SALA DE AULA: UM ESPAÇO DEMOCRATICO?
GT 4 – PRÁTICAS INVESTIGATIVAS
Maria Cleonice Nunes de Andrade*
Joaquim Cardoso da Silva Neto**
Carlos Alberto Príncipe***
RESUMO
Este artigo tem como objetivo identificar até que ponto as relações interpessoais entre
professor/aluno favorecem na construção de um espaço democrático na sala de aula.
Esta pesquisa de campo partiu da caracterização das práticas cotidianas da sala de aula
de uma escola integrante do sistema “S” de ensino. As observações se deram a partir de
observações diretas e registros contínuos, e teve o objetivo de analisar as interações
professor-aluno a partir dos registros e das observações e por fim, contribuir na
discussão da sala de aula na perspectiva formativa e emancipadora.
PALAVRAS-CHAVE: Educação. Escola. Cidadania.
ABSTRACT
This article aims to identify the extent to which the interpersonal relationships between
teachers and students in favor of building a democratic space in the classroom. This
field research was based on the characterization of the everyday practices of the
classroom of a school system member "S" of education. The observations made
themselves from direct observations and continuous records, and aimed to analyze the
teacher-student interactions from the records and observations and finally contribute to
the discussion in the classroom formative and emancipatory perspective.
KEYWORD: Education. School. Citizenship.
* Especialista em Metodologias de Ensino para Educação Básica/UFS e Licenciada em Letras
Português/UNIT. Graduanda do Curso de Pedagogia da Universidade Tiradentes; Membro dos Grupos de
Pesquisa GPGFOP/Unit; e-mail: [email protected]
** Mestrando em Letras/UFS, Especialista em Metodologias de Ensino para Educação Básica/UFS e
Licenciado em Letras Português/AGES; e-mail: [email protected]
**Graduando do Curso Administração da Universidade Tiradentes; e-mail: [email protected]
INTRODUÇÃO
A formação do cidadão no âmbito escolar é tema de debate nas diversas
discussões entre representantes sociais. É através da educação que o homem pode
constituir-se como sujeito autônomo e criativo, sendo capaz de exercer seus direitos e
cumprir os seus deveres sociais de forma consciente.
Sendo assim, espera-se que a escola, segundo espaço oficial onde a criança
inicia efetivamente a sua vida social, seja constituída de práticas e conceitos
democráticos. Desta forma, as práticas escolares que reduzir-se a práticas reprodutoras,
que se dão através de simples exercícios, transmissão de conteúdos, e pouco contribuem
para a emancipação do sujeito sejam substituídas novas metodologias de ensino, em um
espaço democrático, com a realização de práticas construtivas em que o aluno possa
expressar-se e exercer um poder de autotransformação.
Sendo assim, é importante refletir sobre o conceito de educação na visão de
Paro (2010). Segundo este autor o termo educação pode ser entendido de duas formas
distintas, a primeira sob o olhar do senso comum, corresponde ao conjunto de normas e
padrões que a escola e/ou a família passa aos alunos e filhos. A família tem a tarefa de
formação moral e a práticas de bons costumes, já a escola se encarrega de passar os
conhecimentos específicos das disciplinas teóricas das ciências em geral. Nos dois
espaços o conhecimento se dar de forma hierárquica, ou seja, quem sabe ensina a quem
não sabe.
A segunda concepção pode ser entendida de forma mais ampla e
corresponde à forma cientifica de ver a educação. Esta consiste na apropriação da
cultura em sua plenitude. O autor define cultura como tudo que é produzido pelo
homem, como valores, crenças, ciências, artes, tecnologia etc.
É a partir do segundo conceito que essa pesquisa deve trilhar. Uma visão
ampla de educação, que tenha o objetivo de formar o homem em sua integridade e não
apenas indivíduos condicionados a responder testes e exercícios com questões objetivas.
Com isso, é importante assumir cada vez mais a cultura de que a educação se constrói
das vivencias escolares, do contato com o outro, considerando-lhe como ser social e
participativo.
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Nesse sentido, esta pesquisa tem como objetivo: identificar até que ponto as
relações interpessoais entre professor/aluno favorecem na construção de um espaço
democrático na sala de aula. Para isso, faz-se necessário caracterizar as práticas
cotidianas da sala de aula a partir observações diretas e registros contínuos, analisar as
interações professor-aluno a partir dos registros e das observações e por fim, contribuir
na discussão da sala de aula na perspectiva formativa e emancipadora.
