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Análise cultural da sociedade brasileira do século XIX, a partir do Rio de Janeiro
Taís Elaine do Nascimento Vieira *
Resumo: O texto aborda, em linhas gerais, a condição da mulher no século XIX, especificamente
na Cidade do Rio de Janeiro, destacando a relação casa-rua como um espaço moral e suas
especificidades culturais. Além disso, a partir de inúmeros teóricos, demonstra uma perspectiva
menos dogmática e mais voltada para a compreensão do próprio fenômeno.
Palavras-chave: Patriarcalismo – mulher – casa – rua – sociedade.
Abstract: This paper addresses, in general, the condition of women in the nineteenth century,
specifically in Rio de Janeiro City, highlighting the house-street relationship as a moral space and
its cultural specificities. Besides, using differnete authors, the text presents a less dogmatic and
more focused on the reading comprehension view of the phenomenon itself.
Keywords: Patriarchalism - woman - house - street - society.
O presente texto faz parte do segundo e terceiro capítulos da minha monografia
intitulada Considerações sobre a situação da mulher no ideal de ordem da cidade do Rio
de Janeiro do século XIX, apresentada como exigência final para aprovação no Curso de
Especialização em Sociologia Urbana ao Departamento de Ciências Sociais do Instituto de
Filosofia e Ciências Humanas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
A sociedade brasileira é muito interessante porque é moderna e tradicional. Um
sistema com espaços internos muito bem divididos que não permitem qualquer código
hegemônico ou dominante. Somos uma pessoa em casa, outra na rua e ainda outro no outro
mundo. Em cada espaço, somos submetidos a valores e visões diferentes. A esfera da casa
inventa uma leitura pessoal; a da rua, uma leitura universal. A casa e a rua são "categorias
sociológicas" para compreensão da sociedade brasileira (FREYRE. 1961). Isto significa
que estas palavras não designam simplesmente espaços geográficos ou físicos, mas, acima
de tudo, são entidades morais, esferas da ação social, províncias éticas dotadas de
positividade. Roberto DaMatta faz uma crítica interessante que
A História do Brasil tem mostrado como sempre insistimos em "ler" e
interpretar o país pela via exclusiva da linguagem oficial que se forma
no espaço generalizado da rua, espaço das nossas instituições públicas e
que sempre apresenta um discurso politicamente sedutor, pois que
sistematicamente normativo. Ou seja: desse ponto de vista, a fala sempre
diz o que fazer para resolver a questão (DAMATTA, 1991).
Utilizar-se da esfera legal não possibilita resolver questão alguma, porque somente
um lado do problema será visto, gerando, assim, soluções incompletas. DaMatta afirma:
Como corrigir o mundo público brasileiro por meio de leis impessoais, se
não se faz simultaneamente uma série crítica das redes de amizade e
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compadrio que embebem toda nossa vida política, institucional e
jurídica? (1991).
A ordem imposta pelas leis e pela polícia não une o país, não é a única possível.
Roberto DaMatta, um dos mais eminentes antropólogos brasileiros, nos alerta para uma
divisão muito nítida entre dois espaços sociais fundamentais que dividem a vida social
brasileira: o mundo da casa e o mundo da rua (DAMATTA, 1991). São estabelecidas
distinções fundamentais, com a rua sendo vista como um lugar do movimento, em
contraste com a calma e a tranquilidade da casa, o lar e a morada.
Na casa ou em casa somos membros de uma família ou um grupo fechado com
limites bem definidos. O grupo que ocupa uma casa tem alto sentido de proteção das suas
fronteiras, agindo em defesa de seus bens materiais e de seus membros mais frágeis, como
as crianças e as mulheres. Quando falamos da "casa", não estamos nos referindo
simplesmente a um local onde dormimos, comemos ou que usamos para estar abrigado do
vento, do frio ou da chuva. Mas - isto sim - estamos nos referindo a um espaço
profundamente totalizado numa forte moral. A "casa" não se trata somente de um espaço
físico, mas de um lugar moral, um local onde as pessoas se realizam basicamente como
seres humanos que possuem um corpo físico e social, no qual cada morador é único e
insubstituível.
