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Expressões emotivas em sala de aula: como as professoras lidam
com elas?
Vanêssa Fernandes da Silva Menezes1
Sandra Patrícia Ataíde Ferreira2
RESUMO - O presente trabalho tem como objetivo geral investigar de que modo às professoras do 4º
ano do Ensino Fundamental I da rede municipal de Jaboatão dos Guararapes lida com as emoções dos
alunos em sala de aula. Para tal, foi utilizada entrevista semi-estruturada a duas professoras do 4ºano
graduadas em Pedagogia e oito observações. Os dados foram analisados qualitivamente através da análise
de conteúdo de acordo com a teoria psicogenética de Wallon. Verificou-se que as professoras
compreendem a emoção dentro desta teoria, embora confundam emoção com sentimento. Com relação à
prática pedagógica das professoras, foi constatado que a expressão emotiva do aluno é considerada na
ação pedagógica com o intuito de contribuir para a sua aprendizagem.
Palavras-chave: Psicogenética; expressões emotivas; aprendizagem.
1. INTRODUÇÃO
A escola como um espaço privilegiado na educação das crianças, além do seu
caráter histórico de transmissora cultural, deve considerar todas as atividades de
aprendizagem, todas que, segundo a perspectiva psicogenética de Wallon, dizem
respeito ao conjunto motor, afetivo e cognitivo. Embora no cotidiano escolar seja
perceptível uma forte valorização dos aspectos cognitivos em detrimento dos aspectos
emocionais-afetivos, é sabido que o ser humano não é composto apenas de habilidades
intelectuais, ele também possui sua dimensão afetiva, que está presente nas suas
relações com o processo cognitivo. Dessa forma, não podem ser desconsideradas na
sala de aula, onde as relações estabelecidas entre os sujeitos e o objeto de
conhecimento pressupõem a importância da afetividade. Desconsiderar essa questão
leva a uma análise reducionista e equivocada do ser humano, como declaram Leite e
Tarsoni (2002).
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_ Concluinte de Pedagogia – Centro de Educação – UFPE. [email protected]
2
_ Professora Adjunta do Departamento de Psicologia e Orientação Educacional – Centro
de Educação – UFPE. [email protected]
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A afetividade na perspectiva psicogenética de Henri Wallon, na qual essa
investigação se sustenta, engloba três manifestações: sentimento, emoção e paixão. O
sentimento para este autor é psicológico e revela um estado permanente, enquanto a
emoção, por ser uma manifestação fortemente orgânica, é ocasional e efêmera. Já a
paixão conta com o raciocínio, portanto, existe a noção de realidade externa. O
apaixonado busca transformar a realidade em desejo. A paixão só aparece quando a
criança tem a capacidade de autocontrolar-se. (WALLON, 1941/2007).
No âmbito da afetividade, será escolhida para o estudo desta pesquisa, a emoção.
Para Wallon (1941/2007), a emoção é a exteriorização da afetividade que acompanha o
indivíduo desde a infância, unindo a vida orgânica à vida psíquica. O desenvolvimento
psíquico da criança é marcado pelo meio social, pelas relações que estabelecem entre os
indivíduos.
Um dos espaços que a criança frequenta e interage, é a sala de aula. As
interferências desse ambiente podem proporcionar o surgimento da emoção,
provocando no indivíduo distúrbios motores - tremor na boca e nas pernas, contração
nos músculos do corpo, reações viscerais e glandulares. A criança apresenta estes
sintomas corporais visíveis aos olhos. É tarefa do professor, observá-los e compreendêlos em sua natureza fisiológica e social. Ignorar as reações emocionais significa
desconsiderar a formação psicológica do aluno e o desenvolvimento de suas funções
orgânicas. Diante dessa responsabilidade do educador, surgiram algumas indagações:
De que maneira o professor lida diante da manifestação emocional da criança em sala de
aula? A expressão emotiva do aluno interfere na prática pedagógica do professor? Quais
as estratégias utilizadas pelo o professor para regular a emoção dos alunos em sala de
aula? O que o professor entende por emoção?
Na busca de resolver essas indagações tem-se como preocupação pesquisar
como os professores do 4°ano do Ensino Público compreendem a emoção e como lidam
com as expressões emotivas dos alunos em sala de aula. Para isso, tenta-se observar
como ela está presente no contexto escolar, e como é importante o professor conhecer a
teoria no que diz respeito à psicogenética de Wallon sobre a emoção. Para este autor
(1941/2007, p 121), a emoção:
Consiste essencialmente em sistemas de atitudes que, para cada
uma, correspondem a certo tipo de situação. Atitude e situação
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correspondente se implicam mutuamente, constituindo uma
maneira global de reagir que é de tipo arcaico e frequente da
criança.
Para Almeida (1999, p.93), lidar com a emoção da criança em sala de aula traz
grande dificuldade para o professor. Por ser imprevisível, surge nos momentos de
completa vulnerabilidade do indivíduo. Por não considerarem essa imprevisibilidade, os
professores ao se depararem com as reações emocionais dos alunos, ficam suscetíveis
ao seu contágio numa situação de “bate-rebate” na sala de aula.
De acordo com Galvão (1995, p. 64), as emoções por se desenvolverem no meio
social, nutre-se do efeito que causa no outro como uma espécie de “combustível para
sua manifestação.” O meio social tem influência direta nas expressões emotivas, ele é
suficiente para enfraquecer ou mesmo fazer cessar essa manifestação.
Observando a dificuldade do professor em lidar com a expressividade emocional
em sala de aula, e, por haver uma inquietação da primeira autora pelo o estudo da
emoção, foi escolhido estudar a expressividade emocional no aluno em sala de aula.
Isso só foi possível devido os primeiros contatos com a teoria psicogenética de Wallon
na disciplina aspectos sócio afetivos do desenvolvimento. As discussões realizadas
nesta disciplina possibilitaram a busca pela compreensão dessa teoria, especificamente,
no que se refere ao estudo da emoção. Já na disciplina de Pesquisa e Prática Pedagógica
II, oferecida pelo o curso de Pedagogia da UFPE, em que foi possível fazer
observações, constatou-se a turma bastante eufórica e que a educadora não conseguia
criar mecanismos pedagógicos diante das expressões emotivas dos alunos. Dessa forma,
a professora ficava suscetível ao contágio emocional dos alunos e, consequentemente,
passava a fazer parte do “circuito perverso” (DANTAS 1992).
