Superior Tribunal de Justiça
RECLAMAÇÃO Nº 3.976 - MG (2010/0040425-4)
RELATOR
RECLAMANTE
ADVOGADO
RECLAMADO
INTERES.
ADVOGADO
:
:
:
:
MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES
TELEMAR NORTE LESTE S/A
CAIO CESAR VIEIRA ROCHA E OUTRO(S)
SEGUNDA
TURMA
RECURSAL
DE
GOVERNADOR
VALADARES - MG
: ANTÔNIO GONÇALVES DOS SANTOS
: GLAYDSON SARCINELLI FABRI E OUTRO(S)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator):
Trata-se de reclamação ajuizada por Telemar Norte Leste S/A em face de julgado da
Segunda Turma Recursal de Governador Valadares/MG, relativo ao Recurso n.
0105.09.294284-3, no qual se condenou a reclamante a restituir os valores pagos a título de
pulsos excedentes, em razão da ilegalidade da ausência de discriminação das ligações
realizadas pelo seu cliente, em ofensa ao princípio da transparência, insculpido no Código de
Defesa do Consumidor.
Alega-se que o julgado da Turma Recursal está em dissonância com o decidido por
esta Corte na Súmula n. 357 e no REsp n. 1.074.799/MG, julgado pelo rito do art. 543-C do
Código de Processo Civil.
Pedido de liminar deferido às fls. 245/249 (e-STJ).
Informações da autoridade reclamada às fls. 308/309 e 310/311 (e-STJ).
Embargos de declaração opostos em face da liminar às fls. 303/304 (e-STJ) que não
foram conhecidos.
Pedido de reconsideração da liminar também não conhecido (fl. 429, e-STJ).
Petições de terceiros interessados buscando a reversão do provimento liminar ou a
exclusão de determinado feito, por suas peculiaridades, do âmbito de abrangência do
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provimento liminar (fls. 331/343, 436/528 e 553/536, e-STJ).
Parecer do Ministério Público Federal pelo não-conhecimento da reclamação, com
revogação da liminar concedida.
É o relatório.
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RECLAMAÇÃO Nº 3.976 - MG (2010/0040425-4)
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECLAMAÇÃO.
ACÓRDÃO DE TURMA RECURSAL VS. ENTENDIMENTO EM
REPETITIVO. CABIMENTO DA MEDIDA AJUIZADA. TELEFONIA.
COBRANÇA
DE
PULSOS
EXCEDENTES.
AUSÊNCIA
DE
DISCRIMINAÇÃO DAS LIGAÇÕES. QUESTÃO APRECIADA NO RESP
1.074.799/MG (ART. 543-C DO CPC E RES. STJ N. 8/08). DIVERGÊNCIA
ENTRE ENTENDIMENTOS CARACTERIZADA. RECLAMAÇÃO
PROCEDENTE.
1. Trata-se de reclamação ajuizada por Telemar Norte Leste S/A em face de
julgado da Segunda Turma Recursal de Governador Valadares/MG, relativo ao
Recurso n. 0105.09.294284-3, no qual se condenou a reclamante a restituir os
valores pagos a título de pulsos excedentes, em razão da ilegalidade da ausência
de discriminação das ligações realizadas pelo seu cliente, em ofensa ao princípio
da transparência, insculpido no Código de Defesa do Consumidor.
2. Cabe reclamação para a adequação do entendimento adotado em acórdãos de
Turma Recursais Estaduais à jurisprudência, súmula ou orientação adotada na
sistemática dos recursos repetitivos do STJ, em razão do decidido nos EDcl no
RE 571.572/BA (Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe de 27.11.2009) e
das regras contidas na Resolução 12/2009 do STJ.
3. Para tanto, é necessário que a parte demonstre incompatibilidade entre o
entendimento adotado no acórdão reclamado e aquele pacificado no âmbito do
Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso especial julgado pelo rito do art.