A pesquisa tem como temática sala de aula: um espaço democrático? A
escolha do tema se deu através da preocupação em refletir sobre a importância de um
espaço democrático na construção do conhecimento. Sendo assim foi escolhido como
objeto de estudo as práticas escolares desenvolvidas em uma escola integrante do
sistema “S” de ensino.
UMA ESCOLA DEMOCRÁTICA
Para que a educação cumpra o papel de constituir o homem em sua
integridade, transformando-o em cidadãos autônomos e conscientes é preciso
transformar a escola em um ambiente democrático, onde a participação dos sujeitos
envolvidos no processo de ensino/aprendizagem seja cada vez mais igualitária e notória.
Vejo a necessidade de a escola organizar-se democraticamente com
vistas a objetivos transformadores[...] e aqui subjaz, portanto, o
suposto de que a escola só poderá desempenhar um papel
transformador se estiver junto com os interessados, se se organizar
para atender aos interesses das camadas às quais essa transformação
favorece, ou seja, das camadas trabalhadoras (PARO, 2000, p. 12)
É necessário pensar em transformações para a escola existente na sociedade
atual, o ambiente escolar precisam ser transformados em lugares capaz de contribuir,
através dos seus conteúdo e práticas, para que os seus alunos possam apropria-se de um
saber historicamente acumulado, e assim desenvolver uma consciência critica diante das
transformações sociais (PARO, 2000).
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Sendo assim, pensar em uma escola democrática é refletir práticas baseadas
em princípios democráticos, que priorize a participação, dando direitos iguais para
estudantes, professores e funcionários. Um espaço de ensino onde seja possível ouvir a
voz de toda comunidade escolar, e principalmente dos alunos, atores centrais do
processo educacional, de modo a engajar-lhes de forma direta nas atividades escolares.
Pensar a educação como prática democrática é desprezar a concepção do
senso comum ora citada por Vitor Paro, aquela que diz respeito à simples transmissão
de conhecimento do professor, único detentor do saber, para o aluno, receptor passivo,
e apropria-se de novas práticas pedagógicas. Privilegiando o envolvimento do educador
no processo de apropriação da cultura. No entanto, se de acordo com a concepção
tradicional de ensino, é possível que haja sucesso no aprendizado realizado de forma
mecânica, ocultando a participação ativa do educando no processo, estudos mostram no
âmbito da educação nos mostram o contrário, pois o profissional que defende tais
práticas acaba praticando uma “pedagogia estéril”. Completa Vigotski (apud PARO,
2010)
O professor que envereda por esse caminho costuma não conseguir
senão uma assimilação vazia de palavras, um verbalismo puro e
simples que estimula e imita a existência dos respectivos conceitos na
criança mas, na prática, esconde o vazio. Em tais casos, a criança não
assimila o conceito mas a palavra, capta mais de memória que de
pensamento e sente-se importante diante de qualquer tentativa de
emprego consciente do conhecimento assimilado. No fundo, esse
método de ensino de conceitos é a falha principalmente do rejeitado
método puramente escolástico de ensino, que substitui apreensão do
conhecimento vivo pela apreensão de esquemas verbais mortos e
vazios. (VIGOSTSKI, 2001:247 apud PARO, 2010, p. 49)
Diante disso, é preciso que se pense cada vez mais em uma educação
pautada na participação continua e ativa do sujeito, pois para um ambiente escolar se
tornar cooperativo, todas as práticas tradicionais de educação precisam ser revistas. A
escola precisa de um novo paradigma, onde o professor abandone velhas práticas,
muitas vezes, invalidas e aproprie-se de novas concepções de construir conhecimento de
forma democrática.
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RELAÇÕES INTERPESSOAIS NA ESCOLA
Diante das mudanças ocorridas no cenário social nos últimos anos, é importante
refletir sobre o papel da escola no tocante a tentativa educar de modo a atender às
demandas da sociedade.
Levando em consideração que a educação tem o objetivo de acompanhar as
mudanças sociais e preparar os educandos para lidar com essas mudanças, é de suma
importância que a escola, espaço social de construção de conhecimento, abandone
práticas instáveis e se posicione de forma diferenciada em relação aos a sua clientela.
Aproveitar as interações oriundas das relações com o meio social do aluno para a
construção de conhecimento, ou seja, trabalhar a partir das relações interpessoais é
envolver o sujeito no seu processo de ensino/aprendizagem e assim, fazer com que o
espaço escolar seja além de um ambiente que prepara para a cidadania, um lugar onde
se efetiva a cidadania de forma prática e cotidiana. Pois segundo (ALARCÃO,2001) é
na escola que “se tem que viver a cidadania, na compreensão da realidade, no exercício
da liberdade, na responsabilidade, na atenção e no interesse pelo outro, no respeito pela
diversidade[...]”. Assim, é importante assumir cada vez mais a cultura de que a
educação se constrói das vivencias escolares, do contato com o outro, considerando-lhe
como ser social.
