CONDIÇÕES SOCIOECONÔMICAS E A INSEGURANÇA ALIMENTAR EM
NUTRIZES ATENDIDAS NA ATENÇÃO PRIMÁRIA 1
SILVA, Karla de Souza Maldonado da2; FONTOURA, Ethiene da Silva3;
BLÜMKE, Adriane Cervi4; MATTOS, Karen Mello de5.
1
Trabalho de Pesquisa _UNIFRA
Curso de Nutrição do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA), Santa Maria, RS, Brasil
3
Curso de Nutrição do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA), Santa Maria, RS, Brasil
4
Curso de Nutrição do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA), Santa Maria, RS, Brasil
5
Nutricionista, Especialista e Mestre em Saúde Coletiva, Docente do Curso de Nutrição e Membro do
Grupo Interdisciplinar em Pesquisa (GIPES) do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA) Santa
Maria, RS, Brasil Curso de Nutrição do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA)
E-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected];
[email protected].
2
RESUMO
A insegurança alimentar está associada ao acesso a uma alimentação adequada que é
interferida pelas condições socioeconômicas. As nutrizes são um grupo de risco para enfrentarem
essas situações. O objetivo desta pesquisa é delinear o nível de insegurança alimentar relacionando
com o perfil socioeconômico, escolaridade e estado civil. Foram entrevistadas 38 nutrizes de 10
Unidades Básicas de Saúde. A segurança alimentar foi prevalente porém, a medida que a classe
diminuiu a insegurança alimentar aumentou. A relação com a escolaridade também demostrou um
aumento a medida de que as nutrizes se mostravam menos instruídas. A associação com o estado
civil mostrou que as gestantes que não residem com seus companheiros apresentam maior índice de
insegurança alimentar. Essa pesquisa
contribuiu para a identificação de grupos em risco de
insegurança alimentar, mostrando a necessidade da formulação de políticas públicas com objetivos
claros para sanar esses problemas.
Palavras-chave: Segurança alimentar e nutricional; Nível socioeconômico; Nutrizes.
1. INTRODUÇÃO
A insegurança alimentar é determinada, principalmente, pela pobreza e pelas
desigualdades sociais, sendo que está associada ao acesso a uma alimentação adequada
que pode ser interferida pelas condições socioeconômicas (SALLES-COSTA; et al, 2008). A
escassez de alimentos gera desconforto físico e psicológico (HABICHT; et al, 2007).
A produção de leite materno exige uma quantidade de nutriente equivalente ao custo
energético total da gestação. Sendo assim, grupos de risco como as nutrizes estão mais
suscetíveis a enfrentarem situações que ocasionam insegurança alimentar, seja pela
quantidade de alimentos consumidos quanto pela restrição em relação à qualidade (HOSOI;
ABREU, 2006).
Estudos que analisam fatores associados à insegurança alimentar possibilitam o
planejamento de programas e políticas públicas de caráter preventivo e promoção da saúde
1
para nutrizes (SALLES-COSTA; et al, 2008)
Tendo em vista a magnitude da amamentação para a saúde materno-infantil, o
desenvolvimento da presente pesquisa, visa contribuir para o delineamento socioeconômico
destas nutrizes e consequente presença da insegurança alimentar e a sua relação com o
nível socioeconômico, e escolaridade materna e e seu estado civil.
2. DESENVOLVIMENTO
O leite materno deve ser o primeiro alimento oferecido ao recém-nascido, pois além
de outras vantagens, ele apresenta benefícios nutricionais para a saúde da criança o que
reduz a mortalidade e morbidade por doenças infecciosas e é um fator protetor para a saúde
da nutriz (BARROS; et al, 2009).
Aspectos socioeconômicos, estado civil, renda e estado nutricional da mãe são
alguns dos fatores que podem influenciar a prática e a duração da amamentação (SALIBA;
et al, 2008). Para que a amamentação possa ser desenvolvida com qualidade, sem
apresentar riscos nutricionais à mãe e ao bebê, o acesso à alimentação adequada é de
suma importância.
