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Políticas e práticas curriculares no contexto da escola pública: direitos humanos,
ética e utopia
Politiques et pratiques des projets scolaires dans le contexte de l’école
publique : Droits humains, éthique et utopie
Ana Maria Eyng (PUCPR)
Resumo
Neste estudo, são considerados os direitos humanos nas políticas e práticas curriculares no contexto de
escolas públicas de educação básica. A análise pauta-se em um dos aspectos cruciais na concepção e
efetivação de uma educação básica democrática, igualitária e justa, ou seja, numa educação ética. A
pesquisa tem como foco o objetivo de desenvolvimento do milênio da Educação básica de qualidade
para todos, o decreto nº. 6.094, de 24 de abril de 2007, o Plano Nacional de Educação em Direitos
Humanos (2007), o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) e referenda-se nos estudos de Moreira
(2003), Candau (2005), Hall (2006), Arroyo (2007), Silva (2007), McLaren (2008), Castels (2008), Aplle e
Buras (2008), Moreira e Candau (2008), Bauman (2009).
A coleta de dados, por meio de entrevistas estruturadas, abrangeu nove escolas públicas de educação
básica, localizadas num bairro de grande vulnerabilidade social, sendo duas estaduais e sete municipais.
Na organização dos instrumentos, tratamento e análise de dados, o software Sphinx Léxica serviu de
apoio.
Com base na pesquisa empírica, são analisadas percepções de pais, alunos, professores, funcionários e
gestores sobre os direitos e as manifestações das violências nas escolas.
Os resultados expressam aspectos do pensamento ético e axiológico dos sujeitos que constituem a
comunidade educativa. Confirmam estudos anteriores, realizados pelo grupo de pesquisadores do
observatório de violências nas escolas PUCPR. Observa-se, sobretudo, na percepção de professores e
estudantes, que o respeito constitui-se em um dos direitos mais almejados e ainda não suficientemente
vivenciados nos espaço da escola e da sociedade.
A concretização de uma educação básica de qualidade para todos, pautada nos valores éticos do
diálogo, respeito mútuo, na justiça e na solidariedade se constitui numa utopia? A análise das múltiplas
causalidades das violências nas escolas e suas implicações numa educação ética, na garantia de direitos,
pode ajudar na compreensão do jogo de forças que atravessam o cotidiano escolar. A partir dessa
compreensão, procura-se esboçar possibilidades para efetivar o compromisso de tornar, de fato, a
educação básica de qualidade para todos, pautada numa perspectiva ética.
Palavras-chave: políticas curriculares, ética, direitos humanos, educação básica
Résumé
Dans cette étude, on abordera les droits humains dans les politiques et les pratiques des projets
scolaires dans le contexte des écoles de l‟éducation fondamentale.
L‟analyse s‟appuie sur l‟un des aspects les plus importants de l‟élaboration et de l‟exécution d‟une
éducation de base démocratique, égalitaire et juste, c‟est-à-dire, d‟une éducation éthique. La
recherche a pour but le développement du millénaire de l’Éducation fondamentale de qualité pour
tous, l‟arrêté 6.094 du 24 avril 2007, le Plan National d‟Education en Droits Humains (2007), le Statut de
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l‟Enfant et de l‟Adolescent (1990), et se refère aux études de Moreira (2003), Candau (2005), Hall
(2006), Arroyo (2007), Silva (2007), McLaren (2008), Castels (2008), Aplle et Buras (2008), Moreira et
Candau (2008), Bauman (2009).
La récolte de données à travers les entretiens structurés comprend neuf écoles publiques d‟éducation
fondamentale, dont deux étatiques et sept municipales, situées dans une région de grande fragilité
sociale. Pour l‟organisation des instruments, traîtement et analyse de données, on s‟est appuyé sur le
logiciel Sphinx Léxica. A partir de la recherche empirique, on analyse les perceptions de parents,
élèves, professeurs, employés et administrateurs à propos des droits et des manifestations des violences
dans les écoles.
