1 CÍRCULO DE CULTURA: ESTRATÉGIA PROBLEMATIZADORA DE COMPETÊNCIAS EM SAÚDE MENTAL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE Joyce Wadna Rodrigues de Souza1 Álissan Karine Lima Martins2 Maria Isabel Leandro da Silva3 Claryssa Queiroz de Oliveira4 Wandenkol Gouveia Costa5 RESUMO O estudo objetivou relatar a experiência de aplicação do círculo de cultura como estratégia de problematização das competências em saúde mental na Atenção Primária à Saúde. Pesquisa-ação fundamentada na metodologia do Círculo de Cultura, direcionada por Paulo Freire. Os participantes foram seis enfermeiros das Unidades de Saúde da Família do município de Cajazeiras-PB além de três discentes do curso de graduação em enfermagem. A problematização proporcionada pelo círculo de cultura permitiu às participantes identificarem os serviços que compõem a Rede de Atenção Psicossocial e refletirem sobre o papel de cada um e sua articulação com a Estratégia de Saúde da Família (ESF). Além disso, foi possível vivência que na prática da articulação entre ESF e outros serviços de apoio na rede, a referencia e contra-referência não acontece de maneira efetiva, o que dificulta o monitoramento e a continuidade a assistência à saúde mental. O estudo proporcionou um ambiente de aperfeiçoamento de competências em saúde mental necessárias neste cenário de atuação, funcionando como estratégia de educação permanente para a enfermagem, já que possibilitou a participação ativa dos sujeitos e uma reflexão crítica acerca da realidade. Descritores: Atenção Primária à Saúde, Enfermagem, Saúde Mental. 1 Acadêmica do Curso de Enfermagem da Unidade Acadêmica de Enfermagem, Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Cajazeiras, Paraíba, Brasil. 2 Enfermeira; Doutora em Enfermagem pela Universidade Federal do Ceará (UFC); Docente do Curso de Enfermagem da Universidade Regional do Cariri (URCA), Crato, Ceará, Brasil. 3 Acadêmica do Curso de Enfermagem da Unidade Acadêmica de Enfermagem, Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Cajazeiras, Paraíba, Brasil. 4 Acadêmica do Curso de Enfermagem da Unidade Acadêmica de Enfermagem, Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Cajazeiras, Paraíba, Brasil. 5 Acadêmico do Curso de Enfermagem da Unidade Acadêmica de Enfermagem, Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Cajazeiras, Paraíba, Brasil. 2 INTRODUÇÃO O desenvolver de práticas em saúde atualmente tem se fundamentado em vertentes que colocam em evidência a inclusão de saberes voltados os prestações de cuidado integral aos atores sociais, valorizando não só as dimensões biopsicossociais, mas os determinantes e condicionantes do ambiente de vida desses sujeitos. Assim, a saúde mental concebe-se como um componente de cuidado ampliado que demanda dos profissionais de saúde o desenvolvimento de competências para atuação frente às necessidades em saúde mental nos diversos cenários de atuação(1,2). Percebe-se que o desenvolvimento de competências em saúde mental é importante em todos os níveis de atenção para respaldar a prática do enfermeiro, porém neste estudo será abordada competência dentro do cenário da Atenção Primária à Saúde (APS). Entende-se por competência a articulação entre o saber, saber-fazer e saber-ser, ou seja, respectivamente corresponde a incorporar nos modos de cuidar conhecimentos teóricos, habilidades fundamentadas nos conhecimentos teóricos e empíricos, e por fim, à atitude que diz respeito à execução das habilidades condizente com as situações que emergentes no cotidiano do profissional(3). Então, nota-se a necessidade de articular conhecimento, habilidade e atitude para o desenvolvimento adequado e respaldado de ações em saúde mental. Dessa forma, a Atenção Primária à Saúde representa um cenário estratégico para incorporação nos modos de cuidar individual e coletivo de saberes e fazeres em saúde mental pelo enfermeiro. Como estratégia prioritária da APS, a Estratégia Saúde da Família (ESF) possibilita ao enfermeiro uma melhor aproximação da comunidade, permitindo assim a formação de vínculo entre comunidade e profissional, e consequentemente o conhecimento das