O acesso à alimentação é um direito básico e primordial aos seres humanos, sendo
este um direito assegurado pela segurança alimentar que consiste no acesso por meios
socialmente aceitáveis à uma dieta qualitativa e quantitativamente adequada às
necessidades humanas individuais (MARÍN-LEON; et al, 2005; CORRÊA, et al., 2003).
Entretanto, grupos populacionais com baixo poder aquisitivo ou que encontram-se
em grande modificação fisiológica que podem ocasionar vulnerabilidade, como por exemplo
as nutrizes, podem ser afetadas pela insegurança alimentar. A insegurança alimentar
engloba diversos fatores como: a preocupação em virtude do acesso a comida, o fato de
passar fome, a perda da qualidade nutritiva da dieta, a redução da diversidade alimentar e
da quantidade de alimentos (CORRÊA; et al., 2003), a incerteza sobre o abastecimento de
alimentos e as experiências de fome (GULLIFORD; MAHABIR; ROCKE, 2003), e pode
produzir deterioração do nível de bem-estar de pessoas, famílias ou comunidades, conforme
a exposição a determinados tipos de riscos (PEREIRA; et al, 2006).
3. METODOLOGIA
A presente pesquisa trata-se de um estudo com delineamento transversal realizado
em todas as Unidades Básicas de Saúde (UBS) do município de Santa Maria/RS que
possuem atendimento pediátrico e/ou ginecológico. O número total de UBS são 10 e estão
divididas em todas as áreas da cidade.
2
A amostra foi constituída por nutrizes atendidas nas UBS. Foram excluídas as
nutrizes que possuíam filhos maiores de 12 meses de vida. A coleta de dados aconteceu no
período de maio de 2012 a agosto de 2012 onde foram aplicados três instrumentos. O
primeiro foi um questionário, elaborado pelas próprias pesquisadoras, contendo os
seguintes dados: iniciais do nome; endereço; telefone; renda familiar em salários mínimos;
gêneros alimentícios mais adquiridos e custo mensal com sua aquisição; custo mensal com
medicamentos.
O segundo e terceiro instrumentos utilizados são validados e consistem na Escala
Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) que consiste em um questionário estruturado e
por meio de um somatório de pontos possibilita a classificação da insegurança alimentar em:
segurança alimentar, insegurança alimentar leve, insegurança alimentar moderada ou
insegurança alimentar grave (SAMPAIO, et al; 2006) e o Critério de Classificação
Econômica do Brasil (CCEB) da ANEP (2008), sendo este validado e permite classificar a
população em classes econômicas. Cada instrumento foi aplicado de forma individualizada
por meio de entrevista.
Os dados foram armazenados em uma planilha elaborada pela própria pesquisadora,
para posterior análise estatística descritiva (média e desvio padrão para variáveis contínua e
percentual para variáveis categóricas) dos resultados.
Todas as nutrizes que atenderam ao critério de seleção e que aceitaram participar
desta pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) após
explicações detalhadas sobre o objetivo do estudo e os procedimentos utilizados. Cabe
salientar que as nutrizes participantes assinarão em duas vias de igual valor, sendo uma
encaminhada a participante e a outra com a pesquisadora.
Este estudo foi aprovado pelo Núcleo de Educação Permanente em Saúde (NEPES)
da Secretaria de Município da Saúde de Santa Maria/RS, pelas Unidades de Saúde e pelo
Comitê de Ética e Pesquisa do Centro Universitário Franciscano – UNIFRA, sob registro
número 072.2011.2 e compõe a linha Educação, sociedade e integralidade na saúde do
Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em Saúde (GIPES) e do Centro Universitário Franciscano
(UNIFRA).
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Participaram da pesquisa 38 nutrizes com idade de 14 a 42 anos, com média de
idade de 25,6 anos que buscaram atendimento nas Unidades Básicas de Santa Maria/RS no
período de maio a julho de 2012.
A aplicação da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) revelou que 68,4%
3
(n=26) das nutrizes entrevistadas não sofriam com a insegurança alimentar, 26,3% (n=10)
sofriam com a insegurança alimentar leve e 2,6% (n=1) com a insegurança alimentar
moderada, revelando que mais da metade das nutrizes estavam na faixa de segurança
alimentar, sendo que nenhuma nutriz se mostrou na faixa de insegurança alimentar grave.
