Como A Escola Mantém O Status Quo? Alguns Dos Principais Ensinamentos De
Bourdieu E Passeron Sobre A Educação Crítica
Autoria: Ívina Pereira da Silva, Carolina Machado Saraiva de Albuquerque Maranhão,
Felipe Marques Carabetti Gontijo
“Não há democracia efetiva sem um verdadeiro
poder crítico” (Pierre Bourdieu)
Resumo
A área de ensino tem se desenvolvido fortemente nos últimos anos. Podemos verificar isso
através da criação do encontro específico da área e das linhas temáticas tanto no ENEPQ
quanto no ENANPAD. Um dos aprofundamentos necessários que deve ser feito para fomentar
o amadurecimento das discussões sobre o ensino em administração refere-se ao embasamento
teórico e epistemológico sobre a função do docente. Sabemos que o professor não é somente
um transmissor de conteúdos. Ele exerce função política importante na formação do
profissional e do sujeito em sala de aula. Ao lermos o livro “A reprodução” de Bourdieu e
Passeron, percebemos a importância de inúmeras teses ali apresentadas, que ainda configuram
o sistema atual de ensino e que são fundamentais para a formação do docente de
administração. Percebemos também que a pedagogia crítica, corrente que surgiu após a teoria
reprodutivista, compartilha com esta alguns elementos balizares sobre educação. A
compreensão do paradigma reprodutivista da educação – que desmonta a ingênua crença da
educação democrática – assim como suas interfaces com a pedagogia crítica é conhecimento
necessário para a construção de massa crítica de docentes do curso de administração e para o
aprofundamento das discussões sobre educação e ensino que são travadas nesta área de
conhecimento.
Introdução
A área de ensino tem se desenvolvido fortemente nos últimos anos. Podemos verificar isso
através da criação do encontro específico da área e das linhas temáticas tanto no ENEPQ
quanto no ENANPAD. As temáticas propostas aprofundam-se no tema de educação,
diferentemente dos anos anteriores, em que tratavam o tema de forma mais ampla e
desestruturada. Hoje, encontramos temáticas como formação docente e estruturação de
programas de curso. Acreditamos que esta especialização da área reflete um amadurecimento
do campo, que deve ser seguido de um mergulho aprofundado nos pilares das discussões mais
abrangentes sobre a educação.
Um dos aprofundamentos necessários que deve ser feito para fomentar o amadurecimento das
discussões sobre o ensino em administração refere-se ao embasamento teórico e
epistemológico sobre a função do docente. Sabemos que o professor não é somente um
transmissor de conteúdos. Ele exerce função política importante na formação do profissional e
do sujeito em sala de aula. A verdadeira compreensão do papel social do professor passa pelo
aprofundamento teórico e pelo desvelamento das amarras contextuais e históricas das
instituições de ensino, revelando suas potencialidades formativas e suas limitações estruturais.
Ao lermos o livro “A reprodução” de Bourdieu e Passeron, percebemos a importância de
inúmeras teses ali apresentadas, que ainda configuram o sistema atual de ensino e que são
fundamentais para a formação do docente de administração. Percebemos também que a
pedagogia crítica, corrente que surgiu após a teoria reprodutivista, compartilha com esta
alguns elementos balizares sobre educação. A compreensão do paradigma reprodutivista da
educação – que desmonta a ingênua crença da educação democrática – assim como suas
interfaces com a pedagogia crítica é conhecimento necessário para a construção de massa
crítica de docentes do curso de administração e para o aprofundamento das discussões sobre
educação e ensino que são travadas nesta área de conhecimento.
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Para desenvolvermos tal intento, organizamos este trabalho da seguinte forma: na primeira
seção, apresentamos uma breve contextualização sobre o surgimento do paradigma
Reprodutivista da educação. Em seguida tratamos do fim do ideal da educação democrática.
Na terceira seção, contextualizamos a obra “A Reprodução”. Na quarta seção, discutimos
como Bourdieu e Passeron defenderam a tese de que a escola é uma instituição reprodutora da
ordem dominante, através dos conceitos de “sistema de ensino e classes sociais”, “autoridade
docente e autoridade da linguagem” e “origem social e êxito escolar”. Em seguida, tratamos
das principais críticas direcionadas às teses da teoria reprodutivista. Em seções finais,
apresentamos as conclusões e referências utilizadas.
O surgimento do paradigma Reprodutivista da educação
Até meados do século XX, acreditava-se que a escola seria o espaço para diminuição das
diferenças sociais, decorrentes de uma política autoritária e tradicional, possibilitando o
surgimento de uma sociedade mais igualitária, moderna e democrática. Essa crença tinha
fortes raízes funcionalistas sobre o papel da escola. A ascensão social dos alunos se daria com
base com base no mérito. Os alunos competiriam em condições iguais e aqueles que se
destacassem por seus dons individuais seriam levados, por uma questão de justiça, a avançar
em suas carreiras escolares e, posteriormente, a ocupar as posições superiores na hierarquia
social (NOGUEIRA e NOGUEIRA, 2002). A escola pública e gratuita, nessa perspectiva,
seria uma instituição neutra cuja função social seria oferecer as mesmas chances de sucesso
aos alunos, através de um programa de ensino padronizado e racional, que os selecionaria
com base em critérios objetivos.
