ZERO HORA DOMINGO, 19 DE ABRIL DE 2015 16 ECONOMIA | RADAR LIGADO CADU CALDAS [email protected] Este selo vai acompanhar reportagens – em diferentes plataformas de mídia do Grupo RBS – sobre empresas, pessoas, setores e iniciativas de sucesso no Estado. C rescimento baixo, inflação furando o teto da meta, juro alto, câmbio disparando e investidores pessimistas. O primeiro trimestre de 2015 não foi fácil. Empresários enfrentam diferentes obstáculos para crescer em um ano que promete ser um dos mais fracos para o comércio e a indústria. É um cenário de que ninguém gosta. Em economia, alertam especialistas, crises são tão importantes quanto períodos de fartura e salto nas vendas. O momento de aperto traz a necessidade de mudanças e obriga empresas a rever conceitos e atitudes para se tornarem melhores. – Quem é bom, sempre sai melhor de uma crise. Quando a atividade econômica vai bem, é fácil crescer. Qualquer surfista pega onda grande. A situação muda de figura quando o mar está revolto. Aí permanece quem tem a prancha adequada e sabe remar. Fica quem é bom, quem entrega o melhor produto, quem atende com mais atenção – afirma Sérgio Honório de Freitas, sócio-diretor da Falconi Consultores de Resultados. Se é assim, o Rio Grande do Sul está cheio de bons surfistas. Empresas que já enfrentaram fortes turbulências econômicas saíram fortalecidas. Nesta edição, sob selo o RS que Dá Certo, Zero Hora conta a história de três delas (veja ao lado), afetadas pela crise financeira que atingiu o mundo em 2008 e 2009. De setores e tamanhos diferentes, cada uma utilizou estratégias próprias para escapar das dificuldades impostas pelo momento. Em comum, dois fatores: o foco em melhorias na gestão e o tom otimista de empresários, que apostaram em crescimento mesmo quando grande parte das empresas perdia fôlego. Ao mesmo tempo que a crise representa uma oportunidade, é importante saber aproveitá-la, relatam especialistas. – Período de redução nas vendas pode ser uma chance para se reposicionar no mercado. Mas é preciso saber em que posição se quer estar e em que velocidade se quer chegar lá. O que diferencia as empresas mais preparadas é que, em geral, se recusam a fazer parte da crise e continuam melhorando – ressalta Freitas. PRODUTIVIDADE NINGUÉM GOSTA DE ENFRENTAR UMA CRISE, mas três empresas mostram como um período de retração pode servir para ajustar o negócio, procurar novos nichos e adotar estratégias que vão assegurar o crescimento INVESTIR NA GESTÃO SETORNOU REGRA Apesar de quase todas as empresas acreditarem que investir na melhoria da gestão contribui para a competitividade da corporação, conta o especialista, nem todas colocam medidas em prática e ficam no discurso. Por outro lado, a preocupação em fazer a lição de casa, melhorar os processos e aumentar a produtividade não é mais apenas das grandes companhias. Pequenas e médias também têm decidido se aprimorar em vez de ficarem paradas. Jairo Martins, superintendente-geral da Fundação Nacional da Qualidade (FNQ), instituição sem fins lucrativos especializada em gestão, conta que nem sempre foi assim. No passado, existia preocupação unicamente com a qualidade do produto. Agora, as empresas passaram a focar e a investir na qualidade da gestão: – Não basta reduzir despesas. É preciso fazer as escolhas certas. Alguns gastos são desperdício. Outros, não. Se não souber diferenciar, a empresa morre de autoasfixia. DAVID RANDON Diretorpresidente das Empresas Randon RONI RIGON, BD, 28/02/2012 DEFRENTEPARAA Mesmo em tempos de crise, empresas precisam investir. É parecido com andar de bicicleta: se parar, cai. A máxima dita por David Abramo Randon, diretor-presidente das Empresas Randon, com sede em Caxias do Sul, resume bem a filosofia do grupo. Mesmo em períodos de incerteza, quando a economia dá passo para trás, não dá para engatar marcha a ré. Em 2008, momento em que a crise econômica acertou em cheio o setor automobilístico, a regra na companhia gaúcha era uma só: “Fazer mais com menos.” Como? – Com muito treinamento, criatividade e melhoria de processos. Adotamos novos materiais, por exemplo. Diluímos nosso endividamento, reduzimos os estoques, simplificamos. O importante era sair do “quadrado” – brinca David Randon. Os incentivos fiscais e os estímulos ao consumo realizado pelo governo naquela época ajudaram a afastar rapidamente o pessimismo do mercado