Glúten: dos
conceitos ao
trabalho do INSA
Marina Rocha Pité
Seminário: Glúten e Segurança Alimentar, 2008
Glúten: definição
Utilização de glúten na indústria alimentar
Legislação rotulagem/ limites recomendados
Proposta espanhola: nova Directiva?
Métodos de Análise de glúten em alimentos
Alimentos analisados no INSA - implicações para a indústria
Considerações finais
Definição Glúten
Segundo o Codex Alimentarius: “fracção proteica do trigo, cevada, centeio e aveia,
suas variedades cruzadas e derivados, a que algumas pessoas são intolerantes (celíacos)
e que é insolúvel em água e numa solução de 0,5 M de cloreto de sódio”.
Trigo
Cevada
Centeio
Aveia
Utilização de glúten na Indústria Alimentar
O glúten foi isolado pela 1ª vez a partir da farinha em 1745, por Jacopo Becari, numa
experiência que consistia em lavar farinha de trigo com água, separando assim o
amido do glúten. Esta descoberta tornou-se a base da indústria dos cereais.
Crescente aplicação na indústria alimentar:
A- Características físicas e funcionais
(estabilidade ao calor, efeitos de textura e sabor)
B- Baixo custo
Fortificação de farinhas de baixo teor proteico
Alimentos vegetarianos como substituto proteico da carne;
Queijos sintéticos – oferecendo-lhes características texturais e de paladar semelhantes
Cereais de pequeno almoço fortificados com glúten;
Medicamentos (factores de enchimento)
Produtos de Cosmética
Indústria papel, têxtil e quimica
(+) Trigo
Durum
Espelta
Kamut
Bulgur
(?) Amido de trigo
(+) Farinha integral
(+) Gérmen de trigo
(+) Seitan= glúten de trigo
(+) Aveia
(+) Centeio
(+) Cevada
(+) Cuscus (de trigo)
(+) Farelo
(+) Massas / Pasta / Lasanha
(+) Semolina
(+) Triguilho
(+) Triticale
(?) Cereais de peq.almoço
(+) Pizza comercial
(+) Malte
(+) Extracto de malte
(?) Amido vegetal
(? ) Extracto proteico vegetal
(?) Proteína vegetal hidrolizada
(?) Proteína vegetal texturizada
Batatas ou outros amidos
(+) Batatas congeladas com
farinha de trigo adicionada
(?) Batatas fritas de pacote
(?) Puré de batata
Leite e derivados
Bebidas
Cereais e derivados
(+) Cerveja
(+) Bebidas contendo malte
(+) Cafés misturados com cevada
(+) Chás de ervas (c/ malte de
cevada)
(?) Leite aromatizado
(+) Leite maltado
Produtos cárneos
(?) Conservas/congelados carne ou
peixe
(?) Fiambre, presunto, chouriço
(+) Farinheira/alheira
(?) Croquetes
(?) Rissóis
(+) Panados industriais
(?) Charcutaria comercial
(?) Hamburguer de tofu
(?) Patés
Molhos/Óleos/Condimentos
(?) Maionese
(?) Ketchup
(?) Mostarda
(?) Temperos industrializados
(?) Molho de soja
(+) com glúten;
(?) Leites achocolatados
(?) Leites aromatizados
(?) Queijos
(?) Iogurtes
Doces/Sobremesas/Pastelaria
(?)
(?)
(?)
(?)
(?)
(?)
(?)
(+)
(+)
(+)
(+)
(?)
Compotas
Puré de castanha
Bombons
Chocolates
Caramelos
Pudins
Gelados
Bolos
Biscoitos
Bolachas
Tartes
Gelatinas
Outros
(?) Aperitivos
(?) Sopas
(?) Conservas várias
Aditivos
(?) E-14XX – amidos modificados
(?) pode conter glúten
Legislação - Rotulagem
Directiva 2003/89/CE
Modifica a Directiva 2000/13/CE no que respeita à indicação dos ingredientes
presentes nos géneros alimentícios
“Tendo em conta que determinados ingredientes podem provocar alergias ou
intolerâncias … deve ser obrigatória a inclusão na lista de ingredientes qualquer
ingrediente que se utilize na produção de um alimento e que se mantenha no produto
acabado, quando sejam alguns dos ingredientes enumerados no Anexo III da
Directiva”
ANEXO III
“ Cereais que contêm gluten (trigo, centeio, cevada, aveia, espelta, kamut e
variedades cruzadas)”
Directiva 2007/ 68/CE - altera o Anexo IIIA da Directiva 2003/89/CE no que
respeita a determinados ingredientes alimentares
Ingredientes que com base em pareceres da EFSA, não são susceptíveis de
provocar reacções indesejáveis em indivíduos susceptíveis.