Na década de 60, em meio à crescente insatisfação dos jovens com o ensino e as disfunções
deste sistema, Bourdieu propõe uma nova forma de interpretar esta instituição, revelando
elementos que a perspectiva anterior (funcionalista) não permitia:
Onde se via igualdade de oportunidades, meritocracia, justiça social, Bourdieu passa
a ver reprodução e legitimação das desigualdades sociais. A educação, na teoria de
Bourdieu, perde o papel que lhe fora atribuído de instância transformadora e
democratizadora das sociedades e passa a ser vista como uma das principais
instituições por meio da qual se mantêm e se legitimam os privilégios sociais.
(NOGUEIRA e NOGUEIRA, 2002, p. 26).
A teoria de Bourdieu foi corroborada por relatórios desenvolvidos por órgãos mundiais, cujos
dados apontavam para a forte relação entre desempenho escolar e origem social. Em poucas
palavras, a estrutura social conduziria as ações individuais e tenderia a se reproduzir através
delas, mas esse processo não seria rígido, direto ou mecânico (NOGUEIRA e NOGUEIRA,
2002).
Para Bourdieu, o aluno não é um sujeito abstrato capaz de competir em condições de
igualdade com aqueles que apresentam maior bagagem cultural, social e econômica. Sua
competência, portanto, não se relaciona à sua constituição biológica ou psicológica particular,
mas por sua origem social, que o colocaria em condições mais ou menos favoráveis diante das
exigências escolares “Imersos num meio no qual se sabe manejar a palavra, onde a língua
culta é a língua natural, esses jovens integram desde a infância as regras do saber-viver
intelectual e do saber pensar” (CATANI, 2002, p. 71). Desta forma, os alunos são atores
socialmente constituídos, configurado em seus mínimos detalhes: as aptidões, as posturas
corporais, a entonação de voz e as aspirações relativas ao futuro profissional.
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Bourdieu nega, de maneira radical, o caráter autônomo do sujeito individual (CATANI,
2002). Sua caracterização se dá pela herança de uma bagagem que inclui, por um lado, certos
componentes objetivos, externos ao indivíduo como o capital econômico, tomado em termos
dos bens e serviços, o capital social, definido como o conjunto de relacionamentos sociais
influentes mantidos pela família, além do capital cultural institucionalizado, formado
basicamente por títulos escolares. A bagagem transmitida pela família inclui também certos
componentes que passam a fazer parte da própria subjetividade do indivíduo, sobretudo, o
capital cultural na sua forma “incorporada” como os gostos em matéria de arte, culinária,
decoração, vestuário, esportes e o domínio maior ou menor da língua culta. “Os estudantes
privilegiados recebem como herança um bem tão precioso quanto invisível ao olho nu: a
cultura. No seio dessa elite intelectual, os valores não são transmitidos pelo dinheiro (o
‘capital econômico’), mas pela escola (o ‘capital cultural’)” (CATANI, 2002, p. 71).
Cada grupo social constituiria um sistema específico de disposições para a ação em função
das condições objetivas que caracterizam sua posição na estrutura social, transmitido aos
indivíduos na forma do habitus. O acúmulo histórico de experiências de êxito e de fracasso,
os grupos sociais construiriam um conhecimento prático, e não plenamente consciente,
relativo ao que é possível ou não de ser alcançado pelos seus membros dentro da realidade
concreta na qual agem, bem como o aprendizado sobre as formas mais adequadas de fazê-lo
(NOGUEIRA e NOGUEIRA, 2002). Desta maneira, forma-se um conjunto de expectativas e
maneiras de significar o mundo referentes à posição de classe dos indivíduos e do habitus por
ele internalizado, a isso Bourdieu denomina de ethos de classe. A partir desse ethos de classe
– os indivíduos julgam as estratégias de ação disponíveis e as consideram mais seguras ou
mais arriscadas para se conseguir êxitos - de acordo com a localização do grupo a que
pertencem no espaço social e de acordo com o montante de capital que possuem (econômico,
social, cultural e simbólico).
Este aprendizado, construído ao longo do tempo, fruto de processos conscientes e
inconscientes, levaria ao ajustamento entre investimentos e condições objetivas de ação,
definindo-se as estratégias mais adequadas, que acabariam por ser adotadas pelos grupos e
seriam, então, incorporadas pelos sujeitos como parte do seu habitus.
O fim do ideal da educação democrática
O sistema escolar só consegue desvinvincular de modo tão perfeito sem deixar vestígios da
sua função de legitimadora da ordem vigente porque consegue dissimular as funções que
unem a inculcação dos valores e normas à conservação da estrutura das relações de classes
(BOURDIEU, 2008).
A escola é o local da conservação social e não de mobilidade social, como crê o senso
comum. Todo este processo de conservação social, analisado através do paradigma cultural,
mostra que os indivíduos oriundos das classes mais altas - os privilegiados - têm mais chances
de se beneficiarem através da escola (BOURDIEU, 1998).
