Gestão Social de Inovações Educacionais na Construção de Comunidades Virtuais de Aprendizagem Carlos Henrique Silva de Castro Lucília Machado Resumo: Neste texto, se advoga a necessidade da renovação conceitual do termo de inovação, tradicionalmente ligado à tradição schumpeteriana de viés economicista. Para tanto, se propõe fazer a incorporação das dimensões sociológicas e de gestão social de acordo com o conceito cunhado por Latour que ultrapassa as questões tecnológicas e atinge o âmbito sociológico e, ainda, de acordo com o conceito de ambiente inovativo cunhado por Maciel que encontra o conceito de Latour ampliando-o na medida em que valoriza o espaço social dos atores da inovação. Conceitos de extrema relevância para a educação, baseados nas relações entre os sujeitos e as redes, tendo em vista a construção de comunidades virtuais de aprendizagem baseadas em práticas dialógicas mais ricas de significados, fundamentadas nas identidades sociais e culturais, na negociação de interesses, em inovações em EaD sustentadas pela participação e legitimidade. Palavras-chave: Gestão social; Inovações Socioeducacionais; Comunidades Virtuais de Aprendizagem. Abstract In this text, it is advocated the need of a conceptual renewal of the innovation concept traditionally linked to the Schumpeterian tradition of an economist view. To achieve this, there is a proposal to incorporate the sociological dimensions and the social management according to the concept stamped by Latour who overcomes the technological questions and achieves the sociological spheres, and also, according to the concept of innovative environment stamped by Maciel who finds Latour´s concept and enhances it as he values the social space of the innovation actors. These are concepts of extreme relevance for education, based on the relationship between the subjects and the nets aiming at building virtual communities for learning based on dialogic practices richer in meaning, founded on the social and cultural identities, in the negotiation of interests, in the e-Learning innovations supported by participation and legitimacy. Keywords: Social Management; Socioeducational Innovations; Virtual Communities for Learning. 1. Introdução A partir de 1980 a temática inovação - tecnológica, organizacional, etc. - passou a fazer parte dos discursos e da agenda de diferentes setores da economia, impulsionada pelo aumento da competitividade decorrente da abertura dos mercados internacionais. Nos países desenvolvidos, este processo foi acompanhado por medidas de valorização das inovações visando o comércio 1 internacional, adotadas pelos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE (ANDRADE, 2005, p. 145). No Brasil, é a partir de meados dos anos de 1990 que os investimentos nas políticas de inovação se iniciam (ANDRADE, 2005, p. 145). Apesar de tornar-se rapidamente a coqueluche das políticas de investimento, tal conceito, ainda em 2010, carece de amplo debate e pesquisas diversas que contribuam para aclarar as lacunas deixadas pelos diversos estudiosos que trabalham com a temática desde a sua gênese, em Schumpeter, no início do século XX (ANDRADE, 2005, p. 146). O conceito desenvolvido por Schumpeter possui um caráter corporativo, envolve investimento em pesquisa e desenvolvimento e não requer a menção à participação dos diversos atores que possam estar implicados no processo produtivo. Para este autor, (...) os investimentos nas novas combinações de produtos e processos produtivos de uma empresa repercutem diretamente em seu desempenho financeiro, de modo que o moderno empresário capitalista deve ocupar ao mesmo tempo um papel de liderança econômica e tecnológica. O comportamento empreendedor, com a introdução e a ampliação de inovações tecnológicas e organizacionais nas empresas, constitui um fator essencial para as transformações na esfera econômica e seu desenvolvimento no longo prazo. (SCHUMPETER, 1982, apud ANDRADE, 2005, p. 146). Este conceito inicial toma força com o surgimento da teoria da “hélice tripla”, que propõe a conjunção de Estado, universidades e empresas na busca de soluções respaldadas em pesquisa científica e tecnológica (ANDRADE, 2005, p. 147). A ênfase é dada aos produtos em detrimento dos