Conteúdo 1 Preliminares 5 1.1 Polinómios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 1.2 Extensões de Corpos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 1.3 Teoria de Galois . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 25 2 Sn como grupo de Galois 2.1 Preliminares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 2.2 Elementos algebricamente independentes sobre Q . . . . . . . 26 2.3 Polinómios cujo grupo de Galois é Sn . . . . . . . . . . . . . . 30 3 Números Construtíveis 35 3.1 Preliminares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 3.2 Extensões quadráticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 4 Polinómios com raízes não exprimíveis por radicais 45 4.1 Extensões por radicais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 4.2 Polinómios sem zeros exprimíveis por radicais . . . . . . . . . 54 5 Problema Inverso de Galois 59 5.1 Extensões das Séries Formais de Laurent . . . . . . . . . . . . 60 5.2 Extensões de K(x) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70 3 4 CONTEÚDO CONTEÚDO 1 Em 1830, Galois associa um grupo, o qual é hoje conhecido como sendo o grupo de Galois, a uma dada equação polinomial f (x) = 0. Dado f (x) = xn + an−1 xn−1 + ... + a0 , com coeficientes a0 , a1 , ..., an−1 ∈ K e raízes α1 , ..., αn nalguma extensão de K, formamos um corpo ∆ tal que ∆ é o menor corpo que contém K e α1 , ..., αn . Assim construído, a ∆ dá-se o nome de corpo de decomposição de f (x). O grupo de Galois de f sobre K é o grupo de todos os K-automorfismos de ∆ e nota-se por G(∆ : K). Mostra-se que é, a menos de isomorfismo, um subgrupo de Sn , o grupo simétrico em n elementos. Um grupo é simples se não tem subgrupos normais. Um subgrupo H de um grupo G é normal se para todo g ∈ G, gHg −1 = H. Nota-se por H ≤ G o facto de H ser subgrupo de G e por H E G o facto de H ser subgrupo normal de G. Todo o grupo finito pode ser expresso da forma id = H1 E H2 E ... E Hr = G, onde cada Hi /Hi−1 é simples. Se cada um dos grupos quocientes simples obtidos for cíclico, então G diz-se solúvel. Se para G tomarmos o grupo G(∆ : K), onde ∆ e f são como acima, dizemos que equação f (x) = 0 é resolúvel por radicais se é possível calcular os zeros de f (x) a partir dos coeficientes de K através um números finito de adições, diferenças, produtos, quocientes e extracções de raízes. Galois demonstra que a equação f (x) = 0 é resolúvel por radicais se e só se G(∆ : K) é um grupo solúvel. Galois observa que o grupo simétrico S5 não tem essa propriedade, o que explica o facto de a equação geral do 5◦ grau não ser resolúvel por radicais, ou, por outras palavras, de não existir uma fórmula resolvente geral com radicais para as equações do 5◦ grau. A teoria dos grupos, criada por Galois no decurso da sua investigação sobre a resolubilidade de equações, teve posteriormente enorme desenvolvimento noutras áreas. Também a teoria dos corpos e das suas extensões se veio a revelar fundamental noutras áreas da matemática. A dificuldade em calcular o grupo de Galois de certos polinómios é um dos aspectos desta teoria que se mantém insatisfatório. Assim, a correspondência entre equações polinomiais de grau n e subgrupos de Sn só é viável para valores muito pequenos de n. Como é impossível compreender completamente esta correspondência, para todo n, é natural levantar a seguinte questão: Será que todos os subgrupos de Sn ocorrem, pelo menos uma vez, nesta correspondência, isto é, será que todo o subgrupo de Sn corresponde a algum 2 CONTEÚDO polinómio de grau n? Esta questão é uma formulação do Problema Inverso da Teoria de Galois. Hilbert foi pioneiro no estudo