Como espaço moral importante e diferenciado, a casa se exprime numa rede
complexa e fascinante de símbolos que são parte da cosmologia brasileira, isto é, de sua
ordem mais profunda e perene. A casa brasileira é uma área especial na qual todos que
habitam se relacionam por laços de sangue, idade, sexo e vínculos de hospitalidade e
simpatia. A velha e boa ordem é estabelecida e mantida pelas diferenças de sexo, idade e
parentesco. Em certos contextos, podemos instituir a casa como o ideal da própria
sociedade brasileira. FREYRE (1995), quando escreveu Casa - Grande & Senzala, estava
certamente estudando um dos espaços mais significativos da nossa estrutura social, espaços
que reproduziam a própria sociedade brasileira. Assim, a casa demarca um espaço
amoroso onde a harmonia deve reinar sobre a confusão, a competição e a desordem.
Já na rua, há grupos desarticulados de indivíduos e pessoas indiferenciadas e
desconhecidas. Na rua não há, teoricamente, nem amor, nem consideração, nem respeito,
nem amizade. É local perigoso, oceano de maldade e insegurança, espaço de luta pela vida.
Local onde não somos respeitados como pessoa dotada de valores morais e com vontades.
É o espaço cuja crueldade se dá no fato de contrariar frontalmente todas as vontades.
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São diversas as distinções entre o espaço da rua e o da casa, mas "a rua compensa a
casa e a casa equilibra a rua. O que se perde de um lado, ganha-se do outro"
(DAMATTA, 1994). As categorias casa e rua são fundamentais para a ordem e o sentido
da vida doméstica diária. Na casa quem governa é o pai, o irmão, o marido e as redes de
parentesco. Na rua, ao contrário, o comando é dado à autoridade que governa com a lei. No
local da rua, não se deve brincar com quem representa a ordem. Uma discussão na rua
certamente pode degenerar em conflito, em casa pode promover um alto entendimento. O
mundo da casa é aconchegante com uma rede imperativa de relações calorosas, e o espaço
da rua é anônimo e inseguro com leis e polícia. Em geral, a rua é um espaço definido como
perigoso e movimentado seja durante o dia ou a noite.
O visitante Hermann Burmeister descreve as ruas do Rio de Janeiro de 1850:
“encontra-se no Rio de Janeiro muito mais gente de cor, maltrapilha ou seminua, do que
gente branca em trajes convenientes. Nota-se, antes de tudo, a ausência de senhoras bem
vestidas” (1980). Outro viajante, Daniel P. Kidder, que esteve no Rio de Janeiro também
por volta de 1845, afirma no seu relato:
Devido a brandura e o descaso da polícia, grande número de vagabundos
perambulava constantemente pelas ruas pedindo esmolas, indigentes de todas as
espécies faziam ponto em lugares determinados, nas ruas da cidade, onde
saudavam os transeuntes como que num lamento: "Favorece o seu pobre pelo
amor de Deus (KIDDER, 1980).
A autora Graham (1992) destaca o toque de recolhida na cidade do Rio de Janeiro
do século XIX em que o medo das ruas:
Sem fiscalização gerava regulamentos que impunham outras fronteiras,
as temporais... À noite a vida da rua cessava oficialmente, e esperava-se
que as pessoas estivessem em casa. Para marcar aquele momento, os
sinos da igreja de São Francisco e do mosteiro de São Bento tocavam as
ave-marias - às dez horas no verão e às nove no inverno - por meia hora,
"para se recolherem os cidadãos. Depois dessa hora, os que estivessem
"parados na rua sem motivo manifesto, ou dentro de taverna, botequim, e
casa de jogos", ficavam sujeitos à prisão ou a multas. Os escravos
passavam pela rua só com a permissão expressa de seus senhores, e os
cortiços trancavam seus portões para impedir a entrada de escravos
fugitivos e intrusos desordeiros ou, talvez, para reter lá dentro os
próprios inquilinos. ... Ao menos assim era até 1878, quando o chefe de
polícia decidiu que o Rio de Janeiro se tornara cosmopolita e o costume
de tocar os sinos à noite parou. Contudo, o toque de recolher obrigatório
continuou a ser às dez horas (1992).