– Xaropes de glucose produzidos à base de trigo (incluindo a dextrose) ou de
cevada
– Maltodextrinas de trigo
– Cereais utilizados na produção de destilados ou de álcool etílico de origem
agrícola, para bebidas espirituosas e outras bebidas alcoólicas
Teores de glúten recomendados pelo Codex Alimentarius
A Comissão do Codex Alimentarius – Relatorio ALINORM 08/31/26, Novembro de 2007,
para. 64, apêndice III, pagina 50 (aprovado em ALINORM 08/31/22 de Julho 2008), define:
Géneros alimentícios “sem-glúten”:
a) consistindo em ou produzido somente com ingredientes que não contenham trigo
centeio, cevada, aveia e suas variedades cruzadas e que os níveis de glúten não
excedam 20 mg/kg no total.
b) consistindo em um ou mais ingredientes com trigo, centeio, cevada, aveia e
variedades cruzadas, que foram especificamente processados para remover glúten, e
que os níveis de glúten não excedam 20 mg/kg no total.
Géneros alimentícios processados para reduzir o teor de glúten
entre 20 a 100 mg/kg:
Consistindo em um ou mais ingredientes provenientes do trigo, centeio, cevada, e ou
aveia e suas variedades cruzadas, que foram especificamente processados para reduzir
o teor em glúten para níveis entre 20 e 100 mg/kg no total.
“ com baixo teor em glúten ” ?
Plano de suporte a pessoas com intolerância ao glúten
O Ministério da Saúde e do Consumo Espanhol estabeleceu
recentemente um Plano de Suporte a Pessoas com intolerância ao
glúten
No âmbito deste Plano têm tomado medidas a várias níveis
Proposta apresentada à União Europeia este ano (baseada em
mecanismos legais em vigor em Espanha)– sugerindo a elaboração de
uma nova directiva para a rotulagem de géneros alimentícios e que trará
como uma das principais novidades:
- Pela 1ª vez se estabelece que um produto sem glúten não deve
superar os 20 mg/kg, quer seja destinado a consumo exclusivo para
celíacos ou consumo geral, incluindo a presença de glúten por
contaminação cruzada
Métodos de análise de glúten em alimentos
Codex Alimentarius
Comité de Métodos de análise e de amostragem
5. Métodos de Análise e Amostragem
5.1 Requisitos gerais
A determinação quantitativa do glúten em géneros alimentícios e ingredientes deve
ser baseada num método imunológico ou outro método que providencie igual
sensibilidade e especificidade.
O anticorpo usado deve reagir com as fracções proteicas do cereal que são tóxicas a
pessoas intolerantes ao glúten e não devem reagir com proteínas de outros cereais ou
outros constituintes do alimento ou dos ingredientes.
O limite de detecção deve ser menor que 10 mg gluten/kg.
A análise qualitativa que indica a presença de glúten deve ser baseada em métodos
relevantes (métodos ELISA, métodos ADN)
5.2 Método para determinação de glúten
Ensaio imunoenzimático ELISA - R5, método de E. Mendez (Unidade de Glúten –
CNB)
Glúten- Composição
Gliadinas - trigo
Secalinas - centeio
Aveninas - aveia
Hordeínas - cevada
50%
Figura 1- O grão de trigo e sua constituição
Método ELISA-R5
Métodos imunoenzimáticos ELISA
Rápido, de simples implementação,
especificidade,
sensibilidade
Princípio do método ELISA - Princípio imunológico de reconhecimento e
união de anticorpos às moléculas de antigénio – prolaminas)
Método ELISA-R5 “sandwich”
Validado pelo AOAC – Association of Analytical Communities
Limite de detecção 3 mg de glúten/kg, Limite de quantificação 5 mg/kg
Específico para as prolaminas do trigo, centeio e cevada).
