aqueles reconhecidos pelo
direito constitucional positivo e, portanto, delimitados espacial e
temporalmente) e os assim denominados “Direitos Humanos”, que, por sua
vez, constituem as posições jurídicas reconhecidas na esfera do direito
internacional positivo ao ser humano como tal, independentemente de sua
vinculação com determinada ordem jurídico-positiva interna. Com efeito,
ainda que se possa e deva reconhecer uma crescente interpenetração,
caracterizada particularmente pela influência recíproca entre as esferas
internacional e constitucional (diga-se de passagem, expressamente
consagrada na nossa Constituição, especialmente no seu art. 5º, § 2º),
inexistem dúvidas quanto a seu distinto tratamento, de modo especial, o
grau de eficácia alcançado, diretamente dependente da existência de
instrumentos jurídicos adequados e instituições políticas adequadas e/ou
judiciárias dotadas de poder suficiente para a sua realização. (SARLET,
2001)
10
Observa-se que essa diferenciação trata os “direitos humanos” como direitos
inerentes à própria condição humana, são inatos e mutáveis de acordo com a
situação em que se enquadra; e os “direitos fundamentais” surgem a partir de uma
positivação e internalização em um ordenamento jurídico específico.
O surgimento da Constituição de 1946 restabeleceu os Direitos Humanos,
onde além de restaurados, os mesmos foram ampliados. Ainda se levarmos em
conta as várias emendas que tal Constituição sofreu, podemos dizer que a mesma
foi garantista em relação aos Direitos Humanos.
Em compensação, o surgimento da Constituição de 1967 pode ser
considerado um retrocesso no que diz respeito aos Direitos Humanos. Porém, essa
mesma vigorou, na prática, apenas até o final de 1968 quando foi baixado o Ato
Institucional nº5 - AI-5.
O AI-5 trouxe de volta todos os poderes discricionários do Presidente,
estabelecidos pelo AI-2, além de ampliar tais arbitrariedades, dando ao
governo a prerrogativa de confiscar bens, suspendendo, inclusive, o habeas
corpus nos casos de crimes políticos contra a segurança nacional, a ordem
econômica e social e a economia popular. Foi um longo período de
arbitrariedades e corrupções. A tortura e os assassinatos políticos foram
praticados de forma bárbara, com a garantia do silêncio da imprensa, que
encontrava-se praticamente amordaçada e as determinações e "proteções
legais" do AI-5. Tanto foi assim, que a Constituição de 1969 somente
começou a vigorar, com a queda do AI-5, em 1978. (DIREITOS HUMANOS
NA INTERNET, 2011)
A anistia ocorrida em 1979, mesmo que ocorrendo de forma diferente do que
era esperada, representou uma conquista significativa para o povo.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – CRFB/1988 –
surgiu protegendo os direitos do homem. Segundo artigo publicado no site Direitos
Humanos na internet, ainda que tardia, a Constituição que ainda hoje vigora, surgiu
para resgatar a dignidade da pessoa humana.
A Constituição de 1988 veio para proteger, talvez tardiamente, os direitos do
homem. Tardiamente, porque isso poderia ter se efetivado na Constituição
de 1946, que foi uma bela Constituição, mas que, logo em seguida foi
derrubada, com a ditadura. É por isso que Ulisses Guimarães afirmava que
a Constituição de 1988 era uma "Constituição cidadã", porque ela mostrou
que o homem tem uma dignidade, dignidade esta que precisa ser resgatada
e que se expressa, politicamente, como cidadania. O problema da
dignidade da pessoa humana, vem tratado na Constituição de 1988, já no
preâmbulo, quando este fala da inviolabilidade à liberdade e, depois, no
artigo primeiro, com os fundamentos e, ainda, no inciso terceiro (a dignidade
da pessoa humana), mais adiante, no artigo quinto, quando fala da
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à igualdade.
(DIREITOS HUMANOS NA INTERNET, 2011)
11
A característica de tardia relativa à CRFB/1988 pode mostrar-se inadequada
se forem observadas as situações e os momentos históricos que influenciaram-na,
ressaltando que cada país tem a sua peculiaridade no tocante ao desenvolvimento
político-social.
Flávia Piovesan (2002) ensina que “a ordem constitucional de 1988 apresenta
um duplo valor simbólico: é ela o marco jurídico da transição democrática, bem como
da institucionalização dos direitos humanos no país”. A autora considera também
que a “atual Constituição simboliza uma ruptura jurídica com o regime militar
autoritário que tomou conta do Brasil no período compreendido entre 1964 e 1985.”
Se forem observados os dispositivos constitucionais, desde o preâmbulo da
atual Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988), pode-se
observar o quanto o legislador preocupou em garantir a dignidade, o respeito e o
bem estar da pessoa humana, de modo a se alcançar a paz e a justiça social.
2.2 Evolução Histórica dos Direitos Humanos
É certo que os direitos humanos advêm de uma longa e conflituosa história e,
bastante se discutiu sobre a possibilidade e necessidade da implantação de tais
direitos.
Conforme Flávia Piovesan:
Sempre se mostrou intensa a polêmica sobre o fundamento e a natureza
dos direitos humanos – se são direitos naturais e inatos, direitos positivos,
direitos históricos ou, ainda, direitos que derivam de determinado sistema
moral. (PIOVESAN, 2002, p. 122)
Segundo Fábio Comparato (2003) a ideia de uma igualdade social entre todos
os homens surgiu durante o período axial da história, e, ainda assim, foram
necessários vinte e cinco séculos para a proclamação de uma Declaração Universal
de Direitos Humanos onde “todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e
direitos”.
A ideia de direitos humanos tem raízes religiosas, onde cristãos defendiam
uma “teoria de direito natural” assim “o indivíduo está no centro de uma ordem social
e jurídica justa, mas a lei divina tem prevalência sobre o direito laico tal como é
definido pelo imperados, o rei ou o príncipe.”
12
A idéia de direitos humanos tem origem no conceito filosófico de direitos
naturais que seriam atribuídos por Deus; alguns sustentam que não haveria
nenhuma diferença entre os direitos humanos e os direitos naturais e vêem
na distinta nomenclatura etiquetas para uma mesma idéia. Outros
argumentam ser necessário manter termos separados para eliminar a
associação com características normalmente relacionadas com os direitos
naturais. (COMPARATO, 2003, p.50)
Com o advento da idade moderna as teorias acerca do direito natural foram
distanciadas e a ordem divina deixou de prevalecer. Aqui, os homens seriam livres
por natureza possuindo direitos dos quais não poderiam ser despidos quando
vivendo em sociedade.
Fábio Konder Comparato (2003) divide grandes etapas históricas na
afirmação dos direitos humanos, dentre elas a Independência Americana, a
Revolução Francesa e a Declaração de Direitos de Virgínia, sendo que o citado
autor reconhece esta última como “o registro de nascimentos dos Direitos Humanos
na História”.
Ainda segundo Comparato (2003) a primeira fase de internacionalização dos
direitos humanos teve início na segunda metade do século XIX, encerrando-se com
a 2ª Guerra Mundial e se manifestou em três setores, sendo eles: o direito
humanitário (Convenções de Genebra) – compreendendo o conjunto de leis e
costumes da guerra afim de diminuir o sofrimentos das pessoas atingidas pela
mesma - , a luta contra a escravidão – surgimento de regras interestatais de
repressão ao tráfico de escravos africanos – e a regulação dos direitos do
trabalhador assalariado – criação da Organização Internacional do Trabalho visando
a proteção do trabalhador assalariado.
A partir de 1945, ao fim da 2ª Guerra Mundial, após massacres inaceitáveis, a
humanidade compreendeu o valor supremo da dignidade humana. “O sofrimento
como matriz da compreensão do mundo e dos homens, segundo a lição luminosa da
sabedoria grega, veio aprofundar a afirmação histórica dos direitos humanos”.
(COMPARATO, 2003, p.55)
Nas palavras de Thomas Buergenthal citado por Fávia Piovesan (2002):
O moderno Direito Internacional dos Direitos Humanos é um fenômeno do
pós-guerra. Seu desenvolvimento pode ser atribuído ás monstruosas
violações de direitos humanos da era Hitler e à crença de que parte destas
violações poderiam ser prevenidas se um efetivo sistema de proteção
internacional de direitos humanos existisse. (BUERGENTHAL citado por
PIOVESAN, 2002, p.131)
13
Após inúmeros conflitos e tentativas de acordos a Assembléia Geral das
Nações Unidas aprovou a Declaração Universal e a Convenção Internacional sobre
a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio que figuram como marcos iniciais da
nova fase histórica,
fase essa
que
ainda hoje se encontra em pleno
desenvolvimento.
Finda a 2ª Guerra, surge, também, o neoconstitucionalismo, procurando
reconstruir as bases do Direito Constitucional. As alterações ocorridas sistematizamse sob três aspectos distintos: a) histórico, b) filosófico e c) teórico – este pode ser
caracterizado por três vertentes sendo: “I) o reconhecimento de força normativa à
Constituição, II) a expansão da jurisdição constitucional, III) o desenvolvimento de
uma nova dogmática da interpretação constitucional”. (BARROSO citado por CAMBI,
2007)
No Brasil, a influência do neoconstitucionalismo pôde ser sentida com o
advento da CRFB/1988 que marca a transição para o Estado Democrático de
Direito. A dignidade da pessoa humana torna-se valorada, estendendo-se para
quaisquer relações.
2.3 Os Direitos Humanos nos dias atuais
Os Direitos Humanos não podem ser fundados em idéias absolutas. As ideias
absolutas perdem o valor com o intenso desenvolvimento e mudança, ocorrências
naturais em todas as sociedades. Tempo e espaço são fatores que mostram como
um direito pode ser relevante em um determinado lugar e não ter relevância alguma
em uma outra localidade. Da mesma forma, existem direitos que valem para todos e
direitos inerentes a algumas pessoas apenas. A preocupação atual é garantir a
eficácia na proteção de todos os direitos existentes. Seguindo a linha de Comparato:
Surge agora à vista o termo final do longo processo de unificação da
humanidade. E, com isso, abre-se a última grande encruzilhada da evolução
histórica: ou a humanidade cederá á pressão conjugada da força militar e do
poderio econômico-financeiro, fazendo prevalecer uma coesão puramente
técnica entre os diferentes povos e Estados, ou construiremos enfim a
civilização da cidadania mundial, com o respeito integral aos direitos
humanos, segundo o princípio da solidariedade ética. (COMPARATO, 2003,
p.55)
Acredita-se que uma contradição clara pode ser observada atualmente, sendo
que os direitos humanos entraram no discurso contemporâneo com enorme força
14
contradizendo o atual e intenso processo de globalização. Há os que acreditam que
as tendências econômicas e inúmeras revoluções tecnológicas acabam por gerar
instabilidade, desemprego e exclusão social, entretanto, tal opinião é altamente
questionável na concepção de outros tantos.
Inelutável ou não, nos termos em que está posta, e independentemente dos
juízos de valor que se lhe possa atribuir, a globalização dos anos 90,
centrada no mercado, na informação e na tecnologia, conquanto atingindo
(quase) todos os países, abarca diretamente pouco mais de um terço da
população mundial. Os dois-terços restantes, em todos os continentes, dela
apenas sentem, quando tanto, os reflexos negativos. (ALVES, 2011)
De acordo com Marcos Rolim (1998), existe uma nova geração de Direitos
Humanos que segue a linha e atualiza o caminho já aberto pelas primeiras e oferece
aos povos uma base concreta para a legitimação de suas demandas por justiça:
Os direitos que tem como titular não o indivíduo, mas grupos humanos
como a família, o povo, a nação, a coletividade regional ou étnica e a
própria humanidade. A auto-determinação dos povos, o direito ao
desenvolvimento, o direito à paz, ao meio ambiente, entre outros, inseremse nesta terceira geração.” Atualmente, outros temas oferecidos ao debate
público pela evolução da ciência e pela mais nova revolução tecnológica
vêm suscitando controvérsias fecundas a respeito de direitos já
considerados "de quarta geração". Tal é o caso, por exemplo, dos direitos e
obrigações decorrentes da manipulação genética ou do controle de dados
informatizados. (ROLIM,1998)
Apesar da discordância de alguns, observa-se atualmente, que para se
conseguir viver em sociedade a criação de regras que estabeleçam os limites de
cada um e incentivem o respeito de uns para com os outros é imprescindível.