Considerar o homem um ser político, construtor de história implica pensar esse
homem vivendo socialmente, tomando decisões conjuntas, para efetivar a sua
historicidade e agir politicamente o homem precisa estar inserido no meio social, pois
segundo (PARO, 2002), o homem não pode realizar história sozinho, de forma isolada,
para que ele se constitua sujeito é necessária a convivência com outros seres humanos.
A convivência humana em grupo segundo (PARO, 2010) pode se dá de duas
formas distintas. A primeira quando a dominação acontece, seja por parte de um grupo
ou de uma pessoa, com o objetivo de anular o conhecimento da outra parte, tratando o
outro (os) como objetos. A segunda acontece a partir do diálogo, tendo em vista a troca
de informações, em um intercâmbio de interesse e vontades, com base na negociação
mútua, respeitando as vontades e interesses das partes envolvidas. No ambiente onde o
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último caso acontece os envolvidos mantêm uma convivência pacifica e harmoniosa, e
de forma democrática se afirmam como sujeitos.
Sendo assim, para o processo de ensino/aprendizagem acontecer de modo
eficaz é necessário ter uma concepção diferenciada de educação, dispensando o senso
comum – que consiste em o aluno ir a escola receber informações de professores, nesse
caso, o detentor do saber, de forma mecânica e em seguida responder a testes
avaliativos. E pensar em educação no sentido mais amplo – que consiste em atividades
democráticas tendo o desenvolvimento humano coletivo a principal referência.
Segundo Garden (apud ARMSTRONG, 2001) o desenvolvimento do
potencial humano é ampliado quando o individuo é exposto à ambientes estimulantes,
desenvolvendo atividades reais em contato com outros.
Ele questionou seriamente a validade de se determinar a inteligência
de um indivíduo tirando-se este individuo do seu meio ambiente
natural e pedindo-lhe para fazer tarefas isoladas que jamais fez antes
[...]. Em vez disso, Garden sugere que a inteligência tem mais a ver
com a capacidade de (1) resolver problemas e (2) criar produtos em
ambiente com contextos ricos e naturais. (ARMSTRONG 2001, p.13)
Dentre as oito inteligências múltiplas desenvolvidas com Ganden está
inteligência interpessoal, e diz respeito à:
capacidade de perceber e fazer distinção no humor, intenção,
motivação, sentimentos das outras pessoas. Isso pode incluir
sensibilidade a expressão facial, voz e gestos; a capacidade de
discriminar muitos tipos de sinais interpessoais; e a capacidade de
responder efetivamente a estes sinais de uma maneira pragmática (por
exemplo, influenciar um grupo de pessoas para que sigam certa linha
de ação) (ARMSTRONG 2001, p.14)
Sendo assim, é de suma importância estabelecer relações interpessoais no
ambiente escolar, pois à medida que essas capacidades de comunicação são
estabelecidas entre os sujeitos envolvidos no processo de ensino/ aprendizagem, a
educação deixa de ter um caráter tradicional, com práticas conservadoras e passa a
cumprir o papel de mediadora da emancipação do sujeito.
As atividades valorizem as relações interpessoais pode se estender ao
espaço da sala de aula e se estender ao pátio da escola, onde todos podem socializar um
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trabalho desenvolvido em equipe na sala de aula, ou uma visita a biblioteca, ou até
mesmo uma conversa com a equipe de gestão da escola.
Dessa forma, os sujeitos estarão construindo conhecimento a partir de
vivencias, tornado-se líderes, senti-se responsável no seu próprio processo de
aprendizagem.
METODOLOGIA E ANÁLISE DE RESULTADOS
Para que fosse possível diagnosticar a existência ou ausência de um
espaço democrático em sala fez-se necessário levar a caracterização das práticas
escolares das salas de aula da escola SESC do município de Socorro/SE. As
observações foram realizadas em duas turmas diferentes, uma classe de 2º ano do ensino
fundamental e a outra do 3º ano, também do ensino fundamental. A caracterização se
deu a partir de observações diretas e registros contínuos.