principais necessidades em saúde mental do território adscrito(4). Devido ainda hoje a saúde mental ser relacionada à institucionalização e compreendida como especialidade, sua implementação na prática da Equipe de Saúde da Família tem representado um desafio, que por sua vez não tem permitido subsídios para a construção de competências em saúde mental necessária dentro do cenário da APS(5). Portanto, como membro da equipe profissional atuante na ESF, o enfermeiro depara-se com o desafio de incluir em seu processo de trabalho as ações voltadas à saúde mental, uma vez que o atual cenário da saúde tendencialmente distancia a saúde mental deste importante espaço de promoção da saúde(5). 3 Com objetivo de ampliar prática do enfermeiro em saúde mental na ESF, percebe-se a necessidade de ultrapassar barreiras, começando desde a disposição do próprio profissional, produzindo reflexão de toda equipe multiprofissional e quebrando estereótipos que são construídos dentro da comunidade. Dessa maneira, ver-se a importância de se incluir na realidade dos sujeitos ferramentas problematizadoras que despertem a capacidade de reflexão e mobilizem elementos existentes na realidade da atuação profissional, para que as ações de promoção da saúde mental sejam efetivadas nessa prática. A realização deste estudo tem como justificativa contribuir para a prática do enfermeiro, principalmente para sua atuação na Atenção Primária a Saúde, dentro do cenário da Estratégia Saúde da Família, no que diz respeito à incorporação de competências voltadas ao exercício das práticas de saúde mental adequada a realidade da comunidade. Nesse sentido, o estudo objetivou relatar a experiência de aplicação do círculo de cultura como estratégia de problematização da competência em saúde mental na Atenção Primária à Saúde. Com isso oportunizou-se o processo de reflexão sobre os saberes e habilidades imprescindíveis para prática profissional do enfermeiro, além da possibilidade de identificar impasses e desafios presentes que interferem na prática deste profissional. METODOLOGIA Trata-se de um relato de experiência de uma pesquisa-ação fundamentada na metodologia dos Círculos de Cultura proposta por Paulo Freire realizada com enfermeiros das Unidades de Saúde da Família do município de Cajazeiras, Paraíba. Como ferramenta metodológica, a pesquisa-ação agrega uma ação à resolução de problemas identificados em diversos cenários sociais, de forma que os facilitadores e participantes podem interagir de maneira cooperativa e participativa, permitindo as duas partes se envolvam e assim a busque resolução e esclarecimento da situação-problema(6). O círculo de cultura de Paulo Freire é um espaço de problematização que proporciona aos envolvidos a oportunidade de expor suas ideias, experiências e práticas, bem como possibilita a reflexão crítica de ocasiões e a construção coletiva do conhecimento(7). Este método foi inicialmente criado para a alfabetização de adultos, e por isso para aplica-lo em outro ambiente que não seja o de alfabetização, as seguintes etapas nortearam a dinâmica do método: conhecimento do universo vocabular, dinâmica de acolhimento, a tematização, a 4 problematização (desconstrução) e a avaliação/fechamento onde ocorre uma reflexão crítica para reconstrução. Cada etapa deste método viabiliza um aprofundamento nas questões geradas pelo diagnóstico situacional da realidade do grupo em que se trabalha, promovendo melhor envolvimento dos sujeitos com a problemática trabalhada para que trabalhem coletivamente. A particularidade participativa e dialógica do círculo de cultura como intercessor de práticas educativas permitiu formação do encontro com a participação de 6 enfermeiras lotadas nas Unidades de Saúde da Família do município de Cajazeiras-PB. As ações enfatizaram a competências do gerenciamento e negociação da oferta de cuidados dentro do sistema de saúde, destacando o protagonismo dos profissionais para atuarem conforme a realidade do seu território de atuação. A coleta de dados foi realizada através de agendamento prévio para aplicação de um instrumento contendo as competências necessárias para atuação do enfermeiro em saúde mental na Atenção Primária à Saúde, no período de junho a julho de 2014. Durante o círculo de cultura a coleta de dados incluiu a observação não participante e o registro se deu pelo diário de campo, câmera fotográfica e filmadora. O círculo de cultura seguiu as seguintes etapas: acolhimento, tematização, problematização e fechamento/avaliação. