ANALISTA TRE / TRF
Disciplina: Direito Processual Penal
Prof.: Nestor Távora
Data: 09.06.2009
Aula n°11
MATERIAL DE APOIO - MONITORIA
Índice
1. Artigos correlatos
1.1 O caso do índio pataxó queimado em Brasília. Recurso em sentido estrito.
1.2 A apelação no Processo Penal
2. Jurisprudência correlata
2.1 HABEAS CORPUS 61.440 – São Paulo
3. Simulados
1. ARTIGOS CORRELATOS
1.1 O CASO DO ÍNDIO PATAXÓ QUEIMADO EM BRASÍLIA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO.
Eis a íntegra do recurso em sentido estrito do Ministério Público, referente à sentença de pronúncia que
desclassificou o crime cometido por jovens que atearam fogo ao índio pataxó Galdino Jesus dos Santos
de homicídio doloso para lesão corporal seguida de morte.
Autora: Maria José Miranda Pereira, promotora de Justiça.
"Sentido senhores! Quando o tribunal popular cair é a parede mestra da justiça que ruirá! Pela brecha
hiante vasará o tropel desatinado e os mais altos tribunais no alto de sua superioridade!" (Roberto
Lyra)
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS
Processo : 17901/97
Recorrente: MINISTÉRIO PÚBLICO (MPDFT)
Recorridos: MAX ROGÉRIO ALVES e outros
RAZÕES DE IRRESIGNAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Colenda Turma,
Trata-se de Recurso em Sentido Estrito, interposto contra r. sentença de fls. 560/582, inconformado que
está o MINISTÉRIO PÚBLICO com o teor do r. decisum que desclassificou a imputação de crimes de
homicídio doloso mais corrupção de menor, para lesões corporais seguidas de morte.
Adentrando o mérito, a MM. Juíza transcreve alguns depoimentos e menciona outros, valorando-os de
forma, data venia, indevida, razão por que decidiu que os acusados, embora jogando o combustível e
ateando fogo na vítima, não teriam assumido o risco de produzir o resultado morte. Faz longo arrazoado
sobre a diferença entre dolo eventual e culpa consciente, transcrevendo doutrina e jurisprudência que
julga aplicável ao caso.
Não decidiu com o costumeiro acerto, conforme se demonstrará:
OS FATOS:
Os cinco rapazes divertiram-se até as três horas da madrugada. Trocaram de carros numa
surpreendente seqüência de vezes. Só MAX, naquela noite fatídica, usou diversos carros de luxo, alguns
importados, muito acima dos padrões dos carros brasileiros para os mortais comuns. Mas queriam ainda
mais diversão. Às três horas da madrugada, decidiram andar pela cidade à procura do que fazer - "para
encontrar alguma coisa para a gente curtir" (fl. 401). Foi quando avistaram um ser humano, que não
parecia humano, parecia um mendigo. Estava em situação de desamparo, na noite gelada, dormindo no
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banco frio de uma parada de ônibus. Esta imagem deveria inspirar sentimentos nobres de compaixão,
de caridade. Em pessoas de boa índole, certamente inspiraria. Poderiam os afortunados da sorte ter tido
nobreza de ir até suas casas pegar um dos tantos cobertores que possuíam para aquecer o infeliz. Mais
do que o corpo, teriam aquecido seu coração. Poderiam tê-lo conduzido até à pensão onde ele deveria
estar. Poderiam também só fazer uma oração. Poderiam até mesmo olhá-lo e seguirem indiferentes.
Pessoas tão angelicais, tão sublimes e superiores, como as trinta e uma "testemunhas de santificação"
afirmaram que eles são, teriam assumido uma atitude digna.
Mas não! A imagem do "mendigo" desamparado fez nascer neles o abjeto desejo de fazê-lo objeto da
diversão que procuravam.
MAX ou NOVELY teve a infeliz idéia de atear fogo no "mendigo". Todos - todos - aderiram ao propósito
nefando! Discutiram os detalhes, repartiram tarefas, dividiram responsabilidades, cotizaram-se para
comprar o combustível, tomaram providências para não serem identificados e, após a prática criminosa,
evadiram-se do local sem prestar o devido socorro.
Não foi um ato impulsivo, de momento. Não foi uma idéia infeliz e irrefletida. Entre o planejamento e a
colocação do plano em prática, tiveram duas horas - duas horas - para refletir, para desistir, para
enxergar a hediondez do propósito. Ninguém, em nenhum momento, chegou sequer a ponderar em
sentido contrário.
Firme na intenção, saíram pela cidade à procura de combustível. Num posto de gasolina, todos
desceram do carro. Não encontraram vasilhame para comprar. Os cinco "bem-nascidos" dirigiram-se
então a um latão de lixo, onde pegaram dois recipientes. O frentista alertou-os para o fato de aquelas
vasilhas estarem sujas de óleo, o que poderia estragar o carburador do carro. Se pretendessem fazer
uma brincadeira inocente, não a teriam escondido do frentista. Responderiam que o combustível não
precisaria estar limpo. Afinal, seria só para acender um fogo e fazer uma brincadeira. Se fossem apenas
passar um susto em um mendigo que sairia correndo, não precisariam preservar suas identidades.
Na verdade, sabiam das trágicas conseqüências e da leviandade da pretendida "diversão" e precisavam,
pois, manter-se anônimos. A madrugada era fria. Estavam, presumivelmente, bem-vestidos e bemagasalhados. No entanto, contrariando toda a lógica, enfiaram as mãos em um tambor de água suja,
usaram sabão e lavaram o conteúdo dos recipientes. Ajuntaram moedinhas. Todos contribuíram para a
aquisição dos dois litros de álcool. Não foram dois vidrinhos, não foram dois copos. Foram dois litros!
Alegam ter "dado voltas pela cidade", retornando posteriormente ao local onde dormia o "mendigo".
Esconderam o automóvel noutra pista, sem qualquer movimento àquela hora da noite. Assim, se fossem
flagrados, ninguém anotaria a placa do carro. Foram a pé até à Avenida W.3. O menor G. (Nota do
Editor: o nome completo do menor será sempre omitido neste texto, apesar de constar do original) e
seu primo Eron levaram o combustível. Os outros três dividiram caixas de fósforos. Todos participariam
efetivamente.
Eron e G. jogaram o combustível na desgraçada vítima, e os demais riscaram os fósforos. Tudo
conforme o combinado. A vítima virou uma tocha humana. Era só um mendigo sendo assado vivo.
Assustaram-se? É natural. Mas não perderam o raciocínio. Não desmaiaram. Não ficaram
impossibilitados de agir. O mínimo - o mínimo - que seria de se esperar, nestas circunstâncias, é que
tentassem evitar a tragédia. Mas não! Optaram pela fuga covarde. Correram até a Avenida W2 e
ingressaram no automóvel. Eron ficou parado no canteiro central, olhando. Os demais gritaram "corre,
corre". E ele correu. Fugiu com os outros. Fugiram todos. Inacreditavelmente. Sem prestar socorro.
Após a fuga, pessoas passaram pelo local e avistaram um "manequim", um "boneco" pegando fogo. Era
incrível. Madrugada fria, rua deserta, e um boneco em chamas numa parada de ônibus. Mas o boneco
começou a se debater. Dava gritos horríveis de insuportável dor. O boneco era vivo! Era um ser
humano.
Precisava ser tratado como um ser humano. Os que assim pensaram, tudo fizeram para apagar as
renitentes chamas. Jogaram um galão d´água, duas cervejas, um tapete de carro... As chamas
continuavam invencíveis. Afinal, foram dois litros de álcool sobre aquele corpo! Evandro Pertence tirou
seu smoking e envolveu a vítima. Nairo também tirou o seu casaco e fez o mesmo. Todos, em
desespero, tentavam, como podiam, salvar GALDINO da agonia. Evandro jogou seu próprio corpo para
abafar o fogo que o consumia. As chamas poderiam tê-lo queimado também. Além do mais, ele não
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tinha nada com a tragédia. Mas não hesitou em arriscar sua vida. Não sabia que era índio. Não sabia se
era mendigo. Sabia que era um ser humano e que merecia seu amor.
Enquanto isso, os cinco homicidas tratavam de trocar de carro mais uma vez. Não podiam mesmo ser
identificados! E foram dormir, no conforto de suas casas.
A fuga foi mais uma prova do caráter, personalidade e moral deformados dos agentes do ilícito, que
atinge o mais elementar bom senso e fere a sensibilidade de qualquer pessoa de bem.
Se terceiros, alheios, arriscaram-se para salvar GALDINO, obrigação muito maior tinham os cinco
rapazes que haviam causado a tragédia. Se não pretendiam sequer ferir "um ser humano igual a nós",
como afirmou NOVELY, tinham obrigação ainda maior de procurar evitar o trágico resultado. No entanto
preferiram fugir.
A alegação de que fugiram porque outros socorreram a vítima, não tem como convencer. A prova
inconteste é de que só apareceu alguém depois que haviam corrido até o carro para a fuga. E foi
justamente a fuga que levou as testemunhas a se alertarem quanto às suas responsabilidades. A fuga
precedeu o socorro tardio.
GALDINO consumia-se num indescritível sofrimento. Contorcia-se e tinha convulsões de dor. Tatiana
afirmou que "no local em que Galdino pegava fogo parecia ter uma espécie de óleo espalhado pelo chão
e que a mesma acredita ser do próprio corpo da vítima, pois aquele óleo estava ainda misturado com
carne humana" (fls. 119). Outros disseram que seu rosto "se desmanchava". Rojas afirmou que, se
fosse um animal, tê-lo-ia sacrificado.
Como considerar apenas uma brincadeira selvagem, sem assunção do risco do resultado morte, fato de
tamanha gravidade?
Os réus alegaram inspiração em "pegadinhas", segundo um deles, "pegadinhas do Faustão". Sem entrar
no mérito do bom ou do mau gosto de tais "pegadinhas", não se conhece uma que se assemelhasse a
tamanha perversidade. A não ser a de uma Rádio, cujo "conteúdo" era:
"Aproveitando a onda de campanhas, a TV Cover lança a campanha contra o frio. Ao encontrar um
mendigo debaixo daquela ponte úmida, aqueça-o com álcool e fósforos. Vamos acabar com o frio de um
mendigo. O TV Cover adverte: ajudar o ser humano é prejudicial à saúde"
Por mais inacreditável que pareça, alguns incivilizados resolveram colocar em prática a abominável
"piada". Foram dezenas de "menores de rua" e mendigos "aquecidos" com álcool e fósforos, em todo o
País. De muitos deles se encontrou somente o "carvão" do que haviam sido. Afirmar que previram o
resultado morte, mas acreditaram sinceramente que ele não ocorreriam, pode ser um precedente
perigoso.
A VERSÃO INVERÍDICA DOS ACUSADOS E O DOLO EVENTUAL
A MM. Juíza afirma em sua r. decisão que (fls. 575 - original sem grifo):
"mais um dado importante evidenciou-se durante a instrução. É que, apesar de terem adquirido dois
litros de combustível, logo que chegaram ao locus delicti o conteúdo de um dos vasilhames foi
derramado na grama. O laudo de exame de local demonstra a afirmativa, principalmente a fotografia de
fls. 182. A prova técnica, por seu turno, também vem ao encontro da versão dos acusados de que os
fósforos foram acesos precipitadamente, enquanto Eron derramava o líquido inflamável sobre a vítima,
fazendo-o largar abruptamente o vasilhame."
Com o devido respeito, equivocou-se a douta Magistrada. A prova técnica não confirma a afirmação! Ao
contrário, infirma-a. A fotografia mencionada mostra é que aquele vasilhame estava vazio,
sugestivamente amassado. Seu conteúdo não foi derramado na grama. Os Peritos não encontraram
qualquer vestígio neste sentido. Quanto ao outro recipiente sob o banco, cuja parte superior estava
comburida, é prova de que não se incendiou enquanto estava cheio de combustível! Se ao bambear a
tampa do vasilhame para despejar algumas gotas, um fogo "precipitado" (precipitado com duas horas de
premeditação!!) atingisse acidentalmente o litro cheio de combustível, os acontecimentos teriam sido
diferentes. E a intensidade do fogo, as queimaduras graves que provocou, mostram justamente o
contrário. Foram utilizados, efetivamente, dois litros de combustível.
E se tivessem jogado somente um litro, seria o fato menos grave?! Absolutamente não. O que é estar
em chamas após ser embebido em um litro de álcool? Um litro? Dois litros? Qual a diferença? O
resultado não teria sido igualmente grave?!
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Contraria qualquer lógica acreditar-se que realmente eles analisaram a questão "e chegaram a um
consenso" de que não necessitavam dos dois litros de combustível, derramando um deles sobre a
grama. Ora, por que teriam se cotizado, comprando os dois litros, lavado os dois vasilhames,
carregando-os até o local do crime para, só lá, discutirem sobre a conveniência de derramar um deles
sobre a grama?! Não há qualquer sentido nesta farsa! E se era mesmo só para fazer uma brincadeira, se
era mesmo só para dar um susto no "mendigo", teriam se comportado de forma diferente: teriam, por
exemplo, jogado só umas gotas, só um vidrinho, não dois litros. Aliás, se era só para assustar, para que
o álcool?!?! Por que não colocar o fogo bem próximo? Por certo, quando acordasse com o calor, a vítima
até poderia mesmo correr atrás dos "meninos", das "crianças", como se tem dito. Seria uma brincadeira
muito divertida, fruto de grande inteligência e nobreza de caráter. Mas seria só uma brincadeira.
Também seria só uma brincadeira, de ótimo gosto, por sinal, se tivessem colocado fogo na manga da
camisa, na barra da calça... GALDINO teria acordado com a dor, mas a tempo de rasgar a roupa e salvar
sua vida. E os "meninos" poderiam dar suas gostosas gargalhadas! Mas não se contentaram com isto!
Deram-se ao trabalho de ir longe comprar combustível, lavaram vasilhames, juntaram-se para efetuar o
pagamento, transportaram o combustível até o local do fato, dividiram o fósforo para uqe todos
tivessem chance de participação efetiva...
E diz-se agora que não assumiram o risco do resultado?! Mas o que deveriam ter feiro para mostrar que
assumiram o risco?! Jogado um barril inteiro de combustível?! Ou jogado fogo com um lança-chamas?!
