XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 O ENSINO BÁSICO NA VOZ DE SEUS ALUNOS: EM FOCO, A DIMENSÃO AFETIVA Laurinda Ramalho de Almeida Andrea Jamil Paiva Mollica Claudia Maria Labinas Roncon Saud Lilian Corrêia Pessôa Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUCSP Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: Psicologia da Educação RESUMO O trabalho apresentado é um recorte de pesquisa realizada entre 2008 e 2010 por um grupo de estudo do Programa de estudos Pós-Graduados em Educação: Psicologia da Educação da PUC de São Paulo cujo objetivo foi mapear e analisar a produção acadêmica sobre a temática afetividade, no referido programa, de 1969 a 2009. Para o presente artigo foram selecionadas 10 pesquisas desse mapeamento que apresentavam emoções e sentimentos expressos por alunos de escolas públicas do ensino básico objetivando, assim, analisar seus resultados. Os estudos revelaram aspectos importantes que podem contribuir para a transformação da prática docente; a relevância da dimensão afetiva é fortemente evidenciada. É possível reconhecer, por meio do que expressam os alunos, as práticas ou situações que geram satisfação e prazer e que, por isso mesmo, precisam ser intensificadas pelo professor para que sua relação com o aluno possa ser produtiva para a aprendizagem de ambos. Por outro lado, a ausência de compromisso por parte do professor, sua indiferença em relação ao que sentem os alunos durante a sua aula, a adoção de posturas autoritárias, a falta de participação nas aulas, geram sentimentos e emoções que têm no desprazer a sua tônica. A resposta dos alunos diante de situações como essa é o conflito, a rebeldia, a “bagunça”, a falta de vontade de assistir as aulas. Apesar das duras críticas tecidas pela maioria dos alunos das escolas públicas, eles as justificam apoiando-se no sentimento que nutrem pela escola da qual se sentem parte e da qual anseiam obter melhorias. Palavras-chave: afetividade, alunos de escola pública, ensino básico Introdução O trabalho que ora apresentamos é um recorte de pesquisa realizada entre 2008 e 2010 por um grupo de estudo do Programa de estudos Pós-graduados em Educação: Psicologia da Educação da PUC de São Paulo. O objetivo dessa pesquisa foi mapear e analisar a produção acadêmica sobre a temática afetividade, no referido programa, de 1969 a 2009. Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.002314 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 2 Cabe ressaltar que o ponto de partida da referida pesquisa foi o reconhecimento de que cognição e afetividade são dimensões constitutivas da pessoa e que, portanto, no processo ensino-aprendizagem, em todos os níveis de ensino, não se pode privilegiar o aspecto cognitivo, desmerecendo o afetivo, visto que o que se alcança na dimensão afetiva repercute no cognitivo e vice-versa. A pesquisa caracterizada como estado do conhecimento passou pelos seguintes passos: 1) Foi elaborada uma lista de descritores relacionados à temática da afetividade no contexto escolar, a ser usada para orientar a busca dos trabalhos. Tomou-se o cuidado de selecionar tanto termos gerais como termos próprios de várias abordagens: sentimentos, emoções, afetividade, dimensão afetiva, relações afetivas, relações interpessoais, sentimentos nomeados (alegria, medo, raiva etc.), responsabilidade, empatia, consideração positiva incondicional, autenticidade, congruência, comportamento emocional, conflitos, indisciplina, vínculo afetivo, relação professoraluno, relação professor-professor, relação entre agentes escolares nomeados (gestor, coordenador pedagógico, professor etc.), vínculo professor-aluno, atenção, desatenção, violência, bullying e burnout; 2) foram definidos como critérios, quanto ao processo de identificação dos trabalhos: seleção por títulos, palavras-chave, resumos e, em caso de dúvida, leitura das pesquisas na íntegra; 3) foram utilizados os seguintes caminhos, para a constituição do corpus para análise: a) para os primeiros 30 anos de produção utilizou-se do catálogo 30 anos de Produção em Psicologia da Educação - Dissertações e Teses (MOROZ,1999); b) para os dez últimos, Biblioteca Digital da PUC-SP - Sapientia ou visitas à biblioteca, no caso da necessidade de leitura do trabalho na íntegra. O mapeamento revelou a existência de 71 pesquisas (teses e dissertações) que tratavam