Bourdieu e Passeron (2008) mostram, por meio da idéia de violência simbólica, a não
arbitrariedade da produção simbólica na vida social (re) produzidas nas escolas e advertem
para o seu caráter efetivamente legitimador das forças dominantes, de preservação das
posições de privilégio e reconhecimento social, que são expressas por meio dos gostos de
classe e estilos de vida, que torna objetiva a distinção social existente no plano simbólico.
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Cada família repassa aos seus filhos, um determinado capital cultural e um determinado ethos
(hábitos), que estão constituídos de sistemas de valores. Estes ficam implícitos e
profundamente interiorizados nos indivíduos e são bases de seus desejos e de orientação de
suas ações. É a partir desses valores e dos aprendizados proporcionados pela família que o
aluno constrói sua trajetória escolar. Bourdieu e Passeron chamam atenção para a forte
relação entre o capital cultural dos alunos e a classe a que pertencem. Segundo eles, alunos
originários de famílias mais abastadas têm maior capital cultural em relação aos alunos
provenientes de famílias mais pobres. Em outras palavras, o capital cultural é um dos fatores
a proporcionar o êxito escolar, no qual jovens oriundos das camadas superiores chegam mais
facilmente ao sucesso devido ao capital cultural familiar, assim como os poucos filhos das
camadas populares que ingressam na faculdade pertencem a famílias que diferem
positivamente da média das famílias de sua categoria pelo seu nível de capital cultural:
É provável por um efeito de inércia cultural que continuamos tomando o sistema
escolar como um fator de mobilidade social, segundo a ideologia da ‘escola
libertadora’, quando, ao contrário, tudo tende a mostrar que ele é um dos fatores
mais eficazes de conservação social, pois fornece a aparência de legitimidade às
desigualdades sociais e sanciona a herança cultural e o dom social tratado como dom
natural.
... Um jovem da camada superior tem oitenta mais chances de entrar na
Universidade que o filho de um assalariado agrícola.". (BOURDIEU, 1998, p.41).
Bourdieu e Passeron (2008) também ressaltam os mecanismos da superseleção, em que as
crianças de classes médias onde se espera a menor taxa de êxito precisam sobressair-se em
relação aos outros da mesma classe social para que suas famílias e professores continuem
apoiando-as, estimulando-as e ajudando a inculcar os valores escolares para continuar os
estudos. Esta superseleção também ocorre, com base = na idade; crianças de classes
camponesas e operárias, normalmente mais velhas que as crianças de meios mais favorecidos,
são mais facilmente eliminadas, com a mesma idade, do que crianças destes meios. Esta
dinâmica de seleção e eliminação transparece a ação dos privilégios hereditários em
detrimento das diferenças de dons/aptidões naturais.
Bourdieu critica o ideal da escola libertadora, pois uma vez que este ideal desconsidera a não
igualdade de chances de oportunidades entre os alunos. Segundo ele, aos indivíduos
ingressam na escola com diferentes chances de êxitos, pois são oriundos de classes e famílias
diferentes e, por isso, possuem maior ou menor capital cultural e são submetidas a maior ou
menor grau de seleção. Nas palavras dos autores: "[...] tratando todos os educandos, por mais
desiguais que sejam eles de fato, como iguais em direitos e deveres, o sistema escolar é
levado a dar sua sanção às desigualdades iniciais diante da cultura". (BOURDIEU, 1998,
p.53). Portanto, como dito a pouco, a escola contribui para perpetuar as desigualdades, ao
mesmo tempo em que as legitima, quando traveste transforma as diferenças econômicas e
sociais ocorrida pela preservação de privilégios de algumas classes em resultados de
processos meritocráticos. Dessa forma, legitima a transmissão da herança cultural, fazendo
crer que o sucesso escolar é uma simples questão de trabalho e dons. Assim:
somos obrigados a concluir que a equidade formal à qual obedece todo sistema
escolar é injusta de fato, e que, em toda sociedade onde se proclamam ideais
democráticos, ela protege melhor os privilégios do que a transmissão aberta dos
privilégios (BOURDIEU, 1998, p. 53).
Contextualização da obra “A Reprodução”
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Para melhor compreender a importância da teoria da reprodução é de extrema importância
estudar o papel da escola na formação do cidadão, já que ela é o principal componente do
capital cultural “ que se constitui (sobretudo, na sua forma incorporada) o elemento da
bagagem familiar que teria o maior impacto na definição do destino escolar” (NOGUEIRA e
NOGUEIRA, 2002, p. 23).
Na área de Sociologia da Educação, certamente Bourdieu está entre seus principais teóricos,
tendo contribuído imensamente para a visão da escola como instituição legitimadora do poder
dos dominantes sobre os demais. “A cultura legítima, referendada pelos exames e diplomas,
vem a ser aquela pertencente às classes privilegiadas” (CATANI, 2002, p. 69). É difícil fazer
um balanço das contribuições e dos limites da obra de Bourdieu neste campo, que se constitui,
ainda hoje, se não o mais importante, certamente um dos mais importantes paradigmas
utilizados na interpretação sociológica da educação (NOGUEIRA e NOGUEIRA, 2002).