Dolo eventual nunca foi "intencional". Se fosse, para que a diferenciação? Se o "assumir o risco" significa
"querer", por que o dolo eventual? Bastaria o dolo direto. Se homens de dezoito, dezenove e vinte anos,
sem qualquer debilidade mental, com educação "esmerada", podem jogar dois litros de álcool
diretamente sobre o corpo de um mendigo, atear-lhe fogo, tudo de forma demorada, planejada,
estudada, e isto significa que "não assumiram o risco de matar", o que é assumir o risco de matar?!
Se, cientes do resultado que adviria, não desistiram da ignóbil conduta, significa que assumiram o risco
de provocar o resultado!
Outra versão fantasiosa com que se procura enganar os julgadores é a prentensa existência de um
cobertor. Todos, devidamente instruídos, apresentaram esta mentira na primeira oportunidade.
Desmascarados, "suavizaram" de "cobertor" para "um pano". Tudo à unanimidade. Mas não havia pano!
Não havia cobertor! A "testemunha" trazida para sustentar a falácia, mentiu grotescamente, conforme
se demonstrará na fase processual adequada.
É absolutamente insustentável que tenham jogado uma gota, ou umas gotas de álcool sobre os pés da
vítima e que o fogo tenha subido. A parte mais atingida, onde havia mais concentração de combustível,
foi a região dos órgãos genitais. E o fogo "não subiu". As lesões não são mais graves nos pés e menos
graves na direção da cabeça. Pelo contrário, os pés foram menos atingidos. A região plantar não se
queimou. Uma sandália ficou intacta e a outra quase intacta. E foi justamente a barra da calça jeans a
parte menos danificada pelo fogo. Mesmo sem um novo laudo, desnecessário e não aconselhável nesta
fase processual, é fácil constatar o ardil. Jogar álcool nos pés e o fogo "subir acidentalmente" tornaria o
fato, por certo, menos grave. Mas não foi o que ocorreu.
DO DOLO DIRETO DE CAUSAR LESÕES
Se existem argumentos para afirmar que os homicidas disseram a verdade, se se pode garantir tão
enfaticamente que não assumiram o risco do resultado morte, é incoerente dizer-se que queriam ferir o
"mendigo". Afinal, eles sempre afirmaram que não só não queriam matar, mas também que não
queriam ferir. Exemplifica-se com o depoimento de NOVELY (fls. 286/7 - original sem grifo):
"o interrogando tem consciência que o álcool combustível é substância altamente inflamável, porém a
sua intenção, bem como a dos demais era de somente derramar o líquido sobre o pano que cobria as
pernas da vítima, a fim de lhe dar um susto, para vê-la correr; que em momento algum passou pela
cabeça do interrogando que a vítima poderia morrer, como também não passou pela cabeça do
interrogando que a vítima poderia ser lesionar."
Ora, se afirmaram que sequer imaginaram que poderiam lesionar a vítima, como afirmar que queriam
causar-lhe lesões corporais?? Por dedução lógica, não? A resposta é óbvia: Porque era humanamente
impossível que não tivessem assumido o risco de lesionar. Mas se é óbvio que não poderiam ignorar que
iriam lesioná-la, parece igualmente óbvio não poderem ignorar que dois litros de álcool e fogo causaria o
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resultado morte. O raciocínio deve ser o mesmo. Consta da r. sentença (fls. 579): "A ação inicial dos
réus, sem qualquer dúvida, foi dolosa. Não há como afastar a conclusão de que, ao atearem fogo na
vítima, sabiam que iriam feri-la." Ora, eles afirmaram categoricamente que não previram nem morte
nem sequer lesões. Assim, também as lesões não teriam saído da "esfera do consentimento"!! Por que
se pode inferir que queriam sim o resultado "lesões, se é proibido inferir que não assumiram o risco do
resultado morte? Ou se julga pela lógica, ou pelas "sinceras" afirmações dos "bons meninos", como se
tem dito.
A propósito, trinta e uma "testemunhas" vieram exaltar suas nobilíssimas qualidades. Todos, no mundo
jurídico, sabem os objetivos de tais "testemunhos". Mas, supondo-se, para argumentar, que fossem
verdadeiros, pessoas de tão boa índole teriam coragem de se divertir com um ser humano em chamas?!
"Meninos bons, dóceis, gentis e meigos" teriam agido com tamanha selvageria?! Algum "menino" de
dezenove anos pode ignorar a dor de um só dedo queimado?! Ainda que pretendessem apenas ferir, é
perverso demais queimar um ser humano, mormente em situação de tanta inferioridade e desamparo! A
simples intenção de ferir já afastaria completamente a adjetivação de "bons, meigos", etc, etc. Querer
ferir alguém com queimaduras, seja para matar, seja para divertir, seja para assustar, seja para vê-la
correr, seja o resultado um simples ferimento, seja uma deformação de rosto, membros e corpos que
vemos naturalmente pelos salões sociais, de qualquer ângulo que se veja, é um ato demonstrativo de
terrível perversidade!
Discorda-se, também com veemência, de mais uma razão de decidir. Está às fls. 577: "Assiste razão à
defesa do acusado Antônio Novely quando se afirma que desespero e afobação não se coadunam com
aqueles que agem com animus necandi". Uma das testemunhas teria dito que eles pareciam estar com
muita pressa e desesperados. É lógico que estavam com muita pressa. Precisavam fugir antes que
alguém anotasse a placa do carro, fugir antes que fossem identificados, fugir para garantir a
impunidade. Quanto ao que pareceu a uma testemunha, isto é, pareceu que estariam desesperados...
Até o mais frio dos animais teria ficado chocado com a cena horripilante. Mas se é para emprestar esta
extensão e importância à uma palavra de uma testemunha, por que não dar a mesma importância à
palavra "eufóricos", utilizada por G., em Juízo, para expressar como se sentiram após a prática do
crime?! "Desesperados" foi a impressão subjetiva de uma testemunha. "Eufóricos" foi a confissão de um
estado de espírito.
Não bastasse terem tirado a vida da vítima com tamanha crueldade, querem agora, para não fugir à
regra, denegrir vergonhosamente a sua imagem, atribuindo-lhe a pecha de assassino incendiário de um
sobrinho?! Porque atribuir a GALDINO a prática de um crime que, sabidamente, ele não cometeu?! E se
fosse verdade, faria diferença?! Se GALDINO tivesse realmente matado um sobrinho, queimando-o, em
que isto beneficiaria os "meninos"?! Por acaso eles agiram como justiceiros?!
Analisando o mérito do crime, o i. Desembargador JOAZIL GARDÈS, do TJDF, na fundamentação de seu
voto para colocar MAX ROGÉRIO ALVES em liberdade, escreveu:
"Se perguntarmos: tiro mata? Veneno mata? Enforcamento (esganadura) mata? Afogamento mata? A
resposta inevitável será: mata; mas, se perguntarmos queimadura mata? A resposta até mesmo de
médicos que não sejam especialistas em queimados (!!!), invariavelmente será: queimadura não mata,
isto porque toda a sorte de queimadura, produzida por fogo ou substâncias de efeito análogo é possível
de ser tratada, sendo natural avistarmos pelas ruas e salões sociais, pessoas com rostos, membros e
corpos deformados por queimaduras."
O trecho mereceu transcrição na r. sentença da ilustre Magistrada, como um fundamento a mais da
decisão. No entanto, o fogo matou. O fogo mata! Os homicidas sabiam que o fogo mata. Ao jogarem
dois litros de combustível e atearem fogo em alguém indefeso, assumiram o risco de provocar o
resultado morte. Tipificou-se um crime doloso contra a vida.
DE OUTRAS VERSÕES INVERÍDICAS:
Também enganou-se, data venia, a MM. Juíza, quando afirma (fls. 578 - grifos acrescidos):
"Uma frase constante do depoimento de Max, no auto de prisão em flagrante, sintetiza o que realmente
ocorreu. Está a fls. 15: ´pegou fogo demais, a gente não queria tanto.´ Como já enfocado, assumir o
risco não se confunde, em hipótese alguma, com previsibilidade do resultado. Assumir o risco é mais
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(...) é querer ou aceitar (...) é necessário que o agente tenha a vontade e não apenas a consciência de
correr o risco."
Como dar tamanha credibilidade à versão defensiva de MAX e dos demais?! Ela, definitivamente, não
sintetiza o que realmente ocorreu! É uma versão que destoa do conjunto probatório. É peça de defesa,
com intuito evidentemente de buscar a impunidade. É tão falsa quanto falsos são "o cobertor", "o pano",
o uso de um produto inflamável que já estaria dentro do carro... É tão falsa quanto falsa é a "crise de
amnésia conjunta", quando todos afirmam que não se lembram de quem foi a idéia de queimar o
mendigo, de quem foi a idéia de que o fariam com álcool e fósforos... É tão falsa quanto falsas são as
alegações de que se lembram de forma idêntica de determinados detalhes e se esquecem, também de
forma conjunta e idêntica, de outros.
DA CORRUPÇÃO DO MENOR
Será possível que se acredite serem verdadeiras as afirmações de que pouparam o "frágil" G. da
provável "carreira" do mendigo assustado?! Logo após os fatos, quando estavam todos com os dados
fresquinhos na memória, todos os cinco afirmaram, de forma harmônica e sem contradições, na
presença de advogados, que G. também participou de todas as etapas. Todos teriam se esquecido de
que, há poucos instantes, tinham deliberado proteger sua fragilidade?! E depois, quando pesava sobre
eles a acusação de facilitar a corrupção do menor, todos tiveram outro ataque de "boa-memória",
lembrando-se que decidiram em comum acordo que o menor era frágil, e que precisava ser protegido da
"carreira" do mendigo?! Parece de meridiana clareza que esta versão objetiva absolvição pelo crime de
corrupção de menores!
O menor, que, por sinal, nada tem de frágil ou de pequeno, não tinha registros de maus antecedentes.
Hoje responde por um ato infracional de homicídio triplamente qualificado. Presentes, pois, os
pressupostos para que os maiores sejam julgados pelo crime imputado, naturalmente após
apresentação de todas as teses defensivas em Plenário do Júri.
DA DESCLASSIFICAÇÃO NESTA FASE PROCESSUAL
Qualquer principiante sabe que uma das quatro hipóteses legais nesta fase processual é, em tese, a
desclassificação. Evidente que a afirmação de que a desclassificação, se fosse o caso, só poderia ser
feita pelo Conselho de Sentença, após os debates em Plenário de Júri, referia-se a este caso específico,
onde, na fase imediatamente anterior se afirmou, "assumiram o risco de provocar o resultado
lamentavelmente advindo". Um entendimento é conseqüência lógica do outro. Se se entendeu estarem
presentes os requisitos para a sentença de pronúncia, por via de conseqüência, entendeu-se incabível a
desclassificação. A deturpação maldosa do sentido que se quis dar foi proposital.
Muitos estão convictos de que, nas circunstâncias, os homicidas agiram com dolo direto. O próprio MM.
Juiz da Vara da Infância e da Juventude, após minuciosa e criteriosa análise dos autos, chegou à firme
conclusão de que assumiram o risco de provocar o resultado lamentavelmente advindo. Com todo o
respeito ao entendimento contrário, agiu ele com muita correção e justiça, ao atribuir a G. a prática do
ato infracional de homicídio triplamente qualificado.
Esta signatária, da mesma forma que a Promotora de Justiça que atuou no outro processo pelo mesmo
delito, e da mesma forma que o MM. Juiz que proferiu o julgamento, com base nas provas apresentadas,
viu claramente o dolo eventual. É certo, como aliás já dito pela MM. Juíza (fl. 571), que é tênue a linha
divisória entre o dolo eventual de homicídio e o preterdolo nas lesões corporais seguidas de morte.
Assim sendo, ainda que haja dúvida, nesta fase processual não devia, com todo o respeito, ter-se
procedido à desclassificação. Nesta fase, incide o Princípio maior do in dubio pro societate. Este Princípio
é citado na quase totalidade das sentenças de pronúncia. Em geral, já consta até mesmo de um
"modelo", no computador.
"Teria sido mais fácil agradar à sociedade utilizando-se o benefício da dúvida"?! Não se trata de ser mais
fácil ou mais difícil. Simplesmente, in dubio pro societate!
É bem verdade que nosso Direito Penal adotou a Teoria Finalista da Ação. Mas é igualmente verdade que
o sistema processual penal sedimentou e consagrou o Princípio de que, nas fases de proposição - na
denúncia e na pronúncia - simples indícios são suficientes. No julgamento sim, incide o princípio in dubio
pro reu. Mas para a pronúncia, in dubio pro societate. No caso em comento, nem se trata de meros
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indícios. Muito menos meras conjecturas. Se não se quer chamar de "provas", chame-se de "veementes
indícios" e a solução mais justa e mais correta será in dubio pro societate.
A irresignação, aqui, reclama justo proclamar o egrégio TJDF a impossibilidade evidente de o Magistrado
singular - cuja independência o Ministério Público defenderá às últimas conseqüências, na defesa do
Estado Democrático de Direito, do qual referido atributo afigura-se corolário - impedir ao Júri a
apreciação da causa a ele reservada soberanamente pela Carta Política.
Longe está a espécie, insista-se, de propiciar ao julgador monocrático o afastamento do homicídio
doloso, acima de mínima dúvida, em virtude da atipicidade da conduta.
A conclusão agora questionada, ao contrário, resultou da valoração ampla dos fatos e provas, após
análise minuciosa do feito, revelando a eminente Magistrada sua compreensão particular da demanda, o
que inviabilizou, desde logo e definitivamente, a manifestação dos jurados, a quem caberá o respectivo
julgamento e, se for o caso, reconhecer a desclassificação operada de modo prematuro e infundado na
presente fase processual.
Enfim, devido mesmo aos referidos veementes indícios de autoria, deveria a pronúncia obrigatoriamente
reconhecer o fato tipificado na denúncia como homicídio triplamente qualificado, sem lugar à
desclassificação efetuada após exaustiva valoração dos elementos da causa, em claríssima violação da
competência do Tribunal Popular (Constituição da República, artigo 5º, inciso XXXVIII e Código de
Processo Penal, artigo 74, §1º), em completo desacordo às normas processuais incidentes na espécie
(artigo 408 e 410 do Código citado).
Não se trata de negar a possibilidade de o Magistrado apreciar a causa para definir se se tipifica ou não
hipótese de crime doloso contra a vida, única circunstância que, de lega lata, atrairia a competência do
Tribunal Popular.
Tal juízo de tipicidade, contudo, há de se limitar à verificação de indícios de autoria e somente justificará
decisão negativa quando, inarredável e inquestionavelmente, não se verificar a subsunção dos fatos à
mesma.