deste problema. Ele começou por mostrar, através do seu teorema da irredutibilidade, que é suficiente que grupos ocorram como grupos de Galois de polinómios sobre o corpo Q(x). O facto de existirem várias extensões de Galois de determinado tipo não isomorfas leva à introdução do conceito de rigidez. Este garante-nos que, sob determinadas condições, um dado grupo finito ocorre como grupo de Galois sobre Q, e que a extensão de Galois associada é única, a menos de isomorfismo. Começamos no capítulo 1, por rever alguns conceitos básicos sobre polinómios, extensões e teoria de Galois necessários para o desenvolvimento do trabalho. A maioria das demonstrações será omitida. No capítulo 2, será demonstrado que, para todo o inteiro positivo n, existe um polinómio em Q cujo grupo de Galois é isomorfo a Sn . Neste capítulo será essencial a utilização do Teorema de Hilbert. Este permite-nos, dado um polinómio irredutível f (x1 , x2 , ..., xn , y) em n + 1 variáveis sobre Q, concluir que existem valores racionais para x1 , x2 , ..., xn para os quais o polinómio resultante em y seja irredutível sobre Q. Os números construtíveis são a base do capítulo 3. Um número real α diz-se construtível se existe um segmento de comprimento |α| obtido a partir de um segmento de recta unitário num número finito de passos usando apenas uma régua não graduada e um compasso. Veremos que, sendo α um real construtível, então o seu grau sobre Q, degQ α, é uma potência de 2. No entanto, também será visto que esta não é uma condição suficiente, uma vez que existem reais α tais que degQ α é uma potência de 2 e α não é construtível. A demonstração deste teorema assentará no Teorema demonstrado no capítulo 2. No capítulo 4 será dada uma condição necessária e suficiente para um dado polinómio ser resolúvel por radicais. Mostra-se também que, para todo n ≥ 5, existem polinómios em que nenhuma das suas raízes pode ser exprimível por radicais. No capítulo 5 começamos por introduzir o conceito de pontos de ramificação e de classes de conjugação de uma dada extensão de Galois. Introduzimos à custa destes conceitos certas classes de equivalência, formadas por um grupo de Galois, os pontos de ramificação e o conjunto das classes de conjugação associadas aos pontos de ramificação, e demonstra-se que, a menos de isomorfismo, para cada classe de equivalência dada, existe uma única extensão de Galois finita de C(x). A existência de tais extensões é-nos garantida CONTEÚDO 3 pelo teorema de Riemann, o qual será apenas enunciado, não se conhecendo demonstração algébrica. 4 CONTEÚDO Capítulo 1 Preliminares Começamos por relembrar alguns conceitos importantes para o trabalho. Neste capítulo muitas das demonstrações serão omitidas. Os resultados podem ser encontrados em [3], [4] e [8]. 1.1 Polinómios Todos os anéis considerados neste trabalho são unitários e associativos. Um anel comutativo A diz-se um domínio de integridade se, para todo a, b ∈ A, sempre que ab = 0 então a = 0 ou b = 0. Relembramos agora o conceito de característica. Definição 1.1.1 Seja A um anel. Consideremos o conjunto An = {a ∈ A : na = 0} , para cada n ∈ N. Se para qualquer natural n, se tem An 6= A, diz-se que A tem característica zero e escrevemos car(A) = 0. Caso contrário, se existe algum natural n tal que An = A, então a característica de A é o menor natural n0 tal que An0 = A e escrevemos car(A) = n0 . Definição 1.1.2 Dizemos que K é um corpo se K é um anel comutativo onde K\ {0} é não vazio e (K\ {0} , ·) é um grupo abeliano. Definição 1.1.3 Seja A um anel comutativo com identidade. Designamos por polinómio em A na incógnita x a expressão n P f (x) = an xn + an−1 