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A questão da pluralidade metodológica e a interdependência das ciências sociais
Aluizio Alves Filho *
Resumo: O artigo analisa os aspectos metodológico e teórico como elementos centrais da
problemática que corta as ciências sociais, destacando o enfoque weberiano ao ponderar que as
ciências sociais, ao contrário das naturais cujo fim é a explicação, têm na compreensão a construção
da interpretação a partir de diversos fios cognitivos. Ressalta-se, ainda, que o campo de
investigação das ciências sociais não se exaure por conta da inesgotabilidade dos seus fenômenos.
Palavras-chave: Sociologia – Weber – approaches – ciências – metodologia.
Na medida em que a chamada revolução industrial, iniciada na Inglaterra em
meados do século XVIII, se processa e se expande, não apenas transforma as relações
sociais, mas também, necessariamente, as formas usuais de entender a sociedade. Ao longo
do século XIX a industrialização foi tornando inteiramente obsoletas as antigas técnicas
produtivas e as relações de produção existentes. O trabalho servil foi dando lugar ao
assalariado, a nobreza aos donos do capital, as monarquias absolutas aos governos
constitucionais, os sistemas aristocráticos foram cedendo espaço aos ideais democráticos,
as cidades cresceram e as antigas colônias europeias no Novo Mundo conquistaram a
independência, aboliram o trabalho escravo e organizaram-se como países soberanos. No
bojo desse complexo processo de mudanças estruturais, velhas concepções sobre o homem,
o Estado e a sociedade foram sendo substituídas por um conjunto de novas concepções
como o positivismo, o empirismo, o racionalismo, o evolucionismo e a dialética que de
distintas formas alicerçaram e permitiram a irrupção das modernas ciências sociais.
Duas grandes vigas mestras surgidas na antiguidade, cujos princípios atravessaram o
tempo, sendo modificadas por vários approaches, também funcionaram como pontes
fundamentais para que ocorresse o parto de diversas ciências sociais. Essas vigas mestras
foram: o Direito Romano, onde surgiram as primeiras instituições jurídicas como a Lei das
XII Tábuas, e a Filosofia, cuja elaboração inicial como sistema estruturado de ideais
ocorreu na Grécia Clássica a partir do século VI a.C, tendo em Platão e Aristóteles os seus
principais expoentes. Importante também ter em mente que as ciências sociais nasceram no
século XIX, quando diversas ciências naturais que se constituíram em épocas anteriores já
haviam atingido considerável grau de sistematização e maturidade e, por tal razão,
condicionaram não apenas a metodologia das ciências nascentes, mas também sua
terminologia. Nesse caso, a utilização ainda contemporânea de conceitos como função
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social, organismo social, célula social e corpo social são exemplos expressivos de
terminologia importada pelas ciências sociais de uma ciência natural: a biologia. Algo de
similar pode-se dizer do conceito de tensão social, que surgiu no campo da física e encontra
largo uso nas ciências sociais. Quanto à metodologia há presença de enfoques organicistas,
evolucionistas e estruturalistas, conceitos urdidos no campo do estudo da natureza, também
são presenças constantes nas hipóteses metodológicas que atravessam com diferente peso e
grau de influência o conjunto de ciências que tem por propósito lançar luzes sobre os
fenômenos sociais.