processos e práticas sociais envolvidas nas inovações, cujo objetivo fundamental é atender as demandas específicas destes segmentos, especialmente, governos e empresas. Ficam sem respostas questões sobre como explicar o sucesso de determinadas experiências e o insucesso de outras. Assim, a partir de 1980, constrói-se um novo conceito de inovação que evolui voltando seu foco para a formação e o desenvolvimento de redes constitutivas e presentes no processo inovativo (FREEMAN, 1992, apud ANDRADE, 2005, p. 148). Entretanto, o paradigma anterior “não conseguiu alterar significativamente o elenco de agentes envolvidos nas práticas da inovação – sobretudo universidades, empresas e órgãos governamentais” (ANDRADE, 2005, p.148). Os insucessos de alguns processos inovativos foram, então, explicados, posteriormente por Latour. Para este, os maus resultados podem ser explicados pela desconsideração dos pesquisadores da inovação daqueles que sofrem impactos com os resultados finais alcançados: a população e seus interesses. Estes insucessos seriam explicados e esclarecidos caso fosse 2 observado o meio e ouvidas as pessoas atingidas, resultando em produtos e processos de maior aceitação e com maior potencial para o sucesso. Isto significa promover a gestão social das inovações. Para Latour: Toda inovação solicita um contexto que lhe seja favorável e, caso seja impedido de manipular tal ambiente, o agente inovador se verá incapacitado para impor novas regras de articulação entre as tecnologias e o comportamento social. (LATOUR apud ANDRADE, 2005, p. 149) Volta-se, assim, para as questões sociais que envolvem o processo produtivo, todavia, sem seu conceito ainda contemplar o importante papel da sociedade e da gestão social, mas apenas as questões sociais que envolvem a inovação no seu processo de concepção específico. Em 1997, um novo conceito para ambiente de inovação encontra o conceito de Latour, mas o amplia. Para Maciel, a noção de ambiente de inovação: (...) procura dar conta do conjunto de condições – limites, obstáculos, possibilidades, estímulos – da inovação em uma determinada formação social. Ambiente de inovação refere-se portanto ao conjunto de fatores políticos, econômicos, sociais e culturais que estimulam ou dificultam a inovação (...) (1997, p. 109, apud ANDRADE, p. 150). Esta nova perspectiva articula tecnologia, economia e vida social de forma aberta e inclusiva ultrapassando a relação tida como essencial e fechada entre inovação e setor produtivo até então. O conjunto das características do meio e seus elementos culturais e sociais tornam-se, tardiamente, há de se dizer, componentes da inovação. Com o advento da Internet e seu rápido crescimento e popularização, novas práticas sociais vão se configurando e ampliando o ambiente de inovação. Sujeitos diversos e com identidades diversas se encontram num espaço virtual, que permite a interação acerca de interesses vários. Trata-se de um novo e ascendente espaço social, que nos próximos anos tornariam reais as possibilidades de interação difíceis de serem concebidas pelo homem médio da sociedade até então. Surgem preocupações com a interação em ambiente virtual a partir da constituição de redes neste novo espaço. O conceito de redes, que melhor se adéqua ao novo espaço é o descrito por Castells e: (...) possui um significado sociológico tradicional, como interconexão de nós diferenciados, composta por agrupamentos humanos diversos. A chegada da era da informação, que articula a microeletrônica e o pós-fordismo, representa para Castells o contexto social propício para a ampliação da sociabilidade em rede do século XXI. (CASTELLS, 1999, apud Andradre, 2005, p. 151) 3 A interconexão de nós, descrita por Castells, avança por onde a limitação física antes não permitia, possibilitando, assim, a formação de agrupamentos com configurações tão diversas quanto possíveis. A relevância da pesquisa sobre inovação em educação já havia se mostrado relevante desde as alterações propostas por Latour ao conceito inicial de Schumpeter, que o amplia agregando as questões sociais. Tal visão atinge o seu ápice de abertura com as pesquisas de Maciel que inclui no espaço inovativo os impactados pela inovação e sua cultura, sendo que estes devem ser os reais agentes de inovação. Trata-se de uma realidade observada por diversos autores que refletirá em políticas socioeducacionais uma vez que educação, cultura, inovação, tecnologia e economia se aproximam a partir das contribuições de Latour e Maciel acerca da descrição de inovação e espaço inovativo. 