xn−1 + ... + a0 = ai xi , i=i 5 6 CAPÍTULO 1. PRELIMINARES onde ai ∈ A e n ∈ N. Aos elementos ai (i = 0, 1, ..., n) chamamos coeficientes de f (x). Ao maior expoente de x que tem coeficiente não nulo em f (x) chamamos o grau de f (x) e escrevemos deg f(x) para designar este grau. Dizemos que o polinómio nulo tem grau −∞. Seja n o maior inteiro tal que an 6= 0. Ao elemento an chamamos coeficiente principal. Se an = 1, dizemos que f (x) é um polinómio mónico. É fácil verificar que o conjunto de todos os polinómios com coeficientes num anel A numa incógnita x forma um anel, o qual notaremos por A[x], o anel de polinómios em x com coeficientes em A. Dado D um domínio de integridade, D[x] também o é. O seu corpo das fracções é ½ ¾ f (x) D(x) = : f (x), g(x) ∈ D[x], g(x) 6= 0 . g(x) O teorema seguinte permite-nos a divisão de polinómios semelhante à divisão conhecida para os naturais. Teorema 1.1.4 (Teorema da Divisão) Sejam K um corpo e f (x), g(x) ∈ K[x], com f (x) 6= 0. Então existem polinómios únicos q(x), r(x) ∈ K[x], com deg r(x) < deg f (x) tais que g(x) = q(x)f (x) + r(x). Demonstração [3, Teoema I.2.5] ¤ Definição 1.1.5 Sejam K um corpo e f (x), g(x) ∈ K[x]. (a) Dizemos que f (x) divide g(x) se existe q(x) ∈ K[x] tal que g(x) = q(x)f (x). Neste caso escrevemos f (x) | g(x); caso contrário, f (x) g(x). (b) Dizemos que d(x) é um máximo divisor comum em K[x] de f (x) e de g(x) se d(x) divide f (x), d(x) divide g(x) e, se, sempre que algum h(x) ∈ K[x] divida f (x) e g(x), então h(x) divide d(x). Neste caso, escrevemos m.d.c(f(x),g(x)) = d(x). (c) Dizemos que f (x) e g(x) são primos entre si se 1 é o máximo divisor comum de f (x) e g(x), isto é, se m.d.c(f (x), g(x)) = 1. 1.1. POLINÓMIOS 7 Definição 1.1.6 Sejam A um anel comutativo com identidade e f (x) ∈ A[x] tal que deg f (x) ≥ 1. Dizemos que f (x) é um polinómio irredutível em A[x] se não existem g(x), h(x) ∈ A[x] tais que deg g(x), deg h(x) < deg f (x) e f (x) = g(x)h(x). Relembramos que se f (x) ∈ D[x] for um polinómio mónico sobre um domínio de integridade D de grau ≥ 1, f (x) é irredutível em D[x] se e só se é irredutível em F [x] onde F é o corpo das fracções de D. Definição 1.1.7 Sejam K um corpo e f (x) ∈ K[x]. Dizemos que um elemento α ∈ K é uma raiz de f (x) em K se f (α) = 0. Lema 1.1.8 Sejam K um corpo e f (x) ∈ K[x]. Um elemento α ∈ K é uma raiz de f (x) se e só se x − α divide f (x). Demonstração Suponhamos que x − α divide f (x). Então, f (x) = (x − α)g(x), para algum g(x) ∈ K[x]. Assim, f (α) = (α − α)g (α) = 0, isto é, α é raiz de f (x). Por outro lado, suponhamos que f (α) = 0. Pelo Teorema da Divisão (Teorema 1.1.4) existem polinómios únicos q(x), r(x) ∈ K[x], tais que f (x) = q(x)(x − α) + r(x) com deg r(x) < deg (x − α) = 1. Logo, r(x) é um polinómio constante em K[x], digamos r. Assim, 0 = f (α) = q(α)(α − α) + r. Portanto r = 0, de onde concluímos que x − α divide f (x). ¤ Definição 1.1.9 Dizemos que α é uma raiz de multiplicidade m de f(x) se (x − α)m | f (x) mas (x − α)m+1 - f (x). Se α for raiz de multiplicidade m onde m ≥ 2, dizemos que α é uma raiz múltipla de f (x). 8 CAPÍTULO 1. PRELIMINARES Definição 1.1.10 Dizemos que um corpo K é algebricamente fechado se todo o polinómio f (x) ∈ K[x] de grau positivo admite uma raiz em K. O teorema que se segue será de maior importância no próximo capítulo; se um polinómio em n + 1 variáveis sobre Q for irredutível então podemos construir a partir deste um polinómio irredutível em Q[x]. A demonstração é feita por indução em n e será omitida; pode no entanto ser encontrada em [7, Teorema 36]. Teorema 1.1.11 (Hilbert) Seja f (t1 , t2 , ..., tn , x) um polinómio irredutível