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Alcides Carneiro (HUAC) da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) sob o parecer N°393.953. Em consonância com a Resolução de nº 466/2012, que trata de pesquisas envolvendo seres humanos, foram obtidas as assinaturas do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). RESULTADOS E DISCUSSÃO O primeiro momento da pesquisa compreendeu a etapa da descoberta do universo vocabular dos enfermeiros, realizada por meio de visita as Unidades de Saúde da Família e aplicação de um questionário sobre competências em saúde mental na Atenção Primária. Neste momento, foi possível vivenciar um pouco do processo de trabalho do enfermeiro neste cenário, bem como identificar pontos críticos na sua prática em saúde mental e assim levantar as situações-problemas a serem abordadas no círculo de cultura. Através do diagnóstico situacional das condições de trabalho e de gerenciamento da demanda nas unidades básicas pelos enfermeiros, se planejou as atividades do círculo de cultura. Deste modo, foram incluídas diversas técnicas com a finalidade de gerar um processo de 5 desconstrução e reflexão crítica sobre a competência do gerenciamento e negociação da oferta de cuidados dentro do sistema de saúde. Assim, deu-se seguimento a primeira etapa do círculo com uma técnica de acolhimento, distribuiu-se entre as participantes algumas imagens de figuras públicas e desconhecidas. Após livre escolha das figuras que funcionaram como disparadores do processo de acolhimento abriu-se um espaço para discussão pedindo que os sujeitos fizessem uma reflexão e expressassem suas percepções acerca das expressões e ações das pessoas nas imagens. A finalidade foi despertar um processo de reflexão crítica sobre a questão do pré-julgamento que perpassa o cotidiano os diversos espaços e cenários, destacando o ambiente de trabalho, que no âmbito da saúde mental ainda se relaciona com estigma e pré-conceito, podendo afetar direta e indiretamente a assistência à pessoa em sofrimento mental. Nas imagens distribuídas havia expressões de tristeza, preocupação, sofrimento, dor, alegria, etc., além de outras imagens de políticos, religiosos e esportistas. Eu peguei a imagem do Papa Francisco, bem ele é uma pessoa que transmite alegria, felicidade, fé, confiança e esperança. (Enfermeiro 1) Eu peguei Osama Bin Laden, uma pessoa sem compaixão que pode fazer o que for em nome de um deus e de uma religião. A segunda foi de Ronaldo, ex-jogador de futebol, que é uma pessoa riquíssima, ou melhor milionária, mas que aparenta ser uma pessoa superficial em seus relacionamentos, não só no relacionamento homem-mulher, mas nos relacionamentos de amizade. Pelo menos é o que eu percebo. (Enfermeiro 2) A minha primeira imagem foi de Lula, a cara dele mostra que ele tá pensando, me dei bem, mudei de vida (risos). E a segunda é de uma pessoa com enxaqueca, preocupada com as contas pra pagar. (Enfermeiro 3) Dessa maneira, a partir desse momento de acolhimento, foi direcionada a discussão que proporcionou o levantamento de questões relacionadas à competência do “Gerenciamento e negociação da oferta de cuidados dentro do sistema de saúde”, favorecendo assim uma troca de saberes e vivências entre os sujeitos participantes. 