OBSERVATÓRIO DA LUTA CONTRA A FRAUDE
iCORREIO
Crise criminável
e criminogenética
QUEM NASCEU MOEDAS, NÃO
CHEGARÁ NUNCA A NOTAS
Salvo honrosas excepções, de cada
vez que um membro do governo
fala, sai asneira e da grossa. A última foi expressa pelo secretário de
Estad, Carlos Moedas que considerou o relatório do FMI como um
documento muito bem feito, muito
bem trabalhado e muito completo.
Classificar desta forma um documento que propõe o corte de até
120 mil postos de trabalho na função pública, 20% nas pensões, no
subsídio de desemprego, aumento
de taxas moderadoras, etc., só pode
estar a brincar com o Zé Povinho
ou então não estar no seu perfeito
juízo. Já não há paciência para aturar governantes destes. Na realidade, “quem nasceu moedas, não chegará nunca a notas”.
JORGE MORAIS
POR EMAIL
A economia não é mais do que uma parte da sociedade em que outros valores são
fundamentais e ajudam à resolução dos próprios desmandos da actividade económica
Carlos Pimenta
1. As crises, fases do ciclo económico,
fazem parte do após Revolução Industrial (XVIII), espalhada à escala mundial durante o século seguinte. À medida que o capitalismo submetia os anteriores modos de produção e abrangia
mais países as crises passaram a ser
mais frequentes, mais amplas e tendencialmente periódicas. Sendo cada
uma diferente das restantes, todas apresentam características comuns. Antecipada, numa aparente contradição,
por um aumento das cotações na bolsa, revela-se na diminuição do investimento privado, na quebra da procura
agregada, no aumento dos estoques e
dificuldade de venda, na diminuição
do emprego e na subocupação das
máquinas e equipamentos. Esta situação altera a dinâmica social e política
pela insegurança e revolta, pela subserviência e ruptura, pela leitura clara do encoberto.
2. Estas crises são radicalmente diferentes das anteriores (até séc. XVIII).
Antes as crises representavam fome
porque a produção era insuficiente.
Actualmente a fome resulta de haver
produção a mais em relação às possibilidades de venda. É a miséria nascida na, e da, opulência. Alguns chamam-lhes crises de subconsumo, outros designam-nas por crises de sobreprodução.
Há capital a mais em relação às possibilidades da sua rentabilização. A superação da crise passa pela não utilização, destruição, do capital e dos recursos: o capital fixo é destruído pela
paralisação das máquinas e encerramento das instituições produtivas; o
capital mercadoria é-o pela acumulação sem venda; o capital humano é-o
pelo desemprego e pela deterioração
das condições de vida; o capital monetário-financeiro desvaloriza-se e muitas das dívidas não são pagas.
3. Numa crise não está apenas em
jogo a eficácia económica. A economia
não é mais do que uma parte da sociedade em que outros valores são fundamentais e ajudam à resolução dos próprios desmandos da actividade económica. A vida humana e a preservação
do nosso habitat são alguns desses valores fundamentais. Valores que exigiriam uma actuação adequada do Estado que tivesse em conta os princípios
éticos fundamentais da sociedade contemporânea, indicados na Declaração
Universal dos Direitos do Homem.
Contudo não têm sido essas as referências fundamentais da União Europeia. A concubinagem entre o poder
político e o capital financeiro, manifestada através da socialização dos prejuízos e privatização dos lucros dos
bancos é a principal causa do actual
prolongamento da crise. Salva-se o capital fictício gerado na loucura e na fraude da bolsa, profusamente acumulado
nos bancos, mas matam-se muitos que
empenharam todas as suas energias
num negócio ou dependem do salário
para viver.
4. A crise em que vivemos foi fortissimamente ampliada por fraudes e
outros crimes económicos, muitos já
investigados e julgados. Muitos dos que
estiveram na origem de tal ambiente
continuam a ser politicamente apoiados e salvaguardados, em detrimento
de todos os demais.
E tudo isto acontece numa Europa
onde existe uma poderosa criminalidade económica organizada em condições de aproveitar as debilidades dos
Estados e as dificuldades das empresas para entrelaçar mais o legal com o
ilegal, para aumentar a sua influência
política.
Vivemos numa sociedade criminogenética, em crise, que tende a reforçar
a sua toxidade, para o que contribui o
neoliberalismo.
É um imperativo social, legal e ético
promover uma política que beneficie
tanto o capital produtivo como o trabalho, só viável numa lógica de combate à crise, de crescimento e de defesa da democracia.
Escreve à sexta-feira
A crise em que
vivemos foi
fortissimamente
ampliada por fraudes e
outros crimes
José Fernandes
Actualmente
a fome resulta de haver
produção a mais
em relação às
possibilidades de venda
Capital monetário-financeiro desvaloriza-se e dívidas não são pagas
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—25 Janeiro 2013
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iJORNAL_1166_25JAN13 : GERAL 48 : 15 : 15 Opinião 6.ª feira