Por isso diz-se que o direito é fruto da evolução humana. Há, hoje em dia,
toda uma gama de pessoas que entendem isso como a verdadeira forma de
evolução da humanidade, e não a capacidade de ir a lua ou de fazer um
carro mais veloz que o som. Esses, sem sombra de dúvidas, são os
verdadeiros defensores dos chamados “Direitos Humanos.” (MELLO, 2011)
A maioria dos direitos são conquistados após várias lutas e mesmo depois de
conquistados pode ser difícil a tarefa de protegê-los.
Para que se vislumbre uma real efetivação dos direitos humanos é
necessário, em um primeiro momento, que tais direitos sejam inseridos em um texto
com força de lei. Atualmente, esses direitos têm perspectiva no plano internacional,
sendo fato notório que através do tempo os direitos humanos vêm se aperfeiçoando
e se tornando cada vez mais amplos. Uma considerável conquista em se tratando da
efetivação dos Direitos Humanos foi a Convenção Americana de Direitos Humanos,
15
também denominada Pacto de São José da Costa Rica, conforme veremos no
próximo capítulo.
É certo que para uma garantia maior quanto à proteção aos direitos humanos
é necessária a existência de um consenso mútuo de tolerância e respeito,
eliminando qualquer forma de preconceito ou discriminação. Tal atitude não implica
que o ser humano tenha que mudar seu pensamento, o necessário é que um
respeite o outro e respeite inclusive seu pensamento.
16
3 A CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS - PACTO DE SÃO
JOSÉ DA COSTA RICA
3.1 O surgimento do Pacto de São José da Costa Rica
O Pacto de São José da Costa Rica ou Convenção Americana de Direitos
Humanos foi assinado em São José, Costa Rica, no ano de 1969, entrando em vigor
somente em 1978. Sendo um tratado, é aplicado somente àquelas nações que o
assinaram.
A Convenção Americana de Direitos Humanos foi adotada em 1969 em uma
Conferência inter-governamental celebrada pela Organização dos Estados
Americanos (OEA). O encontro ocorreu em San José, Costa Rica, o que
explica o porquê da Convenção Americana ser também conhecida como
“Pacto de San José da Costa Rica”. (BUERGENTHAL citado por PIOVESAN,
2002, p.230)
Segundo Piovesan (2002), tal Convenção pode ser considerada o instrumento
de maior importância no sistema interamericano.
O Pacto de São José da Costa Rica surge com o intuito de reconhecer e
consagrar diversos direitos civis e políticos, destacando-se entre eles:
O direito à personalidade jurídica, o direito à vida, o direito a não ser
submetido à escravidão, o direito à liberdade, o direito a um julgamento
justo, o direito à compensação em caso de erro judiciário, o direito à
privacidade, o direito à liberdade de consciência e religião, o direito à
liberdade de pensamento e expressão, o direito à resposta, o direito à
liberdade de associação, o direito ao nome, o direito à nacionalidade, o
direito à liberdade de movimento e residência, o direito de participar do
governo, o direito à igualdade perante a lei e o direito à proteção judicial.
(PIOVESAN, 2002, p.30)
Considerando os diversos direitos elencados e protegidos pela referida
Convenção, cabe a cada Estado-membro assegurar em legislação própria, ou
qualquer outra medida legal, “a obrigação de respeitar e assegurar o livre e pleno
exercício desses direitos e liberdades, sem qualquer discriminação” (PIOVESAN,
2002).
É também dever do Estado-membro a adoção de quaisquer medidas cabíveis
a fim de efetivar os direitos e liberdades enunciados.
Observam-se tais deveres nos Artigos 1º e 2º do supramencionado Tratado:
17
Artigo 1º - Obrigação de respeitar os direitos - 1. Os Estados-partes nesta
Convenção comprometem-se a respeitar os direitos e liberdades nela
reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que
esteja sujeita à sua jurisdição, sem discriminação alguma, por motivo de
raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer outra
natureza, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou
qualquer outra condição social. - 2. Para efeitos desta Convenção, pessoa é
todo ser humano. - Artigo 2º - Dever de adotar disposições de direito
interno. Se o exercício dos direitos e liberdades mencionados no artigo 1
ainda não estiver garantido por disposições legislativas ou de outra
natureza, os Estados-partes comprometem-se a adotar, de acordo com as
suas normas constitucionais e com as disposições desta Convenção, as
medidas legislativas ou de outra natureza que forem necessárias para
tornar efetivos tais direitos e liberdades. (PIOVESAN, 2002, p. 427).
Conforme exposto, observam-se expressas na Convenção Americana de
Direitos Humanos as obrigações impostas aos Estados-partes. Acatando a
Convenção, o Estado interessado se compromete a respeitar e a garantir os direitos
e liberdades nela previstos e, no caso de esse Estado já não prever as garantias
necessárias, compromete-se ainda a adotar as medidas necessárias para a
respectiva
efetivação.
Sendo
assim,
resta
explícita
ao
Estado-parte
a
impossibilidade de se esquivar das responsabilidades claramente assumidas.
Flávia Piovesan (2002) traz, ainda, palavras de Thomas Buergenthal
estabelecendo:
Os Estados-partes na Convenção Americana têm a obrigação não apenas
de respeitar esses direitos garantidos na Convenção, mas também de
assegurar o seu livre e pleno exercício. Um governo tem,
consequentemente, obrigações positivas e negativas relativamente à
Convenção Americana. De um lado, há a obrigação de não violar direitos
individuais. Mas a obrigação do Estado vai além desse dever negativo e
pode requerer a adoção de medidas afirmativas necessárias e razoáveis,
em determinadas circunstâncias, para assegurar o pleno exercício dos
direitos garantidos pela Convenção Americana. (BUERGENTHAL citado por
PIOVESAN, 2002, p. 232)
Reforça-se então que os Estados devem respeito e garantia ao previsto no
Tratado do qual são signatários além do dever de suportar obrigações positivas e/ou
negativas, dependendo do caso. Essas obrigações positivas podem ser visualizadas
em obrigações de fazer, realizar. Como exemplo, uma obra ou serviço realizado
para assegurar o pleno exercício dos direitos garantidos pela Convenção. No caso
das obrigações negativas, podem ser visualizadas as obrigações de não fazer, uma
abstenção e/ou omissão quanto à prática de determinado ato.
Para a real eficácia do acordado pelos Estados-partes o Pacto de São José
da
Costa
Rica
estabelece, conforme
Piovesan
(2002),
“um
aparato
de
18
monitoramento em implementação dos direitos que enuncia”. Tais funções caberão
à Comissão Interamericana de Direitos Humanos e à Corte Interamericana de
Direitos Humanos, as quais serão abordadas posteriormente neste mesmo trabalho.
Sendo assim, caberá a cada um dos Estados-partes se adequar e acatar o
que foi proposto na Convenção a qual ele próprio se submeteu, não deixando ainda
de suportar as obrigações sejam elas positivas ou negativas e assim atribuir uma
real eficácia e respeito, demonstrando ainda responsabilidade por um acordo ao
qual, voluntariamente, participa.
3.2 O Pacto de São José da Costa Rica no Brasil
Conforme mostrado anteriormente o Pacto de São José da Costa Rica foi
criado em 1969 e entrou em vigor no ano de 1978. Reforçando essa afirmativa,
Piovesan (2002) cita Buergenthal: “A Convenção Americana entrou em vigor em
julho de 1978, quando o 11º instrumento de ratificação foi depositado.”
Entretanto, o Brasil somente aderiu à Convenção no ano de 1992, sendo
considerado por Piovesan (2002) um dos Estados que mais tardiamente ratificou o
Tratado.
Apesar de tardiamente adotar a Convenção, observa-se na Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988 muitas semelhanças em relação às
garantias e aos direitos humanos sobre os quais versam o Pacto de São José da
Costa Rica.
Em sua primeira parte em que são tratados os deveres dos Estados e
direitos dos protegidos, os vinte e cinco artigos retratam o panorama
equivalente aos quatorze primeiros artigos da nossa Carta Maior. O Pacto
trata da proibição da escravidão e da servidão, do direito à liberdade
pessoal, das garantias judiciais, do princípio da legalidade e da
retroatividade da lei mais benéfica, da liberdade de consciência e de
religião, da liberdade de pensamento, do direito de reunião, da liberdade de
associação, do direito à nacionalidade e dos direitos políticos.
Resplandecem embutidos em seu texto os mesmos princípios que regem a
Constituição Federal. O princípio da dignidade da pessoa humana está
presente no art. 5°, §2°, PSJCR ao estabelecer que: “Ninguém deve ser
submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou
degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o
respeito devido à dignidade inerente ao ser humano.” Destacam-se também
os princípios da presunção da inocência, da retroatividade de lei mais
benéfica, da secularização, da legalidade, do contraditório e da ampla
defesa, da liberdade de pensamento e outros. (TSUTIYA, 2007)
19
A discussão enfrentada por essa Convenção no Brasil relaciona-se com a sua
hierarquia normativa, como ela entrará no ordenamento jurídico. Lembrando que,
não pode o Estado-membro esquivar-se de suas obrigações, considerando ainda
que no Brasil o Pacto de São José da Costa Rica foi ratificado sem ressalva.
Atualmente, a doutrina apresenta duas teorias com o intuito de solucionar um
aparente choque de normas entre o Direito interno e as normas internacionais, como
também para explicar a relação de hierarquia entre elas. São as correntes: Teoria
Monista e Teoria Dualista.
Perante a Teoria Monista, ressalta-se a existência de somente um
ordenamento jurídico formado pelo direito interno e o direito externo. Entretanto, o
próprio Monismo apresenta mais de uma vertente: uma que preza o direito nacional,
considerando o Estado como ente soberano e, sendo soberano, não poderá admitir
interferências de normas que não tenham sido criadas por seus próprios órgãos.
Assim, essa vertente inclina-se pela supremacia do Direito interno, tornando o
Direito Internacional um mero desmembramento.
Outra vertente apresentada pela Teoria Monista seria a predominância do
Direito Internacional. Neste caso, considera-se que a autonomia Estatal encontra
seu limite diante de norma internacional. Relacionado a essa vertente, Tejo (2005)
cita Kelsen, em sua Teoria Pura do Direito:
Se esta norma, que fundamenta os ordenamentos jurídicos de cada um dos
Estados, é considerada como norma jurídica positiva- e é o caso, quando se
concebe o direito internacional como superior a ordenamentos jurídicos
estatais únicos, abrangendo esses ordenamentos de delegação- então a
norma fundamental- no sentido específico aqui desenvolvido, de norma não
estabelecida, mas apenas pressuposta- não mais se pode falar em
ordenamentos jurídicos estatais únicos, mas apenas como base do direito
internacional. (KELSEN citado por TEJO, 2005)
Hans Kelsen propõe - pirâmide Kelseniana - uma pirâmide de normas em que
o vértice é composto do Direito Internacional que dá origem e obrigatoriedade a
todas as normas internas do Estado.
Em face da Teoria Dualista admite-se a existência de duas ordens distintas:
uma interna e outra externa, sendo que uma não se comunica com a outra, elas têm
fundamentos de validade distintos e destinatários distintos. Nesse caso, a norma
internacional só teria validade caso fosse recepcionada pelo Direito interno, caso em
que não surgiriam conflitos.