Método ELISA-R5 “competitivo”
Detecta prolaminas hidrolisadas do trigo, centeio e cevada
(cervejas, xaropes, fórmulas infantis)
Limite de detecção 3 mg de glúten /kg
Método ELISA-R5 “competitivo”
Específico para as prolaminas da aveia
Limite de detecção – 8 mg de glúten/kg
Método ELISA-R5 “sandwich”
Homogeneização (trituração, etc)
Pesagem para tubo de análise
Adição de solução “cocktail”
Estufa (50ºC)
40 min
ETANOL
60% (v/v)
Etanol (80%)
Centrifugação
≥2500 g (20-25ºC)
Trigo?
Centeio?
Cevada?
Aveia
“COCKTAIL”
> 90 ºC
Diluição
Extracção com remoção
de taninos
ELISA
Outros métodos de análise de glúten
Western blot/SDS-PAGE
Vantagens: Detecção de proteínas insolúveis. Permite
identificar as proteínas do glúten; Não permite a
quantificação; LD - 10 ppm
Desvantagens: Muito demorado, requer formação e
especialização
SDS-PAGE
PCR (“Polimerase Chain Reaction”)
Vantagens: Sensibilidade muito alta. Permite
identificar qual o cereal contaminante;
Desvantagens: Não detecta as proteínas, só o ADN
que as codifica; requer formação e especialização
Espectrometria de massas (MALDI-TOF “Matrix
Assisted Laser Desorption Ionization – Time of
Flight )
Vantagens: Rápido, reprodutível; Ideal para a
tipificação das proteínas;
Desvantagens: Instrumentação complexa, cara, não
quantitativa, necessita prévia elaboração de livrarias
de espectros
MALDI-TOF
Outros métodos de análise de glúten (cont)
Tiras imunocromatográficas
Vantagens: bom método para a
indústria, rápido e de interpretação
visual
Desvantagens: Não permite a
quantificação
LD – 5 ppm
+
▬
Trabalho realizado no INSA
Protocolo INSA – Associação Portuguesa de Celíacos (APC) em 2005
(1)
(2)
(3)
(5)
Validação método ELISA-R5/ Comparação c/ o método ELISA de Skerritt
Avaliação do teor de glúten em alimentos
ELISA-R5 “sandwich” vs “ competitive” /outras metodologias
Inquérito à população celíaca – caracterização da DC em Portugal
Ensaios interlaboratoriais FAPAS
Avaliação do teor de glúten em alimentos
Analisámos até agora no INSA 250 amostras para o teor de glúten, utilizando o
método ELISA-R5
A APC selecciona diferentes produtos correntes no mercado que lhes suscitam
dúvidas quanto à presença de glúten
Foi registada a descrição do rótulo de cada um dos produtos analisados
Foram comparados os resultados analíticos obtidos com a informação
veiculada pelo rótulo
Alimentos analisados
Produtos destinados a celíacos (28)
Cereais, tubérculos, e seus derivados (47)
Refeições pré - preparadas (12)
Molhos / Especiarias/ Caldos de carne e peixe (16)
Produtos de charcutaria (26)
Confeitaria/ Sobremesas/ Gelatinas (21)
Produtos à base de chocolate (27)
Gelados (30)
Outros (43)
Fórmulas infantis <LD
Pão
Cereais, tubérculos, e seus derivados
! Arroz e derivados
Dos 5 produtos analisados, 2 tinham teores de glúten > 20
ppm, um deles perto dos 5000 ppm.
! Milho e derivados
Dos 26 produtos analisados, 10 apresentaram teores de glúten
superiores a 20 ppm, um deles chegando aos 600 ppm.
Cereais peq. Almoço (à base de milho ou arroz)
Foram analisados 3 produtos sem ingredientes com glúten,
apenas 1 com > 20 ppm
Batatas, mandioca, tapioca e derivados
Dos 10 produtos analisados, apenas 2 com vestígios de glúten
(4 e 10 ppm).