Bourdieu e Passeron (2008) fundamentaram a “teoria da reprodução”, pois acreditavam que o
ato educativo sempre, obrigatoriamente, perpassava pela violência simbólica. Os autores
supracitados centralizaram a sua discussão sociológica no interesse de melhor compreender os
mecanismos da reprodução social que legitimam as diversas formas de dominação. Para tanto,
apresentam a escola como o local da conservação social, desconstruindo a idéia muito aceita
pelo censo comum de que a escola seria o lugar do mérito e esforço pessoal e que promovesse
a mobilidade social. Ele explica todo este processo de conservação social, através do
paradigma cultural, onde os filhos daqueles que ocupam as mais altas posições na hierarquia
social têm maiores chances de serem exitosos em sua carreira escolar.
A pesquisa que teve como fruto o texto “A reprodução- elementos para uma teoria do sistema
de ensino” objetivou determinar os fatores sociais e escolares do êxito da comunicação
pedagógica pela análise das variações do rendimento da comunicação em função das
características sociais dos receptores. Bourdieu e Passeron (2008) entendem como êxito da
comunicação pedagógica a função da distância que separa o habitus que ela tende a inculcar
(no caso da pesquisa realizada por ele, o domínio da língua erudita) do habitus que foi
inculcado por todas as formas anteriores de trabalho pedagógico e, em última análise, pela
família. Ou seja, a comunicação eficiente, ou exitosa, é aquela em que mais diminui a
distância entre o habitus do aluno (constituído por suas experiências pregressas, inclusive na
sua socialização primária - enquanto estava no seio de sua família) e o habitus que é
pretendido inculcar.
A escola contribui então, para perpetuar as desigualdades, ao mesmo tempo em que as
legitima, quando transforma as diferenças econômicas e sociais em distinção de qualidade e
legitima a transmissão da herança cultural, fazendo crer que o sucesso escolar é uma simples
questão de trabalho e dons. Segundo Baudelot (2002), a teoria da reprodução cultural
demonstra a existência de uma relação entre a cultura e as desigualdades escolares, uma vez
que a escola pressupõe certas competências que são de fato adquiridas na esfera familiar.
Como a escola mantém o status quo? Os ensinamentos de Bourdieu e Passeron sobre a
educação crítica
Sistema de ensino e classes sociais
Bourdieu e Passeron (2008) buscam explicar os efeitos que exercem as transformações dos
receptores sobre a comunicação pedagógica e definem, para isso, dois estados-limite do
sistema tradicional (extrapolação das características sociais dos grupos receptores): (1) o
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orgânico, em que o sistema lida com um público perfeitamente conforme com suas exigências
implícitas; e o (2) estado crítico, em que o “mal entendido terminaria por tornar-se
intolerável” (p.119).
As diferenças que aparecem a cada momento da história do sistema escolar, entre os graus e
tipos de mal-entendidos lingüístico ou cultural (que se poderia considerar como ineficácia da
comunicação pedagógica), podem ser explicados por referência ao sistema de relações
circulares entre a representação dominante da hierarquia das disciplinas e as características
sociais e escolares de seu público.
A lógica dessa relação seria mais ou menos a seguinte: as matérias mais valorizadas
socialmente tendem a selecionar os melhores alunos (que no caso da França seriam os alunos
de capital lingüístico mais elevado), que geralmente são os de classe mais alta ou os
superselecionados de classes mais baixas, enquanto que as matérias menos valorizadas são
escolhidas por alunos de classe média ou classe baixa (alunos de capital lingüístico mais
baixo); há uma relação entre a escolha de um aluno em fazer uma ou outra disciplina, mais ou
menos valorizada, e suas origens e passado escolar.
De acordo com Bourdieu e Passeron (2008), há uma relação entre o sistema de ensino e a
estrutura das relações entre classes sociais em que conceitos como os de oportunidade escolar,
disposição relativa à escola, distância cultural escolar (ou de grau de seleção); que se integram
às propriedades ligadas à dependência de classe (como o ethos de classe ou o capital cultural)
e das propriedades pertinentes da organização escolar, como por exemplo, a hierarquia dos
valores, que implica na hierarquia dos estabelecimentos, das seções, das disciplinas, dos graus
ou das práticas são auxiliadores na compreensão dessas relações.
Mesmo cientes da parcialidade desta colocação – que apenas retém os traços importantes da
dependência de classe com o sistema de ensino, entendido apenas como sistema de
comunicação – os autores consideram-na como uma necessária abstração metodológica; como
condição do entendimento dos aspectos mais específicos e mais encobertos das relações de
reprodução: “é pela maneira particular segundo a qual ele realiza sua função técnica de
comunicação que um sistema escolar determinado realiza, além disso, sua função social de
conservação e sua função ideológica de legitimação” (2008, p.134).