O circuito perverso, para esta autora instala-se quando o indivíduo não consegue
reagir de forma cortilizada diante das reações emocionais alheias. Esse circuito perverso
traz um grande desgaste psicológico e emocional tanto para o professor como para o
aluno.
Para Wallon (1925/2007), as emoções dependem de mecanismos que são
cerebrais, isto é, fisiológicas, subordinados à ação cultural em nível cortical. As
estruturas sub-corticais (para Wallon, opto- estriado) organizam as manifestações
emocionais, o que significa que elas escapam ao controle da vontade. Com o
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amadurecimento do córtex, a possibilidade de impor comando à expressão emocional
surge gradativamente. O professor por apresentar um córtex mais desenvolvido em
relação ao do aluno, pelo fato deste está no início do processo de desenvolvimento, deve
reagir de forma cortilizada, isto é, racional diante das expressões emotivas em sala de
aula.
Mediante o levantamento da literatura sobre a emoção (nas bases de SCIELO e
CAPES), na perspectiva psicogenética de Henri Wallon, encontraram-se apenas dois
estudos que tratam a emoção no contexto escolar à luz dessa teoria (MUNHOZ, 2007;
WINTER 2006). Já no âmbito da afetividade, foram encontrados muitos estudos no que
diz respeito à teoria de Wallon (e.g. SILVA, 2011; DOURADO, 2010; SEGUNDO,
2007; ULLER, 2006).
Estes estudos contribuíram para a realização desta pesquisa no que se refere ao
estudo da afetividade na perspectiva de Wallon. Porém, observa-se que eles não tratam
do Ensino Fundamental I nas suas investigações.
Analisando os estudos de Galvão (1995), no contexto escolar, é comum
situações de conflito emocional envolvendo professor e aluno deixando o professor sem
saber o que fazer diante de situações como irritação, raiva, agressividade e medo. Ainda
para essa autora, o estudo da psicogenética de Wallon sobre a emoção traz interessante
elementos para compreender essas manifestações emocionais. Afinal, a atividade
intelectual voltada para compreensão das causas de uma emoção reduz seus efeitos e
dessa forma possibilita ao professor agir de modo adequado em cada situação.
Deste modo, neste estudo, desejou-se investigar a atuação docente na expressão
da emoção no Ensino Fundamental I, no 4º ano de uma escola pública; objetivos
específicos: (i) analisar as estratégias utilizadas pelo o professor para regular as
manifestações emocionais dos alunos; (ii) observar de que maneira a emoção é
considerada pelo o professor no processo de ensino e aprendizagem do aluno; (iii)
compreender o que o professor entende por emoção.
Espera-se que essa investigação traga contribuições importantes para os
professores do Ensino Fundamental I da escola pública quanto às expressões emotivas
na sala de aula. A escola pública é uma conquista histórica de todos aqueles que lutam
pela expansão do ensino de qualidade. Desenvolver estudos nesses espaços significa
contribuir de forma positiva para os docentes que reivindicam a qualidade no ensino,
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estando implicado nisso a compreensão do sujeito em sua integridade e, portanto, em
seus aspectos cognitivo e afetivo.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 A perspectiva de Wallon sobre constituição da pessoa
A psicologia genética estuda as origens, isto é, a gênese dos processos psíquicos.
Wallon foi dentre os psicólogos do século XX, um dos que formulou a teoria
psicogenética, assumindo uma perspectiva genética, histórica e dialética sobre o
desenvolvimento, buscando compreender a transformação da criança ao longo do
tempo.
Genética e histórica porque procura explicar o indivíduo pela origem da
atividade biológica e pela história da espécie humana, marcada pelas interações sociais.
Dialética, porque considera a possibilidade do homem conhecer e transformar sua
realidade. Por meio da dialética, “é possível aproximar-se das diversas faces do objeto,
construindo conhecimento em suas condições reais e em suas relações recíprocas”
(ALMEIDA, 1997, p. 24).
De acordo com Zazzo (1978, p.131), muitos acusaram Wallon de organicista
devido os seus estudos com base na neurologia. Ainda para este autor, “o organicismo, é
o orgânico tomado isoladamente que se coloca na origem de todos os fenômenos
próprios de vida e de todos quantos são próprios da sociedade.” Zazzo defende o
materialismo e as concepções neurológicas de Wallon que herdou de sua formação em
medicina e cuja utilização rotulou-o por muitos anos de organicista.
Wallon admite que as funções orgânicas são anteriores ao pensamento. No bebê,
nos seus primeiros meses de vida, suas funções orgânicas estão ligadas ao bem estar ou
mal-estar, como, por exemplo, a saciedade, o sabor do leite da mãe, em que a satisfação
é intensa, fazendo com que as pernas se movimentem. Diferentemente, o mal-estar
como a fome, a cólica e o desconforto postural, expressam-se em espasmos, contorções
e gritos. Com o tempo suas habilidades vão se aperfeiçoando estabelecendo uma
correspondência dinâmica entre seus atos e o meio social. (GALVÃO, 1995)
Para Wallon (1941/2007), a partir do momento que a criança vai se
desenvolvendo com as interações do meio, ela vai passando por etapas as quais
denominou de domínios funcionais que correspondem, portanto, aos da afetividade, do
ato motor, do conhecimento e da pessoa. O conceito de meio para Wallon inclui as
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relações humanas, a dos objetos físicos e dos objetos específicos que estão inseridos na
própria cultura do indivíduo. A partir da interação do meio com domínios funcionais
(afetividade, ato motor, conhecimento e pessoa) realizar-se-ão trocas e adaptação
recíprocas que constituirão a pessoa.
Nessa investigação, ir-se-á estudar a afetividade, pois é nela que as expressões
emotivas mais se desenvolvem.