da afetividade, sendo seis teóricas e 65 empíricas. Para critério de análise, estas últimas foram classificadas em função dos sujeitos das pesquisas: aluno (30), professor (15), professor e aluno (11), agentes educativos, como diretor, vice-diretor e coordenador pedagógico, entre outros (09). A partir desse procedimento, cada pesquisa foi analisada e foram feitas importantes reflexões acerca do debate sobre afetividade no contexto escolar. Para o presente artigo, selecionamos 10 pesquisas que têm como destaque o sujeito aluno. Isto porque, dos 30 estudos mapeados, 10 deles revelam emoções e Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.002315 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 3 sentimentos expressos por alunos de escolas públicas do ensino básico. Assim sendo, o presente trabalho tem como objetivo analisar os resultados das pesquisas que tratam da afetividade no contexto escolar a partir do olhar do aluno. Ao fazermos a discussão, fundamentamo-nos na teoria psicogenética de Henri Wallon (1879-1962) por considerarmos que a mesma nos oferece recursos para compreendermos, entre outros fatores, a manifestação da afetividade. A respeito desta, basicamente, a teoria postula que é um conjunto de funções psíquicas, que ligado a outros conjuntos, o cognitivo e o motor, constituem a pessoa. Considerando especificamente a afetividade, a teoria apresenta três momentos de evolução emoção, sentimento e paixão. A emoção é visivelmente percebida, por ser orgânica, expressa no corpo, embora de curta duração; o sentimento não é tão visível quanto à emoção, mas é mais duradouro, o ser humano expressa de forma representacional o que sente; a paixão evidencia o autocontrole, para dominar a situação não deixando que as emoções e sentimentos sejam percebidos pelo outro, para atender ao objetivo que pretende. Além dos fundamentos indicados acima vale ainda salientar outro pressuposto essencial dos estudos wallonianos: a integração organismo-meio. Para o teórico, o desenvolvimento humano só é possível por meio da relação complementar e recíproca entre os fatores orgânicos e socioculturais. O meio “[...] é o complemento indispensável do ser vivo. Ele deverá corresponder às suas necessidades e às suas aptidões sensoriomotoras e, depois, psicomotoras [...].” (WALLON, 1986, p.168). A escola é um meio considerado por Wallon como funcional, pois tem a função outorgada pela sociedade de promover ensino e aprendizagem. É nela que os alunos passam boa parte do seu tempo e é o campo de atuação de diversos profissionais da educação. Nas relações que se estabelecem no espaço escolar (salas de aula, salas de reuniões, pátio etc.) seus membros afetam-se reciprocamente e nessas relações se dá o desenvolvimento (este pode ser facilitado ou barrado). De acordo com os estudos wallonianos, o meio social predomina sobre o meio físico, e o outro das reações interpessoais tem papel fundamental. Procedimento metodológico Como já referido, este texto refere-se a um recorte de pesquisa já concluída. Para efeito desta comunicação, e para atender aos objetivos do XVI ENDIPE, selecionamos, em primeiro lugar, as 30 pesquisas analisadas que tinham como foco o sujeito aluno. Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.002316 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 4 Em seguida, identificamos aquelas que tratavam de emoções e sentimentos (dimensão afetiva) dos alunos do ensino básico de escolas públicas. Uma vez selecionados tais estudos, estes foram organizados em função dos níveis de ensino aos quais se refere, explicitando o nome do autor, a data da pesquisa, o título, a problemática e o referencial teórico. Tal organização permitiu a seguinte categorização dos trabalhos. Ensino Fundamental I: 1- PIRES, Raquel Domingues (1996). Esta é a escola que adoro: concepções de alunos de 8 a10 anos- mestrado PROBLEMA: Investigar que concepção criança de 8 a 10 anos tem de sua escola, como concebem a escola real que lhes é oferecida e a distância que a separa da escola que deseja. REFERENCIAL: Wallon 2-FRANCO, Adriana de Fátima (2001). Auto-Estima nas Classes de Aceleração: da Concepção Teórica à Implementação- mestrado PROBLEMA: Qual a visão de alunos de classes de aceleração acerca de si mesmos e de seu processo de escolarização? REFERENCIAL: Vygostsky Ensino fundamental II: 1- ARDITO, Maria Teresa