543-C ou de Súmulas. Nesse sentido: EDcl na Rcl 7837/RS, Rel. Ministro
HUMBERTO MARTINS, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/08/2012, DJe
15/08/2012; Rcl 6721/MT, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 23/11/2011, DJe
09/11/2012).
4. Esta Corte Superior de Justiça, no julgamento do REsp 1.074.799/MG, Rel.
Min. Francisco Falcão, Primeira Seção, DJ. 08.06.09, submetido ao rito dos
recursos repetitivos, firmou o entendimento de que não é ilegal a cobrança de
pulsos excedentes, no período anterior a 01.08.07, com base apenas na ausência
de discriminação das ligações efetuadas pelos usuários do serviço de telefonia.
5. Mesmo após a matéria ter sido pacificada pelo STJ, a Turma Recursal decidiu
de modo divergente. Dessa forma, evidencia-se o confronto, que deve
necessariamente ser solucionado em favor do que ficou consignado no recurso
submetido à sistemática dos repetitivos.
6. Os efeitos da presente reclamação não devem alcançar os processos que se
encontram com trânsito em julgado nos Juizados Especiais Especiais.
Precedentes: EDcl na Rcl 3924/BA, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES,
PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/12/2012, DJe 14/02/2013, e MC 16568/TO,
Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
10/03/2010, DJe 06/05/2010.
7. Reclamação procedente.
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VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator):
Trata-se de reclamação ajuizada por Telemar Norte Leste S/A em face de julgado da Segunda
Turma Recursal de Governador Valadares/MG, relativo ao Recurso n. 0105.09.294284-3, no
qual se condenou a reclamante a restituir os valores pagos a título de pulsos excedentes, em
razão da ilegalidade da ausência de discriminação das ligações realizadas pelo seu cliente, em
ofensa ao princípio da transparência, insculpido no Código de Defesa do Consumidor.
O Supremo Tribunal Federal, ao se debruçar sobre o tema da impossibilidade de se
veicular recurso contra decisão de Turma Recursal Estadual diretamente ao Superior Tribunal
de Justiça, tampouco de o próprio STF apreciar matéria infraconstitucional no recurso
extraordinário cabível, consignou o entendimento de ser viável, em caráter excepcional, o
ajuizamento da reclamação constitucional estabelecida no art. 105, inc. I, "f", da Constituição
da República.
Na ocasião, ponderou-se o risco de se consolidar decisões proferidas à luz de
interpretação da legislação infraconstitucional federal contrária à jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça, a quem cumpre o dever constitucional de uniformizá-la, bem como a
inexistência, nestes casos, da solução prevista no art. 14, § 4º, da Lei n. 10.259/2001, restrita
aos juizados especiais federais. Esta a ementa do julgado:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
AUSÊNCIA
DE
OMISSÃO
NO
ACÓRDÃO
EMBARGADO.
JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
APLICAÇÃO ÀS CONTROVÉRSIAS SUBMETIDAS AOS JUIZADOS
ESPECIAIS ESTADUAIS. RECLAMAÇÃO PARA O SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CABIMENTO EXCEPCIONAL ENQUANTO
NÃO CRIADO, POR LEI FEDERAL, O ÓRGÃO UNIFORMIZADOR.
1. No julgamento do recurso extraordinário interposto pela embargante, o Plenário
desta Suprema Corte apreciou satisfatoriamente os pontos por ela questionados,
tendo concluído: que constitui questão infraconstitucional a discriminação dos
pulsos telefônicos excedentes nas contas telefônicas; que compete à Justiça
Estadual a sua apreciação; e que é possível o julgamento da referida matéria no
âmbito dos juizados em virtude da ausência de complexidade probatória. Não há,
assim, qualquer omissão a ser sanada.
2. Quanto ao pedido de aplicação da jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça, observe-se que aquela egrégia Corte foi incumbida pela Carta Magna da
missão de uniformizar a interpretação da legislação infraconstitucional, embora
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seja inadmissível a interposição de recurso especial contra as decisões proferidas
pelas turmas recursais dos juizados especiais.