Les résultats expriment des aspects de la pensée éthique et axiologique des acteurs qui constituent la
communauté éducative. Cela se voit par des études préalables, réalisées par le groupe de chercheurs de
l‟Observatoire de violences dans les écoles PUCPR. On observe, surtout à travers la perception de
professeurs et d‟étudiants, que le respect est le droit le plus souhaité, mais pas encore présent dans
l‟espace de l‟école et de la société. Le désir d‟avoir une école fondamentale de qualité pour tous basée
sur les valeurs éthiques du dialogue, du respect mutuel, de la justice et de la solidarité est-il une
utopie ? L‟analyse des causes multiples des violences à l‟école et leurs implications dans une éducation
éthique, dans la garantie des droits, peut aider à la compréhension du jeu de forces qui traverse le
quotidien scolaire. Et, à partir de cette compréhension, on cherche à dessiner les possibilités de
réaliser, en effet, une éducation fondamentale de qualité structurée sur une perspective éthique.
Mots-clés: politiques des projets scolaires, éthique, droits Humains, éducation fondamentale
Direitos humanos, ética e utopia nas políticas curriculares.
As políticas educacionais estabelecem os princípios que regem a educação e os direitos que são
assegurados e normatizados na legislação. A educação, na perspectiva ética tem como princípio o
estabelecido no artigo 5º da Constituição Federal que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.” (BRASIL, 1988). Para que o
princípio da igualdade seja respeitado no espaço escolar, o currículo deverá se engajar na garantia dos
diretos humanos entendidos como sendo,
os direitos de todo ser humano, sem distinção de raça, nacionalidade, etnia, gênero,
classe social, cultura, religião, opção sexual, opção política, ou qualquer outra forma de
discriminação. São os direitos decorrentes da dignidade do ser humano, abrangendo,
dentre outros: os direitos à vida com qualidade, à saúde, à educação, à moradia, ao
lazer, ao meio ambiente saudável, ao saneamento básico, à segurança, ao trabalho e à
diversidade cultural. (BRASIL, 2003, p. 10).
Esses direitos, fundamentais, constituem elementos básicos da cidadania e devem ser contemplados e
vivenciados no espaço escolar. Além desses, a educação escolar deverá trabalhar no sentido de
contribuir na garantia dos direitos das crianças e adolescentes estabelecidos no ECA.
O estatuto estabelece no artigo 15º que “A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito
e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis,
humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.” (BRASIL, 1990) No artigo 11º, prevê o direito à
saúde, indicando que “É assegurado atendimento médico à criança e ao adolescente, através do Sistema
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Único de Saúde, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e
recuperação da saúde.” (BRASIL, 1990)
Esses direitos são basilares e ao mesmo tempo a utopia, na configuração e efetivação de uma educação
básica ética, para todos. Nesse sentido, convém assinalar os questionamentos apresentados no relatório
do desenvolvimento humano, publicado pelo programa das nações unidas para o desenvolvimento.
A ética mundial não é a imposição de valores “ocidentais” ao resto do mundo. Pensar
assim seria tanto uma restrição artificial do âmbito da ética mundial, como um insulto a
outras culturas, religiões e comunidades. A principal fonte da ética mundial é a ideia de
vulnerabilidade humana e o desejo de aliviar o sofrimento de todas as pessoas, na medida
do possível. Outra fonte é a crença na igualdade moral básica de todos os seres humanos.