6 Na tematização a discussão abordou a importância do apoio matricial para a assistência e continuidade eficiente desta à pessoa em sofrimento mental na comunidade. Entende-se por “matriciamento” ou “apoio matricial” uma nova maneira de produção de saúde, onde duas ou mais equipes, conjuntamente participam do processo de criação de uma proposta de intervenção pedagógico-terapêutica(8). No decorrer desse segundo momento de tematização, foi abordada a importância do apoio matricial para a assistência e continuidade eficiente desta à pessoa em sofrimento mental na comunidade. Entende-se por “matriciamento” ou “apoio matricial” a nova maneira de produzir saúde, onde duas ou mais equipes conjuntamente participam do processo de criação de uma proposta de intervenção pedagógico-terapêutica(8). Na ocasião, as enfermeiras relataram as principais dificuldades enfrentadas pelo déficit desse apoio matricial, tanto relacionado aos serviços envolvidos diretamente na atenção psicossocial, bem como nos demais serviços de que compõem a rede de saúde. Infelizmente estamos sem o apoio do NASF no município, desde o início de dezembro que estamos sem contar com esse apoio. Então fica complicado de fazer alguma coisa. (Enfermeiro 1) Quando a gente encaminha uma pessoa para o NASF, ela acha que por estar sendo encaminhada pra lá, é um algo mais. Só que quando chega lá passa pela triagem, enfrenta aquelas filas e sinceramente, aquelas dificuldades no atendimento, não sou eu que tô falando, sei a que a rede funciona, mas eles mesmos falam, que acham isso e se decepcionam. (Enfermeira 3) Quando a gente encaminha um paciente para os CAPS na ficha que enviamos do paciente, tem embaixo um espaço com o nome contra-referência, não custava nada eles preencherem, mas eles não preenchem. Ai não tem nem como saber acompanhar essa pessoa. Se o enfermeiro quiser saber alguma coisa tem que perguntar à pessoa ou ao familiar. (Enfermeiro 2) Tal discussão culminou na reflexão sobre o significado da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), que tem como perspectiva o fortalecimento de diretrizes da Reforma Psiquiátrica. Assim, entende-se que a RAPS estabelece alguns serviços integrantes do Sistema Único de Saúde (SUS), como pontos de atenção para a assistência de sujeitos em sofrimento mental, incluindo a atenção a usuários de crack, álcool e outras drogas(9). 7 Dessa forma, com o objetivo de gerar uma melhor percepção e fixação do papel da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) realizou-se uma montagem de alguns serviços que a compõem. Nesse momento, as participantes formaram um continuo de atenção à saúde mental em um quadro branco, com os seguintes serviços, todos interligados a Estratégia Saúde da Família (ESF): Centros de Atenção Pisicossocial (I, II e III); Centro de Atenção Pisicossocial Infanto-Juvenil (CAPSi); Centro de Atenção Pisicossocial Álcool e Drogas (CAPSad); Núcleo de Apoio a Saúde da Família (NASF); Centro de Referência de Assistência Social (CRAS); Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS); Comunidades Terapêuticas; Residências Terapêuticas; Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU); Unidades de Pronto Atendimento 24 horas (UPA); e enfermaria especializada em Hospital Geral(9). Esse momento permitiu que as participantes refletissem sobre o papel de cada serviço dentro da RAPS e como a Estratégia Saúde da Família representa um alicerce para esses serviços ao tempo que também se mostra muitas vezes como ponto de partida, ou seja, além da identificação das principais necessidades em saúde mental partirem deste serviço para outros, a assistência é contínua, fazendo com que o usuário mesmo referenciado a outros serviço seja ainda acompanhado de maneira integral pelos profissionais da ESF. No terceiro momento – a problematização, as participantes foram dividas em dois grupos, onde cada um recebeu um caso clínico, para que fosse analisado e interpretado, e assim sugerissem as condutas que acatariam como enfermeiras de ESF, com vista a promover uma reflexão de toda a discussão e questionamentos levantados no prosseguimento do encontro, bem como sensibilizar para situações reais e para a prática da escuta e do atendimento humanizado em saúde mental. O primeiro caso clínico tratava de um idoso, militar aposentado e viúvo, que nos últimos meses vinha apresentando um comportamento diferente do habitual, restringindo-se a só querer ficar em casa, descuidando da aparência, apresentando solidão, tristeza e insônia, o que levou a prática da automedicação de benzodiazepínicos. Assim, seu Filho preocupado procurou a Unidade de Saúde