Apesar dos contrastes entre rua e casa e o consequente equilíbrio que uma
proporciona a outra, conclui-se que as leis formais da vida pública brasileira absorveram
algumas das regras da moralidade costumeira que governam a honra, o respeito e,
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sobretudo, a lealdade que devemos aos amigos, aos parentes e compadres. Verificou-se que
não é possível analisar totalmente a sociedade brasileira se somente nos debruçarmos na
esfera legal, porque esta é uma ordem imposta na esfera pública com algumas
peculiaridades adquiridas pelas relações pessoais. Já na privada, o que domina é a ordem
imposta principalmente pelo chefe da família.
Com a distinção entre "rua" e "casa" feita por DaMatta (1994) pode-se perceber que
em cada universo cultural a mulher pode ser vista de uma forma. Isto ocorre porque o
universo da rua e da casa são mais que espaços físicos demarcados e universalmente
reconhecidos. A rua forma uma espécie de perspectiva pela qual o mundo pode ser lido e
interpretado, oposta à da casa, onde predominam a desconfiança e a insegurança. Assim, se
a mulher é da rua, ela deve ser vista e tratada de um modo. Trata-se das chamadas
mulheres da vida, pois a rua e a vida formam uma equação importante no sistema de
valores brasileiro. Por outro lado, se a mulher é de casa, ou seja, dona - de – casa, deve ser
tratada com mais respeito e proteção.
Freyre (1987) também faz a distinção entre as mulheres da "rua" e da "casa"
quando fala que a moda de a mulher deixar ver as pernas ou a de deixar entrever os seios
encontrou resistências porque os protestos a excessos libertários têm, por vezes, atuado em
defesa da chamada "mulher de família" contra o risco de poder der confundida com a
chamada "mulher de vida fácil".
As "mulheres da casa" são uma espécie de objeto doméstico. Pode-se comparar a
mulher passiva ante o marido como uma espécie de objeto quase religiosamente
ornamental dentro da cultura de que fazia parte, especialmente como esposa e mãe. Essas
"mulheres ornamentais", segundo Freyre (1987), inspiravam uma série de modas de vestir,
calçar, pentear para o embelezamento de suas pessoas aos olhos de pais, maridos e filhos.
Assim, em civilizações patriarcais, as modas de embelezamento das mulheres terem
chegado a requintes artísticos. A arte brasileira da joia é uma produção artística nascida da
inspiração do culto do homem à mulher ornamental. É um exemplo de que alguns
negativos sociais, como a subordinação da mulher ao homem em sociedades patriarcais,
podem corresponder paradoxalmente a positivos. Na concepção de Foucault, o poder
produz positividades. O poder marital, segundo os juristas, é o poder que o marido possui
sobre a mulher, anulando sua vida jurídica e pública. É interessante atentar para a análise
de Foucault dentro desta perspectiva: “o poder produz real, produz domínios de objetos e
rituais de verdade. O poder possui uma eficácia produtiva, uma riqueza estratégica, uma
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positividade. Tem como alvo o corpo humano, não para supliciá-lo, mas para aprimorá-lo
e adestrá-lo” (1979).
Pode-se dizer que o poder marital tem a sua positividade, que é a construção da
identidade do homem, da mulher e da própria família em geral. No livro Modos de homem
e modos de mulher, de Freyre, é possível visualizar bem como o poder marital intervém no
corpo tanto dos homens quanto das mulheres e constrói o modo do homem e a moda da
mulher de se vestir, andar, falar, pensar. Nesse material, Gilberto Freyre menciona que:
A mulher, no criativo Brasil patriarcal, foi, evidentemente, uma vítima
do quase absoluto domínio sobre ela, da vontade, a princípio do pai, em
seguida do esposo: sobre ela e sobre os filhos. Mas, em compensação
foi, principalmente quando sinhá ou sinhazinha, mimada, cortejada,
valorizada esteticamente, pelo seu dominador, daí resultando modas de
mulher, da era patriarcal, que concorreram para valorizar a cultura
brasileira em setores estéticos nada desprezíveis, como os que se
afirmaram em artes muito brasileiras como a das joias, a das rendas, a
dos leques, ligadas a valorizações das figuras femininas (1987).