sobre Q em n + 1 variáveis. Então, existe um número infinito de conjuntos de valores racionais α1 , α2 , ..., αn tais que f (α1 , α2 , ..., αn , x) é irredutível em Q[x]. Recorde-se que um domínio de factorização única (DFU) é um domínio de integridade, no qual todo o elemento não nulo e que não seja invertível pode ser escrito como produto de primos a menos do produto por uma unidade e que esta decomposição é única a menos da ordem dos factores. Relembramos agora um critério importante que nos garante a irredutibilidade de alguns polinómios. Teorema 1.1.12 (Critério de Eisenstein) Seja K um corpo quociente de um domínio de factorização única A e p(x) = an xn + an−1 xn−1 + ... + a1 x + a0 um polinómio sobre A de grau n. Se existe um primo p ∈ A tal que 1. p não divide an , 2. p divide a0 , a1 , ..., an−1 , 3. p2 não divide a0 então p(x) é um polinómio irredutível sobre K. Demonstração [14, Teorema 37.5] ¤ 1.2. EXTENSÕES DE CORPOS 1.2 9 Extensões de Corpos Neste parágrafo revemos conceitos da teoria de corpos que serão necessários. Definição 1.2.1 Sejam K, L corpos. Dizemos que L é uma extensão de K se K é um subcorpo de L. O símbolo L/K designa a extensão L de K. O lema seguinte é óbvio atendendo à definição de característica: Lema 1.2.2 Seja K um corpo de característica zero. Então qualquer extensão L de K também tem característica zero. Definição 1.2.3 Sejam K, L corpos tais que L é uma extensão de K. O grau da extensão L/K é a dimensão de L quando considerado como espaço vectorial sobre K e escrevemos [L : K] para designar este grau. Dizemos que L é uma extensão finita de K se o grau [L : K] for finito. Caso contrário, dizemos que L é uma extensão infinita de K. Dados K e F subcorpos de um corpo E tais que F ⊂ K ⊂ E e v1 , v2 , ..., vn uma base de E sobre K e u1 , u2 , ..., um uma base de K sobre F, facilmente se demonstra que {ui vj : i = 1, 2, ..., m; j = 1, 2, ...n} é base de E sobre F. Temos assim que : Teorema 1.2.4 Sejam K e F subcorpos de um corpo E tais que F ⊂ K ⊂ E. Se E é uma extensão finita de K e K é uma extensão finita de F, então [E : F] = [E : K] [K : F] . Demonstração [3, Teorema II.1.5] ¤ Definição 1.2.5 Seja L uma extensão do corpo K e seja λ ∈ L. Dizemos que λ é algébrico sobre K se λ é raiz de algum polinómio não nulo p (x) ∈ K [x]; caso contrário, dizemos que λ é transcendente sobre K. Definição 1.2.6 Seja L uma extensão do corpo K. Dizemos que L é uma extensão algébrica de K se todo o elemento de L é algébrico sobre K. Caso contrário, dizemos que L é uma extensão transcendente de K. 10 CAPÍTULO 1. PRELIMINARES Proposição 1.2.7 Seja L uma extensão do corpo K e seja α ∈ L um elemento algébrico sobre K. Existe um e um só polinómio irredutível mónico f (x) ∈ K[x] tal que f (α) = 0, ou seja, tal que α é raiz de f (x). Tem-se ainda que qualquer polinómio de K[x] que admita a raiz α é múltiplo de f (x), isto é, f (x) é o polinómio de grau mínimo entre os polinómios que admitem a raiz α. Definição 1.2.8 Seja L uma extensão do corpo K e seja α ∈ L um elemento algébrico sobre K. O polinómio mínimo de α sobre K é o único polinómio mónico mα (x) ∈ K[x] de grau mínimo de α sobre K. Definição 1.2.9 Seja mα (x) ∈ K[x] o polinómio mínimo de α sobre K. Define-se grau de α sobre K como sendo o grau de mα (x), isto é, degK α := degK mα (x) Dado um corpo e uma sua extensão construímos agora subcorpos intermédios. Definição 1.2.10 Seja L uma extensão do corpo K e S um subconjunto de L. Ao menor subcorpo de L que contém K ∪ S dá-se o nome de subcorpo de L gerado por K ∪ S e representa-se por K(S). Definição 1.2.11 Seja α ∈ L ⊃ K e uma aplicação ψ : K[x] −→ L dada por ψ (p (x)) = p(α). Então designamos ψ (K [x]) por K [α]. A aplicação introduzida na definição 1.2.11 é um homomorfismo de anéis. Como K [α] é, por definição, a imagem de K [x] por um homomorfismo de anéis, K [α] é um anel. Mais, podemos demonstrar que K [α] é o menor anel que contém K∪ {α}. Definição 1.2.12 Seja L uma extensão de K. Dizemos que L é uma extensão simples de K se existe α ∈ L tal que L = K (α). Teorema 1.2.13 Seja L uma extensão do corpo K e seja α ∈ L. Então K[α] = {f (α) : f (x) ∈ K[x]} e ½ ¾ p(α) K(α) = : p(α), q(α) ∈ K[x], q(α) 6= 0 . q(α) Tem-se também que K(α) é o corpo das fracções de K[α]. 1.2. EXTENSÕES DE CORPOS 11 Demonstração A imagem da aplicação ψ : K[x] −→ L f (x) 7−→ f (α) é um subanel de L. Seja R um subanel de L que contém K e α. Então, por ser fechado para a adição e para a multiplicação, f (α) ∈ R, para todo f (x) ∈ K[x]. Deste modo, {f (α) : f (x) ∈ K[x]} está contido em todos os subanéis de L que contêm K e α. Como K ⊆ Im ψ e α ∈ Im f , K[α] = {f (α) : f (x) ∈ K[x]}. O ocorpo das fracções de K[α] é o conjunto n p(α) : p(α), q(α) ∈ K[x], q(α) 6= 0 , que está contido em qualquer subcorpo q(α) de L que contenha K[α], logo é igual a K(α). ¤ A proposição seguinte dá-nos uma descrição de K(α) quando α ∈ L ⊇ K é um elemento algébrico sobre K. Proposição 1.2.14 Seja α ∈ L ⊃ K um elemento algébrico sobre K, α ∈ /K e mα (x) o seu polinómio mínimo sobre K. Então: (a) K(α), o subcorpo de L gerado por K e α, é isomorfo ao corpo das fracções K[x]/ hmα (x)i; (b) K(α) ' K [α]; (c) K(α) é o conjunto dos elementos da forma an−1 αn−1 + ... + a1 α + ao , onde n é o grau de mα (x). Proposição 1.2.15 Se L é uma extensão de K e α ∈ L é transcendente sobre K, então K(α) ' K[x] como anéis. A proposição seguinte indica-nos o grau de uma extensão simples e algébrica: Proposição 1.2.16 Seja K(α) uma extensão simples do corpo K, onde α é algébrico com polinómio mínimo mα (x) sobre K. Então, {1, α, α2 , ..., αn−2 , αn−1 } é uma base de K(α) sobre K e [K (α) : K] = deg mα (x). Demonstração [3, Corolário II.2.5] ¤ Relacionamos agora o conceito de extensão algébrica com o de extensão finita. 12 CAPÍTULO 1. PRELIMINARES Proposição 1.2.17 Toda a extensão finita é algébrica. Demonstração Seja L/K uma extensão finita. Então, por definição de extensão finita, [L : K] = n < ∞, isto é, L tem dimensão finita quando visto como espaço vectorial sobre K. Assim, o conjunto de quaisquer n + 1 vectores não nulos é linearmente dependente. Seja α ∈ L e consideremos 1, α, α2 , ..., αn . Então, existem c0 , c1 , ..., cn ∈ K, não todos nulos, tais P P que ci αi = 0. Deste modo, α é raiz do polinómio não nulo f (x) = ci xi . Logo α é algébrico sobre K. ¤ Observação 1.2.18 O recíproco da Proposição 1.2.17 é falso. Tem-se que toda a extensão finita é algébrica. Extensões da forma K(α1 , α2 , ..., αn ) onde os αi ’s são algébricos sobre K são finitas. Proposição 1.2.19 Se L = K(α1 , α2 , ..., αn ) onde os αi ’s são algébricos sobre K então [L : K] é finita. Demonstração [3, Lema II.2.6] ¤ Combinando as Proposições 1.2.17 e 1.2.19 obtém-se: Proposição 1.2.20 A extensão L/K é finita se e só se L é algébrico sobre K e existem n ∈ N e α1 , ..., αn ∈ L tais que L = K(α1 , ..., αn ). Demonstração [3, Lema II.2.6] ¤ Definição 1.2.21 Seja K uma extensão de F. Dizemos que K é um fecho algébrico de F se (i) K/F é uma extensão algébrica, e (ii) K é algebricamente fechado. Neste caso, escrevemos K = F. 1.2. EXTENSÕES DE CORPOS 13 A existência dos fechos algébricos é-nos garantida por [4, Corolário 7.3.5], sendo que a existência das extensões algebricamente fechadas de F são asseguradas por [4, Teorema 7.3.4]. Mostramos