Nada disso ocorreu na espécie.
A uma, porque o quadro fático-probatório amolda com inegável conforto a imputada autoria à norma de
regência (Código Penal, artigo 121, §2º, I, III e IV), inviabilizando o respectivo afastamento na presente
fase processual.
Depois, para chegar à malsinada classificação, a emérita Magistrada necessitou proceder a profunda
apreciação mais afinada com o meritum causae, "perdendo-se em estudo comparativo das provas
colhidas, reprimindo umas e, com veemência, valorizando outras, exercendo atribuições próprias dos
jurados", em contraposição a toda doutrina e jurisprudência pacíficas sobre o assunto (cf. RT 521/439,
RT 644/258, apud Damásio de Jesus, Código de Processo Penal Anotado, Saraiva, 12ª ed., 1995, p.
288), acolhidas, até há pouco, nas anteriores pronúncias exaradas pela douta sentenciante. A questão
não se resolve, d.m.v., na aferição do grau de coragem de "decidir" a causa "contra" a opinião pública.
Desclassificar a imputação, nestas circunstâncias, seria ferir de morte o Princípio do in dubio pro
societate. E violar um Princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. É a mais grave forma de
ilegalidade ou inconstitucionalidade, porque representa um abalo nas vigas mestras de toda a estrutura
jurídica.
Alguns simpatizantes da causa defensiva proclamaram que a sentença demonstrou e significou
"coragem de enfrentar toda a sociedade nacional e internacional para fazer justiça". Este raciocínio traz
ínsita uma inverdade incontestável: a de que pronunciar os réus significaria injustiça. Chegou-se a dizer
que, quem pensa diferentemente quer vingança ou linchamento. Por que para todos os presidiários do
País a condenação significou "justiça" e para estes rapazes significaria "vingança", "linchamento"?!?!
Não se pede vingança, nem linchamento, nem nada parecido. O que se procura é apenas e tão-somente
o cumprimento da norma constitucional que estabelece competência exclusiva do Tribunal do Júri para
julgar os autores de crimes dolosos contra a vida. A defesa terá assegurada toda a oportunidade de
apresentar ampla defesa em Plenário do Júri. Aliás, mais que "ampla", "plenitude" de defesa. A decisão
de pronúncia, neste caso, viria dar aplicação à norma constitucional expressa no artigo 5º, XXXVIII. A
linha inversa importa em subversão da ordem constitucional e em transgressão à lei federal,
notadamente aos artigos 408, 410 e 74. §1º do Código de Processo Penal.
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No STJ, discutindo-se sobre o poder de retirada de qualificadora em sede de Pronúncia, assim decidiu o
Exmº senhor Ministro VICENTE LEAL (Recurso Especial de número 604.405/DF - REG. 95.00200092-9 original sem grifo):
"(...) Não se exige no pronunciamento juízo de certeza, mas mero juízo de probabilidade e não é
cabível, nesse ato processual, exame profundo de provas, porque aí não se busca a formação, repita-se,
de um juízo de certeza, que há de ser efetuado em momento subseqüente, seja, quando do julgamento
pelo Tribunal do Júri, que é o Juiz natural competente para o julgamento dos crimes dolosos contra a
vida, segundo o cânon inscrito no art. 5º, XXXVIII, da Carta Magna.
Se assim é, o Juiz da pronúncia, embora esteja obrigado a dar os motivos do seu convencimento,
indicativos da existência do crime e da presença dos indícios suficientes de autoria, não deve efetuar
valoração de provas, sob pena de incorrer no grave erro de influenciar no ânimo dos integrantes do
Tribunal Popular, causa de nulidade do decisum.
Em idêntico sentido, confira-se ainda os reiterados julgados (originais sem grifo):
"Recurso em Sentido Estrito contra despacho de pronúncia - prevalência, nesta fase, do brocardo in
dubio pro societate - não merece guarida pretensão de desclassificação para crime (ou contravenção) de
competência do Juiz singular se este ficou improvado - inteligência do art. 410 do CPP (Unânime - RSE
1416/94/DF - Reg. Ac. 72592)
"Processual Penal. Impronúncia (art. 409, do CPP), comprovada a existência do crime e indícios
suficientes de autoria, pronuncia-se o réu. Nos crimes dolosos contra a vida, decise-se a dúvida em
favor da sociedade. Precedentes da Corte. Recurso provido, para pronunciar o acusado." Unânime (TJDF
- Registro de Acórdão nº 63188 - DJ 5-5-93, página 16276)
"Processo Penal e Penal. Pronúncia. Homicídio. Desclassificação. Competência do Júri. Persistindo dúvida
até a pronúncia, quanto à ocorrência de legítima defesa e aos elementos que poderiam ensejar a
desclassificação do homicídio para lesões corporais, aplica-se o princípio ´in dubio pro societate´. Ao júri
popular caberá decidir o caso. Recurso improvido" (TJDF - RSE - Reg. de Ac. nº 60352 - DJ 4-11-92,
pág. 35517)
"Processo Penal - Pronúncia. 1) Havendo indícios da autoria, e devidamente comprovada a materialidade
do delito, deve o juiz pronunciar o réu a fim de ser submetido a julgamento pelo Egrégio Tribunal do
Júri, pois a pronúncia é mero juízo de admissibilidade, prevalecendo inclusive, nesta fase, o princípio in
dubio pro societate. 2) Recurso improvido." Unânime. (TJMT - RSE nº 061/95 - Santana; Rel.
Desembargador Gilberto Pinheiro).
"PENAL E PROCESSUAL PENAL - CRIME CONTRA A VIDA - Dolo eventual infirmado - Desistência
voluntária indemonstrada - Desclassificação indevida - Reforma da interlocutória mista - Pronúncia - 1)
O agente que, aproximadamente dois metros, aponta arma portentosa (revólver ´38´) contra a região
abdominal da vítima e aciona gatilho, mesmo o fazendo uma única vez, obrou com dolo eventual, pois
se não teve a deliberada intenção de matar, no mínimo, assumiu o risco de produzir esse resultado, já
que a curta distância, a eficiência do instrumento e o alvo escolhido, à toda evidência, afastavam
qualquer dúvida quanto à possibilidade do disparo causar o evento letal. - 2) Não há falar em
desistência voluntária se houve o tiro e a vítima foi atingida no local desejado, por sinal mortal,
principalmente. - 3) Restando não infirmado o dolo eventual, indevida e precipitada é a desclassificação
para lesão corporal, no juízo de admissibilidade da acusação, ao argumento de indemonstração do
animus necandi, máxime se afirmado, em laudo pericial fundamentado, que a lesão em região fatal
provocou risco de vida, em decorrência de hemorragia interna. Até porque, nessa fase, por força do
princípio in dubio pro societate, questões intrincadas sobre a definição jurídica devem ser remetidas ao
Júri popular, único competente para aprofundar-se no exame da prova. - 4) Inobservadas, pelo juiz
singular, as diretrizes dos tópicos anteriores, reforma-se o decisum e pronuncia-se o acusado" (TJSP RSE nº 022/92 - Capital; Câmara Única)
Não se pode pressupor nem absolvição nem massacre no Tribunal do Júri. A instituição do Júri no Brasil
sempre mereceu estar no capítulo dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, o capítulo mais
importante da Lei mais importante. Algumas frases são incansavelmente repetidas em defesa da
instituição. A título de exemplo:
"Somos partidários do júri porque ele é emanação da vontade do povo; porque as suas decisões,
proferidas por consciências livres de preconceitos, atendem ao pensamento médio da sociedade".
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(Evandro Lins e Silva)
"A zona ocupada pelo júri através do mundo contemporâneo traça quase exatamente o meridiano
jurídico da civilização e, pela nitidez com que a sua realidade se acentua de país para país, se poderia
determinar a situação de liberdade individual no seio de cada povo" (Ruy Barbosa)
Doutos julgadores, aprofundar a discussão sobre o mérito não é a melhor técnica. Sabe-se que o
momento processual não é adequado para se discutir o mérito. Sacrifica-se, no entanto, a melhor
técnica em nome do bom Direito.
Por todo o exposto, espera o MINISTÉRIO PÚBLICO, seja provido o presente recurso, para reformar a r.
decisão combatida, pronunciando os réus nos termos da denúncia (121, §2º, I, III e IV e artigo 1º da
Lei 2252/54).
Brasília, 26 de agosto de 1997
Disponível em: http://jus2.uol.com.br/pecas/texto.asp?id=1
1.2 A APELAÇÃO NO PROCESSO PENAL
Autor: Dijosete Veríssimo da Costa Júnior
1 - INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por escopo a análise prévia dos recursos em geral e mais especificamente
acerca do recurso de apelação.
Iniciaremos fazendo um rápida abordagem sobre o conceito, fundamento, classificação, pressupostos enquadrando os objetivos e subjetivos - e os princípios gerais relativos aos recursos no âmbito do
processo penal.
Em seguida passaremos ao estudo pormenorizado do recurso de Apelação Criminal , meta principal do
nosso trabalho.
Examinaremos com minúcia o seu conceito e espécies - plena e limitada - discorrendo também sobre a
sucumbência.
Observaremos quão é importante o juízo de admissibilidade quanto ao interesse e legitimidade, além
dos pressupostos para dar-se conhecimento ao recurso.
Veremos que o princípio da voluntariedade, ínsito aos recursos em geral, sofre exceção nos casos de
recurso de ofício, posto ser dever do juiz devolvê-los a reexame do tribunal "ad quem".
Quanto a apelação em si enfocaremos aquelas interpostas de decisão do juiz singular e das relativas aos
julgados proferidos pelo tribunal do júri.
Atentaremos em seguida aos prazos para a interposição do recurso mencionado, bem como aos
procedimentos que devem ser cumpridos quando de sua interposição.
Por fim trataremos da deserção do recurso - não pagamentos das despesas processuais e fuga do réu
após a interposição do dito recurso - dos seus efeitos, tecendo considerações a respeito das proibições
referentes à "reformation in pejus" e "reformation in mellius".
2 - DOS RECURSOS EM GERAL
2.1 - CONCEITO
Recurso é o pedido de reexame de uma decisão judicial, para que seja promovida a reforma ou
modificação, ou apenas a invalidação da sentença proferida. São previstos em lei, dirigidos ao mesmo
órgão hierarquicamente superior, dentro do mesmo processo.
È um pedido de reexame de decisão ou sentença judicial, pois, em qualquer setor de atividade humana
há inconformidade com o primeiro julgamento. Portanto, na vida jurídica, há entre os litigantes este
mesmo sentimento de rejeição, de inconformidade, de dúvida, necessitando assim de um remédio
jurídico que amenize a angústia e a inaceitação da sentença proferida em primeira instância. E o meio
de se provocar o judiciário para que seja feito um reexame da primeira sentença é justamente o
recurso.
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O reexame pedido através do recurso pode ser para: reformar, modificar, ou até mesmo invalidar a
sentença proferida pelo juízo "a quo".
O recurso para ter o alcance almejado, ou para que seja procedente o pedido , necessita de previsão
legal. O rol de recursos e suas hipóteses de cabimento encontram-se elencadas na legislação
competente para o tipo de recurso que se quer interpor.
O órgão competente para julgar recursos pode ser: o que proferiu a primeira decisão, denominado
também de juízo "a quo", como nos casos de embargos de declaração e o protesto por novo júri. Ou
outro órgão de instância superior , tendo a denominação de juízo "ad quem" julgando portanto, a
apelação, os recursos em sentido estrito, os embargos infrigentes, o recurso especial, o recurso
extraordinário e o recurso ordinário. Em regra, o recurso e reexaminado por órgão hierarquicamente
superior, pois estão de um modo geral intrinsecamente ligados ao princípio do duplo grau de jurisdição.
Como "o recurso é uma fase do mesmo processo, um desdobramento da mesma ação" (Greco, 1995, p.
308), seu desenvolvimento prossegue como uma nova etapa do processo em andamento.
2.2 - FUNDAMENTO
2.2.1 - NECESSIDADE PSICOLÓGICA
Os recursos fundamentam-se, principalmente, na necessidade psicológica, inerente ao ser humano, de
não aceitar uma decisão desfavorável a si.
É comum ao ser humano a rejeição, a incapacidade de se submeter a decisão de outrem guando esta
lhe traga algum gravame ou prejuízo. A primeira atitude que é tomada, pelas pessoas que se vêem
nessa situação é procurar uma forma de contestar a decisão. Na vida judiciária também não é diferente,
surgem para os litigantes as mesmas necessidades psicológicas de satisfazer a sua pretensão, procuram
sempre uma forma ou um remédio jurídico para não ter que se submeter as decisões proferidas através
da sentença. Daí ter-se procurado um meio que se adequasse a necessidade psicológica do ser humano.
A solução vista pelos doutrinadores foi justamente o reexame da primeira decisão, mesmo que fosse
para mantê-la. Só assim estaria satisfazendo a necessidade inata e incoercível do espírito humano de
ver sua sentença examinada por outro juízo.
2.2.2 - FALIBILIDADE HUMANA
Um outro fator preponderante e que serve de fundamentação para o recurso, que é um remédio jurídico,
é a falibilidade humana, pois o ser humano é passível de erro, de falha.
A falta de conhecimento mais aprofundado em certas questões, por parte dos julgadores, ou mesmo
erros, pois o ser humano não é infalível, pode causar prejuízos tamanhos à parte. E confiar-se a decisão
de um julgamento a uma única pessoa, sem possibilidade de ser reavaliado por um outro juízo,
possibilita o arbítrio.
Haja vista ao exposto, os recursos sempre foram admitidos, desde a história do direito, em todas as
épocas e em todos os povos.
2.2.3 - RAZÕES HISTÓRICAS
Existem razões históricas que ajudam a justificar a admissão dos recursos entre todos os povos e em
todas as épocas, logicamente de maneira rudimentar no princípio, mas evoluindo com o tempo e de
conformidade com a necessidade e grau de civilização de cada povo de cada época.
No Direito Romano primeiro surgiram as ações, pois inexistia uma estrutura judiciária hierarquizada, que
dividisse o judiciário em órgãos de primeiro e de segundo grau. Todavia, em virtude da necessidade
psicológica de não aceitação da decisão com passividade, ou guando de erro, decisão ilegal ou injusta, O
Direito Romano criou uma ação para declarar a nulidade de decisões nos casos em que coubesse. Foi o
primeiro passo para o surgimento dos recursos.