Medeiros (1999). A raiva na escola: um estudo com adolescentes- mestrado PROBLEMA: Estudar as concepções do adolescente frente à emoção raiva no contexto escolar REFERENCIAL: Wallon 2- GONÇALVES, Marta de Oliveira (2005). A alegria na escola - um estudo com adolescentes paulistanos- mestrado PROBLEMA: O que provoca alegria em adolescentes no contexto escolar? REFERENCIAL: Wallon Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.002317 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 5 3- MORAES. Regiane Rodrigues (2008). A escola vivida por adolescentes: situações agradáveis e desagradáveis- mestrado PROBLEMA: Investigar as situações agradáveis e desagradáveis que ocorrem na escola a partir do ponto de vista do aluno, possibilitando o conhecimento destas situações e os sentimentos nelas envolvidos. REFERENCIAL: Wallon 4-HORNBLAS, David S. (2009) Bullying na escola: como as crianças lidam e reagem diante de apelidos pejorativos- mestrado PROBLEMA: Investigar um dos recortes do bullying:o uso de apelidos pejorativos, ou seja, como sentem e reagem crianças vítimas desse processo REFERENCIAL: Wallon Ensino Médio: 1-THOMÉ, Melissa (2001). O quê ajuda a aprender? - Características da relação professor-alunos segundo adolescentes.mestrado PROBLEMA: O que o aluno adolescente concebe por relação professor-aluno? REFERENCIAL: Wallon 2-VEREDA, Rita de Cássia (2007). O apelido pejorativo na escola - um estudo com adolescentes paulistanos- mestrado PROBLEMA: Qual a visão do adolescente sobre o apelido pejorativo na escola? REFERENCIAL: Wallon 3-SCHARPF, Luciana (2008). Afetividade em sala de aula: um estudo com adolescentes da rede pública de ensino- mestrado PROBLEMA: A partir da perspectiva dos adolescentes, quais os sentimentos presentes na relação entre professores e alunos, vulneráveis socialmente e suas situações indutoras? REFERENCIAL: Wallon Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.002318 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 6 4-SILVA, Helcio José dos Santos (2008). Afetividade e o estudo de filosofia: um estudo com alunos do Ensino Médio de uma Escola Pública Paulista- mestrado PROBLEMA: Identificar os sentimentos apresentados por adolescentes de Ensino Médio da escola pública frente as aulas de Filosofia, bem como as situações provocadoras destes sentimentos. REFERENCIAL: Wallon Portanto, das 10 pesquisas selecionadas, todas dissertações de mestrado, duas referem-se ao ensino fundamental I, quatro ao ensino fundamental II e quatro ao ensino médio. Com exceção de um trabalho (FRANCO, 2001), nove têm como referencial teórico Henri Wallon. A partir dos resultados das pesquisas fizemos as discussões que seguem. O que dizem os alunos: o entrecruzamento de diferentes pesquisas A discussão que propomos acerca da escola pública tem seu foco no aluno da educação básica, o personagem mais importante na instituição escolar, embora acreditemos que todos os envolvidos exercem papel de relevância no processo educativo. O entrecruzamento de diferentes pesquisas que será feito oportuniza ampliar a compreensão sobre a questão estudada e levantar outros questionamentos que individualmente não se tornaram evidentes, devido ao objetivo de cada uma das pesquisas. O artigo que ora apresentamos teve por fundamento essa premissa. A análise das duas pesquisas que ouviram os alunos do Ensino Fundamental I (1º ao 5º ano) revelou que a ambivalência (própria do ser humano) dos sentimentos que a escola suscita é merecedora de atenção e cuidado por parte do professor. Os resultados da pesquisa de Pires (1996), realizada com alunos de 8 a 10 anos de uma escola pública do interior de São Paulo, apontam para uma escola real que, apesar de suas limitações é amada pelos alunos, e outra escola desejada, em que mais alegria, liberdade e respeito possam existir. Os alunos expressam o seu amor pela escola, mas a desejam como ambiente onde reine sentimentos de alegria, liberdade, respeito. Expressam também, ao falar de escola desejada, a representação dos diferentes meios. Wallon (1975, p.167) elucida esse aspecto: Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.002319 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 7 Vários meios podem então misturar-se dentro do mesmo indivíduo, podem até encontrar-se em conflito. [...] Assim, a existência de meios reais pode ser duplicada na criança