Autoridade Docente e Autoridade da Linguagem
A mensagem transmitida na escola deve ser conduzida por aqueles que têm o direito de
transmití-la aos que são constrangidos a recebê-la, de modo a conferir legitimidade à voz do
professor. Os docentes encontram nas particularidades do espaço escolar as condições
materiais e simbólicas que lhes autorizam manter os discentes a uma certa distância,
conferindo-lhes um alto grau de coerção sobre os alunos, mesmo se estes recusarem-na.
(BOURDIEU e PASSERON, 2008). Portanto, a linguagem dentre todos os meios de coerção
atribuídos à instituição escolar, é a mais perspicaz das formas de coerção e legitimação dos
valores dominantes: “É toda a lógica de uma instituição escolar baseada sobre um trabalho
pedagógico de tipo tradicional e garante até o extremo a ‘infalibilidade’ do ‘mestre’ que se
exprime na ideologia professoral da ‘nulidade’ dos estudantes. (BOURDIEU e PASSERON,
2008, p. 141).
É a linguagem a que explicita as diferenças mais alarmantes entre a língua culta burguesa e a
língua popular, ou seja, é o modo de uso da linguagem o meio mais diferenciador quanto a
posição social do aluno. Por meio da linguagem, o sistema escolar concede ao professor o
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direito e o poder de desviar da instituição para si a autoridade, fazendo com o docente coloque
todos os seus recursos em prol da instituição. Esse é o melhor modo de fazer o docente servir
ao sistema sancionando e legitimando as desigualdades (BOURDIEU e PASSERON, 2008).
Origem social e êxito escolar
Segundo dos autores o exame é um dos instrumentos mais eficazes ao empreendimento de
inculcação da cultura dominante e do valor dessa cultura. Nas palavras deles,
Tanto quanto, ou mais ainda do que pela coerção dos programas, a aquisição da
cultura legítima e da relação legítima com a cultura é regulada pelo direito
consuetudinário que se constitui na jurisprudência dos exames e que deve o
essencial de suas características à situação na qual ele se formula. (BOURDIEU e
PASSERON, 2008, p. 170)
De acordo com Bourdieu e Passeron, para se entender o êxito escolar dos alunos no sistema
educacional francês têm-se que entender (a) as variações de competência lingüística em
função da classe social de origem e (b) a inversão da relação entre a possessão de um capital
cultural (determinado pela profissão do pai) e o grau de êxito. Por sua vez, para compreender
essas relações tem-se que levar em conta dois conceitos, o de capital lingüístico e o grau de
seleção. O capital lingüístico diz respeito à habilidade de se manejar a linguagem,
principalmente a linguagem erudita e suas estruturas complexas; e o grau de seleção diz
respeito à seleção diferencial existente entre estudantes de diferentes sexos e origens sociais.
Bourdieu e Passeron mostram que os alunos de origem social mais populares (assim como os
provincianos) têm menos capital lingüístico, o que impede a maioria deles de passar nas
etapas de seleção da carreira escolar francesa. Segundo o sociólogo, os alunos de classes de
baixa renda são submetidos a uma super-seleção, o que significa dizer que grande parte deles
é barrado nas etapas seletivas e que aqueles que passam são altamente selecionados em seu
meio, ou seja, são os poucos que se adaptaram ou que inculcaram o habitus transmitido pela
ação pedagógica. Dito isso ele afirma que esse processo de super-seleção (que ocorre de
acordo com o contexto e as características relevantes em análise, como por exemplo, a superseleção feminina para cursos que possuem homens majoritariamente) diminui as diferenças
entre os alunos e diminui o peso das origens sociais nos processos seletivos posteriores. Da
mesma forma, explica porque há a inversão da relação direta entre o capital cultural e o grau
de êxito.
Em suma a competência lingüística, e o grau de êxito dos estudantes são produtos da relação
entre seu capital lingüístico e o grau de seleção ao qual foi submetido nas etapas anteriores ao
período analisado, na constituição do que Bourdieu e Passeron chamam de carreira escolar.
A grande valorização do exame no sistema de ensino francês deve-se ao fato de que os
responsáveis pelo funcionamento do sistema educacional estão de acordo em fazer dele uma
exigência de seleção social, tendo a oportunidade e os meios dados pelo Estado para exprimir
completamente a tendência propriamente professoral de maximizar o valor social das
qualidades humanas e das qualificações profissionais que eles mesmos produzem, controlam e
consagram. (p.176)
Em outras palavras, o sistema educacional francês usa do exame para tentar construir uma
hierarquia social em que suas posições estejam nos patamares mais elevados, por isso, a
valorização da forma e do capital lingüístico. Entretanto, Bourdieu e Passeron afirmam que
isso ocorre não sem a concorrência de outras formas de hierarquização social, formuladas por
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outros setores sociais como, por exemplo, o mercado. Nesse contexto, a efetividade da
hierarquização proposta pelo sistema de ensino, para lograr êxito, deve exercer sua ação sobre
classes sociais ou frações de classe que não podem lhe opor nenhum princípio concorrente de
hierarquização. Esse é o mecanismo que
Permite a instituição escolar atrair para a carreira de ensino os estudantes
procedentes das classes médias ou da fração intelectual da grande burguesia,
desviando-os de aspirar a elevar-se noutras hierarquias (BOURDIEU E
PASSERON, 2008, p. 177-78).