2. Gestão social de inovações na educação As pesquisas sobre inovação socioeducacional ganharam novo impulso recentemente. Para Messina et al (2008, p.10), inovação “dá conta de algo que se reinventa, que busca alterar a sua orientação, saindo dos limites de seu espaço habitual. Inovação é antes de nada sair do familiar e incursionar pelo desconhecido (...)” i. Alguns anos antes (MESSINA, 2001, p.226), esta autora destacou dois componentes que distinguem uma inovação: “a) a alteração de sentido a respeito da prática corrente e; b) o caráter intencional, sistemático e planejado, em oposição às mudanças espontâneas.” Messina, em consonância com o caráter sociológico defendido por Latour e Maciel, enfatiza que (...) atualmente a inovação é algo aberto, capaz de adotar múltiplas formas e significados, associados com o contexto no qual se insere. Destaca-se, igualmente, que a inovação não é um fim em si mesma, mas um meio para transformar os sistemas educacionais. (MESSINA, 2001, p.226) Em revisão da literatura acerca da temática encontra-se o ponto de vista de Neirotti e Poggi que, por sua vez, ressoa no conceito de Messina complementando-o: (...) pode-se afirmar que a inovação educacional pode não ser a invenção de um novo dispositivo ou de uma nova prática, mas que constitui uma novidade a partir da perspectiva do processo que caracteriza um conjunto de atores (sejam eles membros de uma escola, de uma comunidade ou simplesmente de um grupo). (NEIROTTI & POGGI, 2005, p. 142) 4 O conceito de espaço inovativo de Maciel é reafirmado por estes autores que defendem que a inovação está condicionada por posicionamentos políticos, sociais, culturais e epistemológicos (NEIROTTI & POGGI, 2005, p. 142). Porém, trazem uma novidade, pois defendem que o que é inovador para uma pessoa ou grupo pode não o ser para outros uma vez que tal percepção “depende da perspectiva e das representações ou concepções dos diferentes sujeitos envolvidos com a educação, a escola, o ensino, a aprendizagem, o sujeito que se quer formar, a sociedade, a cultura, etc”. (GUIJARRO, apud NEIROTTI & POGGI, 2005, p.142-143). E continuam: Em segundo lugar, as inovações não são ‘a - históricas’, mas se definem em função do contexto e do tempo, de tal forma que aquilo em que um contexto pode ser inovador, pode não ser em outro, e o que em um momento foi inovador, em outro contexto determinado pode deixar de sê-lo ao converter-se em rotina. Toda inovação realiza-se em reação a uma situação determinada que se quer transformar, e o novo se define em relação com o anterior; o que é inovação em um país ou escola é tradição em outra. Por último, a relatividade da inovação expressa-se no fato de que ela depende da sociedade, cujas demandas tenta satisfazer e, ao mesmo tempo, está condicionada pelo sistema educativo e social na qual está escrita. (GUIJARRO, apud NEIROTTI & POGGI, 2005, p. 143) Uma problemática trazida pelos autores trata-se da replicação do que se considera inovativo por uns, sobretudo nos níveis centrais dos sistemas educacionais, e que deve ser reaplicado em outros contextos desconsiderando suas particularidades (NEIROTTI & POGGI, 2005, p.227) transformando os verdadeiros atores da inovação em meros coadjuvantes. Prática retrógrada que nos remete ao conceito inicial de inovação cunhado por Schumpeter há quase um século atrás. Assim, cria-se determinada ojeriza por parte dos professores ao que se chama de inovativo, sem na verdade o ser, uma vez que desconsidera o conceito de espaço inovativo, com participação ativa dos sujeitos, tal qual concebeu Maciel. Tal posicionamento por parte dos referidos níveis centrais do sistema educacional, “marcam a história da inovação no campo educacional, percebemos que ela surge associada a uma lógica que buscava a generalização e que se orientava pelos princípios do experimento” (NEIROTTI & POGGI, 2005, p. 227). A solução apontada por estes autores encontra novamente a descrição de espaço inovativo descrito por Maciel. Deve-se “atribuir aos educadores um papel central nos processos de mudança. Destacam “que a reforma fracassou, porque ignorou os docentes e simplificou o problema do ensino” (FULLAN & HARGREAVES, 1999, apud NEIROTTI & POGGI, 2005, p. 227). Ou seja, ignorou a gestão social dos processos de inovação educacional ou de inovação socioeducacional. 