por juízos de valor ou por aspirações imaginativas, no desenrolar dos quais ela opõe a situação onde queria estar à sua e o caso dos outros ao seu próprio destino. Os meios onde a criança vive e os que ambiciona são o molde que dá cunho à sua pessoa. A compreensão de meio em Wallon vai além do espaço físico. Abarca também as relações sociais (tal como também postula Vygotsky) a organização funcional que reúne pessoas diferentes com objetivos comuns, com os mesmos direitos e deveres, e abarca também aquilo que desejam, que sonham, que ambicionam. O que esperar, então, de uma educação que busca apenas a concretização de seus objetivos de modo unilateral, a partir de um único ponto de vista (o de seus idealizadores), sem que sejam considerados os sujeitos implicados no processo? Quais são os efeitos de um ensino padronizado, quando se sabe que o meio em que ele ocorre (a escola como espaço físico e funcional) está constituindo, constantemente, aqueles que dele fazem parte? O meio, portanto, ou os vários meios com os quais o aluno se relaciona, afetamno sobremaneira. O professor, ciente disso, poderá investir na busca de formas para afetar o aluno de modo positivo (agradável, estimulante, interessante, desafiador etc), importando-se com o que ele produz, com o que pensa, com o que deseja, com o que é próprio da sua idade, com os limites necessários, com o respeito às regras de convivência. A pesquisa de Franco (2001) traz à tona a questão do fracasso escolar. O foco do seu estudo foram os alunos das Classes de Aceleração. Essas classes faziam parte de um programa (hoje extinto) de recuperação de alunos com dificuldade de aprendizagem e defasagem de série em relação à idade. Os resultados que obteve revelam que o olhar do outro é um elemento central na constituição do sujeito e, ao confluírem (olhar do sujeito/olhar do outro), despertam medos que geram inseguranças e dificultam a manutenção de um sentimento positivo sobre si mesmo. Não apenas nas classes de aceleração, porém com mais razão nelas, a segurança e a autoestima são imprescindíveis para que a aprendizagem possa ocorrer. Um professor que atue com segurança e tranquilidade geralmente afeta de tal modo os seus alunos que contribui para a sua aprendizagem. O contrário também é verdadeiro. Agitação e impaciência podem favorecer a falta de concentração e indisponibilidade para aprender o que é proposto. Como aprender com esse outro (neste caso o professor) que não acredita no aluno, que Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.002320 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 8 não lhe dá oportunidade de agir autonomamente ou não concede o devido valor às suas produções? A atuação docente deve, pois, cuidar das relações que se estabelecem no espaço escolar, tendo em vista o fato de que essas são mutuamente constitutivas dos sujeitos nela envolvidos. Placco (In PLACCO e ALMEIDA, 2008, p. 69) destaca que: Pelas relações com seus alunos, o professor expressa seu conhecimento e compromisso com seu desenvolvimento social, emocional e cognitivo, nas diferentes faixas etárias. O aprimoramento dessas relações pode e deve possibilitar a construção de um espaço individual e coletivo de desenvolvimento de cada um – alunos e professores. Dos quatro estudos cuja proposta foi compreender questões afetivas na perspectiva dos alunos do Ensino Fundamental II (6º ao 9º ano), dois referem-se a sentimentos de tonalidades desagradáveis, como raiva (ARDITO, 1999) e sentimentos de mal- estar diante de apelidos pejorativos (HORNBLAS, 2009); um dos estudos teve como foco a alegria (GONÇALVES, 2005), sentimento de tonalidades agradáveis; e o último estudo dessa seleção tratou da afetividade em suas manifestações de tonalidades agradáveis e desagradáveis (MORAES, 2008). No que concerne à raiva, o estudo de Ardito (1999) evidencia o quanto as experiências que envolvem injustiça, desrespeito, humilhação na frente de outras pessoas, falta de diálogo entre alunos e professores, bem como quando estes agem de forma autoritária, despertam o sentimento de raiva. A pesquisa realizada por Hornblas (2009) revela que o uso de apelidos pejorativos, tão discutido atualmente, afeta o aluno de tal modo que pode dar origem a sofrimentos psicológicos e reações intempestivas por parte dos alunos a quem são destinados tais apelidos. Esses estudos ratificam a