A busca de imposição da hierarquia escolar (e pela sua autonomização e autoperpetuação)
exprime uma relação de classes em que a aristocracia e a burguesia intelectualizada
(constitutivas do sistema educacional) tentariam impor a sua forma de hierarquizar a
sociedade, colocando-se no alto da pirâmide social. Essa organização operaria em detrimento
de outras tentativas de hierarquização, como a econômica, que privilegiaria a burguesia.
A tendência à autonomização encontrou as condições sociais de sua plena
realização na medida em que ela foi de encontro aos interesses da pequena
burguesia e das frações intelectuais da burguesia que encontravam na ideologia
jacobina da igualdade formal das oportunidades o reforço de sua impaciência
exacerbada para com todas as espécies de ‘favoritismo’ ou de ‘nepotismo’, e na
medida também em que se apoiou sobre a estrutura centralizada da burocracia
estatal que, convocando a proliferação dos exames e concursos nacionais,
submetidos a correção exterior e anônima, oferecia à instituição escolar a melhor
oportunidade de impor o reconhecimento do monopólio da produção e da
imposição de uma hierarquia unitária ou, pelo, menos, de hierarquias reduzíveis ao
mesmo princípio. (BOURDIEU e PASSERON, 2008, p. 182).
Bourdieu e Passeron expõem que nesse contexto a função do exame não se reduz aos serviços
que prestam à instituição ou às gratificações que ocasiona ao corpo universitário, mas para
reproduzir e legitimar as desigualdades existentes na hierarquia social. Para que se perceba
isso basta observar “que a maioria daqueles que, em diferentes fases do curso escolar, são
excluídos dos estudos se eliminam antes mesmo de serem examinados e que a proporção
daqueles cuja eliminação é mascarada pela seleção abertamente operada difere segundo as
classes sociais”. (2008, p. 186).
De acordo com os autores, “os alunos originários das classes populares têm mais
oportunidades de eliminar-se do ensino secundário renunciando a entrar nele do que de
eliminar-se uma vez que tenham entrado e, a fortiori, do que de serem eliminados pela sanção
expressa através do exame” (BOURDIEU e PASSERON, 2008, p. 187-188). Adicionalmente,
aqueles que não se eliminam no momento da passagem de um ciclo a outro têm mais chances
de ingressarem em escolas às quais estão ligadas as oportunidades mais fracas de ascender ao
nível superior do curso. Dessa forma, Bourdieu e Passeron sugerem que a condição mais forte
de eliminação é a origem social e que na maioria dos casos o exame vem só a ratificar essas
outras espécies de auto-eliminação antecipada.
Bourdieu e Passeron argumentam que as estruturas de oportunidade objetivas de ascensão
social são condicionadas pela estrutura de oportunidades objetivas de ascensão pela escola.
Estas últimas estruturas (de oportunidade da Escola) definem as oportunidades de ingresse e
êxito com particular valorização ao capital lingüístico. Sabendo-se que há variações de capital
lingüístico devido às diferentes origens sociais, diz-se que a escola acaba por reproduzir a
hierarquia social. Além disso, o ethos de classe e o habitus também desempenham um papel
importante no ingresso e êxito dos alunos nas instituições escolares. Alunos de classes mais
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baixas acabam por se auto-eliminarem antecipadamente desistindo de continuar na sua
carreira escolar ou ingressando em escolas que estão ligadas a oportunidades mais fracas de
ascensão escolar.
As críticas às teses reprodutivistas
Segundo Silva (1990), as diversas críticas à perspectiva da reprodução social podem ser
agrupadas em torno das seguintes acusações: são mecanicistas, reducionistas, economicistas e
funcionalistas; supõem uma total passividade dos atores sociais; ignoram o conflito, a
contradição e a resistência; são a-históricas; ignoram ou teorizam inadequadamente as
possibilidades de transformação social; simplistas, pessimistas e derrotistas; não
correspondem àquilo que realmente ocorre.
As teorias da reprodução social são criticadas por serem mecanicistas, reducionistas e
economicistas por suporem um “vínculo direto, automático, não mediato e exclusivo, das
relações sociais da educação e na educação com as relações sociais da produção capitalista”,
como coloca Silva. A acusação acerca do caráter funcionalista dessa perspectiva baseia-se na
suposição (principalmente presente em Althusser e Bowles e Gintis) da presença determinante
de uma finalidade que transcende os motivos e as ações dos membros da sociedade e que é
sua própria manutenção e sobrevivência, minimizando com isso o papel de qualquer ação
consciente de sua parte. A essa idéia agregar-se-ia, também, as críticas a respeito da
passividade dos atores sociais, ou ainda sua impossibilidade de ação; a desconsideração do
conflito, contradição e resistência; a desconsideração das possibilidades de transformação
social; o caráter simplista, pessimista e derrotista.