Numa sociedade ou dentro de uma cultura, as modas de mulher, ou para mulheres,
não vêm sendo inspiradas por um tipo exclusivo de mulher: o senhoril ou o dominante
como expressão, em sociedades recentes da alta burguesia. Os tipos não-senhoris de
mulher têm sido inspirações nada insignificantes de modas de mulher. Lembrem-se, com
relação ao Brasil, inspirações saídas de mulheres chamadas do povo: de suas rendas mais
populares, de suas sandálias, de seus tamancos, de seus adornos. Alguns desses adornos, de
origem indígena ou africana. Em tempos patriarcais, houve reciprocidade entre os
ornamentos de sinhás ou de sinhazinhas com os de mucamas.
No setor de modas tradicionalmente brasileiras de mulher, Freyre (1987) acrescenta
a moda de adornos de Nossa Senhora e de santas que passaram a ser adaptados a mulheres
comuns, ou que, de mulheres comuns, foram transferidos ao status de adorno de santas .
Isso ocorria devido à "mulher de família" ter a obrigação de possuir uma conduta
praticamente igualada a de uma santa. A casa e a rua eram espaços de onde se pode julgar,
classificar, medir, avaliar e decidir sobre ações, pessoas, relações e moralidades de forma
distintas, dependendo da localização do observado e do observador.
II
O século XIX, e particularmente o Segundo Reinado, é uma época de muitas
transformações e contrastes, quer pela transição entre Brasil Colonial Agrário e um Brasil
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Republicano a caminho da industrialização, quer pela passagem da sociedade escravocrata
à baseada no trabalho livre. A família, morada ou lar significa agrupamento de pessoas
mutuamente dependentes e co-residentes, algumas em razão da relação de parentesco,
outras de subordinação ou de simples dependência. Todos sob o poder, o comando ou a
proteção de um chefe. O lar brasileiro do século XIX era conduzido pelo chefe
normalmente representado por um homem. Cada membro tinha sua posição social bem
demarcada dentro do seio familiar. As roupas e ornamentos que usavam demonstravam
muito bem a posição de cada um. A família era a unidade básica da vida social, talvez
continue sendo.
O lar se situava num contexto histórico em que o chefe da família possuía
autoridade e responsabilidade sobre todos os outros membros. Não só privilégios, o chefe
também possuía inúmeros deveres na posição de dominador.. Ele deveria zelar pela boa
fama de sua família. O marido e pai, investido como o chefe indispensável da família, o
cabeça do casal, devia administrar a propriedade da família, tinha o direito de castigar
fisicamente todos os seus subordinados, devia guardar a honra das mulheres do seu lar,
entre outras obrigações. E, além disso, nãopoderia recusar o exercício dos poderes que o
costume e a lei lhe haviam conferido.
A manutenção da ordem no lar dependia de cada membro prestar obediência
apropriada a seu lugar, fosse como esposa, ou como filhos, fosse como agregados ou
escravos. O ideal de família na época presumia um lar patriarcal, extenso e fundado no
casamento estabelecido legalmente. Assim, a família e o casamento desempenhavam o
papel de pedra angular para todo o edifício social, escorado pelas instituições
mantenedoras da lei civil e canônica. O status legal e moral era concedido exclusivamente
aos casamentos celebrados por padre católico e reunidos os requisitos da lei secular. As
questões relativas ao patrimônio conjugal e herança eram resolvidas por meio da lei na
qual o Estado retinha a autoridade. As regras do casamento cerceavam necessária e
particularmente as mulheres. O casamento preservava não só a propriedade, mas também a
virtude. A virgindade da mulher também implicava uma qualificação moral para o
casamento. As mulheres casadas permaneciam, na sua grande maioria, sob a autoridade do
seu marido.