5 Apesar de se concordar com a posição de que os professores são importantes atores de mudança, nota-se um valor demasiado atribuído a estes ignorando outros atores envolvidos como aqueles que exercem outras funções tão nobres na educação, tais como o corpo discente, os bibliotecários, supervisores, diretores, secretários, pessoal de apoio, famílias, e, ainda, a comunidade. Confirmando esta posição, Spink aponta motivos para o êxito de inovações em educação em um trabalho que avalia o que seja inovação pela visão dos agentes inovadores em vinte experiências inovativas na área da educação, selecionadas em um grupo de quase oito mil experiências recolhidas para seu estudo. Para Spink (2004): Talvez a importância das experiências exitosas, aquilo que torna seu uso cada vez presente, está tanto no seu otimismo, demonstrando que saídas são possíveis, quantos nos seus origens práticos (sic), trazendo para o palco da discussão sobre a esfera pública milhares de atores diferentes que não escrevem livros e muito menos são professores ou consultores de organizações internacionais, mas são capazes de falar a partir das soluções e caminhos criados. (SPINK, 2004, p.1) Messina et al. (2004), em análise de vinte e quatro experiências inovadoras de formação para o trabalho, apontam como fator primordial para o sucesso da inovação o trabalho de alianças interinstitucionais em prol do sucesso das experiências, bem como a já citada participação dos diversos atores envolvidos no processo e afetados por ele. Para os autores, As inovações sistematizadas se caracterizam majoritariamente pela busca explícita em torno da qualidade educativa – definida em termos de pertinência e participação – tanto como pelos esforços de articulação com a comunidade. As experiências estão estruturadas em termos de um projeto que se centra no educativo ou que se abre a propostas intersetoriais. Em todas elas observam-se também, com maior o menor grau de maturidade, o trabalho interinstitucional e a busca de um modelo pedagógico alternativo. (MESSINA et al., 2004, p. 29)ii O que se observa em toda a literatura aqui apontada é que várias experiências analisadas pelos autores reproduzem parte de outras experiências de sucessos, com a devida adequação ao contexto social em que é reaplicada. E sobre reaplicação, Brunner (apud NEIROTTI & POGGI) pontua: Logo que as inovações são produzidas, elas podem ser adaptadas para difusão, e transmitidas de modo que possam ser adotadas por outros grupos e estabelecimentos. Não seguem pois uma trajetória linear, evolutiva, mas - quando são bem-sucedidas – produzem uma espécie de contágio. É sob essa modalidade que as inovações culturais são transmitidas, em geral, de uma tribo à vizinha, de um grupo geracional ao seguinte, de um país a outro, ou de uma escola ao resto do sistema escolar. (BRUNNER, apud NEIROTTI & POGGI, 2005, p.141) 6 O que se discorda dos referidos autores é sobre a utilização que fazem do termo “difusão”. Não se sabe qual sua real intenção na utilização de tal termo, mas cabe ressaltar que o termo difusão refere-se a um modo de propagação homogeneizador, que não aceita alterações de qualquer espécie (PAULICS, 2003a, p. 8-16). Para melhor ilustrar o pensamento aqui defendido advoga-se que o correto seria o termo translação, pois este se refere a um modelo de disseminação aberta a mudanças de acordo com as necessidades locais, de acordo com as questões sociais que envolvem os atores do processo inovativo de acordo como o ambiente inovativo (PAULICS, 2003b, p. 17-31), tal qual defendido por Maciel (1997, p. 109, apud ANDRADE, p. 150). 