Por fim a crítica de que as teorias da reprodução não correspondem àquilo que realmente
ocorre aglutina alguns dos questionamentos anteriores. “Os atores sociais não são passivos,
como essas teorias supõem. A dinâmica social é feita de mais conflito, luta e contradição do
que as teorias da reprodução querem admitir” (SILVA, 1990, p. 167). Além disso, há aqueles
em que afirmam que as teorias da reprodução social até poderiam construir uma descrição
adequada dos países de capitalismo avançado, mas que passariam longe da teorização
adequada da dinâmica social de sociedades do Terceiro Mundo, como países da América
Latina, por exemplo.
Pedagogia Crítica e a teoria da Reprodução: interlocuções possíveis e necessárias
A pedagogia crítica e a teoria reprodutivista partilham de percepções macrosociais a respeito
do modo como o poder e o controle funcionam tanto dentro, como fora da escola para
preservar o interesse da sociedade dominante. Henri Giroux um grande expoente da
pedagogia crítica considera as teses de Althusser um importante avanço na teoria educacional
crítica, ao revelarem, a sustentação da eficácia reprodutora da escola nas sociedades
capitalistas através dosa aparelhos ideológicos do estado (escola, igreja, serviço social) e dos
aparelhos repressivos do estado (exército, polícia, prisões), ambos mecanismos
autoreguladores do estado e que funcionam pelo uso do consenso e da força (SILVA, 2006).
Ainda no campo das teorias críticas da reprodução social, Giroux particulariza a sua análise
também em Samuel Bowles e Herbert Gintis. Estes autores mantêm tal como Althusser, uma
abordagem estrutural da problemática reprodutora, no entanto, servem-se de um “aparelho”
teórico diferentes, onde as escolas são analisadas como lugares reprodutores através
fundamentalmente do currículo oculto, de relações sociais que correspondem “as relações de
dominação e subordinação existentes no local de trabalho” (ARONOWITZ e GIROUX, 1993:
142).
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Os teóricos reprodutivistas destacam a importância da força social e política do ensino no
processo de aprendizagem. Pierre Bourdieu e Louis Althusser foram dois grandes expoentes
que apontaram a escola como o cerne legitimação das desigualdades sociais, pois é a escola a
responsável por impor os estilos de pensamento, linguagem e as ações oriundas do grupo
dominante. Embasadas nas idéias de Althusser, Bourdieu e Passeron as teorias críticoreprodutivistas criaram o conceito de “dominação cultural” para demonstrar como o processo
de ideologização está presente no ensino.
Conforme ressalta Giroux (1986) o conceito de capital cultural e o conceito de habitus são de
suma importância na compreensão da teoria da reprodução. Capital cultural diz respeito aos
diversos conjuntos de competências lingüísticas e culturais que os indivíduos legam por conta
dos limites de classe de seus familiares. Bourdieu citado por Giroux argumenta que:
As escolas desempenham um papel particularmente importante tanto na legitimação
quanto na reprodução da cultura dominante, pois as escolas, especialmente a nível
superior, encarnam interesses de classes e ideologias que valorizam um tipo de
familiaridade e conjunto de habilidades que apenas alguns alunos receberam através
de suas experiências familiares e relações de classe. Por exemplo, estudantes cujas
famílias não possuem capital cultural altamente valorizados pela sociedade
dominante estão decididamente em desvantagem. (GIROUX, 1986).
Como ressaltou Silva (2006), Bourdieu e Passeron, analisaram as escolas como instrumentos
de reprodução, mas num sentido que destaca os mecanismos de reprodução cultural como
elementos determinantes para distribuição e legitimação de formas de conhecimento, valores,
linguagens e atitudes e comportamentos que dão forma às culturas dominantes e aos interesses
econômicos e políticos que lhes subjazem.
Os pensadores críticos acabam por revelar algumas fragilidades teóricas significativas no
trabalho de Bourdieu, como a recusa em abordar o modo como as culturas de oposição são
produzidas, mais do que meramente reproduzidas (SILVA, 2006). Os pensadores críticos
concebem as escolas como lugares socialmente contraditórios, que geram possibilidades de
mediação e de contestação das ideologias e práticas dominantes, que tanto evitam que ela seja
só lugar de dominação, como só lugar de emancipação.