Com o desenvolvimento do Império Romano surgiu o recurso denominado de apelação, uma forma de
rever as sentenças dos magistrados. Surgiu por obra do Imperador Adriano, o qual, mantinha o poder
de "todas as magistraturas". O desenvolvimento do Estado e a complexa estrutura do Império, obrigou a
admissão de recursos para autoridades hierarquizadas em graus. Foi o início do sistema recursal
propriamente dito. Entretanto, o ordenamento não deixou de conviver com ações que também servem
para impugnar decisões, tais como; revisão criminal, habeas corpus, embargos de terceiro e mandado
de segurança.
2.3 - NATUREZA JURÍDICA
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Há divergência doutrinária acerca da Natureza Jurídica dos recursos. Hélio Tornaghi diz que pode ser
apreciada sob várias concepções: "a) como desdobramento do direito de ação que vinha sendo exercido
até decisão proferida; b) como ação nova dentro do mesmo processo; c) como qualquer meio destinado
a obter a "reforma" da decisão, quer se trate de ação como nos recursos voluntários, quer se cogite de
provocação da instância superior pelo juiz que proferiu a decisão, como nos recursos de ofício"
(Mirabete, 1996, p.598).
Hoje estar praticamente superada as divergências acerca da natureza jurídica dos recursos, como sendo
ações distintas e autônomas. A corrente predominante é a de que a natureza do recurso é: "aspecto,
elemento ou modalidade do próprio direito de ação e de defesa" ( Grinover, Gomes Filho, Fernandes,
1996, p. 32).
Porém, não é uma faculdade, ou seja, um poder que se tem de fazer ou agir em defesa ou aquisição de
direitos. Mas sim, um ônus processual - quer isso dizer que a parte que se sentir prejudicada tem o
encargo, o dever ou obrigação de exercê-lo de interpô-lo, sob pena de não o exercendo, ser prejudicado
e conseqüentemente ter que arcar com os prejuízos , simplesmente por não ter se valido do remédio
jurídico hábil a desfazer o erro.
2.4 - PRESSUPOSTOS DOS RECURSOS EM GERAL
O conhecimento de todo e qualquer recurso exige como antecedente lógico e necessário, a verificação
da existência dos pressupostos objetivos e subjetivos de sua impugnação. É o que se chama de juízo de
admissibilidade do recurso, e é feito tanto na primeira, quanto na segunda instância.
No que respeita aos pressupostos objetivos, existem divergências quanto a sua enumeração por parte
dos doutrinadores. Todavia, seguiremos o entendimento de Vicente Greco Filho, por considerá-lo o mais
completo. Assim, são considerados pressupostos objetivos do recurso:
A) Cabimento. Deve o recurso estar previsto em lei. Se de determinada decisão não há previsão legal de
recurso, deve a mesma ser considerada irrecorrível. Enquadram-se nesse exemplo as decisões
interlocutórias no processo penal, salvo as exceções previstas no art. 581, CPP, e em algumas leis
especiais, posto que neste tipo de processo vigora o princípio da irrecorribilidade das interlocutórias, só
podendo as mesmas serem reexaminadas como preliminar do recurso de apelação;
B) Adequação. Para cada espécie de decisão cabe um recurso específico, devendo-se verificar quando de
sua interposição, se o recurso escolhido é o adequado para se obter o provimento requerido. Tal
pressuposto, entretanto, não pode ser considerado absoluto em decorrência do princípio da
fungibilidade, que permite que o tribunal conheça de um recurso por outro, desde que não se configure
a má fé do recorrente;
C) Tempestividade. O Código de Processo Penal prevê o prazo de interposição de cada recurso, devendo
a parte interpor seu recurso dentro desse lapso temporal, sob pena do mesmo não ser conhecido por ser
intempestivo, ou seja por estar ausente um dos pressupostos objetivos exigidos. Deve-se observar,
contudo, que tendo a parte manifestado a sua vontade dentro do prazo, não poderá ser prejudicada por
eventuais omissões da administração judiciária que venham a retardar o processamento de seu recurso.
Neste sentido dispõe a Súmula 428 do STF: "Não fica prejudicada a apelação entregue em cartório em
prazo legal, embora despachada tardiamente".
D) Regularidade Procedimental. O recorrente deverá observar as formalidades legais quando da
interposição de seu recurso. No tocante à forma, deve a apelação, por exemplo, ser interposta por
petição ou termos nos autos, podendo subir para o tribunal com ou sem razões. Todavia, se o recorrente
for o Ministério Público, terá ele o dever funcional de apresentar suas razões, até para que o acusado
possa contra-arrazoar, exercendo de forma mais ampla o seu direito de defesa;
E) Inexistência de Fato Impeditivo ou Extintivo do Direito de Recorrer.
E.1) São fatos impeditivos: a renúncia e o não recolhimento à prisão nos casos exigidos em lei.
A renúncia é a manifestação da vontade de não recorrer. O Ministério Público não pode renunciar ao
direito de recorrer, em respeito ao princípio da indisponibilidade da ação penal pública, da qual é titular.
Têm essa faculdade, tanto o querelante quanto o acusado, mas para exercê-la, devem manifestar
expressamente sua vontade, não se reconhecendo, assim, a renúncia tácita.
A exigência de recolhimento a prisão prevista no art. 594 do CPP, dentre outros dispositivos legais, data
venia, não tem cabimento, entendendo grande parte da doutrina que tal exigência é inconstitucional, por
afrontar o princípio da presunção de inocência, que impede que se imponha ao réu, antes do trânsito em
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julgado da sentença penal condenatória, medida privativa de liberdade, que represente uma antecipação
da pena, salvo nas hipóteses de decretação de prisão preventiva, justificada pela real necessidade do
recolhimento à prisão; Além de ir de encontro, outrossim, aos princípios da isonomia, já que não se faz
a mesma exigência à parte adversa( Ministério Público e ofendido), da ampla defesa e do duplo grau de
jurisdição.
Além desse aspecto constitucional, comparando-se a art. 594 do CPP com a lei dos crimes hediondos
(8.072/90), deve-se entender que a permissão contida nessa última, qual seja, a de, em caso de
sentença condenatória, poder o juiz em decisão fundamentada, permitir o apelo em liberdade,
independentemente de ser o réu primário ou de ter bons antecedentes ,estende-se àquela.
E.2) São fatos extintivos: a desistência e a deserção.
A desistência é a manifestação de vontade de não prosseguir no recurso já interposto. Só podem desistir
do recurso o querelante, o querelado e o acusado, não podendo o Ministério Público. Inclusive, na
interposição do recurso de apelação por parte do Ministério Público, se este não fixar os limites do seu
pedido na petição ou no termo de interposição, não poderá fazê-lo quando da apresentação de suas
razões, pois isso representaria desistência parcial do pedido, o que lhe é vedado fazer.
A extinção do recurso pela deserção não é possível se o mesmo tiver sido interposto pelo Ministério
Público, sendo aplicável apenas aos processos instaurados por ação de iniciativa privada. Suas hipóteses
se restringem à fuga do réu da prisão depois de interposto o recurso e à falta de pagamento das custas
processuais pelo mesmo.
Os pressupostos subjetivos por sua vez, dizem respeito à sucumbência e à legitimidade para recorrer.
A sucumbência pode ser entendida como o prejuízo ou gravame advindo à parte em razão da decisão
proferida, ou ainda, a relação desfavorável entre o que foi pedido e o que foi concedido. Da sucumbência
decorre o interesse da parte em recorrer, em virtude de ter tido seu direito lesado. Assim, falta
interesse, por exemplo, ao defensor de um dos co-réus para apelar de sentença absolutória de outro; ou
quando a decisão não causa prejuízo ao recorrente, dentre outras hipóteses.
Existem divergências doutrinárias quanto a existência ou não de interesse do réu em apelar de sentença
absolutória. Aduz uma corrente que se o réu for absolvido por insuficiência de provas ou no caso de
perdão judicial (em que há uma sentença condenatória), o réu pode apelar para tentar modificar o
fundamento absolutório, por exemplo, provar inexistência do fato, ou obter sentença que declare extinta
a punibilidade, na tentativa de evitar uma possível sentença absolutória no âmbito cível. Já Vicente
Greco partilha de outra corrente, negando essa possibilidade, pois embora reconheça que a sentença
penal pode repercutir no âmbito cível, acredita que não cabe ao juiz penal, por falta de competência,
invadir a seara civil, principalmente se já tiver cessado seu ofício com a prolação da sentença. Mas
prevalece a primeira corrente.
Quanto ao pressuposto da legitimidade , estão legitimados a recorrer: o Ministério Público, inclusive para
beneficiar o réu, nos casos em que atue como fiscal da lei, uma vez que cabe-lhe velar pelo fiel
cumprimento e execução desta. Todavia, não poderá recorrer nas hipóteses de sentença absolutória em
ação de iniciativa privada, pois faltar-lhe-á o jus accusationis;
O assistente de acusação, mas apenas em caráter supletivo. Assim, se a apelação do Ministério Público
for plena o assistente não poderá recorrer, mas se for parcial, nada o impedirá de recorrer de parte
diferente da sentença. Versam sobre a legitimidade do assistente de acusação para recorrer, as Súmulas
208 e 210 do STF.
Súmula 208-STF: "O assistente do Ministério Público não pode recorrer, extraordinariamente de decisão
concessiva de habeas corpus."
Súmula 210-STF: "O assistente do Ministério Público pode recorrer, inclusive extraordinariamente, na
ação penal, nos casos dos arts. 584, parágrafo 1º., e 598 do Código de Processo Penal."
O querelante, nas ações de iniciativa privada;
O acusado e seu defensor constituído ou dativo. Nada impede que o acusado interponha ele mesmo o
recurso, mas caberá ao seu defensor arrazoá-lo. Não se exige poderes especiais para que o defensor
possa recorrer. Todavia, não poderá recorrer o advogado que não esteja legalmente constituído ou
nomeado para o réu;
O curador, no caso de réu menor de 21 anos.
2.5 - PRINCÍPIOS
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2.5.1 - PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE
As hipótese de cabimento dos recursos estão enumeradas em lei, e a cada tipo de decisão deve-se
interpor um tipo de recurso adequado.
Entretanto, o recurso sendo um remédio jurídico, o qual atende a necessidade de realização da justiça e
da certeza da aplicação do direito, fundamentado, em regra, no duplo grau de jurisdição, não pode, a
parte, que interpor recurso, ficar prejudicado se se confundir com o tipo de recurso.
Há, portanto, situação em que impera a dívida no advogado, na doutrina e na jurisprudência quanto aos
meio adequado ao reexame da decisão.
Sendo assim, "adotou-se no processo penal o princípio da fungibilidade do recurso, colocando-se acima
da legitimidade formal o fim a que visa a impugnação". (Mirabete, 1996 p. 608). Está previsto no art.
579 do Código de Processo Penal que dispõe: salvo a hipótese de má-fé, a parte não será prejudicada
pela interposição de um recurso por outro.
Reconhecendo o juiz desde logo, a impropriedade do recurso interposto pela parte, deve mandar
processá-lo de acordo com o rito do recurso cabível (art. 579, parágrafo único).
É reconhecido que a lei limita o princípio da fungibilidade, não será admitido o recurso inadequado ao
tipo de decisão, gerando a parte que interpôs agir de má fé.
2.5.2 - PRINCÍPIO DA UNIRRECORIBILIDADE
Atendendo-se ao princípio da singularidade, cada decisão tem um tipo de recurso adequado, não
podendo a parte usar de mais de um meio recursal para combater a mesma decisão. Fundamento
contido no art. 593 § 4º, o qual, exclui qualquer possibilidade de se interpor recurso no sentido estrito
quando o recurso cabível é a apelação.
Contudo, há exceções quanto a este princípio.
"1. Apelação e protesto por novo júri se, na decisão do júri, um crime comporta o protesto, é outro não.
A apelação aguardará a nova decisão decorrente do protesto;
2. O recurso ordinário constitucional, por parte da defesa, da decisão degeneratória de habeas corpus, o
recurso especial e o recurso extraordinário, por parte da acusação, se a denegação for parcial e houver
fundamento nas hipótese constitucionais;
3. O recurso de embargos infringentes, o especial e o extraordinário, se a decisão do tribunal,
desfavorável ao réu, contiver parte não-unânime e parte unânime que, em tese, possibilite os recursos
aos Tribunais Superiores. Os embargos infringentes serão julgados em primeiro lugar, ficando os outros
dois recursos aguardando essa decisão. Julgados os embargos, caberá outro recurso especial e outro
extraordinário quanto à parte decidida nos embargos, se houver fundamento constitucional para isso."
(Greco Filho, 1995 p. 317).
3.0 - APELAÇÃO CRIMINAL
3.1 - RECURSO DE APELAÇÃO
Ao que tudo indica o recurso de Apelação teve suas origens no direito romano, onde era conhecido como
appellatio, que significa dirigir a palavra e era um recurso hierárquico dirigido ao Imperador que se
destinava à impugnação de sentença.
O conceito atual de apelação é segundo Tourinho Filho: " O pedido que se faz à instância superior, no
sentido de reexaminar a decisão proferida pelos órgãos inferiores".
Quanto as suas espécies temos aapelação plena, quando se devolve ao conhecimento do Tribunal ad
quem toda a matéria decidida na primeira instância, ou seja, toda a matéria que gerou sucumbência ; e
a limitada , quando a sucumbência é parcial ou quando o recorrente apela de apenas parte da decisão.
Nesse caso vigora o princípio do tantum devolutum quantum appellatum, não podendo o juízo de 2ª
instância julgar além dos limites do pedido do recurso. Vale ressaltar nesse ponto, que embora o
Tribunal não possa julgar além do pedido do recorrente, ele está autorizado a rever todas as questões
antecedentes que venham a influenciar nesse pedido, ainda que não tenham sido examinadas na
sentença recorrida. Tais limites devem ser fixados na petição ou termo do recurso. E na falta de
limitação do pedido, presume-se que se trata de apelação plena.
3.2 - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE
Por questão de economia processual, um recurso ao ser interposto, fica sob a responsabilidade do órgão
jurisdicional a quo a verificação de que aquele deve ser realmente processado e julgado. Nessa
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verificação, o juiz presta uma importante missão que é a realização do juiz de admissibilidade onde
observará se estão à vista os pressupostos subjetivos e objetivos anteriormente abordados.