Outros Alimentos
Refeições pré - preparadas
12 produtos analisados, todos estavam de acordo com a rotulagem,
com excepção de 1 que apresentava teores de glúten >> 20 ppm e
que não tinha nenhum ingrediente com glúten no rótulo.
Molhos / Especiarias/ Caldos de carne e peixe
Os 16 produtos analisados apresentaram teores de glúten < 20 ppm
ou < LD
Produtos de charcutaria
Dos 26 produtos de charcutaria analisados, nenhum apresentou
teores detectáveis de glúten com excepção de um com apenas 7
ppm, apesar de 14 produtos informarem no rótulo que contêm
glúten ou que podem conter glúten.
Confeitaria / sobremesas / gelatinas
21 produtos analisados, todos estavam de acordo com a informação
rotulada, 6 desses produtos (gelatinas) apresentavam no rótulo
“pode conter vestígios de trigo” e apenas 1 delas apresentava 11
ppm de glúten.
Produtos à base de chocolate
27 produtos analisados, os resultados foram concordantes com os
rótulos. 2 deles diziam que pode conter vestígios de trigo (num foi
quantificado 6 ppm de glúten, outro < LD)
Gelados
30 produtos analisados, apenas 2 gelados (sem ingredientes com
glúten) continham teores de glúten > 20 ppm e < 100 ppm
Outros
43 produtos analisados:
Vegetais e legumes congelados, peixe congelado, produtos à base
de soja, fermento, aperitivos, < LD
“pode conter vestígios de ….”
12 alimentos analisados apenas 1 tem > 20 ppm, a maioria < LD
(gelatinas, produtos de charcutaria, chocolates)
Exemplos
“Contém glúten”
rótulos
14 alimentos analisados, apenas 1 com 7 ppm de glúten
Caldo de carne e peixe (molho de soja), produtos de charcutaria
“Molho de soja (contém glúten )”
6 alimentos analisados , só 1 tem 20 ppm. Molho de soja com maltodextrina de trigo?
“malte de cevada” ou “extracto de malte de cevada”
A sua presença nem sempre implica teores de glúten detectáveis por ELISA - R5 em
cereais de pequeno-almoço.
“amido, amido modificado e amido de trigo”
Certos alimentos, como molhos, podem conter apenas vestígios (e.g mostarda com 11
ppm).
“Xarope de glucose, Maltodextrina de trigo, Dextrose” (Directiva 2007/ 68/CE )
Dos 29 alimentos analisados (apenas com estes ingredientes provenientes de trigo)
3 com teores de glúten acima dos 20 ppm – provavelmente contaminações por outras
fontes
Considerações finais
As análises efectuadas no INSA vieram trazer boas e más notícias à APC:
A- Lista de alimentos permitidos pela APC :
As farinhas de arroz e milho naturalmente
sem glúten, amplamente utilizados pelos celíacos,
parecem estar frequentemente contaminadas.
B- Lista de alimentos considerados perigosos pela APC :
Pré- cozinhados , congelados e ultracongelados
Salsichas, fiambre, presunto e chouriço
Polpa de tomate, outros temperos industriais
Caldos de carne e peixe
Gelados, Chocolates em tablete
Gelatinas
Produtos de soja
Considerações finais (cont.)
“pode conter vestígios de”
Frases como “pode conter vestígios de glúten” poderiam ser eliminadas, em
alguns géneros alimentícios, através de pequenas alterações na forma de
produção (validadas por análises ao teor de glúten) que evitassem a ocorrência
de contaminações cruzadas.
Desta forma os celíacos teriam um maior número de alimentos disponíveis.
As empresas espanholas, por exemplo, têm como objectivo usar esta informação
apenas em último recurso, quando não conseguem garantir que o alimento em
questão seja isento de glúten.
Farinhas naturalmente isentas de glúten
Produtos à base de farinhas naturalmente isentas de glúten, deveriam ser alvo
de particular atenção por parte da indústria. Nomeadamente através da
melhoria das práticas de produção e controlo.
FIM
Download

Glúten: dos conceitos ao trabalho no INSA