É importante apontar a diferença que há entre afetividade e emoção de acordo
com a teoria walloniana. A afetividade, como afirmam Almeida e Mahoney (2009, p.
17), “Refere-se à capacidade, à disposição do ser humano ser afetado pelo o mundo
externo e interno por meio de sensações ligadas a tonalidades agradáveis ou
desagradáveis”. Já a emoção, como afirmam essas autoras:
É a exteriorização da afetividade, é sua expressão corporal, motora. Tem um
poder plástico, expressivo e contagioso; é o recurso de ligação entre o
orgânico e o social: estabelece os primeiros laços com o mundo humano e,
através deste, com o mundo físico e cultural. (ALMEIDA; MAHONEY,
2008, p.17).
Para Wallon (1941/2007, p.124), a emoção é o primeiro vínculo que se
estabelece entre os indivíduos, pois permite que: “as relações tornem possíveis e
aguçam seus meios de expressão, fazendo deles instrumentos de sociabilidade cada vez
mais especializados”. Dessa forma, a criança, para Wallon (1945/1989), é
essencialmente emocional e gradualmente vai constituindo-se um ser sócio cognitivo.
Este autor ainda afirma que cada etapa do desenvolvimento está caracterizada
por um conflito que a criança deve resolver na sua relação com o meio social. “Será no
mergulho do organismo em dada cultura, em determinada época, que se desenvolverão
as características de cada estágio” (ALMEIDA; MAHONEY, 2008, p.12). Ainda para
essas autoras, a sequência de estágios proposta por Wallon, é a seguinte: impulsivo
emocional (0 a 1 ano); sensório- motor e projetivo (1 a 3 anos); personalismo (3 a 6
anos); categorial (6 a 11 anos); puberdade e adolescência (11 anos em diante).
O impulsivo emocional vai do nascimento até o primeiro ano de vida,
predominando atividades que visam à exploração do próprio corpo em relação às
sensibilidades internas e externas. O Sensório-motor e Projetivo, é uma fase em que a
inteligência e o mundo externo prevalecem no processo de desenvolvimento cognitivo
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em que o pensamento precisa dos gestos para se exteriorizar. O Personalismo é um
estágio voltado para a construção da pessoa, para o enriquecimento e a construção da
personalidade. A criança vai tomando consciência de si como sujeito social que luta
para se individualizar e se diferenciar a fim de conquistar sua autonomia. De acordo
com Wallon, a criança neste estágio, sente prazer em contradizer e confrontar-se com as
pessoas de seu ambiente pela simples razão de experimentar sua independência. No
Categorial, a criança continua a se desenvolver tanto no plano motor como no plano
afetivo, mas as características do comportamento são determinadas principalmente pelo
o desenvolvimento intelectual. A criança aprende a se conhecer como pessoa
pertencente a diferentes grupos, exercendo papeis e atividades variadas, tomando
consciência de suas possibilidades, adquirindo um conhecimento mais completo de si
mesma. A maturação dos centros nervosos de discriminação e inibição, que tornam
possível uma acomodação perceptiva e mental, e a inibição da vida motora, possibilita
que a criança permaneça concentrada por mais tempo do que no estágio anterior. Na
Puberdade e Adolescência, torna a se voltar para o mundo humano, modificada pelo o
caráter cognitivo da etapa anterior, distinguindo-se do outro pela a diferenciação de
pontos de vista.
O estudo dos estágios de desenvolvimento propostos por Wallon mostra que se
estabelecem de forma interligada e que, no estudo da pessoa total, não se pode
considerar a criança de forma fragmentada, já que ela, para este autor, é um “todo
indissociável e original” (WALLON, 1941/2007, p. 198). O ser humano passa
ativamente por novas experiências que possibilitarão a constituição da pessoa.
No próximo tópico, irá ser estudada a expressão da emoção na sala de aula. A
sala de aula é um espaço privilegiado na educação das crianças, como também um
espaço coletivo adaptado à sua necessidade. Compreender as expressões emotivas
nestes espaços é uma forma de garantir ao professor possíveis reflexões, a fim de que
possam lidar com a emoção do aluno para racionalizá-la. Em outras palavras, um
indivíduo racionalizado é aquele que percebe suas emoções e leva em conta as emoções
na relação com o exterior. É importante o professor lidar com a emoção para
racionalizá-la, tanto no aluno como em si mesmo. (CARRARA, 2004). Desse modo,
contribuirá para aprendizagem do aluno, transformando a sala de aula num ambiente
mais propício para o desenvolvimento da criança.
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2.2 A emoção em sala de aula
Os estudos encontrados nesta pesquisa que tratem a emoção no contexto escolar
à luz da teoria de Henri Wallon foram: (MUNHOZ, 2007; WINTER 2006).
Munhoz (2007) procurou investigar os sentimentos e emoções em relação às
atividades escolares de bons alunos da 8° série (atual 9° ano do Ensino Fundamental II)
de uma escola da rede privada da cidade de São Paulo. O bom aluno na pesquisa do
autor refere-se ao indivíduo que estabelece uma relação satisfatória com professores,
colegas e atividades escolares alcançando bons resultados. Winter (2006) buscou
compreender a emoção em crianças de 02 a 04 anos de idade em situação de brincadeira
espontânea e identificar a emoção no processo de desenvolvimento infantil. Essa
pesquisa foi realizada em uma rede pública de Santa Catarina.
No âmbito da afetividade, foram encontrados muitos estudos no que diz respeito
à teoria de Wallon (e.g. SILVA, 2011; DOURADO, 2010; SEGUNDO, 2007; ULLER,
2006). No estudo de Silva, o autor procurou investigar as concepções dos professores do
6° ano de uma instituição militar acerca da afetividade e a sua influência na prática
pedagógica. Já na pesquisa de Dourado (2011), foi investigada a influência da
afetividade no desenvolvimento infantil e a sua relação com o desenvolvimento
cognitivo e motor, dialogando com Almeida (1999), Galvão (1995) e Morales (2006).
Na investigação de Segundo (2007), foi verificada a influência da afetividade nos
alunos da 8ª série (atual 9º ano do Ensino Fundamental II). E Uller (2006) pesquisou a
influência da afetividade na relação entre aluno/ professor em uma sala de aula do 2°
ano do Ensino Médio.