20
Apesar de haver entendimento no sentido monista, com base no art. 5º, §2º
(“Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros
decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados
internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”),
entendo ser mais correta a posição dualista. Afinal, para que o tratado
ingresse em nosso ordenamento, é necessário que passe por todo o
procedimento previsto na Carta Magna. Deve haver, então, a celebração do
tratado pelo Presidente da República, conforme dispõe o art. 84, VIII; então,
tal tratado deve passar pelo crivo do Congresso Nacional, que deve emitir
decreto legislativo (art. 49, I), devendo por fim ser promulgado pelo
Presidente da República, mediante decreto. Apenas após todo esse trâmite
o tratado externo terá vigor no País, tendo status de lei ordinária (salvo se
tratar de direitos e garantias fundamentais), sendo suscetível inclusive de
controle de constitucionalidade. (TEJO, 2005)
No ordenamento jurídico brasileiro vislumbram-se duas ordens jurídicas
independentes: há a aplicação do direito internacional em âmbito interno, desde que
obedecidos alguns trâmites previstos no ordenamento jurídico interno. Assim, podese considerar que o ordenamento jurídico brasileiro adota a vertente da Teoria
Dualista.
De acordo com obra de Flávia Piovesan (2002) os direitos enunciados em
tratados internacionais de proteção aos direitos humanos apresentam hierarquia de
norma constitucional, enquanto os demais tratados exercem hierarquia infraconstitucional, conforme art.102, III, “b”, CRFB/1988.
Piovesan ainda ensina:
Sustenta-se, assim, que os tratados tradicionais têm hierarquia infraconstitucional, mas supra-legal. Este posicionamento coaduna-se com o
princípio da boa-fé vigente no Direito Internacional (o pacta sunt servanda) e
que tem como reflexo o art.27 da Convenção de Viena, segundo o qual não
cabe ao Estado invocar disposições de seu direito interno como justificativa
para o não cumprimento de tratado. (PIOVESAN, 2002, p. 83)
Entretanto, uma tendência na doutrina brasileira passou a igualar a hierarquia
jurídica das normas internacionais e leis federais. Assim sendo, aplicar-se-á,
geralmente, o princípio de que “lei posterior revoga lei anterior que seja com ela
incompatível”.
Nesse sentido Piovesan (2002) destaca o voto do Ministro Celso de Mello no
ano de 1995:
[...] inexiste, na perspectiva do modelo constitucional vigente no Brasil,
qualquer precedência ou primazia hierárquico-normativa dos tratados ou
convenções internacionais sobre o direito positivo interno, sobretudo em
face das cláusulas inscritas no texto da Constituição da República, eis que a
ordem normativa externa não se superpõe, em hipótese alguma, ao que
prescreve a Lei Fundamental da República. (...) a ordem constitucional
vigente no Brasil não pode sofrer interpretação que conduza ao
21
reconhecimento de que o Estado brasileiro, mediante convenção
internacional, ter-se-ia interditado a possibilidade de exercer, no plano
interno, a competência institucional que lhe foi outorgada expressamente
pela própria Constituição da República. A circunstância do Brasil haver
aderido ao Pacto de São José da Costa Rica – cuja posição, no plano da
hierarquia das fontes jurídicas, situa-se no mesmo nível de eficácia e
autoridade das leis ordinárias internas – não impede que o Congresso
Nacional, em tema de prisão civil por dívida, aprove legislação comum
instituidora desse meio excepcional de coerção processual (...). Os tratados
internacionais não podem transgredir a normatividade emergente da
Constituição, pois, além de não disporem de autoridade para restringir a
eficácia jurídica das cláusulas constitucionais, não possuem força para
conter ou para delimitar a esfera de abrangência normativa dos preceitos
inscritos no texto da Lei Fundamental. (...) Parece-me irrecusável, no exame
da questão concernente à primazia das normas de direito internacional
público sobre a legislação interna ou doméstica do Estado brasileiro, que
não cabe atribuir, por efeito do que prescreve o art. 5º, parágrafo 2º, da
Carta Política, um inexistente grau hierárquico das convenções
internacionais sobre o direito positivo interno vigente no Brasil,
especialmente sobre as prescrições fundadas em texto constitucional, sob
pena de essa interpretação inviabilizar, com manifesta supremacia da
Constituição – que expressamente autoriza a instituição de prisão civil por
dívida em duas hipóteses extraordinárias (CF, art. 5º, LXVII) – o próprio
exercício, pelo Congresso Nacional, de sua típica atividade político- jurídica
consistente no desempenho da função de legislar. (...) A indiscutível
supremacia da ordem constitucional brasileira sobre os tratados
internacionais, além de traduzir um imperativo que decorre da nossa própria
Constituição (art. 102, III, b), reflete o sistema que, com algumas poucas
exceções, tem prevalecido no plano do direito comparado. (MELLO citado
por PIOVESAN, 2002, p. 86 e 87).
Nota-se que, a posição predominante do Supremo Tribunal Federal – STF -,
anteriormente, era a de não reconhecer normas internacionais que contrariavam a
CRFB/1988.
Entretanto, sendo a sociedade uma constante de mudanças, o direito também
acompanha tais mutações e, assim, atualmente o STF também apresenta posição
diversa da que tinha anteriormente. A Emenda Constitucional Nº 045/2004 (BRASIL,
2004) surgiu, também, com o intuito de sanar os problemas acerca da eficácia de
tratados internacionais dentro do ordenamento jurídico, entretanto, essa emenda
não compreendeu o Pacto de São José da Costa Rica, conforme será explicado a
seguir.
3.2.1. O Pacto de São José da Costa Rica e a Emenda Constitucional Nº 045/2004
É notório que sempre houve uma discussão referente à força dos tratados
internacionais dentro do ordenamento jurídico brasileiro levando em consideração o
parágrafo 2º da CRFB/1988.
22
Até pouco tempo vislumbrava-se um aparente conflito de normas no que diz
respeito à prisão civil do depositário infiel.
O artigo 5º, inciso LXVII, da CRFB/1988 estabelece que: “não haverá prisão
civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável
de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”. (BRASIL, 1988)
Assim, a partir da promulgação da Constituição de 1988, a prisão civil
ocorreria somente em decorrência de inadimplemento de obrigação alimentícia ou
no caso do depositário infiel.
Então, vê-se constitucionalmente possível a prisão do depositário infiel.
Entretanto, pelo Decreto 678/1992, o Brasil ratificou o Pacto de São José da
Costa Rica que dispõe em seu Art. 7º - cláusula 7: “Ninguém deve ser detido por
dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente
expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar”. (BRASIL,1988)
Notadamente o referido Pacto exclui a prisão do depositário infiel.
A emenda constitucional nº 45/2004 findou, em parte, tal discussão
acrescentando o §3º ao art. 5º, o qual dispõe: “Os tratados e convenções
internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do
Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos
membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”. (BRASIL, 2004).
Nota-se que os tratados e convenções internacionais, que obedecem aos
pressupostos acima descritos, terão caráter constitucional, podendo inclusive
revogar normal constitucional anterior.
Entretanto, se o referido parágrafo acrescentado sanou algumas discussões,
certamente é causa de início de outras tantas.
São diversas as opiniões sobre o assunto, alguns acreditam que como o
Pacto de São José da Costa Rica não foi submetido ao quorum especificado pelo
atual §3º, a sua posição torna-se subalterna ao ordenamento jurídico interno.
Conforme se pode observar, Fernando Capez entende que:
Ocorre que, como referido tratado não foi submetido a nenhum quorum
qualificado em sua aprovação, sua posição é subalterna no ordenamento
jurídico, de modo que não pode prevalecer sobre norma constitucional
expressa, permanecendo a possibilidade de prisão do depositário infiel.
Qualquer tratado internacional, sem o preenchimento dos requisitos
exigidos pela EC n. 45/04, não pode sobrepor-se a norma constitucional
expressa. Não passa de legislação ordinária. (CAPEZ, 2005)
23
Nota-se que, mesmo versando sobre direitos humanos, o Pacto de São José
da Costa Rica não passou pelo quorum necessário para ter força de norma
constitucional.
Existem os que acreditam que somente por versar sobre direitos humanos já
torna o Pacto de São José da Costa Rica uma norma constitucional, independente
do processo legislativo pelo qual tenha passado.
Para alguns, o Pacto de São José da Costa Rica, exatamente por versar
sobre direitos humanos, erigiu-se à categoria de norma constitucional,
apesar de não aprovado pelo quorum previsto no art. 5º, §3º, da CF/88.
Sustentam os defensores de tal corrente que a liberdade, por ser o valor
máximo da dignidade humana – constituindo um dos fundamentos da
República Federativa do Brasil, não só internamente, mas também nas
relações internacionais -, deveria ser assegurada. (MAYUMI, 2011)
Gilmar Ferreira Mendes, Ministro do STF reconhece a existência de quatro
correntes desenvolvidas no país em relação à posição normativa dos tratados e
convenções internacionais de direitos humanos, sendo:
a) a vertente que reconhece natureza supraconstitucional dos tratados e
convenções em matérias de direitos humanos; b) o posicionamento que
atribui caráter constitucional a esses diplomas internacionais; c) a tendência
que reconhece o status de lei ordinária a esse tipo de documento
internacional e d) a interpretação que atribui caráter supralegal aos tratados
e convenções sobre direitos humanos.(MENDES citado por CAPEZ, 2009)
Segundo o Ministro, atualmente, a quarta corrente é a predominante no país,
e, no dizer de Gilmar Mendes:
[...] pugna pelo argumento de que os tratados sobre direitos humanos
seriam infraconstitucionais, porém, diante de seu caráter especial em
relação aos demais atos normativos internacionais, também seriam dotados
de um atributo de supralegalidade. (MENDES citado por CAPEZ, 2009)
De acordo com Marcos Paulo Queiroz Macedo (2009), a principal razão que
justifica a prática deste posicionamento é entender que o tratado não revoga norma
legal ou constitucional, somente afastando sua incidência, e no caso de tal tratado
não mais vigorar no país, a norma volta a ser plena.
Em 2009, o STF aprovou a proposta de edição da Súmula Vinculante nº 25
declarando a ilicitude quanto à prisão civil do depositário infiel independente da
modalidade do depósito. Assim, seguindo tal entendimento, atualmente, a prisão civil
do depositário infiel não será decretada no país.
24
Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2009) mostra que, apesar de o seu
entendimento ser contrário, já que para ele as normas do Pacto de São José da
Costa Rica teriam apenas força de legislação ordinária, o STF inclina-se a
considerar que todos os tratados sobre direitos humanos, como é o caso do Pacto
de São José da Costa Rica, têm “status” de norma infraconstitucional com atributo
de norma supralegal.
É de se observar que a CRFB/1988 disciplina de forma clara e precisa a
vedação quanto à prisão civil por dívidas, somente autorizando nos casos do
depositário infiel e nos casos de dívidas quanto a obrigações alimentícias, não
deixando lacuna em relação à regulamentação desta matéria.
Com a incorporação do Pacto de São José ao Sistema Jurídico Brasileiro,
passou-se a discutir os efeitos reflexos decorrentes desta incorporação. Em
um primeiro momento, através da interpretação conjunta do texto
constitucional e do texto contido no pacto, a jurisprudência das cortes
superiores manteve seus posicionamentos sobre a prisão civil, cujo
entendimento continuou pacífico por alguns anos. Entretanto, nos últimos
anos, a jurisprudência, principalmente do Supremo Tribunal Federal,
modificou o seu posicionamento, passando a dar outra interpretação à
matéria, a partir da recepção do Tratado em voga. (JÚNIOR, 2009)
Ainda segundo Júnior (2009), a recepção do Tratado Internacional pelo Brasil,
certamente, representa uma evolução em matéria de direitos humanos, na medida
em que seu texto busca consagrar instrumentos e medidas melhores e mais
eficazes em relação à defesa dos direitos humanos. Assim, é “tarefa da doutrina e
da jurisprudência uma adequada interpretação sistemática do pacto, não apenas das
normas em si dispostas, mas dos valores e objetivos estabelecidos neste Tratado.”
Recapitulando o já exposto, o Pacto de São José da Costa Rica veda a prisão
por dívida, assim como a CRFB de 1988 também veda, sendo pontos em comum
entre os dois diplomas. Ambos os diplomas admitem, excepcionalmente, a prisão
civil do inadimplente quanto à obrigação alimentar.