Giroux avalia que a racionalidade crítica da reprodução apresenta, limitações relativas às
possibilidades de transformação social através do agenciamento dos sujeitos. A luz da teoria
crítica os professores e estudantes não podem ser considerados, simples receptores da cultura
dominante, servindo apenas para reforçar o sistema escolar existente, contrariamente às teses
críticas da reprodução, que tendem a esquecer que as escolas são nem um lugar de absoluta
dominação, nem de completa resistência, mas uma combinação destas duas dimensões. As
escolas, portanto, são mais do que meros reflexos ideológicos dos interesses da classe
dominante, as escolas são também instituições relativamente autônomas. Para Giroux, as
teorias críticas da reprodução, ignoram esta natureza contraditória das escolas:
Incapaz de desenvolver uma teoria da ideologia que dissesse respeito ao modo pelo
qual os seres humanos dialeticamente criam, resistem e se acomodam às ideologias
dominantes, Bourdieu exclui tanto a natureza ativa da dominação quanto a natureza
da resistência. (1986, p. 124)
Nogueira e Nogueira (2002) mostram como os estudos de Bourdieu acerca do sistema escolar
influenciaram a pedagogia nas décadas de 1970 e 1980: “Desde então, as teorias de
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reprodução foram criticadas por exagerar a visão pessimista sobre a escola... Vários autores
passaram a mostrar que nem sempre as desigualdades sociais se reproduzem completamente
na sala de aula”. (NOGUEIRA, 2002, p. 75). Apesar das críticas, as conclusões de Bourdieu
em seu cerne, não foram contraditas.
Conclusão
O cerne dos estudos de Bourdieu repousa na relevância do capital cultural e do sistema
escolar na reprodução das desigualdades, a obra A reprodução: elementos para uma teoria do
sistema de ensino Bourdieu e Passeron - representantes da escola reprodutivista da educação buscou desvendar os mecanismos da reprodução social que legitimam as diversas formas de
dominação e reproduz a lógica capitalista. Para tanto, eles analisaram a instituição escolar e o
seu caráter de conservação, reprodução e de imobilidade, destacando os mecanismos de
reprodução cultural como elementos determinantes para distribuição e legitimação de formas
de conhecimento, valores, linguagens e atitudes e comportamentos que moldam as culturas
dominantes.
Os teóricos da pedagogia crítica, comprometidos com o desenvolvimento de uma sociedade
mais justa, apontaram as contribuições que os reprodutivistas trouxeram ao mostrar como a
escola mantém o status quo. Não obstante, os teóricos críticos dão um importante passo
adiante ao introduzir a idéia do caráter dialético da escola, ao mostrar que, ao mesmo tempo
em que a escola é um processo de reprodução - pois reproduz a ordem dominante - ela
também produz uma determinada ordem social de resistência ao que está posto. Essa
dialeticidade introduz a idéia de luta no espaço escolar e a possibilidade de emancipação dos
agentes sociais, não existente nas teorias reprodutivistas. Nas palavras de Giroux a pedagogia
crítica: “rejeita a noção de que as escolas são simplesmente locais de instrução, e ao fazer
isso, não apenas politiza a noção de cultura, mas também indica a necessidade de se analisar a
cultura da escola, dentro do terreno cambiante de luta e contestação”. (GIROUX, 1986, p.
151).
Acreditamos na interlocução existente entre a teoria reprodutivista e a pedagogia crítica ,
partindo do ponto de vista que uma teoria não invalida a outra, muito pelo contrário, se
complementam. A teoria crítica da educação de modo lúcido e coerente apontou e analisou o
que seria um dos pontos cegos das teorias reprodutivistas: a negação da escola como espaço
não só da reprodução, mas também o palco da emancipação e das ações de resistência: “o
poder nunca é unidimensional; ele é exercido não apenas como um modo de dominação, mas
também, como um ato de resistência”. (GIROUX, 1986, p. 147).
Desse modo, poder-se-ia dizer que um dos pontos ignorados pela teoria da reprodução e
coerentemente abordado pela teoria crítica seria a idéia de que as escolas “são também locais
culturais e políticos, assim como é ignorado a noção de que as escolas representam arenas de
contestação e luta entre os grupos culturais e econômicos que tem diferentes graus de poder”.
(GIROUX, 1986, p. 17).
A limitação da teoria reprodutivista reside na recorrente percepção das escolas como meras
máquinas administrativas em prol dos interesses da classe dominante para preservar as
desigualdades e assim seus privilégios. Essa visão é muitas vezes vista como funcionalista e
reducionista por ignorar o poder de ação dos atores sociais, não dando possibilidade aparente,
desprezando as possibilidades de alteração social.
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A pedagogia critica bebe da fonte dos reprodutivistas e vai além ao mostrar os atores sociais
não mais como passivos, mas sim, atores sociais capazes de emanciparem-se: “Embora as
escolas sirvam aos interesses do capitalismo, elas também servem a outros interesses, alguns
dos quais são opostos à ordem econômica e as necessidades da sociedade dominante”
(GIROUX, 1986). Apesar das críticas, as conclusões de Bourdieu em seu cerne, não foram
nunca invalidadas pela teoria crítica da educação e nem por nenhuma outra corrente de
pensamento.
Objetivamos neste artigo fugir a uma leitura etapista e evolucionista de educação, que acredita
que há uma linearidade entre as teorias e questionamentos acerca do seu papel social.
Acreditamos que compreender a teoria reprodutivista em seu tempo é um exercício necessário
à construção de massa crítica sobre o papel do ensino e da formação de professores.
Constituir-se como educador é compreender os significados macrossociais da função
pedagógica, buscando desvelar os sistemas de reprodução e buscar superá-los.
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1 Como A Escola Mantém O Status Quo? Alguns Dos