Embora essas pesquisas tragam contribuições importantes acerca do estudo da
emoção no espaço escolar, algumas lacunas precisam ser contempladas. Na investigação
de Munhoz (2007), só o estudo da emoção do bom aluno fora contemplada. Nesse caso,
percebeu-se a ausência de se tratar as expressões emotivas que ocorrem na sala de aula e
qual seria a atuação do professor para regular as emoções que interferem no processo de
ensino-aprendizagem do aluno. Já na pesquisa de Winter (2006), só as emoções das
crianças entre 2 a 4 anos no que se referem à brincadeira espontânea foram investigadas,
lembrando que as observações do autor não foram realizadas na sala de aula
especificamente, mas no contexto escolar de forma geral.
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Diante desses estudos, sentiu-se a necessidade de investigar a expressividade
emocional do aluno em sala de aula à luz da teoria de Henri Wallon.
Para este autor, a emoção é uma atividade eminentemente social, pois sobrevive
da ação do efeito que causa no outro (GALVÃO 1995). São sempre acompanhadas de
alterações orgânicas, como secura na boca, mudanças no ritmo da respiração, rubor no
rosto entre outras. A teoria psicogenética de Wallon mostra que as emoções estão
interligadas com o tônus. O tônus3 é considerado por Wallon a fonte da emoção, uma
vez que esta é a condição fundamental para a sua manifestação. A emoção é regulada
por ele e ao mesmo tempo a regula. Assim, toda a alteração emocional corresponde uma
alteração tônica. (ALMEIDA; MAHONEY, 2008). Estas autoras também afirmam que
o aumento do tônus ou seu escoamento é conforme o estado emocional que o
acompanha. As autoras explicam que o bebê mantém uma comunicação forte com a
atividade tônico-postural, ou seja, por meio do escoamento do tônus provocado pelos
movimentos e gestos, a criança demonstra alegria. Já movimentos excessivos ou a
acumulação do tônus são sinais de sofrimento ou cólera. Ainda para essas autoras, a
função tônica dá suporte à manifestação da emoção, o que estabelece entre elas uma
relação de profunda complementaridade.
No adulto, as emoções são menos frequentes, bem como as crises emotivas
como: ataques de choro, birras, agressividade, surto de alegria. As emoções aparecem
reduzidas, pois estão subordinadas ao controle das funções psíquicas superiores. Em
crianças maiores, podemos identificar crises de choros sem motivo aparente. Cansada,
por exemplo, a criança mostra-se irritada por qualquer situação, faz birra e até briga.
Passada esta crise, a criança relaxa e fica calma, devido à relação com a atividade de
tônus muscular.
Na sala de aula, as três principais emoções que se expressam por excelência são:
o medo, a alegria e a cólera. Galvão (1995 p. 62) explica esses tipos de emoções:
A cólera, por exemplo, vincula-se a um estado de hipertonia 4, no qual há
excesso de excitação sobre as possibilidades de escoamento. A alegria resulta
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Segundo Wallon (1999 apud Almeida 1959d, p.236), “tônus é aquilo que pode manter os músculos na
forma que o movimento lhes deu, se este chega a interromper-se”. O domínio do tono ‘ não se limita às
vísceras, ao aparelho circulatório, digestório, na sua totalidade, estende-se também, ao sistema muscular.
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Refere-se aos músculos do esqueleto: aqueles que efetuam os deslocamentos dos membros e do corpo
no espaço.
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de um equilíbrio e de uma ação recíproca entre o tônus e o movimento. Na
timidez verifica-se hesitação na execução dos movimentos e incerteza na
postura a adotar, há um estado de hipotonia. Com base nesta relação, resulta
até mesmo uma classificação das emoções segundo o grau de tensão
muscular que se vinculam.
Para Almeida (1999), o medo é demonstrado através de situações novas ou
parcialmente novas para a criança, por exemplo, como responder alguma atividade na
sala de aula. A alegria traz inquietação, caracteriza-se pela liberação do tônus, isto é,
pela hipotonia, também pode trazer entusiasmo ao indivíduo numa realização de
atividades. Esse tipo de emoção, para Almeida, traz menor dano para o intelectual da
criança. Na timidez, há hesitação dos movimentos e incerteza de postura. Um tipo de
emoção geradora de tônus é a ansiedade. E por último, a cólera que, tem o poder de
expor o professor diante da sala de aula, gera desgastes físicos e emocionais, trazendo
efeitos como: gritos, alteração na voz, deixando-o visivelmente vulnerável à emoção.
Para Wallon, (1925/2007) a cólera pode se desenvolver em duas direções
opostas: centrípeta ou projetiva. A cólera centrípeta caracteriza-se pelo domínio da
angústia e está dirigida ao próprio indivíduo. Já a cólera do tipo projetiva, apresenta
reações voltadas para o meio social. Os alunos movidos numa manifestação de cólera
projetiva tem o poder de contagiar o professor, causando-lhe desgastes físicos e
emocionais, trazendo efeitos como contração muscular, gritos, alteração na voz.
Para Almeida (1999), muitos professores por não sabem lidar com várias
situações emotivas em sala de aula, ficam frágeis cognitivamente em situações de
conflito emocional. O professor, ainda, segundo esta autora, deve ser equilibrado
emocionalmente dentro da sala de aula, pois a inteligência, muitas vezes, cede para as
emoções, sendo assim, deve-se manter-se equilíbrio entre a razão e a emoção, de modo
que o emocional não afete no momento de exercer a atividade cognitiva.
De acordo com Galvão (1995, p.114), o professor por possuir habilidades
cognitivas e fisiológicas mais desenvolvidas que as dos alunos, poderia tomar a
iniciativa de encontrar meios para reduzir os efeitos desagregadores da cólera nos
alunos através de
Informações teóricas sobre as características do comportamento emocional e
usando a capacidade de análise reflexiva, o professor deve buscar identificar,
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nos fatores implicados em cada situação, aqueles que agem como
“combustíveis” para o agravamento da crise.