Na primeira turma, a professora tenta fugir das práticas tradicionais
organizando a sala e realizando tarefas que, segundo ela são “diferentes”. As carteiras
ora são organizadas em forma de círculo, ora em pequenos grupos de no máximo 4
alunos. A leitura coletiva é realizada com frequência e os trabalhos e desenhos
confeccionados pelos alunos, são expostos nas paredes da sala. As tarefas de casa são
escritas todos os dias na lousa, pela professora e reproduzida pelos alunos na agenda. A
educadora mantém um diálogo constante com os educandos. As aulas são realizadas de
forma expositiva, a professora fala sobre o assunto e os alunos ouvem atentamente. No
decorrer das explicações a professora abre espaço para discussões, mas nem sempre os
debates acontecem e as crianças se mantêm em silêncio até o final da explicação.
Na segunda turma observada, a professora se mostrou muito passiva e os
alunos extremamente agitados. As carteiras são organizadas sempre em fileiras, os
alunos têm muita dificuldade em se manter sentados. As aulas são realizadas de maneira
expositiva, a professora expõe o assunto na lousa e os alunos escrevem no caderno, em
seguida a professora explica o que foi exposto no quadro e os educandos, na medida do
possível, ouvem a educadora. Quase sempre, no momento da explicação da professora
os alunos estão conversando e ela pedindo silêncio.
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A partir das observações realizadas nas salas de aula foi possível perceber
que, tanto em na primeira turma observada, como na segunda, a existência de práticas
que propicie um espaço democrático é invisível.
Apesar de na primeira classe a professora conduzir a turma de forma
tranquila e organizada e estabelecer conversas com a turma, foi possível perceber que a
inexistência de interação entre os sujeitos envolvidos no processo de aprendizagem,
apenas entre professora e a turma. Sendo assim, não foi possível perceber a troca de
informação entre os alunos, requisito importante para emancipação do sujeito.
Na segunda turma a ausência de disciplina dos alunos dificulta o processo
de ensino/aprendizagem, pois a professora sequer consegue realizar o trabalho
educativo e passa a maioria do tempo das aulas pedindo atenção e reclamando. No
ambiente descrito torna-se difícil a construção do conhecimento, pois as práticas dos
integrantes se dão de forma aleatória. As relações interpessoais não são aproveitadas de
modo a promover o conhecimento coletivo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A valorização das relações interpessoais entre os sujeitos envolvidos no
processo de ensino/aprendizagem no âmbito escolar contribui cada vez mais para a
construção de um espaço democrático onde os alunos, através da educação, possam
apropriar-se da cultura, exercer a cidadania e constituir-se sujeitos.
Desta forma, refletir sobre as práticas escolares em sala de aula é adquirir
uma postura diferenciada em frente a práticas reprodutoras, que se dão através aulas
expositivas, em que muitas vezes, apenas a transmissão de conteúdos é suficiente.
Através do estudo realizado neste artigo foi possível perceber que criar um
espaço democrático na sala de aula, de modo a possibilitar que os sujeitos se
posicionem de forma ativa e participativa no processo educacional, remete a refletir
sobre as mudanças nas metodologias de ensino atuais, a valorização das relações
subjetivas entre os envolvidos no processo de ensino/aprendizagem.
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Com isso, evidencia-se que é preciso refletir a questão das relações
interpessoais para o sucesso do aprendizado. O marco teórico informa e nos direciona a
reflexão sobre a necessidade de socialização do indivíduo em ambientes ricos e
produtivos, para o desenvolvimento das capacidades em resolver problemas e situações
diversas.
À medida em que o trabalho educativo esteja voltado também para a
construção de valores educativos e morais de cidadãos e cidadãs independentes, que
buscam de maneira consciente e honrada, a felicidade e o bem-estar pessoal e coletivo o
homem estará efetivando-se como cidadão. Assim, a educação assumirá o papel de (re)
formadora do homem em sua integridade, ao mesmo tempo contribuir para a sua
participação na sociedade de forma participativa e consciente.
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REFERÊNCIAS
Buffa, Ester, Miguel G. Arroyo, Paolo Nosella. Educação e Cidadania. São Paulo.
Cortez, 2001.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. São Paulo: Brasiliense,
ColeçãoPrimeiros Passos, 28o ed., 1993.
Escola
Reflexiva
e
Nova
Racionalidade
disponível
http://www.scielo.oces.mctes.pt/scielo.php?pid=S087191872006000200004&script=sci_arttext>. Aceso em 01Jun. 2011.
em
>
PARO, Vitor Henrique. Gestão Democrática na Escola Pública. São Paulo: Ática,
2000.
PARO, Vitor Henrique. educação como exercício do poder: crítica ao senso comum
em educação. São Paulo: Cortez, 2010.
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