3. No âmbito federal, a Lei 10.259/2001 criou a Turma de Uniformização da
Jurisprudência, que pode ser acionada quando a decisão da turma recursal
contrariar a jurisprudência do STJ. É possível, ainda, a provocação dessa Corte
Superior após o julgamento da matéria pela citada Turma de Uniformização.
4. Inexistência de órgão uniformizador no âmbito dos juizados estaduais,
circunstância que inviabiliza a aplicação da jurisprudência do STJ. Risco de
manutenção de decisões divergentes quanto à interpretação da legislação
federal, gerando insegurança jurídica e uma prestação jurisdicional
incompleta, em decorrência da inexistência de outro meio eficaz para
resolvê-la.
5. Embargos declaratórios acolhidos apenas para declarar o cabimento, em
caráter excepcional, da reclamação prevista no art. 105, I, f, da Constituição
Federal, para fazer prevalecer, até a criação da turma de uniformização dos
juizados especiais estaduais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
na interpretação da legislação infraconstitucional.
(RE 571572 ED, Min. Ellen Gracie, Tribunal Pleno, julgado em 26/08/2009,
DJe-223 Divulg 26-11-2009 Public 27-11-2009 - negritos acrescentados).
Nesse sentido, esta Corte aprovou a Resolução n. 12/2009, que dispõe sobre o
processamento das reclamações destinadas a dirimir divergência entre acórdão prolatado por
turma recursal estadual e a jurisprudência do STJ.
Para o cabimento de tal medida é necessário que a parte demonstre
incompatibilidade entre o entendimento adotado no acórdão reclamado e aquele pacificado no
âmbito do Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso especial julgado pelo rito do art.
543-C ou de Súmulas. Precedentes: EDcl na Rcl 7837/RS, Rel. Ministro HUMBERTO
MARTINS, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/08/2012, DJe 15/08/2012 e Rcl 6721/MT,
Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI,
SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 23/11/2011, DJe 09/11/2012.
Na espécie, a origem deixou consignado expressamente o que se segue (fl. 190,
e-STJ):
Não há que se falar em prevalência das disposições contidas no Decreto nº
4.733/03, que determinam o detalhamento de contas somente a partir de
janeiro/2006, posteriormente prorrogada para janeiro/2007. É que a referida norma
e as demais Resoluções da Anatel não podem prevalecer em relação ao que é
determinado pelo CDC, especialmente no que se refere à observância ao princípio
da transparência, por serem as normas deste estatuto hierarquicamente superiores
àquelas.
Com esse entendimento, a Turma Recursal reformou a sentença e condenou a
reclamante à restituir ao seu cliente os valores pagos a titulo de pulsos excedentes, relativos
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ao período de dezembro de 2002 até janeiro de 2007 (fls. 58/59, e-STJ).
Todavia, esta Corte tem entendimento diverso, de que somente a partir de agosto de
2007 as empresas prestadoras do serviço de telefonia passaram a ser obrigadas a detalhar
todas as ligações na modalidade local, independentemente de ser dentro ou fora da franquia
contratada. Esta posição foi firmada em sede de recurso especial repetitivo, processado na
forma estabelecida no art. 543-C do CPC e na Resolução STJ n. 8/2008. Esta a ementa:
TELEFONIA
FIXA.
DETALHAMENTO
DAS
CHAMADAS.
OBRIGATORIEDADE. TERMO INICIAL. SOLICITAÇÃO DO USUÁRIO.
GRATUIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO TIDOS COMO
PROTELATÓRIOS. MULTA. AFASTAMENTO. SÚMULA 98/STJ.
I - O Estado, com a edição do Decreto nº 4.733/2003, entre outras medidas
necessárias para a alteração do sistema de tarifação de pulsos para tempo de
utilização, determinou o detalhamento de todas as ligações locais e de longa
distância.