da Família. Primeiramente a gente do PSF deve procurar a família dele, em seguida entrar em contato com NASF para encaminhar ele pra um psicólogo. É importante também encaminhar esse paciente para o CAPS para que este passe pelo psiquiatra, por conta do risco de suicídio já que teve caso na família. (Conduta do grupo 1) 8 No segundo caso, abordou-se o caso de um homem, trabalhador rural, casado e que possui quatro filhos pequenos. Tem comparecido a unidade frequentemente com queixas diversas, mas que ao exame físico detalhado e resultado de exames laboratoriais e de imagens não apresenta nenhuma intercorrência física. No entanto, ao conversar com a esposa, a enfermeira do serviço descobriu que ele estava desempregado, e que há anos não consegue trabalho formal, o levando a irrita-se facilmente, especialmente quando falta alguma coisa em casa. A esposa relatou ainda que apesar das consultas, medicamentos e vitaminas prescritas pelo médico, não vê melhora significativa de seu quadro e diz não saber mais o que fazer. Bem ele era uma pessoa útil e que trabalhava em uma fazenda, e que vem apresentando essas alterações desde que perdeu o emprego. É tanto que quando ele arranja um bico os sintomas desaparecem. E ao chegar na unidade básica o que poderia ser feito nesse caso? Bem no início eu não saberia muito o que fazer, tipo a única solução era conseguir um emprego pra ele. Ai como eu ia fazer isso. Mas pelo que conversamos, vimos que nesse caso podemos contactar junto ao apoio psicológico do NASF o apoio da assistente social, que pode através da articulação com CRAS que pode ajudar nessa questão, ou de conseguir um trabalho ou de uma ajuda de custo ou cesta básica. (Conduta do grupo 2) Diante do exposto, nota-se que é preciso ter cautela para que as ações em saúde não sejam conduzidas com meras regras, e consequentemente só objetivem a remissão de sintomas, não considerando a vida do usuário e o ambiente que ele está inserido. Pois nem sempre esses tipos de intervenções estão relacionadas a resultados positivos na qualidade de vida do usuário, mas é necessário que possa ser questionado a relação do seu sofrimento com as manifestações sintomáticas relatadas(4). Ao procurar o serviço de saúde, o usuário espera que algum profissional deste serviço possa suprir a sua necessidade em saúde e consequentemente resolver o seu problema. No entanto, atribuise ao profissional a capacidade de estar atento ao problema, assistindo ao usuário de forma integral, de modo que possa criar possibilidades e arranjos para o enfrentamento deste. Além disso, não se deve dar ênfase a doença ou apenas a queixa, mas abordar todas as dimensões e contextos que o usuário se insere, produzindo qualidade vida de maneira ampliada, e assim proporcional um cuidado integralizado(4). Esse momento de problematização proporcionou sensibilização para situações reais que chegam cotidianamente a ESF, e como membro da equipe o enfermeiro depara-se com o desafio de mobilizar elementos próprios do seu trabalho como também acionar o apoio de outros profissionais 9 e serviços. Assim, pôde-se trabalhar com o desenvolvimento e aperfeiçoamento das seguintes habilidades: saber identificar as situações em saúde mental no território, como por exemplo, emergências psiquiátrica, avaliando a causa junto à família e acionar a rede de cuidados secundários, se necessário; e agir defendendo os direitos dos usuários e familiares para acesso à rede de atenção social e de saúde, consultas especializadas, medicações e recursos terapêuticos necessários. No fechamento do encontro as enfermeiras fizeram uma rápida avaliação sobre o encontro e sobre a temática abordada, enfocando principalmente na importância de se ter a formação de espaços, como o círculo de cultura, que neste caso, proporcionou a discussão de situações que se apresentam na realidade da prática profissional no cenário da Atenção Primária, como por exemplo, o momento de reflexão sobre as situações de estigmas e preconceitos e a discussão dos casos clínicos, além de trazer esclarecimento sobre questões que envolvem a articulação com os serviços de apoio dentro da rede