importância de cuidados com as relações que se estabelecem no contexto escolar. É comum ouvir o relato de professores sobre o quão difícil é lidar com adolescentes, especialmente por causa do constante enfrentamento e contestação, característicos dessa faixa etária. A compreensão sobre os motivos e situações que afetam os alunos, despertando-lhes o sentimento de raiva e afins (humilhação, tristeza, vingança etc.) pode contribuir para que a prática docente seja constantemente revista, de modo a propiciar a diminuição desses eventos, melhorando a relação professor-aluno e, como consequência, favorecer a aprendizagem. Não é suficiente, porém, saber o que revelam os sentimentos de tonalidades desagradáveis para investir na diminuição da frequência com que ocorrem. É preciso conhecer os indutores dos sentimentos de tonalidades agradáveis para que seja possível Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.002321 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 9 propor mudanças significativas no trabalho docente. Nesse sentido, os resultados obtidos na pesquisa realizada por Gonçalves (2005), apontam que as situações que afetam o aluno, despertando nele o sentimento de alegria, ocorrem quando envolvem o conhecimento, o espaço e a rotina escolar, os amigos, os professores, o sexo oposto. Além disso, algumas atividades que a autora denomina como extraescolares. Para a autora, é importante conhecer as situações indutoras da emoção e do sentimento alegria no adolescente, pois, desse modo torna-se possível intensificar os momentos de satisfação escolar. Moraes (2008), em sua investigação sobre o que afeta os alunos adolescentes na escola, seja de modo agradável ou desagradável, evidenciou o desejo que eles têm de participar ativamente do processo ensinoaprendizagem. Essa pesquisa também revelou que os alunos valorizam a escola onde estudam e, por isso mesmo, tecem críticas a ela em alguns aspectos que acreditam que podem ser melhorados. Mais uma vez é enfatizada a necessidade e, portanto, a importância de pensar no ensino considerando-se as diferentes perspectivas, a diversidade de interesses e necessidades de todos os envolvidos no processo. As pesquisas que envolveram os alunos do Ensino Médio, buscando compreender o que os afeta no contexto escolar, foram realizadas por Thomé (2001), Vereda (2007), Scharpf (2008) e Silva (2008). Tal como as pesquisas citadas anteriormente, que se referem a outros segmentos de ensino (Ensino Fundamental I e II), essas também conferem relevo à necessidade de levar em consideração as situações ou experiências que afetam os alunos de diferentes modos ao se planejarem as atividades escolares. Em sua pesquisa, Thomé (2001) conclui que o aluno adolescente deseja que o professor demonstre interesse por ele; a forma como o professor se relaciona com ele, pode gerar interesse ou desinteresse pela disciplina. A autora afirma que os alunos têm clareza e descrevem comportamentos de professores que auxiliam ou não no estabelecimento de uma relação que “ajuda a aprender”. Desse modo, nota-se que o quanto esse “ouvir os alunos atentamente” pode fornecer bons encaminhamentos para as interações que ocorrem no meio escolar. O estudo de Vereda (2007), apresenta a visão do aluno adolescente a respeito do apelido pejorativo na escola. Seu propósito foi oferecer subsídios aos professores no enfrentamento de questões relacionais de seus alunos, revelando a importância de conhecer e lidar com as ocorrências que afetam os alunos de modo desagradável, uma Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.002322 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 10 vez que isso pode comprometer tanto a sua aprendizagem como o modo de relacionar-se com os colegas. Scharpf (2008) também realiza um estudo com adolescentes, buscando compreender, na perspectiva destes, os sentimentos decorrentes da relação professoraluno em sala de aula, as situações indutoras de tais sentimentos, bem como o modo pelo qual esses adolescentes lidam com isso. Sua proposta buscou compreender sentimentos que geram prazer ou desprazer, entretanto, a autora destaca que seus resultados revelaram a ênfase que os adolescentes participantes da pesquisa deram aos sentimentos de mal estar (provocado pela falta de compromisso do professor, por sua indiferença, ausência de elaboração de uma boa aula,...), expondo