Contudo, como expõe Mirabete " em regra, (...), o juízo de admissibilidade do recurso é feito em dois
graus, ressalvada a hipótese de recurso para o mesmo órgão julgador." (Mirabete, 1996, p. 607). Tal
explicação dar-se pois o exame do juiz a quo não retira do juiz ad quem o reexame do pressuposto para
que, em ocasião de não estarem presentes, possa impugnar o recurso.
Ao serem satisfeitos os pressupostos no juízo de admissibilidade, deve o recurso ser conhecido e logo
após ser processado e julgado. Essa é a regra geral de juízo de admissibilidade aplicada aos recursos em
geral, inclusive ao recurso de apelação, objeto dessa obra.
No caso particularizado da apelação criminal, além dos pressupostos da previsão legal, a forma prescrita
em lei e a tempestividade, o juiz a quo deverá apurar mais dois pressupostos: o interesse e a
legitimidade.
Nesse aspecto, a apelação poderá ser interposta apenas pela parte sucumbente, pois, "só tem legítimo
interesse aquele que teve seu direito lesado pela decisão." (Mirabete, 1996, p. 626)
O pressuposto do interesse é bastante importante que "a apelação interposta pelo próprio réu sem ser
arrazoada pelo defensor produz efeito de recurso." (Nogueira, 1995, p. 391)
Há uma jurisprudência bastante interessante do Superior Tribunal de Justiça a respeito do interesse ou
manifestação de vontade da parte vencida que segue:
"PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. MANIFESTAÇÃO DE VONTADE DA PARTE VENCIDA, POR
OCASIÃO DA INTIMAÇÃO DA SENTENÇA CERTIFICADA PELO MEIRINHO. Réu que, ao ser intimado da
sentença condenatória, manifestou seu desejo de recorrer, fato certificado pelo Oficial de Justiça,
consignando-se no mandado, a assinatura do condenado. Manifestação de inconformismo com a
sentença que, por preencher as exigências do art. 578 do CPP, deve ser conhecida e julgada como
apelação. Dissídio jurisprudencial demonstrado. Recurso especial conhecido e provido para que O
Tribunal a quo julgue a apelação como de direito."
(Decisão unânime da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça - Relator: O Senhor Ministro Assis Toledo
- Recorrente: Ministério Publico do estado do Paraná; Recorrido: Paulo Alves - Recurso Especial nº
64.332-PR (95/19875-6) - DJU - I de 02.10.95, página 32.396 - Fonte: Decisões dos Tribunais
Superiores - F3D Publicações Jurídicas - caderno nº 3 - página 30)
Quanto ao interesse, de acordo com o entendimento dos tribunais, "se houver divergência entre o
defensor e réu, alguns entendem que prevalecem a vontade do defensor, por se tratar de um técnico
(RT, 617:287, 609:353), enquanto outros reconhecem que deve prevalecer a vontade do réu, que é
titular do direito (RT, 611:353, 610:368." (Nogueira, 1995, p. 391-392). É fácil perceber que em relação
ao interesse na apelação, a jurisprudência é divergente.
Segundo MIRABETE, segundo a jurisprudência da Revista dos Tribunais, "O defensor de um dos co-réus
não pode recorrer da sentença que absolve outro, ainda que esta absolvição fica sua convicção pessoal,
pois essa decisão não lhe causa gravame." ( MIRABETE, 1995, p. 627)
O ônus da sucumbência, no caso de co-autoria é do co-réu, havendo possibilidade de recurso apenas
desse interessado, se prejudicado pela decisão proferida em relação a outro co-réu. Justifica-se, pois,
análise do recurso pode beneficiá-lo através do efeito extenso previsto no artigo 580 do CPP sendo,
portanto, fundamentado o direito ao recurso.
No juízo de admissibilidade, da apelação, a outra fase importante é a legitimidade do apelante. O
Ministério Público, segundo entendimento da maioria dos doutrinadores e jurisprudências, não tem
legitimidade para apelar da absolutória sentença proferida na ação penal de iniciativa privada, pois fica
ausente da titularidade do jus accusandi, segundo MIRABETE.
Conforme Paulo Lúcio Nogueira, "o promotor de justiça pode recorrer em favor do réu pleiteando
absolvição ou pedindo redução da pena. Há também acórdão em sentido contrário, ou seja, de que não
lhe cabe recorrer de decisão condenatória em favor do réu." (Nogueira, 1995, p. 392)
O Supremo Tribunal Federal já decidiu habeas corpus sobre a legitimidade do assistente donde decidiu:
"HABEAS CORPUS. LEGITIMIDADE DO ASSISTENTE PARA RECORRER DA SENTENÇA ABSOLUTÓRIA,
DESDE QUE NÃO FAÇA O ÓRGÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CÓDIGO PENAL, ART. 598. Recurso do
assistente provido para condenar-se o paciente a um ano e seis meses de detenção pelos crimes de
homicídio culposo e lesões corporais culposas, decretando-se, entretanto, desde logo, a extinção da
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punibilidade pela prescrição, em fase da pena concretizada do acórdão e diante da orientação do STF,
anteriormente a lei 6416/1977, quando o evento aconteceu. Alegação de ilegitimidade do assistente,
apenas de vítimas de lesões corporais, para pleitear condenação, também, pelo delito de homicídio
culposo. Extinta a punibilidade pela prescrição da ação penal, matéria não impugnada, força e reconhece
que nenhum interesse remanesce, para o paciente, que não impugna sua condenação, ao menos, pelo
crime de lesões corporais. Habeas Corpus que não se conhece."
(Votação unânime, tendo resultado não conhecido. Relator: Ministro Neri da Silveira. Julgamento da
primeira turma. Processo: HC-62664; Habeas Corpus. Publicação: Diário da Justiça de 10-05-85, pg.
06851. Data do julgamento: 22/03/1985. Fonte: Home Page do Supremo Tribunal Federal.)
Em outro julgamento, o STF decidiu da seguinte forma:
"Não tendo o Ministério Público apelado, tem interesse legível, para fazê-lo, o assistente da acusação, a
fim de obter o agravamento da pena. Precedentes do Supremo Tribunal.
Iniciativa concorrente do Ministério Público para a ação penal regida pela lei nº 4.611-65.
Inexistência de cerceamento de defesa de nulidade de sentença, bem como de irregularidade de
intimação para o julgamento da apelação.
Pedido deferido, em parte, para correção de erro aritmético no cálculo da pena."
(Votação: unânime. Resultado: conhecimento e deferimento em parte. Relator: Ministro Octávio Gallotti.
Processo: HC-66754; Habeas Corpus. Julgamento: 1ª turma no dia 18/11/1988. Publicação: Diário da
Justiça do dia 16/12/1988, página 33.514. Fonte: Home Page do Supremo Tribunal Federal.)
Entrementes, a corte suprema já sumulou sobre a possibilidade e legitimidade do assistente recorrer,
como poderemos ver no entendimento da Súmula 210 de 16/12/1963:
"O assistente do Ministério Público pode recorrer, inclusive extraordinariamente, na ação penal, nos
casos dos artigos 584, parágrafo I e 598 do Código de Processo Penal.
(Fonte: Home Page do STF)
Já na Súmula 208 do Tribunal Supremo assim ficou entendido:
"O assistente do Ministério Público não pode recorrer, extraordinariamente, de decisão concessiva de
Habeas Corpus."
(Fonte: Código de Processo Penal da Editora Saraiva)
Conclui Paulo Lúcio Nogueira dizendo: "Quer-nos parecer que o Ministério Público, em regra, não pode
recorrer em favor do réu por lhe faltar legítimo interesse e por não ser parte sucumbida, mesmo quando
tenha pedido sua absolvição, pois o real interesse é da defesa." (Nogueira, 1995, p. 392)
3.3 - FACULDADE
A regra que impera nos recursos em geral é que trata-se de uma faculdade a interposição dos mesmos,
regendo-se assim pelo princípio da voluntariedade. Dessa forma, a apelação também é uma faculdade,
sendo sua interposição desobrigatória, mesmo em si tratando de defesa dativa.
A Constituição da República Federativa do Brasil no seu artigo 5º, inciso LV, tutela a garante a ampla
defesa do acusado, obrigando o juiz a zelar pela efetividade. Entretanto, "Não se pode constranger o
acusado ou seu patrono a que use todos os meios que a lei coloque a sua disposição do desdobramento
de sua defesa. Tem assim o acusado certa disponibilidade que a lei marca por prazo que estabelece. Por
isso, não é possível obrigar-se o defensor dativo a apelar." (MIRABETE, 1996, p. 629)
Como foi dito, o princípio da voluntariedade do recurso tem privilégio no Direito Penal Processual,
ressalvado os casos onde a lei torna o recurso obrigatório, como por exemplo, a remessa de ofício do
juízo a quo para o juízo a quem no chamado "recurso de ofício", nomenclatura repugnada por certos
doutrinadores. O certo seria nomear como processo em que há necessidade obrigatória do duplo grau de
jurisdição.
Em suma, voluntária é a apelação do defensor em relação a sentença condenatória contra o seu
assistido. Segundo Júlio Mirabete, não necessita de poderes especiais a procuração para que o defensor
exerça o direito de recorrer, podendo inclusive o defensor público ou advogado dativo, sem a anuência
expressa do acusado interpor o recurso de apelação.
A renúncia e a desistência da apelação, segundo entendimento firmado pela maioria dos doutrinadores,
necessita ser exercida pelo próprio réu, além da manifestação perante a autoridade judicial que reduzirá
a termo. Contudo, são ambos atos irrevogáveis, ou seja, não se admite ser reavivado em posteriores
manifestações, exceto nos casos de vícios resultantes da vontade. Ao serem manifestadas, produzem
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desde logo efeitos sobre o mérito e o direito. A homologação faz-se desnecessária, visto que a natureza
do ato é meramente declaratória.
3.4 - APELAÇÃO DA SENTENÇA DE JUIZ SINGULAR
O Código de Processo Penal Brasileiro estatui no seu artigo 593, incisos I e II, as hipóteses pelas quais
pode-se impetrar o recurso de apelação da sentença do juiz singular
A hipótese primeira trata-se das sentenças definitivas de condenação ou absolvição. São sentenças
condenatórias aquelas em que julga o juiz procedente, total ou parcialmente os pedidos do autor em
relação ao réu no Processo Penal, ou seja, aquelas em que exista parcial ou total procedência da
imputação da pena. As absolutórias são, a contrário senso, aquelas em que é imputação da pena é
julgada improcedente pelo juiz.
Existem exceções a essa primeira hipótese que são: os casos de absolvição sumária nos processos do
Tribunal do Júri, da qual cabe o recurso da qual cabe o recurso em sentido estrito; e também, o recurso
de ofício.
A segunda hipótese é das decisões definitivas, ou seja, as sentenças definitivas em sentido onde há
julgamento do mérito, entretanto, sem absolver ou condenar, mas encerrando-se a relação processual.
A hipótese terceira é a das chamadas interlocutórias mistas, ou, como o próprio legislador expõe, das
decisões com força de definitivas, onde não há decisão de mérito, encerrando a relação processual,
operando-se terminativamente, ou pondo termo a uma fase processual, nesse caso, não tendo efeito de
decisões terminativas.
Tratam-se de exemplos de decisões definitivas (stricto sensu): a autorização de levantamento de
seqüestro; de restituição de coisas apreendidas; indeferimento de pedido de justificação, dentre outras.
São exemplos de decisões com força de definitivas (interlocutórias mistas): as que remetem as partes
ao juízo civil no pedido de restituição de coisas apreendidas; o indeferimento do pedido de aditamento
ao libelo, dentre outras.
3.5 - APELAÇÃO DAS DECISÕES DO TRIBUNAL DO JÚRI
No que concerne às apelações das decisões do tribunal do júri, temos a sua base regulada pelo art. 593,
III, "a" a "d", do CPP.
Inicialmente podemos observar ser esse tipo de recurso bem diferenciado daqueles originados em razão
de decisões proferidas pelo juiz singular, posto que, enquanto das mencionadas decisões o efeito da
apelação assume um caráter devolutivo, ou seja, a lide é devolvida para nova apreciação pelo juízo "ad
quem" , nas apelações de decisões do tribunal do júri essa apreciação assume um caráter restrito, sem
a devolução do conhecimento pleno da causa, limitando-se o tribunal de apelação a um conhecimento
ditado pela lei. Em razão de sua natureza não há devolução à superior instância do conhecimento
integral da causa criminal. Isso ocorre em razão de que as decisões do tribunal do júri assumiram o
"status" de garantia constitucional, impossibilitando assim interferências em seu conteúdo. É o que foi
disposto no art. 5º, XXXVIII, "c", da CF, onde estabelece que é reconhecida a instituição do júri,
assegurada a soberania dos veredictos.
Partindo objetivamente para a prática dessas apelações, temos como primeira situação de
admissibilidade aquela determinada pelo art. 593, III, "a", onde estabelece a possibilidade de apelação
das decisões do júri quando ocorre nulidades posteriores à pronúncia.
Devemos, de pronto, verificarmos que nulidades são essas. Constatamos que são aquelas nulidades
estabelecidas pelo art. 564, III, "f" a "k", do CPP, como por exemplo: falta de quesitos e respostas, falta
de intimação das testemunhas arroladas no libelo e na contrariedade ao libelo, falta de intimação do réu
para a sessão de julgamento, entre outros. Deve-se observar, no entanto a diferença para o caso de ser
uma nulidade absoluta ou relativa, visto que esta é passível de preclusão se não impugnada após as
formalidades para o julgamento, enquanto que aquelas não sofrem esse tipo de restrição.
Assim é que caso o tribunal "ad quem" acate, dê provimento, a uma alegação de nulidade, os atos são
anulados para que haja uma renovação na primeira instância até que possam vir a ser conclusos para
um novo julgamento. Devemos esclarecer que essa ocorrência não fere o princípio constitucional da
"soberania dos veredictos" em razão de que o julgamento se tornou insubsistente ao passo que os atos
anteriores ao seu intento estavam viciados. Não houve modificação da decisão e sim a declaração de sua
inexistência jurídica.
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No art. 593, III, "b", do CPP, temos a admissibilidade de recurso da decisão do tribunal do júri para
casos em que a sentença for contrária à lei expressa ou à decisão dos jurados.
Verificamos ser esse um caso em o que se dispõe em apreço não é o veredicto dos jurados - estando
eles fora de apreciação - e sim a sentença que é proferida pelo juiz-presidente da sessão de julgamento,
quando se observa ter sido a sua decisão diversa daquela que deveria ter sido proferida caso fossem
observadas as alegações do tribunal do júri ou ainda no caso da própria lei. Respeita-se o regular
pronunciamento dos jurados que não pode ser atacado. Nesse caso o tribunal de apelação fará as
retificações necessárias, posto que profere uma nova decisão em substituição àquela prolatada pelo juizpresidente da sessão.