Diferente do que ocorre no campo das ciências naturais onde existe elevado grau de
consenso entre seus cultores, tanto quanto a teorias e métodos usuais na pesquisa quanto ao
objeto de estudo e aos objetivos a serem alcançados, nas ciências sociais tal consenso está
longe de reinar. O sociólogo alemão Max Weber (1998) nos fornece uma boa pista para nos
situarmos nesta questão, ao observar que a metodologia das ciências naturais é explicativa e
a das ciências sociais interpretativa – compreensiva. Para Weber, a natureza pode ser
explicada, a sociedade não, sendo a recíproca verdadeira. A título de ilustração citamos a
conhecida lei da gravitação universal descoberta e formulada por Isaac Newton: “matéria
atrai matéria na razão direta das massas e na inversa do quadrado de sua distância”. E
assim como não é possível compreender porque a natureza acontece de tal forma e não de
outra, tendo, portanto, as leis descobertas pelos cientistas que a investigam valor universal,
pois não sofrem variações em função de valores éticos, políticos, econômicos ou de
qualquer outra razão subjetiva. Seria inútil aos cientistas sociais tentar encontrar leis
universais para os fenômenos que estudam, pois estes variam profundamente em
decorrência de um conjunto complexo de especificidades histórias, ideológicas e culturais.
Além do weberiano há outros enfoques que visam trazer luzes para as razões do
pluralismo metodológico nas ciências sociais, entre estes, tendo por referência a sociologia,
destacamos o seguinte:
No mundo inteiro, as pessoas que começam a aprender física ou outra das
ciências naturais, estarão aprendendo praticamente as mesmas espécies de
coisas. O mesmo conjunto de proposições básicas serão aprendidas no
Japão e na Rússia, na China e no Peru. Mais essa verdade não se aplica à
sociologia. O estudante na Rússia não principiará com as mesmas
proposições sobre as sociedades, e sobre a relação dos homens com ela
que o estudante dos Estados Unidos. O estudante inglês e o iugoslavo não
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estarão aprendendo os mesmos tipos de proposições para iniciar seus
estudos. Mais do que isso, mesmo dentro de um país, a abordagem que
um estudante verifica lhe estarem ensinando varia, num grau considerável,
segundo as opiniões particulares de seus professores ou do seu
departamento (COULSON e RIDDELLl, 1972, p. 11).
Compreendida como fenômeno empírico, a realidade social é o objeto de estudo de
todas as ciências sociais, mas como tal realidade pode ser entendida de forma
multifacetada, cada ciência social volta suas atenções para uma peculiaridade do social, ou
seja, para um conjunto determinado de fatos, faz destes seu objeto de estudo. Dessa forma,
o direito volta as suas atenções para o fato jurídico, a sociologia para o fato social,1 a
economia para o fato econômico e o mesmo deve ser considerado em relação a qualquer
uma das demais ciências sociais.
Independente da opção metodológica, da orientação epistemológica, ou dos
objetivos imediatos do pesquisador, nenhuma ciência social é capaz de açambarcar toda a
complexidade dos fenômenos sociais, não apenas porque a realidade empírica é
inesgotável, mas também porque tais fenômenos são ao mesmo tempo fatos econômicos,
sociais, políticos, jurídicos, psicológicos, antropológicos, culturais e possuem ainda outras
facetas. Decorre daí o princípio da interdependência entre todas as ciências sociais. Para
termos entendimento que nos aproxime o máximo possível da complexidade que possuem
os fenômenos sociais, torna-se mais que necessário, diremos, imprescindível que os
teóricos de qualquer área das ciências sociais lancem mão de conhecimentos provenientes
de outras ciências do mesmo campo do saber que não especificamente ao que se dedicam.
Referências Bibliográficas:
COUSON, Margaret A. e RIDDELL. Introdução crítica à sociologia. Rio de Janeiro:
Zahar, 1972. Tradução de Edmond Jorge.
WEBER, Max. Economia e sociedade. Vol. I. Brasília: UnB, 1998. Tradução de Regis
Barbosa e Karen Elsabe Barbosa.
* O autor é literato e Doutor em Sociologia pela UnB. Atualmente é Professor do
Departamento de Comunicação Social da PUC – RJ. [email protected]
1
No caso da sociologia não há consenso nem sobre qual seja o seu objeto de estudo, por exemplo, para Emile
Durkheim o objeto de estudo da sociologia é o fato social, para Max Weber é a ação social. E entre as duas
construções há substantivas diferenças, havendo ainda outros pontos de vista epistêmicos sobre o assunto.
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