A divergência tem início em relação à situação do depositário infiel: enquanto
o Pacto de São José da Costa Rica nada dispõe a esse respeito, tratando somente
da possibilidade de prisão civil em casos de inadimplência em obrigação alimentar, a
CRFB/1988 expressa veementemente a possibilidade de prisão dos referidos
depositários.
25
Até há pouco tempo, mesmo com a adesão do Brasil ao Pacto de São José
da Costa Rica, o STF decidia, geralmente pela possibilidade da prisão civil do
depositário infiel, de acordo com o que preceitua a CRFB/1988.
Atualmente, nota-se uma mudança nesse sentido. O próprio STF não tem
reconhecido tal prisão, impossibilitando-a, dando mais eficácia e garantias ao Pacto
ratificado por esse Estado.
26
4 A CORTE E A COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E A
APLICABILIDADE DAS SENTENÇAS NO BRASIL
4.1 A Corte Interamericana de Direitos Humanos
Conforme exposto, anteriormente, a Corte Interamericana de Direitos
Humanos – CIDH – é um dos aparatos que integram o sistema de monitoramento e
implementação dos direitos estabelecidos pelo Pacto de São José da Costa Rica.
O Artigo 1º do Estatuto da Corte define:
Natureza e regime jurídico - A Corte Interamericana de Direitos humanos é
uma instituição judiciária autônoma cujo objetivo é a aplicação e a
interpretação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Corte
exerce suas funções em conformidade com as disposições da citada
Convenção e deste Estatuto. (ESTATUTO DA CORTE INTERAMERICANA
DE DIREITOS HUMANOS, 1979)
De acordo com o Estatuto, a CIDH possui sede em São José, Costa Rica,
entretanto, poderá realizar reuniões em quaisquer dos Estados-membros integrantes
da Organização dos Estados Americanos – OEA.
A Corte é composta por sete juízes nacionais de Estados-membros da OEA,
não devendo haver mais de um juiz com a mesma nacionalidade.
É disposição de artigo do Estatuto da Corte Interamericana de Direitos
Humanos:
Artigo 4. Composição1. A Corte é composta de sete juízes, nacionais dos
Estados membros da OEA, eleitos a título pessoal dentre juristas da mais
alta autoridade moral, de reconhecida competência em matéria de direitos
humanos, que reúnam as condições requeridas para o exercício das mais
elevadas funções judiciais, de acordo com a lei do Estado do qual sejam
nacionais, ou do Estado que os propuser como candidatos. 2. Não deve
haver mais de um juiz da mesma nacionalidade. (ESTATUTO DA CORTE
INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 1979)
Os sete juízes são eleitos a título individual, e não, necessariamente como
representantes dos Estados respectivos. Os juízes que compõem a Corte podem ser
indicados e eleitos pelos Estados-partes da Convenção Americana, entretanto não
precisam ser nacionais dos Estados que aderiram à Convenção, bastando apenas
ser nacional de um Estado membro da OEA.
A Corte Interamericana pode exercer função jurisdicional/contenciosa e
consultiva. É clara a diferenciação das funções em apontamento de Mazzuoli (2007):
27
A Corte detém uma competência consultiva (relativa à interpretação das
disposições da Convenção, bem como das disposições de tratados
concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados Americanos) e
uma competência contenciosa, de caráter jurisdicional, própria para o
julgamento de casos concretos quando se alega que algum dos Estadospartes na Convenção Americana violou algum de seus preceitos. Contudo,
a competência contenciosa da Corte Interamericana é limitada aos Estadospartes da Convenção que reconheçam expressamente sua jurisdição. Isto
significa que um Estado-parte na Convenção não pode ser demandado
perante a Corte se ele próprio não aceitar a sua competência contenciosa.
Ocorre que, ao ratificarem a Convenção Americana, os Estados-partes já
aceitaram automaticamente a competência consultiva da Corte, mas em
relação à competência contenciosa, esta é facultativa e poderá ser aceita
posteriormente. Este foi o meio que a Convenção Americana encontrou
para fazer com que os Estados ratificassem a Convenção sem receios de
serem prontamente demandados. Tratou-se de uma estratégia de política
internacional que acabou dando certo, tendo o Brasil aderido è competência
contenciosa da Corte em 1998, por meio do Decreto Legislativo n. 89, de 3
de dezembro desse mesmo ano, segundo o qual somente poderão ser
submetidas à Corte as denúncias de violações de direitos humanos
ocorridas a partir do seu reconhecimento. (MAZZUOLI, 2007, p. 732)
Em suma, a Corte terá competência contenciosa ao solucionar/apreciar
litígios de direito internacional que são submetidos a ela pelos Estados
jurisdicionados e a competência consultiva, quando da emissão de pareceres sobre
questões jurídicas solicitadas.
A Corte terá competência contenciosa para apreciar qualquer caso
envolvendo Estados-membros que se submeteram à sua jurisdição. Em sua
competência
consultiva,
qualquer
Estado
que
seja
parte
da
OEA,
independentemente de ser signatário da Convenção, poderá consultar a Corte a
respeito da interpretação da Convenção ou qualquer outro tratado que verse sobre a
proteção dos direitos humanos nos Estados americanos, de acordo com Piovesan
(2002).
Flávia Piovesan (2002), para explicitar, cita Thomas Buergenthal:
A Convenção Americana investe a Corte Interamericana em duas
atribuições distintas. Uma envolve o poder de adjudicar disputas relativas à
denúncia de que um Estado-parte violou a Convenção. Ao realizar tal
atribuição, a Corte exerce a chamada jurisdição contenciosa. A outra
atribuição da Corte é a de interpretar a Convenção Americana e
determinados tratados de direitos humanos, em procedimentos que não
envolvem a adjudicação para fins específicos. Esta é a jurisdição consultiva
da Corte Interamericana. (BUERGENTHAL citado por PIOVESAN, 2002, p.
240).
Piovesan (2002) mostra que a Corte, no âmbito de sua competência
consultiva, “tem desenvolvido análises aprofundadas a respeito do alcance e do
28
impacto dos dispositivos da Convenção Americana.” Reforçando isso Piovesan
ainda cita Mônica Pinto:
[...] a Corte tem emitido opiniões consultivas que têm permitido a
compreensão de aspectos substanciais da Convenção, dentre eles: o
alcance de sua competência consultiva, o sistema de reservas, as restrições
à adoção da pena de morte, os limites ao direito de associação, o sentido
do termo “leis” quando se trata de impor restrições ao exercício de
determinados direitos, a exigibilidade do direito de retificação ou resposta, o
habeas corpus e as garantias judiciais nos estados de exceção, a
interpretação da Declaração Americana, as exceções ao esgotamento
prévio dos recursos internos e a compatibilidade de leis internas em face da
Convenção. (PINTO citada por PIOVESAN, 2002, p. 241)
No âmbito da sua competência contenciosa, conforme já comentado acima, a
competência da Corte, abrangerá somente os estados-membros da Convenção
Interamericana de Direitos Humanos, uma vez que esses tenham reconhecido,
expressamente, a sua jurisdição.
Observa-se, de acordo com o art. 61, da Convenção, que somente a
Comissão Interamericana e os Estados-membros terão legitimidade para submeter
um caso à Corte. Se a Corte reconhecer a real ocorrência de uma violação ao que
está disposto na Convenção Americana de Direitos Humanos caberá a ela a adoção
de medidas cabíveis à restauração do direito comprovadamente violado, ordenando
ao responsável o pagamento de justa indenização ou compensação às vítimas.
Flávia Piovesan (2002) traz relevante afirmativa feita por Antônio Augusto
Cançado Trindade:
Os Tribunais internacionais de direitos humanos existentes – as Cortes
Européia e Interamericana de Direitos Humanos – não “substituem” os
Tribunais internos, e tampouco operam como tribunais de recursos ou de
cassação de decisões dos Tribunais internos. Não obstante, os atos
internos dos Estados podem vir a ser objeto de exame por parte dos órgãos
de supervisão internacionais, quando se trata de verificar a sua
conformidade com as obrigações internacionais dos Estados em matéria de
direitos humanos. (TRINDADE citado por PIOVESAN, 2002, p.243)
Piovesan (2002) ensina que uma decisão da Corte tem força jurídica
vinculante e obrigatória e caberá ao Estado o imediato cumprimento:
[...] a Corte Européia de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de
Direitos Humanos têm o poder de proferir decisões juridicamente
vinculantes contra Estados soberanos, condenando-os pela violação de
direitos humanos e liberdades fundamentais de indivíduos, e ordenandolhes o pagamento de justa indenização ou compensação às vítimas
(SIEGHART citado por PIOVESAN, 2002, p.243)
29
O reconhecimento à jurisdição da Corte é facultativo aos Estados, entretanto,
reconhecida a jurisdição, não poderá o Estado jurisdicionado escusar-se do que lhe
for imposto, quando for o caso, sob pena de responsabilização internacional.
Interessa saber que o Brasil reconhece a jurisdição da referida Corte desde
dezembro de 1998, por meio do Decreto Legislativo n. 89 de 3 de dezembro de
1998. Assim sendo, fica o Estado brasileiro obrigado a submeter às suas decisões.
Pode-se considerar, de acordo com Flávia Piovesan (2002), que o sistema
interamericano de proteção aos direitos humanos, ainda que com jurisprudências
recentes, tem se mostrado bastante eficaz quando os próprios Estados se tornam
omissos ou falhos. Piovesan ainda cita Dinah Shelton:
Ambas, a Comissão e a Corte, têm adotado medidas inovadoras, de modo a
contribuir para a proteção dos direitos humanos nas Américas e ambos,
indivíduos e organizações não governamentais, podem encontrar um fértil
espaço para futuros avanços. (SHELTON citada por PIOVESAN, 2002, p.
249)
Percebe-se que os aparatos que integram o sistema de monitoramento e
implementação dos direitos estabelecidos pelo Pacto de São José da Costa Rica
têm se mostrado de real utilidade e eficácia, conferindo uma maior segurança aos
jurisdicionados, além de servir como uma forma de avanço em relação às questões
que lhe são pertinentes.
4.2 A Comissão Interamericana de Direitos Humanos
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, juntamente com a Corte
Interamericana, também integra o aparato de monitoramento e implementação
estabelecido pela Convenção Americana de Direitos Humanos.
A competência da Comissão abrangerá todos os Estados-membros da
Convenção Americana e também todos os Estados pertencentes à Organização dos
Estados Americanos relativos aos direitos consagrados na Declaração Americana de
1948.
Flávia Piovesan (2002) traz uma observação feita por Hector Fix-Zamudio:
O primeiro organismo efetivo de proteção dos direitos humanos é a
Comissão Interamericana criada em 1959. Esta Comissão, no entanto,
começou a funcionar no ano seguinte, em conformidade com o seu primeiro
estatuto, segundo o qual teria por objetivo primordial a simples promoção
dos direitos estabelecidos tanto na Carta da OEA, como na Declaração
30
Americana dos Direitos e Deveres do Homem, elaborada em Bogotá, em
maio de 1948. Embora com atribuições restritas, a aludida Comissão
realizou uma frutífera e notável atividade de proteção dos direitos humanos,
incluindo a admissão e investigação de reclamações de indivíduos e de
organizações não governamentais, inspeções nos territórios dos Estadosmembros e solicitações de informes, com o que logrou um paulatino
reconhecimento. (ZAMUDIO citado por PIOVESAN, 2002, p.233)
Uma das principais funções da Comissão Interamericana é a observância
quanto à efetiva proteção às garantias e aos direitos humanos na América.
Piovesan (2002) ensina que, a fim de cumprir sua função, caberá á Comissão
orientar os governos dos Estados-membros e recomendar a adoção de medidas
adequadas à proteção dos direitos garantidos; solicitar aos governos informações
atestando a efetiva aplicação do disposto na Convenção; e ainda, submeter um
relatório anual à Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos.