Temos ainda o caso de apelação quando houver erro ou injustiça no tocante à aplicação da pena ou da
medida de segurança. É o que dispõe o art. 593, III, "c", do CPP.
Esse ponto é alvo atualmente de grandes questionamentos doutrinários no que toca ao seu alcance, não
sendo definido até que ponto ele seria admissível sem que atingisse a garantia constitucional da
soberania dos veredictos do tribunal do júri.
É de se ver inicialmente que o dispositivo legal alcançaria os casos em que na sentença o juiz-presidente
não acolhe as razões dos membros do júri e interferisse nas causas de aumento ou diminuição da pena,
bem como nas agravantes ou atenuantes, para melhorar ou piorar a situação de quem sofreu o
apenamento. Essa seria a situação lógica que não atingiria aquilo que foi decidido pelo júri. Porém,
existem entendimentos mais extensivos, entre eles o próprio Supremo Tribunal Federal, onde se poderia
impugnar decisões do tribunal do júri que fossem mais ou menos elevados do que o justo para a espécie
em apreço. Esse entendimento tem apoio na irrecorribilidade das decisões do tribunal do júri, o que
acarretaria graves danos para o prejudicado, sem que pudesse recorrer para corrigir as injustiças. É um
entendimento que foge dos laços estritamente legais para acolher valores morais de maior significância
para o mundo fático e garantir princípios de maior relevância individual. Porém, não podemos deixar de
frisar que o entendimento por último mencionado fere as disposições legais e o princípio resguardado
pela Constituição Federal do nosso país no que concerne às decisões do tribunal do júri. É um tema que
se resume em saber o que é mais importante a nível de sociedade.
Por fim, no que toca a admissibilidade de apelação em razão de decisões do tribunal do júri, temos que
é possível quando a decisão dos jurados for manifestamente contrária à prova dos autos. É o que está
disposto no art. 593, III, "d", do CPP. Para esse último caso verificamos a possibilidade da entrada no
"mérito da questão" para que haja uma nova análise. É uma espécie de recurso diferente no que
podemos dizer que interfere superficialmente na decisão do júri, só que não em seu conteúdo. No que
concerne à abrangência desse dispositivo podemos entender que pode ser utilizado para os casos em
que há total discrepância entre o que foi colhido nos autos e aquilo que foi decidido pelo conselho leigo
quando agiu sem a menor concordância com a logicidade presumida em situações idênticas. Isso não
significa que não possa dar interpretação que considera conveniente. Pode, desde que essa
interpretação esteja em consonância com as provas dos autos.
Um ponto discutível nesse item é acerca da abrangência da apelação, entendendo boa parte da doutrina
que deveria ela tratar apenas da questão principal, ou seja, existência do crime, autoria,
responsabilidade; enquanto outra parte, entende que se admite na apelação a inclusão de pontos
secundários como aumento de pena, entre outros. Nosso entendimento é no sentido de admissibilidade
da inclusão de pontos secundários, caso provenha de situação contrária à prova dos autos por ser o
meio viável para dar a possibilidade de uma nova apreciação.
Para o caso desse último item, a nova apreciação deve ser feita por novo julgamento, através de
conselho de jurados. É o que dispõe o art. 593, § 4º, do CPP. Entendemos desnecessária essa afirmação
em razão da garantia constitucional, já mencionada, da soberania das decisões do tribunal do júri. Com
isso não poderia o tribunal "ad quem" fazer uma apreciação do mérito da causa e tão-somente das
condições de admissibilidade da apelação.
Podemos ainda tecer considerações sobre o parágrafo terceiro do artigo 593 do CPP no que se refere a
impossibilidade de segunda apelação por motivo idêntico ao anterior. O legislador pretendeu com isso
evitar que a parte utilizasse da má-fé para acionar por diversas vezes o juízo quando o caso foi alvo de
apreciação, duas vezes pelo tribunal do júri, onde aqueles motivos, fundamentos, que levaram à
apelação já foram apreciados, quer modificados, quer não. Claro deve ser que existe a possibilidade de
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um terceiro julgamento, desde que a apelação não tenha como fundamento legal situação anteriormente
apreciada.
3.6 - PRAZO PARA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO DE APELAÇÃO
No que concerne ao prazo para a interposição de recurso de apelação dispomos do art. 593, "caput", do
CPP, ficando estabelecido que "caberá apelação no prazo de 5(cinco) dias" contados da intimação; bem
como no art. 598, "caput", onde prevalece que "nos crimes de competência do tribunal do júri, ou do
juiz singular, se da sentença não for interposta apelação pelo Ministério Público no prazo legal, o
ofendido ou qualquer das pessoas enumeradas no art. 31, ainda que não se tenha habilitado como
assistente, poderá interpor apelação, que não terá, porém, efeito suspensivo". E no parágrafo único
desse mesmo artigo fica ditado que "O prazo para interposição desse recurso será de 15(quinze) dias e
correrá do dia em que terminar o do Ministério Público".
Tecendo considerações em relação ao primeiro prazo mencionado que é de cinco dias, podemos dizer
que é ele o prazo genérico das apelações. Esse prazo começa a correr a partir da ciência da parte
sucumbente, quer seja pessoalmente, quer através de publicação oficial, devendo ficar claro que no caso
de sucumbência do Ministério Público o prazo começa a correr da intimação que deve ser com a ciência
do Promotor Público.
Em relação ao denunciado vencido o entendimento jurisprudencial é no sentido de que não basta a
simples intimação do réu para que se inicie a contagem do prazo recursal, e sim também do seu
defensor, considerando como marco inicial, para a contagem do prazo recursal a última intimação.
Nesse sentido dispomos do julgado proferido em Minas Gerais que assim dispõe:
"Recurso Crime - Prazo - Início a partir da intimação do defensor constituído. Não basta a intimação do
réu, mas também a de seu defensor, para que se inicie a contagem do prazo recursal."
TAMG - Ap. 12.465 - Entre Rios de Minas - 2ª C. - j. 17.2.86 - rel. Juiz José Loyola - v.u. (RT 612/390).
Para fazermos uma melhor análise de quando devemos começar a contar o prazo não podemos
esquecer, o que deve ser mais importante é a data da interposição do recurso. Não importa a data em
que o juiz teve conhecimento ou a data em que proferiu o despacho de recebimento, sequer pela
demora de protocolo em cartório. É a boa-fé do apelante que deve nortear o transcurso da apelação.
Nesse sentido são as súmulas n.ºs. 428 e 320 do STF.
Ainda com relação ao prazo de 5(cinco) dias, a maior parte da doutrina ainda entende que para o caso
de intimação por carta precatória o prazo começaria a ser contado da juntada da mencionada carta aos
autos. O Código de Processo Penal é omisso no tocante a esse ponto, por isso a jurisprudência entende
que deve ser aplicada subsidiariamente a legislação civil.
Em relação ao segundo prazo previsto para a apelação, que é de 15(quinze) dias, está ele previsto para
o caso de recurso subsidiário em razão da inércia do Ministério Público para a apelação. A primeira
hipótese é o caso de o ofendido não ficar satisfeito com a não interposição do recurso por parte do
Ministério Público, caso em que disporá do mencionado prazo, contado imediatamente após aquele
dispensado ao Ministério Público, fazendo assim jus ao prazo dilatado em razão da menor condição e
necessidade de busca de advogado, no afã de viabilizar o recurso. Assim dispõe decisão prolatada em
Presidente Prudente, assim publicada:
"Prazo - Matéria criminal - Apelação - Interposição pela vítima, habilitada nos autos, como assistente,
após a sentença - Manifestação nos 15 dias contados da prolação daquela - Tempestividade Inteligência dos arts. 584, § 1º, e 598 do CPP. O prazo do assistente para apelar, desde que não se
habilitou nos autos antes da sentença, é de 15 e não de cinco dias."
Rec. 254.973 - Presidente Prudente - 3ª C. - recte.: Daniel Luiz de Freitas - recda.: Justiça Pública - j.
18.12.80 - rel. Juiz Geraldo Gomes - v.u. (RT 555/376)
Porém, ainda nesse ponto restou dúvida para o caso em que o ofendido já estivesse habilitado nos autos
como assistente, se deveria gozar desse privilégio sem uma justificativa plausível, vez que obteve
conhecimento da decisão em momento idêntico ao Ministério Público. A súmula 448 do STF resolve a
questão quanto ao marco inicial, dispondo que " o prazo para o assistente recorrer supletivamente
começa a correr imediatamente após o transcurso do prazo do Ministério Público". Note-se, porém, que
o prazo é de 5(cinco) dias, visto que o assistente habilitado anteriormente não pode ter prazo mais
dilatado que o Ministério Público. Decisão nesse sentido foi publicada em Minas Gerais, dispondo que:
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"Recurso Crime - Apelação - Interposição pelo assistente do Ministério Público, habilitado no curso da
ação penal - Prazo - Incidência após o término do conferido ao promotor público - Intempestividade
caracterizada - Não conhecimento - Inteligência do art. 598, parágrafo único, do CPP - Aplicação do
princípio da isonomia."
TAMG - Ap. 11.588 - Presidente Olegário - 1ª C. - j. 26.09.85 - rel. Juiz Elisson Guimarães - v. u. (RT
612/390)
O prazo de quinze dias permanece para os casos de habilitação tardia, merecendo assim maior prazo.
Por fim, um outro ponto que gera polêmica na jurisprudência é com relação ao advento da audiência
admonitória ou de advertência do "sursis". Essa audiência, feita após o trânsito em julgado da sentença,
portanto com intimação das partes no que tange ao decisório, não reabre o prazo recursal. Nesse
sentido é o decisório proferido em Minas Gerais, assim publicado:
"Recurso Crime - Apelação - Prazo - Pretendida incidência a partir da audiência admonitória Inadmissibilidade - Hipótese em que o defensor do réu já foi intimado da sentença condenatória Recurso não conhecido - Inteligência da Lei 7.210/84. Com o advento da Lei n.º 7.210/84, a audiência
admonitória sobrevem ao trânsito em julgado da sentença condenatória, pelo que se prematuramente
realizada, não se pode pretender que dela tenha início o prazo recursal quando intimado da sentença
condenatória já tenha sido o réu ou seu defensor constituído."
TAMG - Ap. 12.934 - Cássia - 2ª C. - j. 19.8.85 - rel. Juiz Edelberto Santiago - v.u. (RT 612/390)
Como também decisório proferido no TJMT, dispondo que:
"Recurso Crime - Apelação - Interposição no qüinqüídio, contado da audiência admonitória do "sursis" Não conhecimento - Réu que anteriormente fora intimado da decisão - Sua condição, ademais, de
afiançado - Embargos rejeitados - Inteligência do art. 392, II, do CPP."
TJMT - Ap. 56/79 (Einfrs.) - Alto Garças - Cs. Reuns. - embte.: Josino Pereira Guimarães - embda.:
Justiça Pública - j. 15.5.80 - rel. Des. Atahide Monteiro da Silva - m. v. (RT 559/400)
Porém, outra parte da jurisprudência considera irrelevante a intimação anterior à audiência, sendo
favorável ao cabimento da apelação nos cinco dias posteriores à audiência. Dispõe nesse sentido
decisório proferido em Batatais, assim publicado:
"Recurso Crime - Apelação - Interposição dentro do qüinqüídio após a audiência de "sursis" - Réu e
defensor já anteriormente intimados da sentença - Irrelevância - Conhecimento - Critério mais liberal Preliminar repelida. Tempestiva é a apelação interposta dentro do qüinqüídio após a audiência de
"sursis", mesmo que o réu e seu defensor tenham sido anteriormente intimados da sentença."
Ap. 10409-3 - Batatais - 2ª C. - apte.: Ademir Sestari - apda.: Justiça Pública - j. 11.3.82 - rel. Des.
Prestes Barra - v. u. (RT 560/324)
3.7 - PROCESSAMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO
Tratando do processamento do recurso de apelação, temos que existem duas fases de desenvolvimento.
Uma realizada no juízo "a quo" e outra no juízo "ad quem". Passaremos então a essas fases.
A fase inicial, realizada no juízo de primeira instância é aquela da interposição do recurso, podendo o
apelante utilizar-se de formas indeterminadas, desde que atenda a finalidade de cientificar o juízo do
seu objetivo de inconformismo com o julgamento obtido e anseio de reavaliação da causa.
Assim, "assinado o termo de apelação, o apelante e, depois o apelado terão o prazo de 8 (oito) dias
cada uma para oferecer razões, salvo nos processos de contravenção em que o prazo será de 3 (três)
dias". (art. 600, "caput", do CPP). Como já visto, a parte dispõe de um prazo para apelar, podendo ser
de 5 (cinco) dias ou 15 (quinze) dias, a depender da situação, e de outro para apresentar as suas
razões, ou seja, a sua fundamentação, em que está se baseando para desejar uma nova apreciação da
lide. Tem lógica essa separação de prazos, visto que uma parte não poderia ter um prazo tão exíguo
para fundamentar sua apelação, bem como agiliza a prestação jurisdicional, caso não haja desejo de
recurso pelas partes.
O parágrafo 1º, do art. 600, do CPP, estabelece que "se houver assistente, este arrazoará, no prazo de
3 (três) dias, após o Ministério Público". De início poderíamos imaginar que haveria um cerceamento no
tocante ao prazo do assistente, o que não condiz com a realidade em razão de que dispôs, além daquele
prazo oferecido ao Ministério Público, de mais de 3(três) dias para formular as suas razões, caso sejam
necessárias.
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Diz o art. 600, § 2º, do CPP, que se "a ação penal for movida pela parte ofendida, o Ministério Público
terá vista dos autos, no prazo do parágrafo anterior", ou seja, três dias. Podemos afirmar que aqui
temos a situação anterior de forma invertida, tendo em mente que o Ministério Público é que terá o
prazo de 11 (onze) dias para apresentar as suas razões.
Estabelece o art. 600, § 3º, do CPP, que "sendo dois ou mais os apelantes ou apelados, os prazos serão
comuns" Desse dispositivo se extrai a idéia de que os prazos devem correr em cartório caso as partes
não acordem de forma diversa, visto que não se poderia privilegiar uma parte com prazos maiores em
razão de quantidade. A exceção que se faz a isso é com relação ao Ministério Público, que deve ter vista
dos autos fora do Cartório. No tocante aos demais, são intimados da decisão através da Imprensa
Oficial, não dispondo do privilégio do órgão do "Parquet" (Lei n.º 9.271, de 17.04.1996).