No estudo de SALLES-COSTA; et al (2008) mais da metade das famílias sofriam com
insegurança alimentar em diferentes níveis, o que se observa o contrário nesta pesquisa
pois a maioria das nutrizes se encontram na faixa de segurança alimentar.
Considerando a classificação da escala socioeconômica da ABEP (2008) 36,8%
(n=14) das nutrizes foram classificadas na classe B2, 28,9% (n=11) foram classificadas na
classe C1, 15,7% (n=6) foram classificadas na classe C2, 10,5% (n=4) na classe D, 5,2
(n=2) na classe E e 2,6% (n=1) não souberam responder ao questionário de classificação
econômica. SALLES-COSTA; et al (2008) observaram que a maioria das famílias (56%) se
encontravam entre a classe C e D, ocorrendo o mesmo neste estudo, onde 55,1% das
nutrizes entrevistadas se encontraram nas classes C e D.
As nutrizes com grau de escolaridade < 8 anos totalizou 44,7% (n=17) e com grau de
escolaridade ≥ 8 anos totalizou 55,2% (n=21). No estudo de SALLES-COSTA; et al (2008), o
índice de escolaridade < 8 anos dos chefes de família chegou a 58,5%, entre aqueles que
não completaram o ensino fundamental e os analfabetos.
A maior vulnerabilidade das famílias com menor grau de escolaridade pode estar
associada ao menor acesso destes grupos a uma rede de suporte familiar e social, bem
como a outros fatores facilitadores para a manutenção desta prática, como por exemplo, o
acesso a serviços de atenção à saúde e à inserção formal no mercado de trabalho
(DAMIÃO, 2008).
As nutrizes que moravam com seus companheiros representaram 84,2% (n=32) do
total e as que não moravam com seu companheiro representavam 15,7% (n=6). Já em um
estudo realizado por FRAGOSO; FORTES (2011) foram observados que o índice de
mulheres que viviam com seus companheiros foi de 76,5% e as que não viviam com seus
companheiros era de 23,5%. A presença dos companheiros além de fornecer uma
segurança financeira para as nutrizes (SALLES-COSTA; et al, 2008), incentiva a prática do
aleitamento materno diminuindo o índice de insegurança alimentar inclusive para os seus
bebês (FRAGOSO; FORTES, 2011) (Tabela 1).
4
Tabela 1. Caracterização da nutrizes investigadas quanto à situação de insegurança alimentar, nível
socioeconômico, escolaridade e estado civil.
Características das
n
%
nutrizes
Situação de insegurança alimentar (EBIA)
Segurança alimentar
26
Insegurança alimentar leve
10
Insegurança alimentar
1
moderada
Nível socioeconômico (ABEP)
B2
C1
C2
D
E
Não soube responder
Nível de escolaridade da nutriz
<8 anos de escolaridade
≥8 anos de escolaridade
Estado civil da nutriz
Mora com o companheiro
Não mora com o
68,4
26,3
2,6
14
11
6
4
2
1
36,8
28,9
15,7
10,5
5,2
2,6
17
21
44,7
55,2
32
6
84,2
15,7
companheiro
Dentre as nutrizes que foram entrevistadas e classificadas na classe socioeconômica
E, todas apresentaram insegurança alimentar leve, enquanto que a classe C 2,6% (n=1)
relatou insegurança alimentar moderada. À medida que a classe aumentou a segurança
alimentar também aumentou, chegando a 31,5% (n=12) entre as que foram classificadas na
classe B2.
Por outro lado a insegurança alimentar leve se manteve igual em todas as classes
socioeconômicas. Isso indica que a classe econômica é um fator determinante na condição
socioeconômica das nutrizes visto que uma alimentação adequada está relacionada com o
nível de pobreza e acesso aos alimentos. (Tabela 2).
5
Tabela 2. Situação de segurança alimentar classificada segundo a Escala Brasileira de Segurança
Alimentar (EBIA) relacionada com a classificação socioeconômica de nutrizes atendidas nas
Unidades Básicas de Santa Maria – RS.