agora que, dado um elemento algébrico α sobre um corpo K, raiz de um polinómio f (x) ∈ K[x], podemos construir um novo polinómio cujos coeficientes pertencem ao anel gerado pelos coeficientes de f (x), mónico, que admite uma raiz do tipo an α que gera a mesma extensão simples que α. Lema 1.2.22 Seja α algébrico sobre um corpo L e f (x) = n P ai xi um polinómio i=0 sobre L de grau n > 0 tal que f (α) = 0. Então n g(x) = x + n−1 X ai an−i−1 xi n i=0 é um polinómio mónico de grau n tal que g(an α) = 0. Tem-se que ainda que: a) L(α) = L(an α); b) se f for irredutível, g também o é. Demonstração Seja α algébrico sobre L, e f e g tais como na hipótese do Lema. Uma vez que g(an α) = ann αn + n−1 X ai an−i−1+i αi n i=0 = ann αn = an−1 n f (α), + an−1 n n−1 X ai αi i=0 g(an α) = 0. Como an ∈ L e α ∈ L(α), L(an α) ⊆ L(α). Como α = a−1 n an α, por argumento análogo tem-se a restante inclusão. Se f for irredutível, α é algébrico sobre L de grau n, logo n = [L(α) : L] . 14 CAPÍTULO 1. PRELIMINARES Como L(α) = L(an α), n = [L(an α) : L], isto é, an α tem grau n sobre L. Como g(x) é de grau n sobre L, é mónico e g(an α) = 0, g é irredutível sobre L. ¤ Introduzimos agora um novo conceito necessário: Definição 1.2.23 (a) Dizemos que um polinómio irredutível f (x) ∈ K[x] é separável quando não tem raízes múltiplas em qualquer corpo de decomposição. (b) Dizemos que um polinómio qualquer é separável sobre K quando todos os seus factores irredutíveis o são. (c) Seja L/K uma extensão de corpos. Um elemento α ∈ L algébrico sobre K diz-se separável sobre K quando o seu polinómio mínimo o é. (d) Uma extensão algébrica L diz-se separável sobre K quando todos os seus elementos são separáveis sobre K. Teorema 1.2.24 Seja K um corpo de característica zero e f (x) um qualquer polinómio irredutível sobre K[x]. Então f (x) não tem raízes múltiplas em qualquer extensão de K. Demonstração Suponhamos que f (x) tem uma raiz múltipla α. Então, numa certa extensão de K, poderíamos escrever f (x) = (x − α)2 q(x), para algum polinómio q(x) com coeficientes nessa extensão. Assim, a derivada do polinómio f (x), f 0 (x) = 2(x − α)q(x) + (x − α)2 q 0 (x), admite α como raiz. Seja p(x) o polinómio mínimo de α sobre K. Dado que α é raiz de f (x) e de f 0 (x), p(x) divide ambos os polinómios. Ora, sendo f (x) irredutível, assim como p(x), temos que p(x) = ²f (x), para algum ² ∈ K\ {0} e, deste modo, f (x) | f 0 (x). No entanto, f 0 (x) tem grau inferior a f (x), logo f 0 (x) = 0. Considerando f (x) = c0 + c1 x + ... + cn xn , 1.2. EXTENSÕES DE CORPOS 15 com cn 6= 0, temos que f 0 (x) = c1 + 2c2 x + ... + ncn xn−1 . Então, ncn = 0 com n ∈ N. Como K tem característica zero e qualquer sua extensão também a tem, chegamos a uma contradição. Portanto, f (x) não pode ter raízes múltiplas. ¤ Uma vez que o corpo Q tem característica zero, o corolário seguinte é consequência imediata do Teorema anterior: Corolário 1.2.25 Seja f (x) um polinómio irredutível em Q[x]. Então, f (x) não tem raízes múltiplas em qualquer extensão de Q. Demonstramos agora que uma extensão finita e separável é uma extensão simples: Teorema 1.2.26 (Teorema do Elemento Primitivo) Seja E uma extensão finita de um corpo F de característica zero. Então, existe α ∈ E tal que E = F(α). Demonstração Seja E = F(α1 , ..., αn ). Para demonstrar que E é uma extensão simples de F usaremos indução em n. Se n = 1, E = F(α1 ), logo não há nada a provar. Suponhamos que E1 = F(α1 , ..., αn−1 ). Por hipótese de indução podemos admitir que E1 é uma extensão simples de F, isto é, que E1 = F(β), para algum β ∈ E1 . Então, E = E1 (αn ) = F(β, αn ). A demonstração fica assim reduzida ao caso em que n = 2. Digamos que E é gerado por dois elementos α e β. Sejam f (x) e g(x) os polinómios sobre F irredutíveis que admitem as raízes α e β, respectivamente, e seja E0 o corpo de decomposição destes polinómios. Sejam α = α1 , ...