A injunção para tratar os outros como gostaríamos de ser tratados encontra menção
explícita no budismo, cristianismo, confucionismo, hinduísmo, islamismo, judaísmo,
taoísmo e no zoroastrismo e está implícita na prática das outras fés. (PNDU, 2004, p.90)
Observa-se que o relatório que traz como subtítulo Liberdade Cultural num Mundo Diversificado ressalta
as implicações dos valores na configuração de uma ética mundial. Assinala os riscos da intolerância, dos
estereotipos, da discriminação na imposição de valores de uma cultura sobre as demais. E, aponta nas
religiões a presença de valores éticos comuns que podem levar a um tratamento mais justo e igualitário
para todos independente da religião, nacionalidade ou cultura. Essa é a utopia almejada. E, nessa
direção, o relatório sugere cinco elementos nucleares da ética mundial: Equidade; Direitos humanos e
responsabilidades; Democracia. A democracia serve múltiplos fins; Protecção de minorias; Resolução
pacífica de conflitos e negociação justa. (PNDU, 2004, p.90)
Esses elementos são cruciais numa educação ética, que busca a equidade; a democracia; os direitos
humanos e as responsabilidades; a inclusão das minorias e a.resolução pacífica de conflitos e negociação
justa. Nessa direção, procura-se compreender possibilidades de construção de uma educação ética e
garantidora dos direitos da diversidade, tendo como referencia os pressupostos da perspectiva crítica e
pós-crítica de currículo. “A teorização crítica sobre o currículo esteve inicialmente concentrada, como
sabemos, na análise da dinâmica de classes.Tornou-se logo evidente, entretanto que as relações de
desigualdade e de poder na educação e no currículo não podiam ficar restritas à classe social. (SILVA,
2007, p.99)
Pensar a educação e o currículo numa perspectiva ética implica em considerar a analise das diversas
formas de produção das desigualdades. Assim, além da questão de classe o currículo escolar na visão
pós-critica tem como desafio incluir as questões culturais de gênero, etnia, raça, religião e suas
implicações na constituição da identidade e da diferença.
Silva (2007) assinala que “a identidade étnica e racial é, desde o começo uma questão de saber e de
poder” (p.100) Na analise, o autor passa a considerar os significados, distinções e equivalências entre os
termos raça e etnia, especificando que geralmente “reserva-se o termo „raça‟ para identificações
baseadas em caracteres físicos como a corda pele, por exemplo, e o termo „etnia‟ para identificações
baseadas em características supostamente mais culturais, tais como a religião, modos de vida, língua
etc.” (p.100)
Face à dificuldade de distinção os dois termos costumam ser considerados como equivalentes, em
muitas análises. “A confusão causada por essa problemática distinção é tão grande que em certas
análises “raça” é considerado o termo mais geral, abrangendo o de etnia”, enquanto que em outras
análises é justamente o contrário. (SILVA, 2007, p.101)
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Trata-se de conceitos culturalmente construídos, contudo não podem ser considerados como Indica
Silva (2007, p.101) “construtos culturais fixos, dados, definitivamente estabelecidos.” E, complementa o
autor que “Precisamente por dependerem de um processo histórico e discursivo de construção da
diferença, raça e etnia estão sujeitas a um constante processo de mudança e transformação.”( p.101)
Assim, o sujeito na contemporaneidade não pode ser concebido como tendo “uma identidade fixa,
essencial ou permanente” (HALL, 2005, p.12). Embora não sejam fixos, mas por se tratarem de
construtos culturais a questão de raça e etnia influencia na constituição dos traços identitários, na
constituição da igualdade e da diferença.
Na teoria social contemporânea, a diferença, tal como a identidade, não é um fato, nem
uma coisa. A diferença, assim como a identidade, é um processo relacional. Diferença e
identidade só existem numa relação de mútua dependência. O que é (a identidade)
depende do que não é (a diferença) e vice-versa. (SILVA, 2007, p.101)
Nesse sentido, conclui-se que “A diversidade tampouco é um fato ou uma coisa. Ela é o resultado de um
processo relacional – histórico e discursivo – de construção da diferença. (SILVA, 2007, p.101) Por outro
lado a diversidade, ou melhor, as formas de relacionamento com as diversas e crescentes formas que a
diversidade assume num mundo globalizado tem produzido muitos conflitos e violências.
A construção da identidade, conforme explica Mclaren (2001) deve levar em conta as relações entre a
formação subjetiva e a totalidade mais ampla das relações sociais capitalistas globalizadas.”(p.180) E,
também, não se podem ignorar as constatações feitas por Bauman (2009) que “a „abertura‟ perversa das
sociedades que promove a globalização negativa é por si só, causa de injustiças e de modo indireto, de
conflitos e violência.” ( p.15-16).