de saúde. CONSIDERAÇÕES FINAIS O desenvolvimento desta pesquisa-ação possibilitou realização de intervenção educacional com enfermeiros sobre o desenvolvimento de competências em saúde mental para o gerenciamento e negociação da oferta de cuidados dentro do sistema de saúde. Tratar esta temática complexa e ao mesmo tempo inovadora junto aos enfermeiros através do Círculo de Cultura implicou em atitudes de sensibilizar, acolher, dinamizar e refletir em um processo de construção, desconstrução e reconstrução de conhecimento saberes, posturas e práticas. Esta estratégia de educação permanente para enfermagem viabilizou a participação dos sujeitos de forma ativa e dinâmica, além de fomentar uma reflexão crítica acerca das situações da realidade e da incumbência social para a sua modificação. Nas visitas para a descoberta do universo vocabular, foi possível vivência que na prática da articulação entre Estratégia Saúde da Família e outros serviços de apoio na rede, o processo de referencia e contra-referência não acontece de maneira efetiva, o que dificulta o monitoramento e a continuidade a assistência à saúde mental. Isso evidencia que há muitas lacunas a serem preenchidas não apenas pelos profissionais destes serviços, mas também pela gestão da rede. Durante o Círculo de Cultura foi possível fortalecer os pontos positivos evidenciados na realidade dos enfermeiros e também refletir sobre as dificuldades encontradas no processo de 10 trabalho destes profissionais, de forma que houve uma interação entre facilitares e participante, colaborando para o envolvimento e participação ativa dos sujeitos. A técnica grupal onde as participantes expressaram suas percepções sobre as expressões e ações das pessoas nas imagens distribuídas no momento do acolhimento, a troca de saberes e experiências na tematização, a reflexão crítica acerca da realidade através da discussão dos casos clínicos na problematização proporcionou o fechamento do círculo de cultura com uma avaliação positiva dos participantes. Portanto, tais avaliações nos leva a concluir que a metodologia do Círculo de Cultura representa uma estratégia inovadora e prática para a enfermagem, uma vez que representa a formação de um espaço onde se tem a possibilidade de desconstruir e reconstruir saberes de maneira coletiva e assim direcionar novas faces para a qualificação do cuidado em saúde mental. REFERÊNCIAS 1. Lucchese, R. A enfermagem psiquiátrica e saúde mental: a necessária constituição de competências na formação e prática do enfermeiro. Rev Elet Enferm. 2007; 9(3): 883-885. 2. Lucchese R, Barros S. A constituição de competências na formação e na prática do enfermeiro em saúde mental. Rev. Esc. Enferm. USP 2009; 43 (1): 152-60. 3. Zarifian, P. Objetivo Competência: por uma nova lógica. São Paulo (SP): Editora Atlas, 2001. 4. Ministério da Saúde (Brasil). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Caderno da Atenção Básica n.34. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. 5. Neves HG, Lucchese R, Munari DB. Saúde mental na atenção primária: necessária constituição de competências. Rev Bras Enferm. 2010; 63 (4): 666-670. 6. Thiollent, M. Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo (SP): Cortez, 2008. 7. Freire, P. Pedagogia do oprimido. 47ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Paz e Terra; 2008. 8. Chiaverini, DH (Org). Guia prático de matriciamento em saúde mental. Ministério da Saúde: Centro de Estudo e Pesquisa em Saúde Coletiva, 2011. 236p. 9. Brasil. Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União, 2011. 11 10. Hirdes, A. A perspectiva dos profissionais da Atenção Primária à Saúde sobre o apoio matricial em saúde mental. Ciência & Saúde Coletiva, 2015; 20 (2): 371-382. 11. Antonacci MH, Kantorski LP, Willrich JQ, Argiles CTL, Coimbra VCC, Bielemann VLM. Estrutura e fluxo da rede de saúde como possibilidade de mudança nos serviços de atenção psicossocial. Rev Esc Enferm USP, 2013; 47 (4): 891-8. 12. Oliveira RF, Andrade LOM, Goya N. Acesso e integralidade: a compreensão dos usuários de uma rede de saúde mental. Ciência & Saúde Coletiva, 2012; 17 (11): 3069-3078.