αm e β = β 1 , ..., β n as suas raízes. Pelo Teorema 1.2.24, as raízes αi ’s são todas distintas. Consideremos as seguintes equações em x αi + xβ j = α + xβ, com 1 ≤ i ≤ m e 2 ≤ j ≤ n. Estas equações têm exactamente uma solução em F, α − αi . x= βj − β 16 CAPÍTULO 1. PRELIMINARES Seja k um elemento de F que não seja solução destas equações e tomemos γ = β + kα. Demonstramos de seguida que a extensão E é gerada pelo elemento γ = β + kα, isto é, vamos ver que F(α, β) = F(γ). Ora, uma vez que γ ∈ F(α, β), temos que F(γ) ⊂ F(α, β). Para mostrar que F(α, β) ⊂ F(γ) basta mostrar que α, β ∈ F(γ). Comecemos por ver que β ∈ F(γ). Para tal, iremos ver que α é raiz de um polinómio de grau 1 sobre F(γ). Consideremos os polinómios f (x) e g(x) como anteriormente. Temos que f (x) e h(x) = g(γ − kx) são polinómios sobre F(γ) (note-se que g(x) ∈ F[x] ⊂ F(γ)[x]). Dada a forma como k, g(x) e h(x) foram escolhidos, α é raiz de ambos os polinómios. Assim, o máximo divisor comum destes polinómios é divisível pelo factor x − α em F[x], admitindo portanto a raiz α. Como f (x) não tem raízes múltiplas, o seu máximo divisor comum também não as tem, ou seja, a raiz α aparece apenas uma vez. Mas, pela escolha de k, os polinómios f (x) e g(γ − kx) não têm outra raiz em comum, dado que as raízes de f (x) são da forma αi , com 1 ≤ i ≤ m, e γ − kαi 6= β j , para todo o j. Portanto, o máximo divisor comum de f (x) e g(γ − kx) tem grau 1. Mas, o máximo divisor comum é um polinómio sobre F(γ), o corpo dos coeficientes de f (x) e g(γ − kx). Portanto, α é a raiz de um polinómio de grau 1 sobre F(γ), ou seja, α ∈ F(γ). Como F(γ) é um corpo e β = γ − kα, β ∈ F(γ). Portanto, F(α, β) = F(γ). ¤ Definição 1.2.27 Seja L um corpo. Dizemos que o polinómio f (x) ∈ L[x] se decompõe em L se f (x) = λ(x−α1 )...(x−αn ), para alguns λ, α1 , ..., αn ∈ L. Definição 1.2.28 Seja f (x) um polinómio com coeficintes num corpo K. Um corpo de decomposição de f(x) é uma extensão L de K em que: (a) f (x) se decompõe em L num produto de termos de grau 1, e (b) L = K(α1 , ..., αn ) onde α1 , ..., αn são as raízes de f (x) em L. O teorema seguinte garante-nos a existência de um corpo de decomposição de um polinómio f (x) ≥ K[x] de grau n ≥ 1, onde K é um corpo. Teorema 1.2.29 Seja K um corpo e f (x) um polinómio de grau n ≥ 1. Existe uma extensão L de K que é um corpo de decomposição de f (x). 1.2. EXTENSÕES DE CORPOS 17 Demonstração [4, Teorema 7.3.1] ¤ Os corpos de decomposição de polinómios sobre corpos K não são necessariamente únicos, no entanto, quaisquer corpos de decomposição de um mesmo polinómio sobre um corpo são isomorfos. Proposição 1.2.30 Seja f (x) um polinómio sobre um corpo K. Dois corpos de decomposição de f (x) são isomorfos. Demonstração [4, Teorema 7.4.3] ¤ Pela Proposição 1.2.20 concluímos que dado um polinómio f (x) sobre um corpo K o seu corpo de decomposição é uma extensão finita de K. A proposição seguinte diz-nos que o grau dessa extensão é necessariamente inferior a n!, onde n é o grau do polinómio. Proposição 1.2.31 Seja K um corpo e seja L um corpo de decomposição sobre K do polinómio f (x) ∈ K[x]. Então, L é uma extensão finita de K e [L : K] ≤ (deg f )! Demonstração [3, Lema III. 1.4] ¤ Definição 1.2.32 Seja L uma extensão do corpo K. Dizemos que L/K é uma extensão normal se cada polinómio irredutível f (x) ∈ K[x] que tem pelo menos uma raiz em L se decompõe em L. O teorema seguinte