Ainda, para Galvão, se cada docente refletir sobre as situações de conflito que
vive com os seus alunos, é possível que ele consiga identificar algumas dinâmicas que
se repetem e consiga distinguir algumas categorias de conflito.
Wallon (1941/2007) ressalta que um fator que pode levar a proporcionar
situações de conflitos do ponto de vista emocional, é a limitação do espaço de expressão
e movimento e interação da criança. O movimento é extremamente necessário para o
desenvolvimento total desta última. De acordo com Galvão (2003, p.69), “além do
papel na relação com o mundo físico, o movimento tem um papel fundamental na
afetividade e também na cognição”. O educador precisaria, assim, observar e levar em
consideração os estados emocionais dos alunos em sala de aula, pois o excesso ou a
ausência de movimento pode também gerar um estado emocional, seja bom ou ruim.
(ALMEIDA 1999).
Devido ao poder de contágio das emoções, os grupos apresentam maiores
índices para a manifestação das emoções coletivas. Em se tratando de um grupo de
crianças e, especificamente, dentro de uma sala de aula, objeto de estudo desta pesquisa,
“a fertilidade do terreno é maior” (GALVÃO, 1995, p.114).
A emoção possui três características que Wallon (1949/1995), denomina de
plasticidade, contagiosidade e regressividade. A plasticidade é a capacidade a apresentar
no corpo os efeitos mais variados como tremor nas mãos, nos dentes entre outros. A
contagiosidade é a capacidade de contagiar os outros com os seus efeitos. E por último,
a regressividade é a possibilidade que tem a emoção de regredir seus efeitos diante de
uma atividade intelectual. Nos adultos, essas características são menos frequentes em
relação às crianças, pois esses possuem mais recursos para o controle das emoções.
Ainda para esta autora, o professor procurar contagiá-las com a sua racionalidade, que
pode influir decisivamente sobre a redução dos efeitos desagregadores da emoção.
Outro aspecto bastante relevante na teoria psicogeneticamente de Wallon, é a
relação da emoção com o movimento. De acordo com Wallon (1971), os movimentos,
como expressões de natureza afetiva, podem gerar emoções e ser resultado delas.
Portanto, os estudos de Almeida (1999) e Galvão (1995) possibilitam ao
educador compreender as reações emotivas em sala de aula, orientado a criar
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mecanismos pedagógicos que possibilitem regular as emoções dos alunos e que
interfiram no desenvolvimento na constituição da pessoa.
3. METODOLOGIA
Para desenvolver essa pesquisa, foi utilizada a abordagem qualitativa, que
segundo Gil (2002, p.41), tem a finalidade de “proporcionar maior familiaridade com o
problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses”. Ainda para este
autor, a abordagem qualitativa tem como finalidade o “aprimoramento de ideias”. A
escolha da abordagem qualitativa permitiu entender como o professor compreende a
emoção, possibilitando compreender as situações apresentadas pelo participante,
(OLIVEIRA 1999).
Para Yin (1989), a pesquisa qualitativa pode ser conduzida através de estudos de
casos. Duas dimensões são consideradas dentro da perspectiva do autor: estudos de caso
único e estudo de casos múltiplos. O primeiro abrange um tipo de sujeito ou uma
instituição, já o segundo, abrange dois ou mais tipos de sujeitos ou instituições. Nesta
pesquisa, foi realizado o estudo de caso único em uma instituição pública de ensino.
Como diz Triviños (1995), o estudo de caso se analisa profundamente, não pretendendo
o pesquisador intervir sobre a situação, mas conhecê-la como ela surge.
Para tal, foram utilizadas como técnicas de coleta de dados, a observação e a
entrevista. Para Oliveira (2007, p. 31), “a observação é a base da investigação científica,
permitindo o registro dos fenômenos da realidade, para se planejarem e sistematizarem
os dados que serão coletados”. Foram feitas quatro observações na sala de aula da
professora do turno da manhã e quatro observações na sala de aula no turno da tarde,
permitindo perceber as expressões emotivas presentes em sala de aula e como os
professores criam mecanismos para regulá-las a fim de que não interfira na
aprendizagem do aluno.
No que se refere à entrevista, esta é um instrumento de coleta de dados muito
utilizado nas ciências humanas, e se apresenta como uma possibilidade de se apreender
as concepções das pessoas em conexão com o meio e o contexto social em que a
pesquisa se insere (GASKEL, 2002). Dessa forma, possibilita uma interação entre
entrevistador e entrevistado, aplicando questões dentro da temática do estudo. Nessa
investigação, optou-se pela a entrevista na modalidade semiestruturada. Esta
modalidade caracteriza-se por um roteiro com perguntas previamente elaboradas,
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apoiadas em teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa. Assim, o participante,
seguindo espontaneamente a linha de seu pensamento e de suas experiências dentro do
foco colocado pelo investigador, participa na elaboração do conteúdo da pesquisa.
A entrevista foi composta por questões referentes aos dados pessoais (nome,
idade, sexo) e profissionais (formação, especializações, tempo de serviço), bem como
ao tema de interesse desta pesquisa, a saber: a expressão da emoção em sala de aula e a
prática pedagógica no que se refere ao estudo da emoção (ver Apêndice A). Essa
entrevista foi realizada individualmente, em horário previamente acordado com os
professores, no espaço escolar. Todas elas foram gravadas em áudio por meio de MP3 e,
posteriormente, transcritas.
3.1 Contexto de investigação e participantes
A instituição investigada foi uma escola da rede estadual do município de
Jaboatão dos Guararapes, situada no bairro do Curado. Esta consta de 2000 alunos
distribuídos no turno da manhã e tarde do 1º ao 5º ano, e uma turma de Educação de
Jovens e adultos – EJA no turno da noite.
Participaram da pesquisa duas professoras do 4º ano do Ensino Fundamental I,
graduadas em Pedagogia, uma com especialização em educação e a outra em gestão
escolar. Uma das professoras lecionava no turno da manhã e a outra no turno da tarde.