Em relação às funções da Comissão, Flávia Piovesan (2002) traz novamente
os dizeres de Hector Fix-Zamudio:
De acordo com as acertadas observações do internacionalista mexicano
César Sepúlveda, atualmente presidente da citada Comissão
Interamericana, a mesma realiza as seguintes funções: a) conciliadora,
entre um Governo e grupos sociais que vejam violados os direitos de seus
membros, b) assessora, aconselhando os Governos a adotar medidas
adequadas para promover os direitos humanos; c) crítica, ao informar sobre
a situação dos direitos humanos em um estado membro da OEA, depois de
ter ciência dos argumentos e das observações do Governo interessado,
quando persistirem estas violações; d) legitimadora, quando um suposto
Governo, em decorrência do resultado do informa da Comissão acerca de
uma visita ou de um exame, decide reparar as falhas de seus processos
internos e sanar as violações; e) promotora, ao efetuar estudos sobre temas
de direitos humanos, a fim de promover seu respeito e f) protetora, quando
além das atividades anteriores, intervém em casos urgentes para solicitar
ao Governo, contra o qual se tenha apresentado uma queixa, que suspenda
sua ação e informe sobre os atos praticados. (ZAMUDIO citado por
PIOVESAN, 2002, p.233)
Piovesan (2002) mostra também que a Comissão ainda será competente para
examinar comunicações encaminhadas por indivíduos ou grupos de indivíduos, ou
ainda entidades não–governamentais, que contenham denúncia sobre qualquer
infringência a direito consagrado pela Convenção, por Estado que dela seja parte.
Citado pela referida autora tem-se ainda as palavras de Thomas Buergenthal:
Além disso, diversamente de outros tratados de direitos humanos, a
Convenção Americana não atribui exclusivamente ás vítimas de violações o
direito de submeter petições individuais. Qualquer pessoa ou grupo de
pessoas e certas organizações não-governamentais também podem fazê-lo.
(BUERGENTHAL citado por PIOVESAN, 2002, p.235)
31
Atente-se que o Estado que for membro da Convenção submete-se
automática e obrigatoriamente à competência da mesma, sendo esta uma cláusula
proposta na Convenção a qual não admite reserva.
Reputando-se verdadeiros os fatos dispostos na denúncia contra um Estadomembro, caberá à Comissão buscar uma solução pacífica entre as partes
(Denunciante e Estado); não resultando o método de solução pacífica, a Comissão
elaborará um relatório constando fatos e conclusões
e, sendo o caso,
recomendações. O relatório será encaminhado ao próprio Estado-membro para que
ele cumpra, dentro de 3 meses, o que lhe for recomendado. Ainda assim, não sendo
solucionado, o caso será enviado à Corte Interamericana de Direitos Humanos, ou
ainda, a própria Comissão poderá emitir opinião própria e conclusão. Decorrido um
novo prazo fixado, a Comissão decidirá se o Estado adotou efetivamente as
recomendações, e, um informe será publicado no relatório anual de suas atividades.
Finalmente, conforme prevê o Regulamento que rege a Comissão, tratandose de casos graves ou urgentes, a Comissão poderá, por iniciativa própria, solicitar
ao Estado responsável a adoção de medidas cautelares para evitar danos
irreparáveis; solicitar à Corte Interamericana a adoção de medidas provisórias, para
evitar um dano irreparável, em matéria que ainda não tenha sido destinada à Corte.
4.3 Corte Interamericana de Direitos Humanos e Comissão Interamericana de
Direitos Humanos: diferenças básicas
Salienta-se que, a Corte Interamericana de Direitos Humanos é um órgão
judicial autônomo, sediado em São José, Costa Rica e, conforme dito, a sua função
é aplicar e interpretar a Convenção Americana de Direitos Humanos e outros
tratados que versem sobre direitos humanos. As pessoas, grupos ou entidades que
não sejam o Estado ou a própria Comissão Interamericana de Direitos Humanos não
têm capacidade para impetrar casos junto à Corte.
A Corte somente pode atender casos em que o Estado envolvido a). tenha
ratificado a Convenção Americana de Direitos Humanos, b). tenha aceito a
jurisdição facultativa da Corte (até 1992, somente 13 das 35 nações
assinaram a jurisdição facultativa), c). caso a Comissão Interamericana
tenha completado sua investigação e d). quando o caso foi apresentado à
Corte ou pela Comissão ou pelo Estado envolvido no caso dentro de três
meses após a promulgação do relatório da Comissão. Um indivíduo ou
peticionário não pode independentemente levar o caso a ser considerado
pela Corte. (HUMAM RIGHTS EDUCATION ASSOCIATES, 2011)
32
Para ser julgada pela Corte Interamericana, ela tem que ser internalizada pelo
país, caso contrário não poderá a Corte intervir no caso. Caso seja devidamente
julgado e sentenciado pela Corte, observa-se:
Artigo 29. Decisões - 1. As sentenças e resoluções que ponham fim ao
processo são de competência exclusiva da Corte. (...) 3. Contra as
sentenças e resoluções da Corte não procede nenhum meio de
impugnação. (ESTATUTO DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS
HUMANOS, 1979).
Sendo um caso julgado por esta Corte, a sentença final será de sua
competência exclusiva, não cabendo recurso.
Em se tratando da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que,
juntamente com a Corte, é um dos órgãos responsáveis por garantir a proteção do
ser humano, tem a sua sede em Washington D.C. e abrange todos os Estados que
são partes da OEA e também àqueles que aderiram à Convenção Americana de
Direitos Humanos, diferentemente da Corte, que exige uma aceitação expressa para
atuar em determinado Estado, somente pelo fato de aderir à Convenção, o Estado
se sujeitará, tacitamente, à Comissão: “Os Estados que ratificaram a Convenção
Americana de Direitos Humanos estão circunscritos pelos direitos humanos
garantidos na Convenção, os quais são monitorados pela Comissão”. (HUMAM
RIGHTS EDUCATION ASSOCIATES, 2011). Qualquer pessoa poderá levar um caso
para apreciação da Comissão, conforme art.23 do Estatuto:
Apresentação de petições - Qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou
entidade não-governamental legalmente reconhecida em um ou mais
Estados membros da Organização pode apresentar à Comissão petições
em seu próprio nome ou no de terceiras pessoas, sobre supostas violações
dos direitos humanos reconhecidos, conforme o caso, na Declaração
Americana dos Direitos e Deveres do Homem, na Convenção Americana
sobre Direitos Humanos “Pacto de San José da Costa Rica”, no Protocolo
Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais “Protocolo de San Salvador”, no
Protocolo à Convenção Americana sobre Direitos Humanos Referente à
Abolição da Pena de Morte, na Convenção Interamericana para Prevenir e
Punir a Tortura, na Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento
Forçado de Pessoas, e na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e
Erradicar a Violência contra a Mulher, em conformidade com as respectivas
disposições e com as do Estatuto da Comissão e do presente Regulamento.
O peticionário poderá designar, na própria petição ou em outro instrumento
por escrito, um advogado ou outra pessoa para representá-lo perante a
Comissão. (REGULAMENTO DA COMISSÃO INTERAMERICANA DE
DIREITOS HUMANOS, 2009)
33
Ressalta-se,
também,
que
a
Comissão,
por
iniciativa
própria,
independentemente de denúncia, poderá investigar e enviar relatório sobre a
situação dos direitos humanos em qualquer dos Estados-membros da OEA.
Assim, a Corte Interamericana somente atuará sobre os Estados que a
aceitarem expressamente, enquanto a Comissão Interamericana vincula-se ao
Estado que seja integrante da OEA ou que tenha aderido à Convenção Americana
de Direitos Humanos. A Comissão aceitará petição de qualquer indivíduo ou grupo
de indivíduos, enquanto à Corte Interamericana, somente, direcionar-se-ão,
diretamente, os Estados jurisdicionados e a Comissão Interamericana quando
entender a pertinência.
Observe-se o exposto pela Advocacia Geral da União – AGU:
A partir do ano de 1996, todavia, inovação trazida pelo III Regulamento da
Corte Interamericana de Direitos Humanos ampliou a possibilidade de
participação do indivíduo no processo, autorizando que os representantes
ou familiares das vítimas apresentassem, de forma autônoma, suas próprias
alegações e provas durante a etapa de discussão sobre as reparações
devidas. Além disso, hoje, com as alterações trazidas pelo IV Regulamento,
também é possível que as vítimas, seus representantes e familiares não só
ofereçam suas próprias peças de argumentação e provas em todas as
etapas do procedimento, como também fazer uso da palavra durante as
audiências públicas celebradas, ostentando, assim, a condição de
verdadeiras partes no processo. (BRASIL, 2011)
Atente-se que a Corte vêm se tornando mais flexível para com os indivíduos,
já que lhes permite intervir conforme acima exposto, durante o curso do processo,
entretanto, representar inicialmente perante à Corte, ainda, caberá somente aos
Estados jurisdicionados e a Comissão Interamericana.
34
5 AS SENTENÇAS DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS
5.1 A aplicabilidade das sentenças no Estado brasileiro
A intenção é que o Estado brasileiro execute, de forma espontânea as
decisões internacionais às quais se submeta, dessa forma, seria desnecessária
qualquer medida judiciária para fazer essa sentença valer dentro do Brasil.
Considerando que não ocorra a execução espontânea, também não se pode afirmar
que, pela via judicial, a execução será possível, já que o resultado, mesmo pela via
judicial, não será obtido forçando o Estado a tomar determinada atitude.
Considerando a possibilidade da execução da sentença internacional deve ser
analisado qual o tipo de prestação foi imposta ao Estado para aplicação das normas
cabíveis.
Se a execução da sentença internacional condenatória for possível, e não
havendo cumprimento espontâneo, caberá distinguir se se tem uma
condenação ao pagamento de indenização ou a outro tipo de prestação. Na
primeira hipótese, aplicar-se-ão diretamente as normas próprias da
sentença nacional contra o Estado, por força do art. 68.2 do Pacto de São
José da Costa Rica. Uma vez que a jurisdição da Corte Interamericana de
Direitos Humanos foi aceita pelo Brasil em 1998 e a Convenção
Interamericana de Direitos Humanos se encontra devidamente internalizada
em nosso país, o artigo sob comento assume valor supralegal, por reger
matéria relativa a direitos humanos, como recentemente reconhecido pelo
Supremo Tribunal Federal. Como lei, o art. 68.2 pode acrescentar e, de fato,
acrescenta ao rol do art. 475-N do Código de Processo Civil um novo título
executivo judicial: a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos
que condena a pagar uma indenização compensatória. Sua execução deve
ser feita nos termos dos arts. 730 e 731 do CPC, que tratam da execução
contra a Fazenda Pública. (PEREIRA, 2009)
Coelho (2008) ensina que a execução das sentenças da Corte pode ocorrer
de duas formas dentro do território nacional, sendo elas: a execução espontânea
pelo Estado ou a execução forçada por meio do Poder Judiciário.
Frisando o que já foi exposto, vale lembrar que nenhum dos Estados poderá
alegar impossibilidade de cumprir o que foi determinado em uma sentença da Corte,
alegando para tal descumprimento uma deficiência em legislação de ordem interna.
Um Estado quando ratifica o Pacto de São José da Costa Rica e ainda
quando reconhece a competência da Corte, compromete-se e responsabiliza-se por
adequar seu ordenamento jurídico interno para que o mesmo fique compatível a
eventuais decisões advindas da firmação de tais compromissos.
35
Coelho (2008) mostra que em relação à execução espontânea de sentença
pelo Estado, somente os Poderes Executivo e Legislativo estão aptos para executálas.
O Pacto de São José da Costa Rica prevê em seu art. 68, inciso 2º, que
”parte da decisão que dispor sobre indenização poderá ser executada no respectivo
país de acordo com o procedimento interno aplicável à execução de sentenças
contra o Estado” (Coelho, 2008). Assim, no Estado brasileiro, o pagamento de
indenizações contra o estado pode seguir o art. 100 da Constituição da República
Federativa do Brasil/1988 e os artigos 730 e 731 do Código de Processo Civil.