Assim, nessa sociedade, conforme Bauman (2009) “não se pode obter ou garantir a justiça, condição
preliminar para a paz duradoura” (p.14) Pois, “agora a „justiça‟, inversamente aos tempos antigos é
uma questão planetária, que se mede e se valora mediante comparações planetárias.”(p.13-14) Na
análise da formulação, circulação e relações entre as políticas Ball(2001) apresenta como síntese para
compreender esse movimento “as políticas nacionais necessitam ser compreendidas como o produto de
um nexo de influências e interdependências que resultam numa “interconexão, multiplexidade, e
hibridização”, isto é, “a combinação de lógicas globais, distantes e locais” .(p.102)
Nesse cenário, de contradições, desigualdades e exclusão se busca a constituição de políticas e práticas
curriculares capazes de promover uma educação intercultural. Contudo, o “multiculturalismo, tal como
a cultura contemporânea é fundamentalmente ambíguo”. (SILVA, 2007, p. 150) Embora, conforme
Moreira (2002) a “centralidade das questões culturais traz inevitavelmente à luz a sensível diversidade
de culturas encontradas hoje no interior de um dado país e entre os diferentes países do globo.”(p.17)
Não se pode negar que “Essa diversidade convive, paradoxalmente, com fortes tendências de
homogeneização cultural.” ( p. 17). E possível constatar o “avanço de expressões poderosas de
identidade coletiva que desafiam a globalização e o cosmopolitismo em função da singularidade cultural
e do controle das pessoas sobre suas próprias vidas e ambientes.” (CASTELS, 2008, p. 18).
Uma educação ética, pautada na garantia dos direitos humanos supõe criar igualdade de oportunidades,
mas
Nessa sociedade multicultural todos não têm as mesmas oportunidades; não existe
igualdade de oportunidades. Há grupos, como os indígenas, negros, homossexuais, pessoas
oriundas de determinadas regiões geográficas do próprio país ou de outros países e de
classes populares e/ou com baixos níveis de escolarização, que não têm o mesmo acesso a
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determinados serviços, bens, direitos fundamentais que têm outros grupos sociais, em
geral, de classe média ou alta, brancos e com altos níveis de escolarização. (CANDAU,
2008, p. 50).
Tais questões incidem, atravessam e determinam a construção das identidades infantis e juvenis
propostas e desenvolvidas no currículo escolar. Pois, “o currículo é documento de identidade.” (SILVA,
2007, p. 150).
Direitos humanos, ética e utopia nas práticas curriculares.
As políticas educacionais assumem como principio a inclusão, a consideração da diversidade. Contudo,
em contraposiçao à vivência e aprendizado de valores éticos pautados no diálogo na solidariedade,
observa-se a manifestaçao de diversas faces de violências no espaço escolar. Segundo Comellas(2009) a
violencia também se aprende nas escolas.
diversidade:
diversidade
étnica,
racial,
“A violência ocorre em lugares onde se concentra a
linguística,
religiosa,
entre
outras.”(CASQUEIRA
CARDOSO,2009,p.443).
O desconhecimento, a intolerância pode gerar preconceitos, discriminaçao e exclusao dos sujeitos
percebidos como diversos, acentuando as desigualdades. A análise das praticas curriculares podem ser
feitas por meio da composição e das representações dos sujeitos que convivem o significam o currículo
no cotidiano escolar. Na análise cultural contemporânea, as questões que transitam nas praticas
curriculares não podem ser analisadas sem o conceito de representação. ( SILVA, 2007, p.103)
Com intuito de coletar elementos da constituição das práticas curriculares se realizou a pesquisa
empírica, a partir da qual são analisadas as representações de pais, alunos, professores, funcionários e
gestores sobre direitos e as manifestações das violências nas escolas.
A coleta de dados, por meio de entrevistas estruturadas, abrangeu nove escolas públicas de educação
básica, localizadas num bairro de grande vulnerabilidade social, sendo duas estaduais e sete municipais.
