O Trabalho de Família de Origem
Autora: Vânia Bastos Fonseca de Castilho
CEFAC 1994
A vida da Família de origem é uma experiência poderosa para todas as pessoas e seu
impacto não fica restrito à infância. A maneira como nos vemos, vemos os outros e o
mundo è moldada neste cenário e a visão de mundo que desenvolvemos fica conosco
por toda vida.
De um modo geral, nos separamos de nossas famílias de origem fisicamente, porém
temos uma enorme dificuldade em nos separarmos emocionalmente. Mesmo que
coloquemos uma montanha entre nós e a mesma e nunca voltemos para casa de
novo, continuaremos a atuar as dinâmicas da nossa família na nova família que
formamos. Uma das coisas mais difíceis é conquistar a separação emocional deste
ambiente poderoso e não repeti-lo ou reagir contra ele.
Ninguém escolhe se deseja ou não lidar com a própria família. Mesmo escolhendo
não lidar, isto é uma forma de lidar com ela. Ninguém pode se tornar livre das
primeiras experiências negando seu significado ou ignorando-as, pois as mesmas
estão destinadas a serem repetidas na vida atual com características diferentes e em
contextos diferentes.
Uma das formas de mudar a própria experiência e consequentemente as experiências
com os relacionamentos atuais è através do Trabalho de Família de Origem. Somente
entendendo o passado num contexto apropriado é que as experiências de vida atuais
e futuras de uma pessoa poderão ser mais positivas tornando-a mais responsável pela
própria vida, menos derrotado por eventos indesejáveis e mais capaz de criar para si
mesma a forma de vida que deseja ter.
Uma das principais metas do Trabalho de Família de Origem é adquirir a capacidade
de identificar e legitimar as próprias metas e ao mesmo tempo manter os
relacionamentos íntimos com os outros. Isto significa a busca da diferenciação (o
mesmo que definição do “self” ou individuação).
Uma pessoa bem diferenciada é capaz de ser ela própria, fazer e dizer o que deseja e
pensa sem sentir-se preocupada se os outros continuarão gostando dela ou a
criticarão. É poder ser transparente sobre si mesma, aceitar as diferenças dos outros
e ao mesmo tempo ser aberta a possibilidades de mudança e capaz de repensar as
próprias posições.
Alguns atributos são necessários para um bom êxito no Trabalho de Família de
Origem.
1. Motivação e Pesquisa – O fator tempo e o interesse são requisitos
necessários, bem como a busca de informações sobre fatos e acontecimentos
através de familiares, mesmo os mais distantes ou tidos como “incapazes”.
2. Descobrir e trabalhar as Próprias Metas – É poder ter clareza sobre os
próprios valores, crenças e desejos e poder expressa-los mesmo sendo
diferentes do senso comum. Ou seja, ser capaz de escolher como deseja ser e
não ser controlado pela aprovação e desaprovação dos outros para ter um
senso de autoestima e valorização.
3. Fazer Distinção entre Pensamento e Sentimento – Uma pessoa bem
diferenciada considera os prós e os contras entre várias escolhas e é capaz de
tomar decisões. Não insiste que os outros vivam suas crenças e não se torna
defensiva ou agressiva com pessoas que têm diferentes crenças.
Ser diferenciado não significa perder contato com os próprios sentimentos.
Significa experienciar e expressar sentimentos quando necessário e usa-los
como fonte de informação.
4. Tornar-se melhor Observador e Controlar as Próprias Reações – Estes dois
aspectos são interligados: o esforço de tornar-se um melhor observador e
aprender mais sobre a família reduz a reação emocional e isto por sua vez
ajuda a tornar-se um melhor observador. Qualquer progresso ajuda uma
pessoa a começar a ficar um pouco “de fora” do Sistema Emocional Familiar
e ajuda-a a ter uma visão diferente deste sistema. Isto capacita o observador
a ficar acima da raiva e da tendência a culpabilizar.
A família só tem a ganhar quando um dos membros é capaz de relacionar – se
mais livremente sem tomar partido e sem tornar-se emaranhado no seu
sistema emocional.
5. Destriangular-se – A função da triangulação é diminuir a ansiedade, porém,
na maioria das vezes, os triângulos aumentam ao invés de diminuírem os
problemas.
A destriangulação é uma necessidade absoluta, se a diferenciação do “self” é a
meta. Significa ver os triângulos em que foi inserido enquanto crescia e poder
ser diferente em relação aos mesmos. O processos de destriangulação tem
como principal meta o poder estar constantemente em contato com o
problema emocional que envolve duas outras pessoas e si próprio sem
tomar partido, sem contra atacar ou defender-se, tendo sempre uma
resposta neutra.