3. Gestão social, inovações educacionais e comunidades virtuais de aprendizagem Pelo potencial para a interação trazido pela word wide web, emerge uma nova Educação a Distância – EaD, que difere da tradicional, aquela por correspondência via cartas do Instituto Monitor de São Paulo e do Instituto Universal Brasileiro, ou mediada pela televisão e rádio a exemplo dos Telecursos Primeiro e Segundo Graus da Fundação Roberto Marinho e tantas outras, a partir do momento em que torna possível a existência de um diálogo mais constante que pode e deve lidar com a manifestação de diferentes vozes e suas cargas identitárias, no espaço virtual. Crê-se que a pesquisa acerca da interação em ambiente virtual deve se distanciar da abordagem schumpeteriana que focaliza inovações em seu caráter pontual e específico, ou seja, o produto tecnológico e seus benefícios para o mercado, deixando de lado a preocupação com o processo da sua construção e gestão, com o impacto e a acolhida social das inovações (ANDRADE, 2005, p. 146). Uma análise da interação só se torna possível a partir da verificação da materialização das indenidades, sobretudo por meio da linguagem, do diálogo. E, como conseqüência, não há como analisar o discurso produzido em determinado espaço desconsiderando os autores de tais arrazoados uma vez que os pressupostos das relações sociais perpassam a linguagem produzida tornando-a carregada de ideologias. O espaço da comunicação é um espaço semiótico em que se encontram diversas vozes, que torna possível a existência do diálogo, da construção e re-construção de significantes, significados e enunciados. Tal posicionamento é justificado pelas palavras de Bakhtin: 7 (...) esse espaço semiótico e esse papel contínuo da comunicação social como fator condicionante não aparecem em nenhum lugar de maneira mais clara e completa do que na linguagem. A palavra é o fenômeno ideológico por excelência. A realidade toda da palavra é absorvida por sua função de signo. A palavra não comporta nada que não esteja ligado a essa função, nada que não tenha sido gerado por ela. A palavra é o modo mais puro e sensível de relação social. (BAKHTIN, 2006, p.34) Dessa forma, a pesquisa das interações virtuais deve trabalhar com a inovação do ponto de vista sociológico uma vez que busca respostas para satisfazer a problemas de ordem dialógica e identitária. Nota-se que se inova nos processos técnicos, mas resta uma pergunta. E as práticas adotadas? Que implicações elas trazem para as relações entre os sujeitos e para a participação destes na gestão destas inovações? Diante das novas possibilidades de levar conhecimento a um número cada vez maior de pessoas, tal questionamento se torna questão central para uma educação inclusiva e de qualidade. A importância da prática é defendida por Marx (1845) em suas onze “Teses sobre Feuerbach”. Para ele, na tese de número oito, “a vida social é essencialmente prática. Todos os mistérios que seduzem a teoria para o misticismo encontram a sua solução racional na praxe humana e no compreender da praxe”. Assim, são as práticas educacionais da nova EaD que significam e dão suporte à aprendizagem. Mudam-se as ferramentas, mas permanecem os velhos desafios. A prática pedagógica inovadora encontra o conceito de ambiente inovativo descrito por Maciel que busca articular tecnologia, economia e vida social de forma aberta, inclusiva e para além da relação entre inovação, mercado e competitividade. Processos mecanizados, direcionados a uma massa, que desconsiderem os aspectos sociais, certamente se tornarão ineficazes diante de sujeitos multiculturais e com identidades locais diferenciadas. A prática pedagógica no ambiente virtual de aprendizagem está, assim, desafiada a fomentar a formação de comunidades onde cada participante poderá trazer a sua contribuição, qual seja o questionamento, a produção de enunciados, o diálogo. A exemplo do conceito de redes trazido por Castells (1999, apud Andradre, 2005, p. 151), “(...) interconexão de nós de nós diferenciados, composta por agrupamentos diversos”, este novo espaço é composto, sobretudo, por agrupamentos humanos diversos de onde deve brotar as questões sociais, culturais, identitárias, ideológicas que formam seu substrato ontológico. Sílvio (apud BACKES et al, 2007, p. 13) coloca que “ao longo da história, os sociólogos foram definindo comunidade como grupo de pessoas que possuem objetivos comuns e se 8 relacionam por meio de interações, escala de valores