Na organização dos instrumentos, tratamento e análise de dados, o software Sphinx Léxica serviu de
apoio.
SUJEITOS
TOTAL
MUNICIPAL
ESTADUAL
Pais
257
180
62
Alunos
583
404
179
Professores
43
27
16
Funcionários
59
46
13
Gestores/Equipe
21
20
1
Quadro 01 – Composição dos sujeitos participantes da pesquisa
Fonte: elaborado com base nos dados da pesquisa de campo.
Nas práticas curriculares, os sujeitos operam com diferentes racionalidades que se manifestam e se
podem identificar, segundo segundo Apple e Buras (2008) numa “ teia enredada de inter-relações
baseadas em questões de classe, raça, gênero, orientação sexual, „habilidade‟, religião, língua e
afiliações locais, nacionais e globais” (p.17).
Assim, traços identitários podem ser esboçados na configuração do grupo em termos de sexo, idade, cor,
religião, escolaridade e saúde infirmados pelos participantes.
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Pais
Alunos
Professores
Funcionários
Gestores/Equipe
M- 14,4%
M–39,8%
M - 16,3%
M- 8,5%
M – 0%
F- 82, 9%
F–60,2%
F - 83,7%
F- 91,5%
F - 100%
Quadro 02 – composição dos sujeitos quanto a gênero
Fonte: elaborado com base nos dados da pesquisa de campo.
Quanto a composição dos sujeitos em relação ao gênero, fica evidenciada a predominância da presença
feminina no espaço escolar. Contudo, “as linhas de poder da sociedade estão estruturadas não apenas
pelo capitalismo, mas também pelo patriarcado.” (SILVA, 2007, p.91)
A visão pós-crítica de currículo busca a inclusão de características, experiências e interesses que
refletem mais a perspectiva feminina. Essa perspectiva está mais alinhada aos princípios de uma ética
mundialmente válida, procura contemplar as conexões entre quem conhece e o que é conhecido,
valoriza as ligações pessoais solidárias, estimula a intuição e a criatividade do pensamento divergente,
das artes e da estética; a responsabilidade comunitária, a cooperação e o respeito mutuo.
Nesse sentido, o dialogo entre gerações, também se constitui em elemento a ser considerado. Na
composição do grupo de sujeitos participantes da investigação observa-se uma proximidade na faixa
etária entre os profissionais da educação e os pais. A grande variação entre as idades dos alunos se deve
aos grupos ouvidos abrangendo os últimos anos da primeira etapa do ensino fundamental até os últimos
anos da segunda etapa.
Nas escolas públicas é bastante comum a existência de crianças fora da
idade/série. Assim podem ser encontrados adolescentes convivendo em grupos predominantemente de
crianças. Esse fato quando não for bem encaminhado e trabalhado pode causar constrangimentos e
conflitos.
Pais
Alunos
Professores
Funcionários
Gestores/Equipe
Branco -58,0%
Branco-47,5%
Branco- 79,1%
Branco- 72,9%
Branco -90,5%
Pardo -20,6%
Pardo-24,9%
Pardo- 11,6%
Pardo -18,6%
Pardo -4,8%
Negro -13,2%
Negro-16,1%
Negro -7%
Negro -6,8%
Amarelo -4,8%
Não resposta -
Indígena-5,0%
NR- 2,3%
NR-1,7%
5,8%
Amarelo-3,8%
Amarelo -1,6%
Indigena -0,8%
Quadro 03 – composição dos sujeitos quanto a cor
Fonte: elaborado com base nos dados da pesquisa de campo.
Na investigação adotou-se a classificação de cor ou raça adotado pelas pesquisas domiciliares do
IBGE(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no qual o informante escolhe uma entre cinco
opções: branca, preta, parda, amarela ou indígena. Os dados indicam uma predominância de sujeitos
declarados como brancos entre os profissionais da educação (professores, gestores e funcionários),
enquanto entre os pais e alunos existe um aumento no número de indivíduos que se declaram como
pardos e negros.