e logo veio o período de bonança. Para Randon, a “demanda artificial” gerada de lá para cá, de certa forma, reforçou a ressaca econômica vivida no primeiro trimestre de 2015, quando as vendas encolheram de forma expressiva. O número de roboques, por exemplo, caiu de 70 mil para 40 mil em relação ao ano anterior. Mas isso também deixou lições importantes. – A nossa meta agora é trabalhar produtividade. Se as vendas aumentarem, não adianta sair abrindo fábricas, é preciso aumentar a produção em cada uma delas – afirma o empresário, que não esconde o otimismo na voz ao projetar uma melhora nas vendas já no segundo semestre deste ano. Melhorar a logística do país e reduzir a pesada carga tributária são obrigações do governo. Mas melhorar a produtividade das empresas é função da iniciativa privada. ZERO HORA DOMINGO, 19 DE ABRIL DE 2015 17 É hora de arrumar a casa. Vamos dar um tempo na expansão, pelo menos neste primeiro semestre. Mas acreditamos em melhora na segunda metade do ano. DIVERSIFICAÇÃO EQUIPE Vice-presidente do Grupo Herval Crise nenhuma assusta a turma que trabalha no Grupo Herval, de Dois Irmãos. Com 55 anos de história, a empresa já passou por muitas situações adversas: recessão, hiperinflação e juros exorbitantes. Nada foi suficiente para abalar o otimismo, conta o vice-presidente Germano Grings, que tem mais de 40 anos de casa. Quando a crise econômica internacional de 2009 chegou ao Brasil, a companhia passou por fortes turbulências. Com as vendas em alta, a Herval estava implantando um ousado plano de expansão e foi obrigada a tirar o pé do acelerador. – Quando olhamos os resultados financeiros, esquecemos o ano de 2009. Pulamos de 2008 direto para 2010. Foi muito complicado. Era uma crise em todos os mercados, não dependia só da gente – lembra Grings. A saída foi investir na equipe. A empresa, claro, tratou de enxugar despesas, mas nada de reduzir pessoal. Foi implantado treinamento para melhorar o atendimento aos clientes, ampliar as vendas e qualificar os produtos. – É importante racionalizar os gastos, mas é fundamental também saber cortar nos lugares certos. Apostamos na valorização das pessoas. Quando vem a crise, os melhores se destacam – conta Grings. Seis anos depois, a ressaca econômica é passado e a Herval vive uma nova fase de crescimento. Somente em 2014, foram abertas 60 unidades das mais diferentes marcas do grupo – Lojas TaQi, If Soluções Planejadas, Beden Sleep Confort e iPlace (foto à esq.). Agora, a ideia é retomar a receita já usada em 2009 e focar no aperfeiçoamento dos funcionários. CRISTIANO SIMÕES Sócio-diretor da S7 Study RONALDO BERNARDI GERMANO GRINGS RICARDO DUARTE OPORTUNIDADE Quando seis anos atrás a crise internacional sacudiu a economia de boa parte do planeta, não só investidores ficaram assustados. Turistas também. O que poderia ter sido um desastre para uma agência de turismo foi uma oportunidade para a S7 Study, que, em vez de investir na abertura de agências, apostou nas vendas à distância e em novas plataformas. Especializada em intercâmbios para destinos específicos, antes de 2008 atendia apenas clientes interessados em viajar para a Austrália. – Quando veio a crise internacional, me dei conta que o nosso negócio corria um grande risco. Se a Austrália, por alguma questão pontual, deixasse de ser um destino atraente, quebraríamos. Optamos por diversificar, atender mais destinos – conta Cristiano Simões, sócio-diretor da S7. Hoje, a empresa conta com seis equipes diferentes de consultores para atender consumidores interessados em embarcar para Austrália, Canadá, Estados Unidos, Inglaterra, Irlanda e Nova Zelândia. Cada núcleo é formado por profissionais que já vivenciaram pelo menos uma experiência como intercambista. Outra aposta foi investir em sites próprios para cada destino, com detalhes sobre pacotes, cursos e escolas, vistos e trabalho no Exterior, e programá-los para serem acessados também em mobile, como smartphones e tablets. Deu resultado. Com escritórios em Porto Alegre, São Paulo e Rio de Janeiro, a empresa mantém aumento de cerca de 15% do faturamento nos últimos três anos. O marasmo econômico que o país vive não assusta. A S7 pretende abrir uma unidade no Nordeste. Quando o cenário está ruim, é preciso pensar mais no médio prazo e tentar entender o que o consumidor vai querer daqui a um tempo. Mesmo que não tenha interesse agora.