II - O prazo para a conversão do sistema, inicialmente previsto para 31 de julho de
2006 pela Resolução 423/2005, foi ampliado em doze meses pela Resolução
432/2006, para não prejudicar os usuários da internet discada, os quais, neste
prazo, foram atendidos com plano alternativo apresentado na Resolução 450/2006.
III - Assim, a partir de 01 de Agosto de 2007, data da implementação total do
sistema, passou a ser exigido das concessionárias o detalhamento de todas as
ligações na modalidade local, independentemente de ser dentro ou fora da franquia
contratada, por inexistir qualquer restrição a respeito, conforme se observa do
constante do artigo 83 do anexo à Resolução 426/2005, que regulamentou o
sistema de telefonia fixa.
IV - Também no artigo 83 do anexo à Resolução 426/2005, restou reafirmada a
determinação para que a concessionária forneça, mediante solicitação do assinante,
documento de cobrança contendo o detalhamento das chamadas locais, entretanto
ficou consignado que o fornecimento do detalhamento seria gratuito para o
assinante, modificando, neste ponto, o constante do artigo 7º, X, do Decreto nº
4.733/2003.
V - A solicitação do fornecimento das faturas discriminadas, sem ônus para o
assinante, basta ser feita uma única vez, marcando para a concessionária o
momento a partir do qual o consumidor pretende obter suas faturas com
detalhamento.
VI - Revogação da súmula 357/STJ que se impõe.
VII - Recurso especial parcialmente provido (Acórdão sujeito ao regime do art.
543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08). (REsp 1.074.799/MG, Rel. Min.
Francisco Falcão, Primeira Seção, DJe 8.6.2009)
Do voto do Ministro relator, depreende-se com mais clareza a divergência
estabelecida entre o julgado desta Corte e a decisão objeto da presente reclamação (negritos
acrescentados):
A alteração do sistema de tarifação de pulsos para tempo de utilização viabilizou o
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detalhamento das ligações.
Tal afirmação não encontra divergência nas manifestações apresentadas pela
ANATEL e pela ASSOCIAÇÃO DAS CONCESSIONÁRIAS, entendendo-se que
antes desse evento (mudança de tarifação) as redes locais ainda não estavam
preparadas tecnicamente para discriminar as chamadas locais.
Não havendo condições técnicas para tal procedimento, falece razão aos
fundamentos apresilhados unicamente ao direito à informação previsto no código
consumerista.
[...]
Neste contexto, de acordo com a sucessão de normas criadas para implementar de
forma efetiva e mais benéfica ao cidadão, ficaram assentadas as seguintes
conclusões:
Primeiro: A partir de 1º de Agosto de 2007, data da implementação total do
sistema, passou a ser exigido das concessionárias o detalhamento de todas as
ligações na modalidade local, independentemente de ser dentro ou fora da
franquia contratada, por inexistir nas resoluções citadas qualquer restrição a
respeito;
Segundo: O fornecimento da fatura detalhada, de responsabilidade da
concessionária, é sempre gratuito, ou seja, sem qualquer ônus para o assinante,
bastando que para sua obtenção, o assinante faça uma solicitação.
Vistos os julgados, evidencia-se o confronto, que deve necessariamente ser
solucionado em favor do que ficou consignado no recurso submetido à sistemática dos
repetitivos.
Salienta-se que os efeitos desse julgado não devem alcançar os processos que
tramitam pelos Juizados Especiais Cíveis estaduais ou pelas respectivas Turmas Recursais
que se encontram com trânsito em julgado. Precedentes: EDcl na Rcl 3924/BA, Rel. Ministro
BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/12/2012, DJe 14/02/2013, e
MC 16568/TO, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
10/03/2010, DJe 06/05/2010
Com essas considerações, voto por JULGAR PROCEDENTE a reclamação.
Prejudicados (i) os embargos de declaração de fls. 533/536 (e-STJ) e (ii) a análise de
manifestação de fls. 331/343 (e-STJ).
É o voto.
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