Seguimos então para a segunda fase do processamento, que ocorre no juízo "ad quem", visto que
ultrapassada a fase inicial. Caso a apelação ultrapasse as fases de primeira instância, com a
apresentação do recurso e razões, oportunidade para contra-razões, preenchimento dos requisitos para
admissibilidade, então os autos serão remetidos à superior instância. O art. 601, "caput", do CPP, dispõe
que: "Findos os prazos para razões, os autos serão remetidos à instância superior, com as razões ou
sem elas, no prazo de 5(cinco) dias, salvo no caso do art. 603, segunda parte, em que o prazo será de
30(trinta) dias". O art. 603, do CPP, menciona os casos em que devem ficar traslado dos termos
essenciais do processo em cartório por razão da distância, nos casos em que a comarca não é sede de
tribunal de apelação. A distância explica o maior prazo dispensado.
Assim, remetidos os autos ao tribunal de apelação, caso já existam razões de apelação, será feito um
novo juízo de admissibilidade para então levá-lo a novo julgamento com inclusão em pauta.
Há casos porém que o apelante prefere apresentar as suas razões no próprio tribunal. Situação essa
prevista no art. 601, "caput", do CPP, já mencionado, e regulada pelo art. 600, § 4º, do CPP, onde
expõe que "Se o apelante declarar, na petição ou no termo, ao interpor a apelação, que deseja arrazoar
na superior instância, serão os autos remetidos ao tribunal ‘ad quem’ onde será aberta vista às partes,
observados os prazos legais, notificadas as partes pela publicação oficial". Como se vê o que se
diferencia da situação anterior é que para esse caso aquilo que deveria ter sido feito no juízo "a quo", no
tocante às intimações necessárias e prazos para as razões e contra-razões, será feita no juízo "ad
quem", em razão de faculdade permitida por lei, o que não deixa de ser um benefício ao apelante, que
disporá de maior prazo para as suas razões.
Por último não podemos deixar de mencionar uma situação diferenciada que é o caso de dois ou mais
réus, o que deverá ser feito caso não haja apelação de todos para não tumultuar o processo. O art. 601,
§ 1º, do CPP, resolve o problema, impondo que: "Se houver mais de um réu, e não houverem todos sido
julgados, ou não tiverem todos apelado, caberá ao apelante promover extração do traslado dos autos, o
qual deverá ser remetido à instância superior no prazo de 30(trinta) dias, contado da data da entrega
das últimas razões de apelação, ou do vencimento do prazo para a apresentação das do apelado". Assim
o dispositivo resolve a situação de tumulto processual, evitando que a eficácia da decisão fique suspensa
em relação àqueles que não apelaram, contribuindo para a agilização processual no sentido de justiça.
3.8 - DESERÇÃO DA APELAÇÃO
Enquadra-se dentro das formas de extinção do recurso de apelação, sendo no entanto, uma forma
anormal de extinção deste recurso, a qual se verifica quando ocorrer a fuga do réu depois de haver sido
interposto o referido recurso por ele. Para tanto, mesmo que venha o réu a ser capturado, sua apelação
será considerada deserta,e , esta não possuirá validade havendo de conseguinte o trânsito em julgado
da sentença, de acordo com o art. 595 do CPP que mensa: "Se o réu condenado fugir depois de haver
apelado, será declarada deserta a apelação".
O efeito da deserção se verifica somente quando a apelação for interposta pelo réu, e não pelo Ministério
Público, quando, em sua atuação como custos legis, recorrer em favor do condenado. Para tanto,
quando a interposição do recurso ocorre estando o condenado em liberdade, não há que se falar em
deserção, haja vista não ter sido ele localizado; o que pode acontecer é o não conhecimento do recurso
se na sentença não foi concedida a liberdade provisória.
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Não se identificará o caso de deserção quando, o réu solto sob fiança, ocorrer hipóteses de sua cassação
ou quebramento, onde deverá recolher-se à prisão para apelar ou se prosseguir no processamento do
recurso.
Estando o réu foragido após o julgamento do recurso, evidentemente não se cogitará a suposição de
deserção.
A enunciação do juiz de que houve a deserção é simples formalidade e a sua omissão não permite o
julgamento do recurso, ou seja, tendo acontecido a fuga do condenado após a interposição do recurso a
esta sanção jurídica - deserção - aplica-se de imediato; assim sendo, pode-se afirmar que a deserção é
um despacho declaratório, não facultativo, de catáter imperativo e de aplicabilidade automática.
Importará em deserção as ações intentadas por queixa, diante do não pagamento das custas, nos
prazos fixados em lei ou determinados pelo juiz.
Sendo a jurisprudência hábil à dirimir conflitos, evidencia-se que esta é pacífica ao afirmar que a captura
do réu condenado não torna sem efeito a deserção, como adiante enseja o Respeitoso julgado:
EMENTA: Direito Penal e Processual Penal.
Apelação de réu preso. Fuga. Deserção(art. 595 do Código de Processo Penal).
Prescrição.Art. 117, V do Código Penal.
1. Se o réu, necessáriamente preso para apelar, foge da prisão, após a interposição do apelo, este deve
ser julgado deserto(art. 595, do C.P.Penal), mesmo que recapturado o apelante antes do julgamento.
2. Não pode ser considerada, como termo "ad quem" do praso prescricional, a data da impetração do
"habeas corpus", com alegação de prescrição da pretenção executória se, antes disso, o paciente foi
preso e está cumprindo a pena, em face do disposto no art. 117, inc. V, do C. Penal.
3. "H.C" indeferido.
Relator: Ministro Sydney Sanches. Paciente: Israel Messias da Cunha. Coator: Tribunal de Alçada
Criminal do Estado de São Paulo. Supremo Tribunal Federal - STF.
3.9 - EFEITOS DA APELAÇÃO
O recurso de apelação enseja efeitos devolutivo e suspensivo. O primeiro vislumbra-se ao fato de
permitir ao Tribunal competente o reexame da matéria mensada na apelação, estando porém, adstrito
aos limites do princípio "tantum devolutum quantum appelatum". Quanto ao segundo - efeito suspensivo
- enumera o art. 597 do CPP "a apelação de sentença condenatória terá efeito suspensivo, salvo o
disposto no art. 393, a aplicação provisória de interdições de direitos e de medidas de segurança (arts.
374 e 378), e o caso de suspensão condicional da pena", desse modo, sendo interposto o apelo da
sentença condenatória, não poderá dar início a execução da pena imposta ao condenado.
A Lei de Execução Penal - LEP - em seu art. 105, considera que a interposição do apelo procrastina a
formação da coisa julgada, retardando de conseguinte, a execução da sentença condenatória, causando
outrossim o que Afrânio Silva Jardim denomina "de efeito da dilação procedimental". Dessa mesma
maneira, ocorre com a sentença absolutória em que foi imposta medida de segurança, haja vista que tal
medida só será passível de execução após a expedição da guia pela autoridade judiciária, ou seja, após
o trânsito em julgado.
Para tanto, o efeito suspensivo da apelação apresenta várias exceções como enseja o caput do art. 596
"a apelação da sentença absolutória não impedirá que o réu seja posto imediatamente em liberdade", e
ainda, as exceções elencadas no art. 597 do CPP, onde faz uma ressalva ao constante no art. 393,
condizente a aplicação provisória de interdição de direitos e de medidas de segurança, e ainda, o caso
de suspensão condicional da pena. Quanto a exceção prevista no art. 393, inc.I, a qual prevê que o réu
será preso ou conservado na prisão, assim nas infrações inafiançáveis, como nas finaçáveis enquanto
não prestar fiança; esse dispositivo não tem aplicabilidade quando a ocorrência de uma das hipóteses
em que o réu pode apelar em liberdade, dando desse modo à sentença efeito suspensivo. Em relação ao
inc.II do prefalado artigo, o lançamento do nome do réu no rol dos culpados com a sentença
condenatória infringe frontalmente a Constituição Federal em seu art.5º, inc.LVII, que impede ser
alguém considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Divergem a doutrina e os tribunais por exelência o Egrégio STF, ao mensar a respeito do recurso de
apelação de sentença absolutória proferida pelo Tribunal de Júri, dando-se provimento ao recurso do
Ministério Público voltando o réu à circunstância anterior ao julgamento; restabelecendo-se desse modo,
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os efeitos da sentença de pronúncia, sendo o réu recolhido à prisão com a mantença da decisão de
pronúncia.
3.10 - REFORMATIO IN MELIUS
Norteado no princípio do "ne eat judex ultra petita partium" o qual, enseja que não pode o juiz julgar
além do pedido da parte; então, não pode o Tribunal ad quem, em recurso exclusivo da acusação, em
favor do réu reformar a decisão, quer seja agravando-lhe a pena, quer seja abrandando-lhe. Sendo esse
o entendimento do STF, onde deixa a mostra a não possibilidade da reformatio in melius, tendo em vista
que existe coida julgada para o réu, incidindo dessa maneira no princípio "tantum devolutum quantum
appellatum" o qual não permite essa possibilidade.
A reformatio in melius é aceita pela maioria dos doutrinadores como também pelos Tribunais Estaduais.
Conquanto, têm se decidido que em se tratando de recurso de apelação emanado da acusação, possuirá
este vasto efeito devolutivo, proibindo-se a reformatio in pejus, em assim agindo, os Tribunais possuem
o poder de julgar além do pedido em prol do condenado em recurso de exclusividade da acusação.
De pe se, caracteriza-se a reformatio in melius quando há a proibição da aplicação de pena mais severa
quando se der ao fato definição jurídica diferente da constante na denuncia ou queixa.
3.11 - REFORMATIO IN PEJUS
Diante da não plenitude do efeito devolutivo do recurso de apelação, o qual permite o reexame da
matéria decidida na sentença do Juiz de primeiro grau; não é possível que o julgamento desse recurso
resulte em decisão desfavorável à parte que interpôs o apelo, e, estando o Tribunal adstrito ao pedido
laborado em tal recurso, não haverá admissibilidade quanto a decisão proferida extra ou ultra petium;
significando outrossim, que não a que se falar em reforma da sentença para agravar a situação do réu,
isto quando o apelo for por este interposto; em síntese, nessa circunstância proibe-se a reformatio in
pejus.
A não permissão da reformatio in pejus torna inadmissível que seja aceita nulidade que não fora arguida
pela acusação, motivo pelo qual prejudicaria o recorrido, de conformidade com a Súmula 160 do STF e,
que em recurso da acusação para a anulação do julgamento do Tribunal do Júri, sendo o pedido apenas
para anular a sentença, ensejando desse modo um julgamento extra petita
A conformação do Órgão do Parquet com a decisão proferida pelo juiz de primeiro grau, não apelando
desta, lastreado na reformatio in pejus, não pode o Juiz ad quem proferir uma decisão mais gravosa
para o réu, tal é o entendimento da grande jurisprudência e doutrina.
Não se vislumbra a reformatio in pejus nas decisões que sejam mais severas para o réu se o recurso de
apelação foi interposto pelo Ministério Público, então, este recurso ora interposto consagrar-se-á
prejudicado, haja vista a plausibilidade do recurso de apelação interposto pelo réu no Juízo de Primeira
Instância.
A regra da reformatio in pejus não possui aplicabilidade para limitar a soberania do Tribunal do Júri,
sendo justificado pelo insigne doutrinador Mirabete que "não pode a lei ordinária impor-lhe limitações
que retirem a liberdade de julgar a procedência ou a improcedência da acusação, bem como a
ocorrência, ou não, de circunstâncias que aumentem ou diminuam a responsabilidade do réu, em virtude
de anulação de veredito anterior por decisão da Justiça togada" (Mirabete, 1996, p. 648)
Valendo-se da jurisprudência para elucidar a reformatio in pejus, o STF assim decidiu:
EMENTA: Habeas Corpus. Júri. Anulação do julgamento pelo Tribunal de Justiça.
2. O paciente foi condenado por homicídio qualificado consumado e por homicídio tentado. Recorreu da
decisão do Júri, tão-só, quanto à condenação pelo homicídio consumado.
3. Quanto à condenação por homicídio tentado, não houve apelação nem do Ministério Público, nem do
réu, ora paciente.
4. O Tribunal anulou o julgamento amplamente, por vício formal, determinando que o réu fosse
submetido a novo pronunciamento do Júri, também de referência ao homicídio tentado.
5. Alegação, no habeas corpus, de reformatio in pejus.
6. A apelação do réu ensejava à Corte julgadora anular o julgamento no que se referia à condenação por
homicídio qualificado consumado. Ao determinar, entretanto, o Tribunal local a renovação integral do
julgamento, pelo Júri, também quanto ao crime tentado, contra cuja condenação não houve apelação,
ultrapassou os limites do recurso.
7. Na inicial o impetrante alega que houve reformatio in pejus, pois a decisão prejudica ao paciente.
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8. Habeas Corpus deferido para, cassando em parte o acórdão referente à apelação criminal, afastar a
determinação de o paciente ser submetido a novo julgamento pelo Júri, quanto ao homicídio tentado.
Relator: Ministro Neri da Silveira. Paciente: Euclides Antonio Penteado. Impetrante: Waldir Francisco
Honorato Júnior. Coator: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Deferimento. Votação: unânime;
em 19/11/96.
4 - CONCLUSÃO
Apresentadas as disposições ulteriores, onde fizemos uma abordagem sobre os recursos em geral a
doutrina se apresenta uniforme quanto ao conceito e fundamentos, havendo divergência no tocante à
sua Natureza Jurídica. Quanto a classificação cada doutrinador a particulariza de acordo com o seu
próprio entendimento, alguns classificando quanto as espécies de recurso e outros quanto ao fim do
recorrente, ao órgão jurisdicional ao qual é endereçado, quanto aos efeitos e quanto a legitimidade. Em
relação aos pressupostos divergem alguns autores na sua enumeração, todavia, seguimos a orientação
de "Vicente Greco Filho", para considerá-la mais abrangente. Quanto aos princípios demos maior ênfase
aos da fungibilidade - ressalvando os casos de má-fé - unirrecoribilidade e suas exceções.