A raça e etnia influenciam na constituição da igualdade e da diferença, na composição das identidades.
O diálogo entre as diferentes culturas raças e etnias ainda não se constitui num desafio para diversos
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contextos globais e locais. Casqueira Cardoso(2009, p. 446) afirma: ”No que diz respeito às minorias
étnicas, existe em Portugal fortes indícios de negação da diversidade, quer linguística, quer religiosa, na
população discente escolar.”
Pais
Alunos
Professores
Funcionários
Gestores/Equipe
Católico -61,5%
Católica – 38,1%
Católica -74,4%
Católico -64,4%
Católica -76,2%
Evang -29,2%
Evang. – 38,8%
evang.-14%
evang.-23,7%
Evang.-19%
Nenhuma -4,7%
Espírita – 0,2%
Espírita -4,7%
NR- 5,1%
NR- 4,8%
Não resposta -2,3% Outras – 0,7%
NR- 4,7%
Nenhuma - 3,4%
Outras -1,2%
Nenhuma - 2,3%
Espírita -1,7%
Espírita -0,8%
Outras -1,7%
Ateu -0,4%
Quadro 04 – composição dos sujeitos quanto a religião
Fonte: elaborado com base nos dados da pesquisa de campo.
Na composição dos traços identitários de igualdade e diferença incidem também, aspectos relacionados
à religião. “Muitas minorias religiosas sofrem várias formas de exclusão, por vezes devido à eliminação
explícita da liberdade religiosa, ou à discriminação contra o grupo.” (PNDU, 2004, p.8)
As diferenças religiosas tem sido fonte de fortes conflitos e violências, gerados em muitos casos pelo
desconhecimento e pelo preconceito. “Mas noutros casos, a exclusão pode ser menos directa e muitas
vezes involuntária, como quando o calendário público não reconhece os feriados religiosos de uma
minoria.” (PNDU, 2004, p.8)
As tensões e conflitos que os sujeitos sofrem e/ou provocam por um longo tempo no seu cotidiano podem
gerar diversos danos à saúde. Ao serem indagados sobre terem ou não problemas de saúde, o grupo que
mais afirmou ter problema de saúde foi o de professores. Considerando a idade média dos participantes
(58,1% tem entre 26 a 36 anos e 20,9% entre 37 a 47 anos), a alta incidência de professores com
problemas de saúde é bastante preocupante, atingindo 86% do grupo. Pode se considerar, nesse caso, que
se trata de problemas relacionados à doenças ocupacionais.
Para compreender melhor os traços culturais que compõe e circulam no cotidiano escolar é necessário
ouvir as percepções dos sujeitos que o significam. Para concluir esse estudo serão consideradas as
indicações sobre os direitos, os problemas e as violências nas escolas.
sujeitos
pais
Direitos
Problemas
Violências
Respeito -29,2%
Não resposta -30,7%
Brigas, bater 34,8%
Educação -23,7%
Infra-estrutura -23,0%
Agressão física e/ou verbal 18,1%
Saúde -21,4%
Alunos -21,8%
Drogas 7,3%
Professores -20,2%
alunos
professores
Saúde – 20%
NR – 36 %
Física – 52,1%
Respeito – 18,5%
Alunos – 33,6%
Verbais – 41,2%
Educação – 16,8%
Infraestrutura – 15,5%
Discriminação – 15,3%
Respeito- 37,2%
Alunos- 30,4%
Agressão Física– 31,7%
138
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Educação- 23,3%
Pais- 23,9%
Agressão Verbal– 17,2%
Liberdade- 9,3%
Infraestrutura– 17,4%
Falta de respeito- 12,5%
funcionários Respeito- 35,6%
Pais/Familiares- 39%
Agressão física – 32,3%
Dignidade- 25,4%
Infra-estrutura- 27,1%
Agressão verbal- 20,8%
Educação- 25,4%
NR- 23,7%
Agressão moral/psicológica- 12,5%
Respeito- 38,1%
Alunos- 38,1%
Agressão física – 30%
Vida- 23,8%
Pais/Familiares- 28,6%
Agressão verbal- 17,5%
Educação- 23,8%
NR- 19%
Agressão moral/psicológica- 17,5%
gestores
Quadro 05 – composição dos sujeitos quanto as representações
Fonte: elaborado com base nos dados da pesquisa de campo
Quanto as suas expectativas, o direito mais almejado pelos sujeitos que compõe a escola é o respeito,
antes mesmo do direito à vida, educação, saúde, liberdade e dignidade também assinalados. Tal
manifestação de direito, o respeito, parece indicar a expectativa de relações interpessoais mais éticas.