Segurança
Categorias de segurança alimentar
Segurança
Segurança
alimentar
Variáveis
n
alimentar leve
%
n
%
alimentar
moderada
n
%
ABEP
B2
12
31,5
2
5,2
0
C1
8
21
2
5,2
1
C2
4
10,5
2
5,2
0
D
2
5,2
2
5,2
0
E
0
0
2
5,2
0
Total
26
68,4
10
26,3
1
*Uma nutriz não soube responder ao questionário socioeconômico.
total
0
2,6
0
0
0
2,6
14
11
6
4
2
37*
A relação da escolaridade da nutriz e a percepção de segurança alimentar conforme
mostra a tabela 3, foi mais evidente para o nível de insegurança alimentar moderada com
prevalência de 2,6% (n=1), onde o nível de escolaridade da nutriz chegou a < 8 anos de
estudo, o que não foi observado nas nutrizes com nível de escolaridade de ≥ 8 anos de
estudo.
Foi observado que quanto maior o nível de escolaridade maior foi a segurança
alimentar,
em
contrapartida
a
insegurança
alimentar
leve
se
manteve
igual
independentemente do nível de escolaridade das nutrizes avaliadas. A escolaridade da
nutriz relacionou-se à insegurança alimentar. Observou-se que a prevalência de segurança
alimentar foi crescente conforme aumentou o grau de escolaridade. Em contrapartida a
proporção de nutrizes com insegurança alimentar moderada reduziu-se com o incremento
da escolaridade da nutriz, embora a situação de insegurança alimentar leve não variou de
acordo com a escolaridade da nutriz.
6
Tabela 3. Situação de segurança alimentar classificada segundo a Escala Brasileira de Segurança
Alimentar (EBIA) relacionada com o nível de escolaridade de nutrizes atendidas nas Unidades
Básicas de Santa Maria – RS.
n
Categorias de segurança alimentar
Segurança
Segurança
alimentar leve
alimentar
moderada
%
n
%
n
%
< 8 anos
11
28,9
5
13,1
1
2,6
17
≥ 8 anos
16
42,1
5
13,1
0
0
21
Total
27
68,4
10
26,3
1
2,6
38
Variáveis
Segurança
alimentar
total
Escolaridade
Ao ser relacionado o estado civil das nutrizes com a percepção de segurança
alimentar: entre as nutrizes que moravam com seus companheiros a prevalência de
insegurança alimentar moderada foi de 2,6% (n=1) e as que não moravam não
apresentaram insegurança alimentar. Estas prevalências diminuíram quando as nutrizes
referiram morar com o companheiro sendo que a segurança alimentar se demonstrou alta
para as mesmas 57,8% (n=22). O fato de a segurança alimentar ser maior em nutrizes que
moram com o companheiro se deve ao fato de que os companheiros exercem uma
influencia positiva na condição socioeconômica da família, bem como no apoio social,
emocional e educacional. (Tabela 4).
Tabela 4. Situação de segurança alimentar classificada segundo a Escala Brasileira de Segurança
Alimentar (EBIA) relacionada com o nível de escolaridade de nutrizes atendidas nas Unidades
Básicas de Santa Maria – RS
Variáveis
Categorias de segurança alimentar
Segurança
Segurança
Segurança
alimentar
alimentar leve
alimentar
moderada
n
%
n
%
n
%
total
Estado civil
Mora com o
companheiro
22
57,8
9
23,6
1
2,6
32
Não mora com
o companheiro
5
13,1
1
2,6
0
0
6
Total
27
68,4
10
26,6
1
2,6
38
7
5. CONCLUSÃO
Esta pesquisa permitiu observar que os indicadores socioeconômicos apresentaram
uma relação com a insegurança alimentar, avaliada pela EBIA, demonstrando que a
utilização desta escala pode contribuir para a identificação de grupos em risco de
insegurança alimentar mostrando a necessidade da formulação de políticas públicas com
objetivos claros para sanar problemas de base estrutural possibilitando a diminuição das
diferenças sociais e estabelecer melhoria da qualidade de vida das nutrizes.
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