Adentramo-nos em seguida na apelação criminal, fazendo abordagens no que se concerne ao conceito,
espécies, juízo de admissibilidade, adentariedade, apelações das decisões do juiz singular e do tribunal
do júri, prazos para interposição, processamento, deserção, efeitos da apelação, ""reformativo in pejus"
e "reformativo in melius".
Concluímos ter estudado uma espécie de recurso que tem por objetivo o reexame do mérito, total ou
parcial, da decisão conforme seja plena ou limitada. Para efeitos de economia processual, vimos quão é
importante o juízo de admissibilidade pelos juízos "a quo" e "ad quem", posto a impedir o desgaste da
máquina judiciária em processos viciados "ab initio". O princípio da voluntariedade impera nessa tipo de
recurso das decisões do tribunal do júri, verificamos ter o legislador como meta a preservação da
soberania dos veridictos, garantia constitucional prevista. Finalmente em relação à "reformatio in pejus"
e "reformatio in mellius" comparamos que o réu não pode ver a sua situação piorada em razão de
recurso interposto ele próprio, ou seja, não é admitido o "reformation in pejus", já quanto ao
"reformation in mellius" existe divergência entre os doutrinadores e os tribunais, alguns já admitem em
certos casos e outros em hipótese alguma. Quanto ao STJ o pronunciamento é de que não cabe em
função do princípio "tantum devolutum quantum appellatum".
BIBLIOGRAFIA
BRASIL, Código de Processo Penal. 36 ed. São Paulo: Saraiva, 1996.
GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Grinover, Ada Pellegrini. Fernandes, Antônio Scarance. Recurso no
Processo Penal; São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996.
GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal; São Paulo: Saraiva, 1995. 3. ed. atual.
HOME PAGE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF) -http://www.stf.gov.br
JESUS, Damásio E. de. Código de Processo Penal anotado; São Paulo: Savaiva, 1989. 7. ed., atual. e
aum.
MIRABETE, Júlio Fabbrini.Processo Penal. 5.ed. rev. atual. São Paulo: Atlas, 1996. p. 624 - 649.
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de Processo Penal interpretado. Referências doutrinárias, indicações
legais, resenha jurisprudencial: atualizado até julho de 1995; São Paulo: Atlas, 1995. 3. ed.
NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Curso Completo de Processo Penal. 9.ed. rev., ampl. e atual. São Paulo:
Saraiva, 1995. p. 389 - 394.
TORNAGHI, Hélio Bastos. Curso de Processo Penal. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 1981. p. 358 - 369.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal; São Paulo: Savaiva, 1994. 15 ed. rev. e atual.
REVISTAS ESPECIALIZADAS
CONSULTORIA EFE TRÊS - D PUBLICAÇÕES JURÍDICAS. Decisões dos Tribunais Superiores. Natal: F3D,
1996. Cad. 3. p. 30.
Revista dos Tribunais: n.ºs. 555/376; 559/400; 612/390; 612/390; 612/390; 560/324.
Fonte: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1079
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2. JURISPRUDÊNCIA CORRELATA
2.1 HABEAS CORPUS 61.440-SP
Ausência de intimação para apresentação das contra-razões. Nulidade. Ocorrência. Ofensa aos princípios
da ampla defesa e do contraditório. Constrangimento ilegal evidenciado. Ordem concedida.
HABEAS CORPUS N.º 61.440-SP
R. p/Acórdão: Min. Arnaldo Esteves Lima
EMENTA:
1. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento no sentido de que a ausência de intimação da
defesa para apresentar contra-razões ao recurso do Ministério Público (art. 588 do CPP), interposto
contra o não-recebimento da denúncia, viola os princípios constitucionais do contraditório e da ampla
defesa.
2. Uma vez verificado que a paciente não teve oportunidade de apresentar as contra-razões ao recurso
em sentido estrito, a melhor solução é abrir essa oportunidade para que ela possa exercer o seu direito
à ampla defesa e ao contraditório, e assim regularizar a sua situação processual, direito concedido aos
demais investigados e não a ela.
3. Ordem concedida para anular o julgamento do Recurso em Sentido Estrito 144.241.5/1, proferido
pela 12.ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, a fim de que seja dada a
oportunidade à paciente de apresentar as contra-razões ao recurso.
(STJ/DJU de 24/11/08)
O Superior Tribunal de Justiça por sua 5.ª Turma, Relator o Ministro Arnaldo Esteves Lima decidiu que a
ausência de intimação da defesa para apresentar contra-razões ao recurso do Ministério público (art.
588 do CPP) interposto quanto ao não recebimento da denúncia viola os princípios constitucionais do
contraditório e da ampla defesa.
RELATÓRIO:
A Exma. sra. Ministra Laurita Vaz:
Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de MARIA REGINA YASBEK,
apontando-se como autoridade coatora o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Segundo consta dos autos, foi instaurado inquérito policial, sendo a ora Paciente uma das investigadas,
para apurar fato relatado no boletim de ocorrência lavrado em 20 de maio de 2001, noticiando a
ocorrência de ‘furto consumado', além de possíveis crimes envolvendo direito autoral, propriedade
intelectual e concorrência desleal, que teria sido praticado na sede da empresa ‘Internetco Investiments'
e de ‘Nexxy Capital Brasil'.
O Ministério Público promoveu pedido de arquivamento do inquérito policial, pelo crime de furto, diante
da ausência de provas suficientes para o início da ação penal, e, com "relação ao delito previsto no art.
195, X, XI e XII, da Lei 9.279/96 e qualquer outro envolvendo direito autoral, propriedade intelectual,
concorrência desleal e divulgação de segredo intelectual ou material, cuja ação é privada, requereu a
extinção da punibilidade, em favor dos imputados, em razão da decadência; quanto aos eventuais
crimes previstos no art. 151 e art. 153, do Código Penal, pediu que seja declarada a extinção da
punibilidade, em razão da decadência do direito de representação" (fls. 16/17).
O pedido ministerial foi deferido pelo Juiz do Departamento de Inquéritos Policiais e Corregedoria da
Polícia Judiciária -DIPO para: "a) arquivar este inquérito policial, em relação ao crime do art. 155, do
Código Penal, com a ressalva do art. 18, do Código de Processo Penal; b) em relação aos crimes
previstos no art. 195, X, XI e XII, da Lei n.º 9.279/96 e qualquer outro envolvendo direito autoral,
propriedade intelectual, concorrência desleal e divulgação de segredo intelectual ou material, e os
previstos nos arts. 151 e 153, do Código Penal, julgar extinta a punibilidade em favor de DENYS
RODRIGUES, JOSÉ LUIZ GALEGO JÚNIOR, CLAUDIOMIR ZANINI e MARIA REGINA YASBEK, [...], com
fundamento no art. 107, IV, do Código Penal." (fl. 23)
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Contra tal decisão foi interposto recurso em sentido estrito que, segundo as informações constantes na
própria petição protocolizada pela vítima, "foi indeferido o processamento do aludido recurso,
ressaltando-se que a decisão guerreada não era recorrível. Foi então interposta carta testemunhável e
apresentadas as respectivas razões. Nelas demonstrou-se que o provimento jurisdicional em questão era
passível de recurso, por não se tratar de mero despacho. [...]. A carta testemunhável foi deferida pelo
E. Tribunal de Alçada Criminal, mas não foi julgado o mérito do recurso em sentido estrito porque os
investigados não haviam tido a oportunidade de oferecer contra-razões." (fls. 25/26)
Posteriormente, o Tribunal de Justiça paulista proferiu a decisão no recurso em sentido estrito, "para
determinar o normal prosseguimento do inquérito policial, visando a apuração da prática dos delitos
tipificados nos arts. 195, X, XI e XII, da Lei n.º 9.279/96 e 151 e 153, do Cód. Penal" (fl. 45). O referido
decisum, aliás, restou assim ementado:
"CONCORRÊNCIA DESLEAL - Decadência - Ação que se procede mediante queixa - Perícia não concluída
- Não ocorrência da decadência - Nos crimes contra a propriedade imaterial, dentre eles o de
concorrência desleal, o prazo do art. 529 do Cód. Proc. Penal, exigindo a prévia conclusão da perícia
para o início da decadência, prepondera, por ser específico, sobre o disposto nos arts. 38 do CPP e 103
do CP." (fl. 36)
Houve, então, a impetração do presente habeas corpus, no qual o Impetrante alega a existência de
constrangimento ilegal contra a ora Paciente, "que figurou como investigada no inquérito policial, sobre
quem se imputou uma série de crimes, não foi intimada para oferecer contra-razões ao recurso em
sentido estrito, por meio do qual se ressuscitou o inquérito policial (doc. 3)." Ressalta que "somente o
investigado José Luiz Galego Júnior e seu ilustre defensor puderam manifestar-se contra-arrazoando"
(fls. 03/04).
Aduz, assim, ser manifesta a nulidade do processamento do recurso em sentido estrito, porque a então
recorrida não teve oportunidade de se defender.
Requer, assim, liminarmente, "a sustação do inquérito policial até a apreciação do mérito do presente
writ" (fl. 07), quando deverá ser concedida a ordem para anular o julgamento "do recurso em sentido
estrito a fim de ser dada oportunidade para que a paciente possa oferecer as contra-razões ao recurso
em sentido estrito, direito concedido aos demais investigados, mas não a ela" (fl. 07).
O pedido de liminar foi deferido nos termos da decisão de fls. 57/59, para "sustar o andamento do
inquérito policial em que se apura o seu suposto envolvimento nos delitos tipificados nos arts. 195, X, XI
e XII, da Lei n.º 9.279/96 e 151 e 153, do Código. Penal."
As judiciosas informações foram prestadas às fls. 84/384, com a juntada de peças processuais
pertinentes à instrução do feito.
O Ministério Público Federal manifestou-se às fls. 386/389, opinando pela denegação da ordem, tendo
em vista a "existência, nos autos, de Certidão de Serventia, dando notícia de que a paciente foi
intimada, na pessoa de seu advogado, na via do D.O.".
O Impetrante juntou contra-razões ao parecer ministerial, afirmando que a intimação se deu em relação
à carta testemunhável, ajuizada porque o Juiz de primeiro grau negou seguimento ao recurso em
sentido estrito.
Por intermédio da petição protocolizada sob o n.º 213508/2007, o Impetrante afirmou que o Juízo do
Departamento de Inquéritos Policiais remeteu os autos à Delegacia de Polícia para continuidade das
investigações, tendo supostamente contrariado decisão liminar concedida por esta Relatora.
Diante disso, oficiei ao Tribunal a quo, solicitando informações a respeito do cumprimento da decisão
que deferiu o pedido de liminar.
Em resposta, a Corte paulista noticiou que "a Juíza de Direito determinou a continuidade das
investigações apenas em relação ao delito previsto no art. 10 de Lei n.º 9.296/96" (fl. 440).
Voto vencedor
Ministro Arnaldo Esteves Lima:
Conforme relatado pela eminente Ministra LAURITA VAZ, o impetrante pede a nulidade do acórdão "do
recurso em sentido estrito a fim de ser dada oportunidade para que a paciente possa oferecer as contrarazões ao recurso em sentido estrito, direito concedido aos demais investigados, mas não a ela" (fl. 7).
A ordem merece ser concedida.
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Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento no sentido de que a ausência de intimação
da defesa para apresentar contra-razões ao recurso do Parquet (art. 588 do CPP), interposto contra o
não-recebimento da denúncia, viola os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa (HC
30.724/SC, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, Quinta Turma, DJ de 10/5/04).
Na hipótese em exame, colho do voto da relatora que o Ministério Público promoveu pedido de
arquivamento do inquérito policial, que foi deferido pelo Juiz do Departamento de Inquéritos Policiais e
Corregedoria da Polícia Judiciária DIPO. Inconformadas, as vítimas interpuseram recurso em sentido
estrito, que foi provido "para determinar o normal prosseguimento do inquérito policial, visando a
apuração da prática dos delitos tipificados nos arts. 195, X, XI, e XII, da Lei n.º 9.279/96 e 151 e 153,
do Cód. Penal" (fl. 45).
Dessa forma, verifica-se que a paciente não teve a oportunidade de apresentar as contra-razões, motivo
pelo qual, dentro desse contexto, a melhor solução é abrir essa oportunidade para que ela possa exercer
o seu direito à ampla defesa e ao contraditório, e assim regularizar a sua situação processual, direito
concedido aos demais investigados e não a ela.
Ante o exposto, concedo a ordem para anular o julgamento do Recurso em Sentido Estrito 144.241.5/1,
proferido pela 12.ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, a fim de que seja
dada a oportunidade à paciente de apresentar as contra-razões ao recurso.
É como voto. Decisão por maioria, votando com o Relator os Ministros Napoleão Nunes Maia Filho e
Jorge Mussi.
3. SIMULADOS
1. É correto afirmar que, das decisões proferidas em habeas corpus, observada a natureza da decisão,
cabem os recursos
a) de apelação, ordinário, extraordinário, de agravo e de embargos de nulidade.
b) em sentido estrito, de apelação, de ofício, extraordinário e de embargos infringentes.
c) em sentido estrito; de ofício, ordinário, especial e extraordinário.
d) de ofício, especial, de embargos infringentes e de embargos de nulidade.
e) em sentido estrito; de apelação, ordinário, especial e de agravo
Resp. C
2. Considere os recursos abaixo.
I. Apelação.
II. Recurso em Sentido Estrito.
III. Protesto por Novo Júri.
IV. Agravo de Petição.
V. Recurso Especial.
VI. Recurso Extraordinário.
São cabíveis, dentre outros, no âmbito do processo penal brasileiro, os indicados APENAS em
a) I, III, IV e V.
b) I, II, III, V e VI.
c) I, II, IV, V e VI.
d) II, III, IV e VI.
e) II, IV, V e VI.
REsp. B
3. João e seu defensor foram intimados da sentença condenatória no dia 8 de janeiro, segunda-feira. O
recurso de apelação, cujo prazo é de 5 dias, poderia ter sido interposto até o dia
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ANALISTA TRE / TRF
Disciplina: Direito Processual Penal
Prof.: Nestor Távora
Data: 09.06.2009
Aula n°11
a) 12 de janeiro, sexta-feira.
b) 13 de janeiro, sábado.
c) 14 de janeiro, domingo.
d) 15 de janeiro, segunda-feira.
e) 16 de janeiro, terça-feira.
Resp. D
4. Da decisão final do juízo de primeira instância que denega ordem de habeas corpus cabe
a) apelação.
b) recurso em sentido estrito.
c) recurso ordinário.
d) carta testemunhável.
e) agravo de instrumento.
Resp. B
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