A quantidade de alunos, no turno da manhã, era de 34, na faixa etária entre 9 a 11 anos,
enquanto que no turno da tarde, a faixa etária era entre 10 a 13 anos, e o grupo era
constituído de 40 alunos. Ambas as professoras já haviam ensinado, no momento que
foi desenvolvido este estudo, em outras turmas do 4º ano, em outras instituições
públicas e privadas.
4. ANÁLISE DOS RESULTADOS
Os dados coletados nesta pesquisa foram analisados qualitivamente. Deste
modo, foi utilizada a análise de conteúdo que, Segundo Bardin (2009), é um conjunto de
técnicas de análise das comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivo
de descrição de conteúdo das mensagens. Neste sentido, o investigador tenta construir
um conhecimento, analisando o “discurso” à disposição e os termos utilizados pelo
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locutor. Além da fonte de informação advinda da entrevista, nesta pesquisa, também
foram consideradas as informações das observações feitas em sala de aula, visto que o
estudo de caso sugere o aprofundamento do fenômeno abordado a partir do cruzamento
dos dados obtidos de diferentes fontes.
Para Bardin (1997), existem três etapas básicas no trabalho com análise de dados
qualitativos: pré-análise, descrição analítica e interpretação inferencial. A primeira fase
do método de análise de conteúdo é a organização do que vai ser analisado: exploração
do material por meio de várias leituras, entrevista semiestruturada ou questionário e
observação. A descrição analítica, a segunda fase da análise de conteúdo, começa na
primeira fase, mas nesta segunda etapa, o material terá um estudo aprofundado,
orientando-se pelos procedimentos como a codificação, classificação e a categorização.
Na última fase, trabalham-se os dados brutos, permitindo destaque para as informações
obtidas, as quais serão interpretadas com embasamento nos materiais empíricos.
Para interpretação dos dados desta pesquisa foi adotado os seguintes
procedimentos: (i) transcrição de cada entrevista, colocando ênfase no conteúdo “das
mensagens”; (ii) construção de um quadro com as falas das professoras a fim de
responder os objetivos da pesquisa; (iii) descrição sobre os conceitos e as práticas dos
entrevistados sobre a emoção à luz dos autores do “Referencial Teórico” desta pesquisa;
(iiii) relato das informações observadas; (iv) relação entre os dados obtidos na entrevista
e nas observações.
Após os procedimentos já mencionados, foram elaboradas duas temáticas de
análise, a saber: (1) O que as professoras compreendem como emoção, (2) A expressão
emocional do aluno e a intervenção pedagógica das professoras.
4.1 O que as professoras compreendem como emoção
As entrevistadas que participaram deste estudo discorreram sobre suas
experiências no estudo da emoção, ressaltando que durante as suas trajetórias
acadêmicas, tiveram pouco contato com autores que se debruçassem sobre a expressão
desse fenômeno em sala de aula.
Em contrapartida, percebe-se que as participantes P1 e P25 compreendem a
emoção de forma diferenciada:
5
Para resguardar a identidade das participantes, foram utilizadas as siglas P1 e P2, aleatoriamente, para as
participantes.
15
“A emoção boa é: a bondade, a escuta. Ela vai te ajudar muito. A ruim
(agressividade) só vai atrapalhar tudo! Um indivíduo agressivo demais, ele
quase não aprende nada! Porque não ouve ninguém. E a gente precisa ouvir
né para aprender também. Da mesma forma, eu compreendo que a alegria
exagerada, dificulta também a concentração como também a dos colegas”.
“Eu entendo a emoção como uma reação. É algo que acontece no momento,
vai depender muito da situação.”. (P2)
Para a primeira entrevistada, a emoção pode ser de forma positiva e negativa. A
primeira é a bondade e a escuta, que para a entrevistada irá contribuir para o indivíduo.
Já a segunda, é a agressividade que é considerada ruim, pois um indivíduo agressivo
torna-se impossibilitado de ouvir as pessoas e isso consequentemente implica no
momento de sua aprendizagem.
Percebe-se na fala de P1 que sentimento e emoção são considerados conceitos
sinônimos. De acordo com a teoria de Wallon, a bondade caracteriza-se por sentimento
devido ser uma reação mais pensada, e por conseguinte, mais duradouro. Quando o
sujeito tem esse sentimento, que é visto para a entrevistada como algo “bom” e positivo
para aprendizagem, passa ouvir melhor as pessoas e interagir de forma mais positiva.
P1 reconhece que mesmo emoções “boas” como alegria, quando em excesso,
compromete a aprendizagem do sujeito afetado, como também a dos colegas. Isto
porque uma “alegria exagerada” dificultada à concentração. Dessa forma, P1 mostra
com clareza que a emoção deve ser considerada no processo ensino e aprendizagem.
Uma das características da emoção é o seu poder de contágio. Quando a criança está
bastante alegre, pode contagiar as demais com a sua alegria. Se esta emoção apresentarse de forma excessiva, terá implicações diretas na aprendizagem porque quando o
indivíduo é tomado pelo fenômeno emocional, não consegue agir de forma racional,
portanto, há uma diminuição da atividade cognitiva que, pelo fenômeno do contágio,
pode apresentar-se na turma como um todo. Neste caso, P1 percebe a necessidade do
equilíbrio entre a emoção e a razão.
Analisando ainda a fala de P1, na tentativa de exemplificar uma emoção ruim, a
mesma passa a declarar agressividade como emoção. Como a agressividade não é bem
vista na sociedade, nem pelos educadores que convivem diariamente com alunos de
comportamento agressivo, isto pode ter levado a entrevistada a afirmar que a
agressividade é uma emoção ruim. Agressividade é a ação de agredir, ofender, insultar
16
e, em alguns casos, causar lesões físicas. Há fatores externos como os de origem
socioeconômico e familiar, que desencadeiam comportamentos agressivos no aluno,
como, por exemplo, bater no colega. Neste caso, não se pode afirmar que todo
comportamento agressivo é de origem emocional, embora, em alguns casos, perceba-se
a relação da emoção com agressividade. Quando a criança está envolta da emoção da
raiva, pode agir agressivamente: bater no colega, agredir verbalmente a professora,
podendo até mesmo lançar golpes contra si mesmo.