Tratando-se das demais espécies de reparação (aquelas de natureza nãopecuniária), a Convenção Americana de Direitos Humanos estabelece que o Estadomembro deve adequar-se adotando medidas legislativas ou medidas de qualquer
outra natureza que seja necessário à efetivação do que foi previamente tratado.
Assim, Coelho (2008) deduz que “as reparações não pecuniárias ordenadas pela
Corte Interamericana deverão ser cumpridas de acordo com os procedimentos
estabelecidos pelo direito interno.” O mesmo autor ainda afirma:
Em caso de condenação, após receber comunicação formal da Corte
Interamericana sobre a decisão de mérito, o Estado deve adotar as medidas
necessárias para proceder a seu cumprimento, sob pena de nova
responsabilização internacional. Esse é o dever da Administração Pública
após o Brasil ter ratificado o Pacto de São José da Costa Rica e declarado
reconhecer a competência obrigatória da Corte Interamericana de Direitos
Humanos. (COELHO, 2008)
Segundo Coelho (2008) é dever do Poder Legislativo a observância aos
tratados firmados pelo Estado e sendo conhecido tais compromissos, que o
Legislativo evite aprovar normas contraditórias ou conflitantes em relação à matéria
dos tratados, cabendo ainda a esse poder a adoção de medidas necessárias para
melhor concretização das sentenças impetradas pela Corte Americana de Direitos
Humanos. Sendo que a inobservância do disposto levará o Brasil a uma
responsabilização internacional.
Tratando da implementação forçada da sentença por meio do Poder
Judiciário, é importante ressaltar que, nenhuma lesão a direito poderá ser excluída
da apreciação do Poder Judiciário, conforme art. 5º, inciso XXXV, da CRFB/88.
Portanto, em caso de o Estado deixar de cumprir as determinações impostas, ou
mesmo se demorar um prazo longo e injustificado, a vítima ou o Ministério Público
poderão acioná-lo no Poder Judiciário. Coelho (2008) ressalta o seguinte:
36
É importante destacar que se a sentença da Corte Interamericana não for
executada em prazo razoável, não só o Poder Judiciário poderá ser
acionado, mas também o Estado poderá ser submetido a novo processo de
responsabilização internacional. O ordenamento jurídico nacional consagra
o princípio da prestação jurisdicional em prazo razoável no inciso LXXVIII do
Art. 5º da Constituição da República. O sistema interamericano, por sua vez,
também assegura o mesmo princípio no inciso 1º do Artigo 8º da
Convenção Americana de Direitos Humanos. Assim, por meio da
interpretação sistemática da Convenção Americana e do ordenamento
jurídico nacional, pode-se inferir que a norma mais favorável à vítima deve
sempre ser aplicada para a execução de decisões judiciais [43]. Ressalte-se
que o princípio da dignidade humana fundamenta o Estado democrático de
direito, conforme o Art. 1º da Constituição da República. Desse modo, o
Estado tem que buscar procedimentos práticos para implementar as
sentenças da Corte Interamericana de modo célere e da forma mais simples
possível em benefício da vítima.(COELHO, 2008)
Entende-se, assim, com base nos princípios da “razoabilidade de prazo para
prestação judiciária”, “dignidade da pessoa humana” e “norma mais favorável à
vítima”, nos casos em que o Estado deixar de cumprir, voluntariamente, uma
sentença imposta pela Corte, além de sofrer uma execução forçada em âmbito
interno, poderá sofrer nova responsabilização internacional.
A Corte, quando procedente a alegação de violação, pode ordenar pela
interrupção do ato transgressivo, pela execução de uma medida necessária a fim de
compensar o direito humano lesado, ou por uma justa indenização a fim de
compensar o dano moral e/ou material, conforme dispõe o art. 63.1, do Pacto de
São José da Costa Rica:
Quando decidir que houve violação de um direito ou liberdade protegidos
nesta Convenção, a Corte determinará que se assegure ao prejudicado o
gozo do seu direito ou liberdade violados. Determinará também, se isso for
procedente, que sejam reparadas as consequências da medida ou situação
que haja configurado a violação desses direitos, bem como o pagamento de
indenização justa à parte lesada. (1969).
Em se tratando da legitimidade passiva, a ação deve ser proposta em face da
União, por ser ela a representante do Brasil nas relações internacionais, conforme
prevê o art. 21, inc. I, CRFB/1988: “Compete à União: I - manter relações com
Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais;” (BRASIL, 1988).
Pereira (2009) cita o juiz federal Adriano Enivaldo de Oliveira:
Na execução de condenações não indenizatórias, assim como se passa
com as indenizatórias, a competência para a execução será do juiz federal,
seja nos termos do art. 109, inc. I, da Constituição, já que o processo será
dirigido contra a União, seja, ainda, ex vi do inc. III: “Art. 109. Aos juízes
federais compete processar e julgar: […] III – as causas fundadas em
tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo
internacional. (OLIVEIRA, citado por PEREIRA, 2009)
37
Observe-se,
portanto,
que
a
responsabilidade
perante
as
Cortes
Internacionais, por violações aos direitos humanos, é da União, independentemente
do estado federado onde tenha sido praticada a violação. Sendo ré a União, a
execução de uma possível condenação seria na esfera da Justiça Federal, devendo
esta tomar as medidas cabíveis perante o infrator.
Pereira (2009) explicita a possibilidade de um litisconsórcio passivo, já que,
em alguns casos, a União mantém relações para representação do País, sendo
assim tem-se a possibilidade de que a execução seja dirigida tanto contra a União,
quanto ao ente federado responsável por cumprir a sentença internacional. Pereira
(2009) exemplifica:
Por exemplo, cabe aos municípios organizar o serviço público local de
caráter essencial, incluindo o transporte coletivo (art. 30, inc. V, da CR). Se,
por absurdo, em algum município brasileiro as companhias de ônibus
discriminarem alguns passageiros, impedindo o seu acesso ao serviço
público, em razão de sua orientação sexual, e esse incidente, esgotados os
recursos internos, motivar um julgamento e uma condenação pela Corte
Interamericana de Direitos Humanos, nesse caso o município deverá
também figurar no pólo passivo do processo executivo, pois a ele caberá
fazer cessar a violação. A União, em todo caso, não poderá ser excluída,
pois terá representado o País no processo internacional. (PEREIRA, 2009)
Em se tratando da legitimidade ativa para propor a ação de execução de
sentença emitida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, havendo o
beneficiário individualizado, este será legitimado, não havendo uma individualização
do beneficiário tal ação caberá ao Ministério Público, conforme arts. 127 e 129, inc.
III, ambos da CRFB/1988 (BRASIL, 1988):
Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função
jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do
regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis./ Art.
129. São funções institucionais do Ministério Público: III - promover o
inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e
social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.
Pereira (2009) ensina que “O Ministério Público Federal terá legitimidade
sempre, admitindo-se, eventualmente, o litisconsórcio facultativo de que trata o art.
5o, § 5o, da Lei 7.357/1985, se houver interesse local na execução da sentença
internacional”.
Reforçando o exposto no presente trabalho, Cançado Trindade adverte que:
38
[...] a grande maioria dos Estados Partes na Convenção Americana ainda
não tomou qualquer providência, legislativa ou de outra natureza, nesse
sentido. Por conseguinte, as vítimas de violações de direitos humanos, em
cujo favor tenha a Corte Interamericana declarado um direito —quanto ao
mérito do caso, ou reparações lato sensu,— ainda não têm inteira e
legalmente assegurada a execução das sentenças respectivas no âmbito do
direito interno dos Estados demandados. Cumpre remediar prontamente
esta situação. (TRINDADE, citado por PEREIRA, 2009)
Ora, pertinente ao cumprimento de sentença internacional, restou claro que o
ordenamento jurídico é lacunoso, mesmo após compromisso firmado por esse
Estado nota-se a inércia do mesmo, o que acaba por deixar as vítimas das violações
de direitos humanos sem o mínimo de garantia.
5.2 A distinção entre sentença estrangeira e sentença internacional e a (des)
necessidade de homologação das sentenças da Corte Interamericana pelo
Superior Tribunal de Justiça
De acordo com os Artigos 483 e 484 do Código de Processo Civil sentenças
estrangeiras são aquelas proferidas por um Tribunal estrangeiro e essas não terão
eficácia no Brasil se não passarem pelo processo de homologação feito pelo
Superior Tribunal de Justiça.
Bregalda Neves (2008) ensina:
É praxe internacional o reconhecimento de sentença estrangeira pelo
Estado, desde que condizente com a ordem jurídica interna. Homologação
consiste no ato judicial de reconhecimento da sentença estrangeira em
outro país. É essencial no Brasil esse pronunciamento. A execução da
sentença estrangeira respeita os termos do processo executório do país em
que for concedida a homologação. A impossibilidade do reconhecimento da
sentença estrangeira é fato impeditivo também da sua execução. (NEVES,
2008)
Aparentemente essa necessidade de homologação da sentença estrangeira é
a necessidade de impedir a execução de sentenças que ofendam a soberania
nacional. Quanto à definição de sentença internacional, José Carlos Magalhães:
Sentença internacional consiste em ato judicial emanado de órgão judiciário
internacional de que o Estado faz parte, seja porque aceitou a sua jurisdição
obrigatória, como é o caso da Corte Interamericana de Direitos Humanos,
seja porque, em acordo especial, concordou em submeter a solução de
determinada controvérsia a um organismo internacional, como a Corte
Internacional de Justiça. O mesmo pode-se dizer da submissão de um litígio
a um juízo arbitral internacional, mediante compromisso arbitral, conferindo
jurisdição específica para a autoridade nomeada decidir a controvérsia.
(MAGALHÃES citado por PEREIRA, 2009)
39
O
Estado
brasileiro
reconhece,
por
opção,
a
jurisdição
da
Corte
Interamericana de Direitos Humanos. Sendo assim, sujeita-se às sentenças desta
Corte, independentemente de homologação, já que elas possuem caráter de
sentença internacional, que difere da sentença estrangeira, dispensando assim, a
necessidade da homologação para ensejar validade no território de um Estado
jurisdicionado.
No mesmo artigo, Marcela Harumi traz a diferença entre sentença estrangeira
e sentença internacional nas palavras de Augustinho Fernandes Dias da Silva:
As sentenças internacionais, proferidas por tribunal de que participe o
Brasil, não são pròpriamente sentenças estrangeiras. Emanam da própria
vontade do estado, por intermédio de seu representante no tribunal. Assim
sendo, estão dispensadas de homologação, devendo ser executadas de
acordo com o ato internacional que as rege. (SILVA citado por PEREIRA,
2009).
Assim, resta claro que não se confunde a sentença estrangeira com a
sentença internacional, já que a primeira é prolatada por juízo estrangeiro no âmbito
do direito estrangeiro e a outra é prolatada por um órgão em que o próprio Estado
garantiu a jurisdição.
Considerando que as sentenças emitidas pela Corte Interamericana são
sentenças internacionais não há que se falar em Homologação feita pelo STJ, já que
o próprio Estado brasileiro aceitou e reconheceu expressamente a jurisdicionalidade
da mesma.
5.3. A obrigação de executar as sentenças da Corte
Conforme já mencionado, as sentenças da Corte somente serão aplicáveis
àqueles países que a reconheceram e a aceitaram para interpretar e aplicar o que
foi proposto no Pacto de São José da Costa Rica.
No Estado brasileiro, a competência da Corte foi reconhecida no governo de
Fernando Henrique Cardoso, sob reserva de reciprocidade e para fatos ocorridos
após o ano de dezembro de 1998, por meio do Decreto 4.463, de 08 de novembro
de 2002.
Assim, sendo o Brasil responsabilizado em alguma sentença da referida
Corte, o país deve buscar meios administrativos e/ou processuais para cumprir o
que foi estabelecido na sentença, qualquer que seja o tipo reparação.