Deve-se ressaltar que a mulher, em seu campo específico, a direção da casa, deveria
possuir liderança sobre os empregados, os afazeres domésticos etc. Assim, a dominação do
marido não seria absoluta desde que ela se mantivesse atribuída com os compromissos
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domésticos. Apesar da grande maioria das mulheres estarem num estado de extrema
acomodação e passividade, também se encontravam no Brasil mulheres descontentes com
tal situação.
1
É importante deixar claro que a subordinação da mulher brasileira ao
homem, admitida por alguns estudiosos como absoluta e universal em nosso passado
histórico, admitiu reações femininas. Mesmo que em número pequeno, as mulheres que se
manifestaram romperam o estatuto de um comportamento absolutamente passivo.
Tanto as ideias mais conservadoras, que limitavam o papel feminino apenas ao lar,
como a admissão de uma posição mais independente para o sexo feminino tiveram
aceitação por homens e mulheres. Além de uma simples rivalidade entre sexos, havia uma
questão de mentalidade diante de mudanças sociais, no caso, aquelas que se operavam,
sobretudo na cidade do Rio de Janeiro do século XIX a receber influências marcantes do
mundo europeu. Tais influências
contrastavam com o patriarcalismo e personalismo
brasileiro, fixados entre nós por uma tradição de origens seculares.
Facções são constituídas na vida pública brasileira à semelhança das famílias de
estilo patriarcal, em que os vínculos biológicos e afins preponderavam sobre as demais
considerações. Formam um todo indivisível, cujos membros se acham associados por
sentimentos e deveres, nunca por interesses e ideias. O grupo familiar mantém-se imune a
qualquer restrição ou abalo. Apresenta-se sempre imerso em si mesmo, não tolerando
nenhuma pressão de fora. A família colonial fornecia a ideia mais normal do poder, da
respeitabilidade, da obediência e da coesão entre os homens. A consequência era a
predominância dos sentimentos próprios do mundo doméstico na vida social - pública.
Predominava um intenso paternalismo. As instituições eram baseadas em princípios
longamente consagrados pelo costume e pela opinião. Como toda estrutura da sociedade
colonial teve sua base fora dos meios urbanos. No Brasil, instaura-se uma civilização de
raízes rurais.
Durante os séculos iniciais da ocupação europeia, a vida da colônia se concentra em
propriedades rústicas, as cidades acabam sendo virtualmente dependentes das propriedades
rurais. A improvisação quase forçada de uma espécie de burguesia urbana resulta em
atitudes peculiares do patriarcado rural se tornando comuns a todas as classes como norma
ideal de conduta. Segundo Holanda (1971), a mentalidade de casa-grande, ou seja, os
longos anos de vida rural invadiram as cidades .
1
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Nas obras de Freyre, o papel feminino é destacado através dos inúmeros tipos de
mulheres que conviviam no Brasil, desde a escrava negra ou mulata à sinhazinha, todas
aparecem como objeto sexual do homem, colonizador e proprietário. Em Sobrados e
mucambos (1961), a o autor mostra a passagem do patriarcado rural brasileiro em
decadência para um processo de urbanização. Apesar de novas instituições em torno da
casa-grande, o tipo comum de mulher, durante o império, aparece apenas voltada aos
interesses domésticos. O homem é o englobador do mundo da rua, do mercado, do
trabalho, da política e das leis, ao passo que a mulher é associada ao mundo da casa e da
família.
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* A autora é bacharel em Direito pela UNIGRANRIO e Ciências Sociais pela UFF,
especialista em Sociologia Urbana pelo IFCH–UERJ e mestra em Sociologia Jurídica pela
UFF. Leciona Sociologia no Ensino Médio da Rede Estadual de Educação – RJ. Leciona as
disciplinas Fundamentos das Ciências Sociais e Sociologia Jurídica no Curso de Direito
UNESA no Campus Cabo Frio, de onde é Coordenadora de Atividades Complementares,
além de pertencer ao NPCJS.
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