Analisando a fala de P2, a emoção é vista como uma reação que acontece de
acordo com a situação. O conjunto de circunstâncias do meio externo pode propiciar o
desencadeamento de uma emoção Wallon (1941/2007).
Com relação à expressividade emocional do aluno em sala de aula, ambas as
entrevistadas conseguem percebê-las:
“Percebo em alguns momentos em que os meus alunos vão reagir
emocionalmente ou estão em alguma crise emocional, e, principalmente na
raiva, a mudanças na respiração, no rosto, na fala. O corpo já fala primeiro.”
(P1).
“E fácil a gente perceber quando o aluno reagirá emocionalmente, os
olhinhos deles logo mudam a voz, o corpo. Acho que isso de certa forma, é
um grande aviso para nós educadores”. (P2)
Diante de uma manifestação emocional da raiva, P1 identifica algumas
expressividades emocionais como: mudanças na respiração, rosto e no tom de voz. Já
para P2 as expressões da emoção pode ser percebida na “mudança dos olhos”, na voz e
na postura corporal. As expressividades emocionais citadas por P1 diante da emoção da
raiva não convém afirmar que elas só manifestam nesta emoção. Em outra emoção esses
efeitos também podem ser visíveis.
De acordo com P2, a expressão da emoção por parte do aluno, é um aviso para o
professor e, desta forma, quando bem interpretadas em sala de aula, pode assumir a
função de indicar a adequação ou a inadequação de uma atividade.
Relacionado ainda com a prática pedagógica, no próximo tópico serão analisadas
as intervenções das entrevistadas frente à expressão emocional dos alunos.
4.2 Expressão emocional do aluno e a intervenção pedagógica
17
A entrevista P1 declara que é importante o professor saber intervir diante de uma
manifestação da emoção. Já para P2, há situações que podem ocorrer em sala de aula,
deixando o professor sem saber como intervir:
“Agressividade é uma expressão emotiva que sempre esteve presente em
meus alunos do 4º ano. Às vezes, o aluno fica naquela, não quer fazer a
tarefa, às vezes, que chutar a cadeira, faz birra descontando a insatisfação,
mas, depois se acalma. Eu chego e vou conversar com ele, faço que nem a
Pedagogia do Oprimido6 a gente tem que ouvir o aluno, não podemos entrar
num jogo emocional.” (P1).
Embora P1 aponte o comportamento da agressividade como uma expressão de
ordem emocional, ela tem clareza em demonstrar que a emoção é uma manifestação
passageira. E desta forma, ela utiliza estratégias para regular essa manifestação
emocional no aluno. Primeiro, ela observa essas reações, que no caso, foi “chutar a
cadeira” e fazer “birra”; em seguida, ela aproxima-se do aluno, comparando isso à
“pedagogia do oprimido”, com o intuito de ouvi-lo e ajudá-lo. Ele observa que depois
dessas intervenções, os efeitos da emoção no aluno logo cessam, confirmando assim a
necessidade da intervenção do professor.
Quando o professor age de maneira racional diante de uma manifestação
emocional, ele permite “bloquear” os efeitos de uma emoção. P1 cita exemplos de
atitudes que podem está relacionada à emoção, como, por exemplo, a do aluno “chutar a
cadeira”, “fazer birra”. Essas ações embora não sendo exclusivamente de manifestações
emocionais, podem estar relacionadas a uma emoção. Para P1, é importante o professor
não entrar “no jogo emocional”. Essa expressão utilizada pela professora remete ao que
Almeida (1999) chama de “circuito perverso”. Este circuito acontece quando o
professor se vê envolvido com a emoção do aluno. Ao agir com razão, consegue exercer
influência na emoção do aluno como também em si mesmo, minimizando os efeitos
desta última.
Para P2, há situações que podem ocorrer em sala de aula, deixando o professor
sem saber como intervir:
6
Obra do educador e filósofo Paulo Freire. O livro propõe uma pedagogia com uma nova forma de
relacionamento entre professor, estudante e sociedade.
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“Leciono no 4º ano por muitos anos, percebo que nessas séries os alunos são
agressivos uns com os outros, isso é um problema muito difícil em sala de
aula para o professor resolver, as situações de agressividade que ele
(professor) não sabe como resolver.” (P2).
Ainda para P2, quando está diante de uma expressividade emocional do aluno
em sala de aula tenta controlar essa expressividade, a fim de que os seus efeitos não
venham a contagiar a sala de aula:
“Eu tento controlar a expressividade do aluno em sala de aula. Como eles
são muito eufóricos e não param, às vezes, eu perco muito tempo reclamando
com os alunos dizendo: gente, faça silêncio! Comportem-se! Eu tento
conscientizá-los dizendo: tá vendo como perco tempo reclamando com vocês
o tempo todo? Se a sala fizesse silêncio, comportasse, a gente iria estudar
muito mais os assuntos”. (P2).
A expressividade emocional relatada pela professora é a de euforia. Esta
expressividade está relacionada com a emoção de alegria. O aluno excessivamente
alegre tem a sensação de bem-estar e se expressa com exaltação, ou seja, com euforia
Galvão (1995). Para P2, quando essa expressividade apresenta-se em excesso, ela
chama atenção dos alunos: “gente, faça silêncio!”, “comportem-se!”. Em seguida, tenta
levar os alunos para uma atividade de conscientização, ou seja, levando a turma a
refletir sobre o fato que existem momentos que devem ser estabelecidos para o estudo
de conteúdos e eles precisam está concentrados. Caso contrário, levará mais tempo para
a aprendizagem. Outra questão que a professora ressalta, é que isto também implica na
quantidade de conteúdos a serem discutidos., ou seja, a euforia dos alunos, permite que
poucos conteúdos sejam dados em sala de aula.
Essa mesma expressividade, também é algo ressaltado na fala da outra
professora. Ambas reconhecem a necessidade do “controle” nessas situações. Porém, P2
revela que a euforia manifestada pelos alunos, é mais expressiva após o recreio:
“Principalmente isso acontece (euforia) na hora do recreio, eles voltam
bastante eufóricos, eu acredito que nessa situação, precisa ter controle na sala
de aula por parte do professor se não fica difícil se trabalhar.”