Esse dado é bastante significativo, pode estar indicando a necessidade de formas de convivência mais
inclusivas que adotem o respeito e o diálogo com a diversidade como princípio metodológico básico.
Esse elemento também fica enunciado quando, nos problemas indicados os sujeitos identificam os
problemas nos outros segmentos de participantes e na infra-estrutura. Tal indicação parece uma forma
de projeção da responsabilidade sobre os outros. Isso com exceção dos alunos que parecem já terem
internalizado que eles são os problemas da escola, talvez estejam ouvindo essa afirmação em demasia.
Observa-se a necessidade de aproximar mais a comunidade pelo diálogo, pelo compartilhamento e
discussão das percepções de cada um. Tal estratégia pode fortalecer o sentido da responsabilidade
compartilhada na ação coletiva, pois a escola precisa ser compreendida como sendo uma “comunidade
crítica de aprendizagem continuada”. (EYNG, 2001, p.24-25)
Nas manifestações sobre o que compreendem e identificam como violências nas escolas, ficando
acentuada a necessidade do fortalecimento dos vínculos, da inclusão, na superação das ações de
desrespeito e discriminação. Embora a agressão física seja a mais indicada, por ser a mais facilmente
identificada, é bastante expressivo o numero de indicações relacionadas à violência verbal, moral,
psicológica, discriminação e falta de respeito.
Considerações finais
Os resultados expressam aspectos da constituição da identidade e do pensamento ético e axiológico dos
sujeitos que constituem a comunidade educativa. Confirmam estudos anteriores, realizados pelo grupo
de pesquisadores do observatório de violências nas escolas PUCPR. Observa-se, na percepção dos
sujeitos, que os direitos humanos, exemplificados no respeito, constituem-se expectativas almejadas e,
ainda não suficientemente vivenciados nos espaços das escolas e da sociedade.
Observa-se ainda, o quanto “A liberdade cultural é violada pela falta de respeito ou de reconhecimento
dos valores, instituições e modos de vida de grupos culturais e pela discriminação e desvantagem
baseadas na identidade cultural.” (PNDU, 2004, p.27) Isso ocorrendo tanto em âmbitos locais quanto
globais. O que leva à falta de perspectivas, contribuindo para o enfraquecimento de valores éticos de
solidariedade, de diálogo, de justiça e de respeito ao ser humano,
139
140
Nesse contexto, parece ser necessário afirmar que a concretização de uma educação básica de
qualidade para todos, pautada nos valores éticos do diálogo, respeito mútuo, na justiça e na
solidariedade se constitui ainda numa utopia. Por outro lado, acredita-se na força da utopia.
A análise das múltiplas causalidades das violências nas escolas e suas implicações numa educação ética,
na garantia de direitos, pode ajudar na compreensão do jogo de forças que atravessam o cotidiano
escolar. A partir dessa compreensão, esboçar possibilidades para efetivar o compromisso de tornar, de
fato, a educação básica de qualidade para todos, pautada numa perspectiva ética.
Pensar a educação básica numa perspectiva igualitária envolve o reconhecimento e respeito à
diversidade cultural presente no contexto escolar, ou seja, enfrentar o desafio de valorizar, incluir e
dialogar com a cultura de todos.
Bibliografia
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políticas e práticas curriculares no contexto da escola pública