comuns e interesses”. Tal conceito encontra a definição de Neirotti & Poggi que, ampliado para a nova realidade tecnológica, contempla também o objetivo da aprendizagem na formação das comunidades. Para estes últimos, múltiplas definições para Comunidade de Aprendizagem dão conta de espaços amplos de aprendizagem, geográficos ou virtuais, sistemáticos ou não, formais ou informais. Já Sartori (2003) avança um pouco mais e descreve as comunidades virtuais como: (...) espaços formados por agrupamentos humanos no ciberespaço. Seu funcionamento está diretamente ligado, num primeiro momento, às redes de conexões proporcionadas pelas tecnologias de informação e comunicação e, num segundo momento, à possibilidade de, neste espaço, pessoas com objetivos comuns, se encontrarem, estabelecerem relações, e desenvolverem novas subjetividades. (SARTORI, 2003, p.3) Nota-se que, pelos conceitos apresentados, em espaço virtual ou presencial, a importância na formação de comunidades está na interação para troca e construção de novos de conhecimentos, no desenvolvimento das subjetividades de que trata Sartori (2003). Assim, um agrupamento somente pode ser chamado de comunidade se evidenciar existência de diálogo entre os membros que o constituem. Destaca-se ainda que essa união de pessoas em comunidades torna-se possível apenas quando há interesses comuns presentes nas identidades dos sujeitos, que serão re-construídas a partir do diálogo estabelecido. A este processo dá-se o nome de aprendizagem que, por sua vez, pode ocorrer em processos formais ou informais de educação desde que haja interações que possibilitem a presença de diversas vozes para uma troca eficaz de conhecimentos e constituição de novos saberes. O desafio do educador em EaD está no fomento desta interação, desse diálogo produtivo, utilizando ferramentas que já vêm se tornando comuns na vida das pessoas. Algumas pesquisas apontam para o sucesso na interação em alguns ambientes educacionais virtuais. É o caso das pesquisas de Axt, Elias et al, (2006), Costa et al (2005) e Giordan e Dotta (s/d)iii. Porém, em outros casos, como o apontado por Backes (2007), tal sucesso não é verificado. Em nenhuma destas pesquisas verificou-se um estudo apurado das práticas pedagógicas adotadas. Encontra-se aí uma lacuna que deve fomentar novas pesquisas. 4. Considerações Finais 9 Visto que, a formação de Comunidades Virtuais de Aprendizagem (CVA) depende necessariamente do diálogo e da polifonia, ou seja, da presença de diversas vozes, cada uma com sua identidade local, uma pesquisa acerca de “Identidades Locais, Interação e Construção de Comunidades Virtuais de Aprendizagem” poderá utilizar-se dos seguintes conceitos, já apresentados em seção anterior: 1) Inovações Sociais tal qual concebe Latour: ultrapassa as questões técnicas para dar conta de abranger as dimensões sociológicas e da gestão social; 2) Ambiente Inovativo tal qual concebe Maciel: encontra o conceito de Latour e o amplia à medida que valoriza o espaço social e a relação entre os atores da inovação; 3) Redes na acepção de Castells: espaço composto, sobretudo, por agrupamentos humanos diversos de onde brotam as questões sociais, culturais, identitárias, ideológicas, entre outras. Conclui-se que, o que se deve pretender com pesquisas dessa ordem é contribuir para uma prática dialógica mais rica de significados em ambientes virtuais que valorize as identidades sociais e culturais, permitindo, por meio de uma gestão social, a construção de enunciados e, consequentemente, do conhecimento. Os agentes inovadores estão, assim, desafiados a agir estrategicamente negociando interesses a fim de ganhar contribuições para o processo inovativo e, consequentemente, uma maior aceitabilidade das práticas inovativas. Práticas pedagógicas que consigam sucesso neste aspecto contribuirão para preencher as lacunas encontradas no fomento do diálogo em ambientes virtuais de aprendizagem, com vistas à formação de CVA, e representarão uma inovação para a EaD respaldada em participação e legitimidade. Referências ANDRADE, Thales de. Inovação e ciências sociais: em busca de novos referenciais. Revista Brasileira de Ciências Sociais [on-line]. 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