Uma parte do processo é conseguida, quando o indivíduo está no seio da
família, durante uma situação que envolve um problema emocional e torna-se
mais objetivo e menos reativo que os outros. A família percebe quando isto
acontece. A formação de triângulos ocorre porque é difícil para duas pessoas
manterem um relacionamento tete à tete e se focarem em si mesmos. Quanto
menos diferenciados são, menos capazes de agir de uma forma neutra e mais
vulneráveis se tornam à formação de triângulos.
O oposto da diferenciação é a fusão, ou seja, estar paralisado num
relacionamento simbiótico e parasitário. Quanto mais fusionada a família é,
maior o número de temas que deixarão seus membros chateados. Estes temas
são evitados em busca de uma pseudo - igualdade.
A pressão para a igualdade leva à ansiedade sobre as diferenças e
consequentemente à tentativa de que o outro mude. Nenhuma pessoa pode
ter um relacionamento intenso sem descobrir diferenças significativas entre
as partes. O que cria problemas é a maneira como se lida com as diferenças.
Geralmente, aqueles que são pressionados a mudar reagem de quatro
maneiras diferentes : cedendo, rebelando, atacando ou desertando.
6. O Condescendente
Faz de conta que não existe diferenças. Isto é mais comum em famílias que
querem mostrar uma aparência de união para o mundo. Evitam conflitos
porque estes enfatizam diferenças. Pensam que as necessidades de
diferenciação são erradas e destrutivas para o relacionamento e preferem
ignora-las. Encontram outras formas de serem assertivos: um sintoma, uma
dor de cabeça para evitar sexo, por exemplo. Qualquer que seja a forma, a
necessidade básica é “paz a qualquer preço”.
O condescendentes tem um verdadeiro talento para criar culpa nos outros e
geralmente sabe usar bem disto.
7. O Rebelde
O rebelde aparenta desejar distância e independência, mas como uma
independência real é muito ameaçadora , eles permanecem próximos e
agem como rebelde. O rebelde não se sente seguro com as diferenças. Ele
está tão envolvido em se rebelar, em não fazer e não ser o que os outros
querem que nunca decide o que realmente quer. Não é capaz de ter metas
próprias, pois está por demais ocupado em ser contra os outros. Para o
rebelde, independência significa fazer o oposto do que os outros querem.
A maioria deles escolhe um parceiro que tem facilidade de ser autoritário.
Geralmente são os segundos filhos do mesmo sexo e na família de origem
gastam um bom tempo definindo-se como diferentes ao irmão mais velho e
lutando pela aceitação.
8. O Atacante
Lida com suas ansiedades sobre diferenças culpando os outros por tudo.
Acham que os outros são a causa de suas frustações e expressam isso. Num
relacionamento onde ambos atacam, os a taques e contra-ataques são
contínuos porque cada um tenta demostrar superioridade ou igualdade. As
pessoas envolvidas neste tipo de conflito geralmente pensam que o outro tem
que mudar antes que ele mude. Ficam presos num círculos de hostilidade
onde o comportamento de um justifica o do outro. O que está por trás deste
comportamento é auto- estima muito baixa .
São pessoas muito sensíveis e críticas.
9. O Desertor
Para algumas pessoas a única forma de lidar com qualquer tipo de demanda é
o abandono ou retraimento. Retraem-se fisicamente e emocionalmente
quando a tensão é muito alta. Aqueles que desertam, geralmente o fazem
porque se sentem impotentes e fracos. Acham que o outro tem todo o poder.
Frequentemente parecem ser muito independentes, mas como os rebeldes, é
apenas fachada. Sua independência depende da manutenção da distância
emocional. Não podem ficar mais próximo sem experimentarem uma enorme
ansiedade.
Quando as diferenças entre as pessoas numa família tornam-se muito
ameaçadoras, um ou mais de um membro da família demanda igualmente. A
menos que se desenvolva um forte “senso de self” a resposta habitual é reagir
de uma das quatro maneiras descritas. Em contraste, uma família “saudável”
pode tolerar muitas diferenças entre seus membros. Sua crenças é de que as
diferenças são interessantes e positivas e usam –nas como mútua estimulação
e crescimento ao invés de temê-las.
Bibliografia
Bowen, M. (s.d.). Family Therapy in Clinical Pratice.Editora Jason Aronson Inc.
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