40
Atente-se que são diversas as formas de reparação, como traz Rodrigo
Meirelles Gaspar Coelho (2008):
Ressalte-se que o termo reparação não deve ser entendido como sinônimo
de “indenização”. Existem reparações que não são pecuniárias, como a
restituição na íntegra ou restitutio in integrum, a satisfação, as garantias de
não-repetição, entre outras. Conforme ensina o professor André de
Carvalho Ramos, o conteúdo das decisões das cortes internacionais de
direitos humanos é bastante amplo e ‘de forma alguma poderemos cair no
engano de que as sentenças da corte se resumem em indenizações. Basta
passarmos no Tesouro Nacional, assinarmos um grande cheque e tudo será
resolvido. Ao contrário, a jurisprudência da Corte (Interamericana) mostra
que além das obrigações de dar pecúnia nós temos obrigações de fazer e
não-fazer. (COELHO,2008)
As reparações impostas vão variar de acordo com a melhor forma possível de
compensar a vítima pelo dano sofrido, Coelho (2008) ainda cita outras formas de
reparação já instituídas em algumas decisões proferidas pela Corte:
O dever de investigar e punir qualquer violação dos direitos consagrados na
Convenção Americana, a construção de estabelecimentos de ensino e
postos de saúde, a reabilitação da vítima, a criação de fundação para a
administração financeira dos valores provenientes da indenização e a
suspensão dos efeitos de uma lei interna. (COELHO,2008)
É certo que após firmar tal compromisso e assumir a responsabilidade o
Brasil não poderá se esquivar de cumprir o que for estipulado pela Corte. Hoje, não
são tantos os casos que tramitam contra esse Estado no referido órgão, entretanto,
a tendência, observando a atual situação, é aumentar o número de casos, assim, a
obrigação do Estado brasileiro é a de se posicionar sobre a forma como será feita a
execução das sentenças da Corte em seu território.
Geralmente, os tratados relativos a direitos humanos, por óbvio, demonstram
prevalência de norma mais favorável à proteção do ser humano. A Constituição não
deve excluir a aplicação dos tratados, da mesma forma que os tratados não devem
excluir a aplicação da CRFB/1988.
Não existe, até o momento, posicionamento brasileiro quanto à forma de
execução dessas decisões a nível interno, gerando incertezas e inseguranças
jurídicas Diante desta situação, vislumbra-se a necessidade de uma emenda
constitucional, ou mesmo de uma legislação disciplinando tal tema. Somente desta
forma, o Brasil estará fortalecendo a jurisdicionalidade que ele próprio atribuiu à
Corte Interamericana, demonstrando maior respeito às suas decisões.
41
A resistência do Estado brasileiro em se adequar aos parâmetros dos direitos
humanos de direito internacional e, por fim, aceitar a prevalência da norma mais
favorável à pessoa humana, apenas confirma a enorme distância entre a teoria e a
prática e acaba por mostrar também, que, em se tratando da formação em direitos
humanos, o Brasil está apenas começando.
5.4 Sentenças da Corte Interamericana proferidas contra o Brasil: casos reais a
título exemplificativo
5.4.1 Caso: Damião Ximenes Lopes
A título de introdução, importa narrar, mesmo que brevemente, sobre quais
questões versam o caso “Damião Ximenes Lopes”.
A história de Damião ocorreu em 1999, na cidade de Sobral, no Estado do
Ceará. Na época, todo esse aparato de proteção aos direitos humanos já
existia, consubstanciado no que se denomina Direito Internacional dos
Direitos Humanos denúncia de violação de direitos humanos que resultou
na primeira condenação do Estado brasileiro no âmbito de uma corte
internacional. Trata-se de uma decisão inédita, em que a Corte
Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil pela morte de
Damião Ximenes, portador de transtorno mental, ocorrida em 4 de outubro
de 1999. No entanto, mesmo com a sentença da Corte Interamericana em
2005, somada aos esforços da família e demais atores envolvidos no
processo, até hoje, nenhum procedimento da jurisdição interna foi
solucionado, ou seja, a ação penal e a ação civil, instauradas para elucidar
o caso, continuam em tramitação no Fórum de Sobral.O caso de Damião foi
a primeira condenação do Brasil em uma instância internacional de direitos
humanos e constituiu também a primeira sentença da Corte Interamericana
relativa a violações de direitos das pessoas portadoras de transtornos
mentais no continente. A família recebeu a indenização no dia 17 de agosto
de 2007, após publicação no Diário Oficial da União, em 14 de agosto de
2007, um ano após a promulgação da sentença. A inconformidade com a
barbaridade da morte motivou Irene Ximenes, irmã de Damião, a apresentar
o caso à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, por meio
de uma denúncia por e-mail em 1999. No dia 30 de novembro de 2005, em
São José da Costa Rica, realizou-se a primeira audiência em face do
Estado brasileiro, na Corte Interamericana dos Direitos Humanos. O caso
de Damião seria julgado naquele Tribunal, seis anos após sua morte e
resultou, conforme dito anteriormente, na primeira condenação do Brasil em
uma instância internacional de direitos humanos, constituindo também a
primeira sentença da Corte relativa a violações de direitos das pessoas
portadoras de transtornos mentais. No dia 17 de agosto de 2007, os
familiares de Damião receberam a indenização estipulada pela Corte
Interamericana e os valores foram depositados nas contas bancárias de
seus familiares. (BORGES, 2008)
42
Como visto nas palavras de Borges (2008), mesmo após a sentença julgada
pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em 2005, até o ano de 2008, a
jurisdição interna quedava-se à inércia, cumprindo a sentença imposta pela Corte
apenas de forma parcial. A justiça global apresenta uma resolução emitida pela
Corte, diante dessa parcial inércia:
A sentença condenatória no Caso Damião Ximenes, a primeira da Corte em
relação ao Brasil, proferida em 4 de julho de 2006, dispôs entre outros
pontos, que: 1) o Estado deve garantir em um prazo razoável, que o
processo interno destinado a investigar e sancionar os responsáveis pela
morte de Damião Ximenes; 2) o Estado deve reparar a família de Damião
Ximenes por sua morte; 3) o Estado deve continuar a desenvolver um
programa de formação e capacitação para o pessoal médico, de psiquiatria
e psicologia, de enfermagem e auxiliares de enfermagem, e para todas as
pessoas vinculadas ao atendimento de saúde mental, conforme padrões
internacionais sobre a matéria.A Corte entende que o cumprimento da
sentença não se esgota com o pagamento da indenização, efetuado pela
União em 17 de agosto de 2007. E destaca que “passados mais de oito
anos desde a morte de Damião Ximenes Lopes sem que se tenha avançado
no esclarecimento dos fatos e, se fosse o caso, à sanção dos responsáveis.
Tendo em conta estas circunstâncias, o Tribunal considera imprescindível
que o Brasil em seu próximo relatório remeta informação atualizada e
detalhada sobre o estado da investigação penal”. (JUSTIÇA GLOBAL,
2008)
Pode ser considerada uma vitória na luta dos direitos humanos o começo do
cumprimento dessa sentença e consequente reconhecimento de responsabilidade
pelo Brasil, perante esse caso. Nota-se também a importância da Corte como
instrumento internacional de proteção aos direitos humanos, importância essa que
seria ainda mais reforçada se o Estado brasileiro se regulamentasse efetivamente.
Observa-se que essa foi a primeira sentença da Corte Interamericana a recair
sobre o Estado brasileiro. A sentença da Corte reconheceu a alegada violação de
direitos humanos ocorrida e a falta de ações de prevenção por parte do governo
brasileiro a fim de que não perpetrasse casos semelhantes. Como medida de
reparação, a Corte condenou o Brasil a indenizar a família da vítima por danos
materiais e imateriais. Determinou ainda, que o país investigasse e punisse os
responsáveis pelo crime de forma ágil e eficaz. Além disso, a sentença estabeleceu
o dever para o Estado brasileiro regulamentar e monitorar os serviços públicos de
saúde mental, investigando e combatendo a impunidade das violações de direitos
humanos nesses locais. Essa sentença veio como uma forma de garantir que o
Estado continue implementando as reformas psiquiátricas já iniciadas no sentido de
melhorar a atual situação dos portadores de transtornos mentais.
43
5.4.2 Caso: Guerrilha do Araguaia
A Guerrilha do Araguaia ocorreu às margens do Rio Araguaia, no estado do
Pará. A questão em voga são as inúmeras ações repressivas realizadas pelas
Forças Armadas entre os anos de 1972 a 1975, nas ditas ações teriam ocorrido:
detenções, torturas, desaparecimentos e execuções de pelo menos 70 pessoas.
Dessas 70 pessoas, somente 4 corpos foram encontrados, ainda assim, graças à
ação de parentes.
Quanto aos entendimentos da Corte, nesse caso, enumera Baldi (2010):
O processo originou-se em 1995, pelo Centro pela Justiça e o Direito
Internacional e pela Human Rights Watch/América, em nome de pessoas
desaparecidas no contexto da “Guerrilha do Araguaia” e seus familiares. O
governo brasileiro foi notificado pela Comissão Interamericana de Direitos
Humanos em 2008 do Relatório contendo diversas recomendações ao
Estado. Tendo em vista que as informações sobre o cumprimento destas
foram tidas como não satisfatórias, a demanda foi submetida à Corte. E
quais os pontos principais do que foi decidido? Primeiro: foi acolhida,
parcialmente, a objeção, constante no julgamento do STF, de que a Corte
somente teria competência para os fatos ocorridos a partir de 1998 e,
portanto, em relação ao período da ditadura militar, estes não poderiam ser
analisados, foi parcialmente acolhido. Neste ponto, a Corte entendeu
que”os atos de caráter contínuo ou permanente perduram durante todo o
tempo em que o fato continua, mantendo-se sua falta de conformidade com
o Direito Internacional” (§17). Desta forma, tendo em vista o caráter
permanente do delito, foi reconhecida a competência para analisar os
alegados desaparecimentos forçados das supostas vítimas a partir do
reconhecimento da competência contenciosa efetuada pelo Brasil. E além
disto, também poderia apreciar as omissões, posteriores a dezembro de
2008, relacionadas com a falta de investigação, julgamento e sanção dos
responsáveis. Segundo: que a decisão de conformidade da lei de anistia
com a Constituição é, de fato, uma questão de direito interno, mas que não
impede, contudo, que a Corte “realize um controle de convencionalidade, ou
seja, a análise da segunda incompatibilidade daquela lei com as obrigações
internacionais do Brasil contidas na Convenção Americana” (§ 48). E isto
não era invasão de competência do STF. Terceiro: sempre que houver
suspeitas de que uma pessoa foi submetida a desaparecimento forçado
deve iniciar-se uma investigação, independentemente da apresentação de
uma denúncia, pois trata-se de uma violação múltipla e continuada de
direitos humanos e de deveres de respeito e garantia (§§101 a 108). E o
Estado brasileiro fica responsável pelo tratamento médico e psicológico ou
psiquiátrico que as vítimas requeiram e, se for o caso, pagar o montante
estabelecido ( § 267 a 269). Quarto: para que uma investigação seja efetiva,
os Estados devem estabelecer marco normativo que implique regulamentar
como delito autônomo o desaparecimento forçado de pessoas (§109). E,
portanto, adequação da legislação interna brasileira. Quinto: houve a
reiteração de que a obrigação de investigar violações de direitos humanos
encontra-se dentro das medidas positivas que os Estados devem adotar
para garantir os direitos estabelecidos na Convenção (§ 137), salientando a
necessidade de apuração de suspeitas de atos de tortura (§142). Sexto: que
são inadmissíveis as disposições de anistia, prescrição e estabelecimento
de excludentes de responsabilidade que pretendam impedir a investigação
e punição dos responsáveis por graves violações de direitos humanos,
44
“como a tortura, as execuções sumárias, extrajudiciais ou arbitrárias, e os
desaparecimentos forçados, todas elas proibidas”, por violar “direitos
inderrogáveis reconhecidos pelo Direito Internacional dos Direitos
Humanos” (§ 171). Neste sentido, a Corte destacou decisões dos sistemas
regional e internacional (§§ 149 a 162), bem como decisões de Estados
membros da OEA (§§ 163 a 169). Sétimo: que em sociedades
democráticas, é indispensável que as autoridades sejam regidas pelo
princípio da máxima divulgação, e que toda a pessoa, inclusive os familiares
das vítimas de graves violações de direitos humanos, tenha o direito de
conhecer a verdade (§§ 199 e 200), de tal forma que, neste caso, teria sido
violado, também, o direito de acesso à informação. Oitavo: que apesar de o
Estado reconhecer sua responsabilidade no âmbito interno, com toda a
legislação e pagamento de indenizações, o mesmo não teria ocorrido no
âmbito internacional. Desta forma, determinou-se a “realização de um ato
público de reconhecimento internacional e de pedido oficial de desculpas
pelas graves violações de direitos humanos perpetradas contra as vítimas”
por denegação de justiça, devendo dele participar “altos representantes dos
três poderes do Estado”, com transmissão através de meios de
comunicação, como rádio, jornais e televisão (§§ 274 a 277). Nono: que a
forma na qual foi interpretada e aplicada a lei de anistia aprovada pelo
Brasil, inclusive pelo próprio STF, “afetou o dever internacional do Estado
de investigar e punir as graves violações de direitos humanos” (§172),
porque: a) impediu os familiares das vítimas serem ouvidos por juiz; b)
violou direito à proteção judicial, pela falta de investigação, persecução,
captura, julgamento e punição dos responsáveis; c) descumpriu a obrigação
de adequar seu direito interno. Desta forma, dada a manifesta
incompatibilidade com a Convenção Americana, as disposições da Lei da
Anistia brasileira “carecem de efeitos jurídicos” (§ 174), que não deriva de
uma questão formal (ser ou não “autoanistia”), mas sim do aspecto material
de “violação aos artigos 8 e 25, com relação aos artigos 1.1 e 2 da
Convenção.” (§ 175). Décimo: a Corte reafirmou jurisprudência consolidada
no sentido de que, “quando um Estado é parte de um tratado internacional”,
todos os seus órgãos, “inclusive seus juízes, também estão
submetidos àquele” e, portanto, o Poder Judiciário “deve levar em conta
não somente o tratado, mas também a interpretação que a ele conferiu a
Corte Interamericana, intérprete última da Convenção Americana” (§ 176).