a precariedade das relações entre professores e alunos na rede pública de ensino, fato que merece a atenção de todos os que se dedicam à pesquisa em educação. O propósito do estudo de Silva (2008) foi identificar os sentimentos que os alunos do Ensino Médio de uma escola estadual paulista expressam acerca das aulas de filosofia e as situações provocadoras destes sentimentos. No caso dessas aulas, na escola pesquisada, predominam no discurso dos alunos sentimentos de tonalidades desagradáveis. Isto porque suas expectativas não são atendidas- esses adolescentes esperam encontrar na filosofia a compreensão de si e do mundo em que vivem, e o professor não dá conta desses aspectos. Aprendizagem que advém do aluno: alguns apontamentos finais. As pesquisas analisadas nesse texto contemplam aspectos importantes que podem contribuir para a transformação da prática docente. Um dos aspectos que se evidencia com força é a relevância da dimensão afetiva. Mostram as pesquisas, por exemplo, que há alunos que revelam não gostar de uma determinada disciplina porque não gostam do professor. Mostram, também, que os alunos compreendem que um professor afetivo é aquele que estabelece os limites, as regras, a valorização do trabalho do aluno, o respeito, a ética, enfim, toda a gama de normas e valores que fazem sentido na nossa cultura. O trabalho realizado pelos pesquisadores dos estudos ora apresentados, evidencia a necessária compreensão da dimensão afetiva que, longe de abarcar apenas sentimentos e emoções de tonalidades agradáveis, dela igualmente fazem parte aqueles cuja tonalidade é desagradável. Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.002323 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 11 Desse modo, é possível reconhecer, por meio do que expressam os alunos, as práticas ou situações que geram satisfação e prazer e que, por isso mesmo, precisam ser intensificadas pelo professor para que sua relação com o aluno possa ser produtiva para a aprendizagem de ambos. São os próprios alunos que relatam o quanto uma aula bem preparada, uma dinâmica diferenciada quando possível, a valorização da sua produção, o respeito mútuo, a possibilidade de participação durante as aulas, suscitam sentimentos e emoções prazerosos e, portanto, os ajudam a aprender. O contrário também é verdadeiro, ou seja, a ausência de compromisso por parte do professor, sua indiferença em relação ao que sentem os alunos durante a sua aula, a adoção de posturas autoritárias, a falta de participação nas aulas, geram sentimentos e emoções que têm no desprazer a sua tônica. A resposta dos alunos diante de situações como essa é o conflito, a rebeldia, a “bagunça”, a falta de vontade de assistir as aulas. Sem a pretensão de apresentarmos respostas como verdades definitivas ou como o único caminho a seguir, encerramos esse texto com a análise do conjunto de pesquisas que o compuseram, afirmando sua crença numa escola pública de excelência, partilhando, assim, do que disseram a maioria dos adolescentes participantes das pesquisas apresentadas, quando apesar de tecerem duras críticas à escola em que estudam, justificam tal atitude apoiando-se no sentimento que nutrem pela escola da qual se sentem parte e da qual anseiam obter melhorias. 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Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.002324 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 12 PIRES, Raquel Domingues. Esta é a escola que adoro. Concepções de alunos de 8 a 10 anos. Dissertação de Mestrado. PUC-SP, 1996. PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza. IN: PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza e ALMEIDA, Laurinda Ramalho. (Orgs). O coordenador pedagógico e os desafios da educação. São Paulo: Edições Loyola, 2008. SHARPF, Luciana. Afetividade em sala de aula. Um estudo com adolescentes da rede pública de ensino. Dissertação de Mestrado. PUC-SP, 2008. SILVA, Hélcio José dos Santos. Afetividade e a aula de filosofia. Um estudo com alunos do Ensino Médio de uma escola pública paulista. Dissertação de Mestrado. PUCSP, 2008. THOMÉ, Melissa. O que ajuda a aprender? Características da relação professoralunos segundo adolescentes. Dissertação de Mestrado. PUC-SP, 2001. VEREDA, Rita de Cássia. O apelido pejorativo na escola. 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