O recreio é momento em que as crianças se movimentam com intensidade, por
consequência disso, exercitam a atividade muscular provocando alegria e bem-estar,
que, por sua vez, é expressa no indivíduo pela euforia. Percebe-se na fala da
19
entrevistada, que essa expressividade de euforia apresentada pelos alunos é devida a sua
relação com o movimento. Isso porque antes de agir com o meio físico, o movimento
atua no meio humano, mobilizando as pessoas por meio de seu teor expressivo
(GALVÃO 1995). Dessa forma, a educadora confirma a necessidade de intervir para
controlar essa expressividade, acreditando que alunos bastante eufóricos deixam o
trabalho do professor muito difícil.
Analisando a intervenção de P2, foi constatado durante as observações que um
aluno de 13 anos, considerado “agressivo”, não fez o exercício, portanto, a professora
riscou o seu caderno. Então, o aluno jogou o caderno no chão e afirmou que não faria
mais nada em sala de aula, mostrando reações de irritabilidade, chegando a agredi-la
verbalmente. P2 dirigiu-se ao aluno e perguntou: “Por que você se comportou dessa
forma? Será que devemos tratar assim as pessoas”? Após este diálogo, o aluno começou
a mostrar sinais de carinho. A professora aproveitou o momento e fez um “contrato
pedagógico com a turma”, afirmando a necessidade do companheirismo e do respeito:
“Se eu não gosto de algo, é certo eu fazê-lo com as pessoas?”
Percebe-se, mais uma vez, na intervenção da educadora, medidas para
“bloquear” os efeitos da emoção. Embora sendo agredida verbalmente, a professora
soube conter a manifestação emocional do aluno, fazendo-lhe agir racionalmente diante
dessa situação. A introdução de medidas concretas que visa possibilitar maior
autonomia e responsabilidade à criança, visa diluir a oposição e facilitar a convivência
nos momentos de crise emocional. (GALVÃO, 1995).
5. Considerações Finais
Buscou-se por meio deste estudo, compreender como os professores de uma
dada instituição previamente escolhida pela pesquisadora entendem a emoção e como
acontecem as intervenções pedagógicas diante da expressividade emocional do aluno.
Foi constatado que as professoras compreendem o conceito de emoção. Embora,
em alguns momentos, foi percebida a confusão entre os conceitos de emoção e
sentimento. Os resultados demonstram, ainda, que, as participantes consideram a
emoção no processo de ensino e aprendizagem, reconhecendo aspectos positivos e
negativos deste fenômeno, apesar de que essa identificação foi feita tomando como
referência o sentimento e não a emoção. Reconhecem que a emoção influencia na
20
aprendizagem e, por isso, afirmam a necessidade do professor administrar conflitos de
ordem emocional. Estes dados confirmam com as autoras (GALVÃO, 1995;
ALMEIDA, 1999) e com o estudos de (MUNHOZ, 2OO7; WINTER 2006).
Em relação às estratégias utilizadas pelas participantes, foi verificado que as
ambas procuram observar a emoção e, em seguida, através do diálogo, procuram agir
racionalmente diante de uma manifestação emocional do aluno, a fim de reduzir os seus
efeitos. Neste caso, este estudo avança em relação aos de Munhoz (2007) e de Winter
(2006) que não buscaram compreender a intervenção do professor para regular a
expressividade da emoção por parte do aluno, em sala de aula.
Foi verificado que as professoras entrevistadas, ressaltam a ausência de uma
formação continuada que trate do fenômeno da emoção em sala de aula, a fim de
possibilitar ao professor possíveis reflexões pedagógicas diante dessa temática. Os
dados deste estudo, por sua vez, permitem concluir que quanto maior a clareza do
professor a respeito da emoção, identificando os fatores que levam a uma situação de
conflito, mais soluções ele irá dispor para minimizar os efeitos da emoção.
Neste estudo, foi possível investigar a intervenção das professoras diante de
expressões emotivas dos alunos em sala de aula. No entanto, não foi possível a
investigação se debruçar na capacidade de o movimento expressar emoções e, desta
forma, investigar a maneira como as professoras lidam com elas. Ressalta-se, portanto,
a necessidade de estudos que venham a dar continuidade à temática emoção relacionada
ao movimento.
Foi percebido durante as observações, o movimento associado à agitação e
tumulto, dessa forma, as professoras demonstraram uma grande preocupação em excluir
o aspecto motor. Não consideravam o movimento como expressões da natureza afetiva
que podem gerar emoções (WALLON, 1949/1995). Foram percebidas situações em que
se movimentar é de fato incompatível com a atividade acadêmica; no entanto, as
professoras não consideravam o movimento como forma de revelar uma determinada
emoção.
Espera-se que a presente pesquisa, traga contribuições para reflexões de
professores e impulsione transformação em suas práticas, reconhecendo a importância
de se considerar o estudo da emoção. E desta forma, contribuir para o desenvolvimento
21
do educando, tornando-se um arguto intérprete de expressões emotivas para planejar sua
ação pedagógica.
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Psicologia da educação), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
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teses. 3. Ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
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23
YIN, R. K. Case study research: design and methods. London: SagePublications,
1989.
APÊNDICE A. Roteiro de entrevista para as professoras
(A) IDENTIFICAÇÃO DOS SUJEITOS
Qual a sua formação?
De que maneira tem ocorrido a sua formação continuada?
Há quanto tempo você atua nesta escola?
Há quanto tempo você trabalha com o 4º ano do Ensino Fundamental I
(somadas experiências atuais e anteriores)?
(B) QUESTÕES SOBRE O FENÔMENO DA EMOÇÃO
Ao longo de sua atuação docente, como tem percebido a expressividade
emocional dos alunos em sala de aula?
No seu dia a dia na sala de aula do 4º ano, quais as manifestações
emocionais mais presentes?
Você poderia relatar uma experiência de uma situação emocional em sala de
aula? Como você reagiu a essa situação?
O que você entende por emoção?
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Expressões emotivas em sala de aula: como as professoras lidam