Na realidade, se a ninguém é escusado alegar o desconhecimento da lei, no
tocante ao Judiciário, tampouco é admissível alegar a inaplicabilidade da
jurisprudência internacional para a interpretação de tratados internacionais.
(BALDI, 2010)
Nota-se in casu que a Corte Interamericana reconhece sua competência em
relação ao Brasil apenas a partir do ano de 1998, entretanto, o caráter permanente
do delito, reconhece-se a competência da Corte para analisar os alegados
desaparecimentos, além de analisar também os atos ocorridos após 1998 que
acabaram por não sancionar os responsáveis. Na vista citação, a Corte destaca
ainda, a falta de adequação da legislação interna brasileira, cita também a
incompatibilidade da Convenção Americana - ratificada pelo Brasil – com a Lei da
Anistia
brasileira,
considerando
esta
última
carente
em efeitos
jurídicos.
Independente do cumprimento ou não das sanções impostas pela Corte, a
adequação da lei interna à normativa internacional, ainda hoje, segue com enorme
morosidade.
45
5.4.3 Caso: Maria da Penha
O caso de Maria da Penha Maia Fernandes foi um dos casos de envolvimento
da Corte Interamericana, que senão a maior, sua repercussão interna foi grande.
A luta de Maria da Penha, com apoio de grupos de defesa da mulher e
organismos internacionais, culminou, inclusive, em uma edição de Lei – Lei
11.340/2006 – a fim de estabelecer garantias às mulheres.
O Comitê Latino Americano de Direitos de Defesa da Mulher – CLADEM –
narra claramente o ocorrido neste caso
Maria da Penha, foi vítima de dupla tentativa de homicídio por seu então
marido e pai de suas 3 filhas, dentro de sua casa, em Fortaleza, Ceará. O
agressor, Marco Antonio Heredia Viveiros, colombiano naturalizado
brasileiro, economista e professor universitário, atirou contra suas costas
enquanto ela dormia, causando-lhe paraplegia irreversível, entre outros
graves danos à sua saúde. Em ocasião posterior, tentou eletrocutá-la no
banho. Até 1998, mais de 15 anos após o crime, apesar de haver duas
condenações pelo Tribunal do Júri do Ceará (1991 e 1996), ainda não havia
uma decisão definitiva no processo e o agressor permanecia em liberdade,
razão pela qual Maria da Penha, CEJIL e CLADEM enviaram o caso à
CIDH/OEA. O Estado não respondeu à petição e permaneceu em silêncio
durante todo o procedimento.Em 2001, a CIDH responsabilizou o Estado
por omissão, negligência e tolerância em relação à violência doméstica
contra as mulheres brasileiras. Considerou que neste caso se davam as
condições de violência doméstica e de tolerância pelo Estado definidas na
Convenção de Belém do Pará e que existia responsabilidade pela falta de
cumprimento aos deveres do art. 7(b), (d), (e) (f) e (g), em relação aos
direitos por ela protegidos, entre os quais, a uma vida livre de violência (art.
3), a que se respeite sua vida, integridade física, psíquica e moral e
segurança pessoal; dignidade pessoal, igual proteção perante a lei e da lei;
e a um recurso simples e rápido perante os tribunais competentes, que a
ampare contra atos que violem seus direitos (art. 4 (a), (b), (c ) (d), (e), (f) e
(g)). Considerou violados os direitos às garantias judiciais e à proteção
judicial dos arts. 8 e 25 da Convenção Americana, em conexão com a
obrigação de respeitar e garantir os direitos, prevista em seu art. 1(1),
devido à demora injustificada e tramitação negligente do caso.Ademais,
estableceu recomendações de natureza individual para o caso e também de
políticas públicas para o país. Em síntese, as de: completar o
processamento penal do responsável; proceder a uma investigação e
responsabilização em relação às irregularidades e atrasos injustificados no
processo; prover uma reparação simbólica e material para a vítima;
promover a capacitação de funcionários judiciais e policiais especializados;
simplificar procedimentos judiciais penais; promover formas alternativas de
solução de conflitos intrafamiliares; multiplicar o número de Delegacias da
Mulher com recursos especiais e oferecer apoio ao Ministério Publico em
seus pareceres judiciais; incluir nos planos pedagógicos unidades
curriculares sobre o respeito à mulher, seus direitos, a Convenção de Belém
do Pará e o manejo de conflitos intrafamiliares.Trata-se do primeiro caso em
que se aplicou a Convenção de Belém do Pará no sistema interamericano,
com decisão em que se responsabiliza um país em matéria de violência
doméstica contra as mulheres. Somente devido ao uso efetivo do sistema
internacional, em ações de litígio e de monitoramento, e pela pressão
política internacional e nacional, é que em março de 2002 o processo penal
46
foi concluído no âmbito interno e, em outubro do mesmo ano, o agressor foi
preso. O caso foi também relatado ao Comitê CEDAW em 2003, o qual
recomendou ao Estado adotar «sem demora uma legislação sobre violência
doméstica». Em 7 de agosto de 2006, como resultado de uma ação
conjunta da sociedade civil e do Estado, aprova-se a Lei 11.340 (Lei Maria
da Penha), que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e famíliar
contra a mulher.Após anos de negociações entre a vítima, o Estado e as
peticionárias, em 7 de julho de 2008, em um evento público realizado em
Fortaleza, faz-se efetiva a reparação à vítima, mediante o pagamento da
indenização e um pedido de desculpas à Maria da Penha, ambos feitos pelo
governo do Ceará, com reconhecimento do Estado brasileiro de sua
responsabilidade internacional diante das violações ocorridas, que teve
grande repercussão nos meios de comunicação. Em dezembro de 2008, o
Estado do Ceará aderiu ao Pacto Nacional de Enfrentamento à Violência
contra a Mulher, importante medida que promove a adoção de políticas
relacionadas com o cumprimento das recomendações da CIDH. Segue
pendente, contudo, a investigação e responsabilização relativas às
irregularidades e atrasos injustificados no processo no âmbito da justiça
interna. (CLADEM, 2010)
Mesmo com algumas pendências ainda apresentadas em relação a este
caso, a promulgação da Lei advinda do mesmo, pode demonstrar um grande avanço
por parte do Brasil, em se tratando da sua responsabilidade para com a Convenção
Interamericana. O Estado brasileiro começa, dessa forma, a se adequar ao sistema
e assumir plenamente sua responsabilidade.
Atente-se que apesar de ainda não em grande número, os três casos
expostos foram apenas ilustrativos, não sendo os únicos que correm ou correram na
Corte Interamericana de Direitos Humanos em relação à responsabilidade desse
Estado.
Certamente ainda existe muito a ser feito e, muito já deixou de se fazer,
entretanto, como tudo começa pelo começo, o esperado é que o Estado brasileiro
cumpra com seus acordos, garantindo-os e tornando-os efetivos, proporcionando
segurança, tranquilidade e estabilidade ao seu povo, ainda mais em se tratando de
acordos tão benéficos para todos.
47
5 CONCLUSÃO
O marco inicial e universal na história dos direitos humanos foi,
indiscutivelmente, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948. No
Brasil, a história dos direitos humanos está diretamente ligada à história das
Constituições Brasileiras. Tanto, pode-se observar o quanto o legislador na
CRFB/1988 se preocupou em garantir a dignidade, o respeito e o bem estar da
pessoa humana, de modo a se alcançar a paz e a justiça social.
Acredita-se que uma contradição clara pode ser observada atualmente, sendo
que os direitos humanos entraram no discurso contemporâneo, com enorme força,
contradizendo o atual e intenso processo de globalização. Pode-se observar que as
tendências econômicas e inúmeras revoluções tecnológicas acabam por gerar
instabilidade, desemprego e exclusão social, apesar de tal ponto ainda apresentar
controvérsias.
Vislumbra-se que considerável conquista em se tratando da efetivação dos
Direitos Humanos foi a Convenção Americana de direitos Humanos, também
denominada pacto de São José da Costa Rica, o qual entrou em vigor somente em
1978. Sendo um tratado, é aplicado somente àqueles países que o assinaram.
O Estado brasileiro ratificou o pacto de São José da Costa Rica em 1992.
Atualmente, após inúmeras controvérsias, o STF inclina-se a considerar que todos
os tratados sobre direitos humanos, como é o caso do Pacto de São José da Costa
Rica, têm “status” de norma infraconstitucional com atributo de norma supralegal.
Em se tratando da Corte Interamericana de Direitos Humanos, a adesão à
sua jurisdição é facultativa, não cabendo, entretanto, ao Estado que a ela aderiu,
esquivar-se de sua jurisdicionalidade. O Estado brasileiro reconhece a jurisdição da
referida Corte desde dezembro de 1998.
A execução das sentenças da Corte pode ocorrer de duas formas dentro do
território nacional, sendo elas: a execução espontânea pelo Estado ou a execução
forçada por meio do Poder Judiciário.
No caso do Brasil, considerando que as sentenças emitidas pela Corte
Interamericana são sentenças internacionais não há que se falar em Homologação
feita pelo STJ, já que o próprio Estado brasileiro reconheceu expressamente sua a
jurisdicionalidade.
48
A resistência do Estado brasileiro em adequar corretamente o ordenamento
jurídico interno ao que foi estabelecido, e por ele acordado, demonstra, que apesar
de muita evolução, em se tratando de direitos humanos, está apenas começando,
restando, sobre esse assunto, bastantes ações a serem realizadas e inúmeras
decisões a serem tomadas e reguladas. Ainda assim, até as presentes informações,
o Estado também não deixou de cumprir nenhuma das imposições por ele sofridas
em relação à Corte Interamericana de Direitos Humanos.
49
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