caracteriza algumas extensões normais. Teorema 1.2.33 A extensão L/K é finita e normal se e só se L é um corpo de decomposição de algum polinómio sobre K. Demonstração [3, Teorema III.1.10] ¤ Proposição 1.2.34 Seja L uma extensão finita e normal de um corpo K e M um corpo intermédio. Então L é uma extensão finita e normal de M. 18 CAPÍTULO 1. PRELIMINARES Demonstração Pelo Teorema 1.2.33, L é o corpo de decomposição de algum polinómio em K[x], f (x). Mas f (x) ∈ M[x], pois K ⊂ M ⊂ L. Assim, L é o corpo de decomposição de f (x) ∈ M[x]. ¤ Introduzimos agora a noção de discriminante de um polinómio sobre K. Este conceito dá-nos uma forma de verificar se o polinómio tem raízes múltiplas. Definição 1.2.35 Dado p(x) ∈ K[x] de grau n e mónico com raízes r1 , ..., rn nalguma extensão de K, define-se o discriminante de p(x) como sendo o produto Y Dp(x) = (ri − rj )2 i<j A proposição seguinte é óbvia atendendo à definição de discriminante: Proposição 1.2.36 Seja K um corpo, p(x) ∈ K[x] um polinómio irredutível e α1 , ..., αn as raízes de p(x) em alguma extensão de K. Então Dp(x) = 0 se e só se p(x) tem raízes múltiplas. Note-se que a Proposição anterior é equivalente a dizer que Dp(x) = 0 se e só se p(x) não é um polinómio separável. Introduzimos agora o conceito de polinómio simétrico. Definição 1.2.37 Dizemos que um polinómio em n variáveis f (x1 , x2 , ..., xn ) ∈ K[x1 , x2 , ..., xn ] é simétrico se se mantém invariante através das n! permutações das suas variáveis. Existem polinómios simétricos fáceis de identificar: os polinómios simétricos elementares. Definição 1.2.38 Seja D um domínio de integridade e x1 , x2 , ..., xn n variáveis sobre D. Chamamos polinómios simétricos elementares nas incógnitas x1 , x2 , ..., xn aos polinómios ei ∈ D[x1 , x2 , ..., xn ] definidos do seguinte modo e1 (x1 , x2 , ..., xn ) = x1 + x2 + ... + xn , e2 (x1 , x2 , ..., xn ) = x1 x2 + x1 x3 + ... + x1 xn + x2 x3 + ... + xn−1 xn , .. . en (x1 , x2 , ..., xn ) = x1 x2 ...xn . 1.2. EXTENSÕES DE CORPOS 19 Dado um domínio de integridade D, podemos, em D[x1 , x2 , ..., xn ], escrever todos os polinómios simétricos à custa dos elementares definidos antes: Teorema 1.2.39 (Teorema Fundamental de Polinómios Simétricos) Seja D um domínio de integridade. Então cada polinómio simétrico em D[x1 , x2 , ..., xn ] pode ser escrito como um polinómio sobre D nos polinómios simétricos elementares e1 , e2 , ..., en . Demonstração [3, Teorema I.6.3] ¤ Lema 1.2.40 Seja K um corpo e seja f (x) = xn + a1 xn−1 + ... + an ∈ K[x]. Sejam α1 , α2 , ..., αn as raízes de f (x) numa extensão L de K, pelo que f (x) = (x − α1 ) (x − α2 ) ... (x − αn ) ∈ L[x]. Então, ai = (−1)i ei (α1 , α2 , ..., αn ), onde as funções e1 (α1 , α2 , ..., αn ) representam o i-ésimo polinómio simétrico elementar nas incógnitas α1 , α2 , ..., αn . Proposição 1.2.41 Seja f (x) um polinómio sobre F de grau n com raízes α1 , α2 , ..., αn . Se f (x1 , x2 , ..., xn ) é um polinómio simétrico sobre F em n variáveis, então f (α1 , α2 , ..., αn ) é um elemento de F. Demonstração Pelo Teorema 1.2.39, o polinómio f (α1 , α2 , ..., αn ) pode ser escrito como um polinómio sobre F nos polinómios simétricos elementares. Se f (x) = an xn + an−1 xn−1 + ... + a0 , então demonstra-se facilmente pelo Lema 1.2.40 que ei (α1 , ..., αn ) = ±an−i /an ∈ F. Consequentemente, f (α1 , α2 , ..., αn ) ∈ F. ¤ Usando o Lema 1.2.40, o Teorema Fundamental de Polinómios simétricos e um raciocínio da demonstração da Proposição 1.2.41 pode-se demonstrar que: Proposição 1.2.42 Seja K um corpo e p(x) ∈ K[x] de grau n. Tem-se que Dp(x) ∈ K. Mais, se K for o corpo de fracções de um domínio de integridade R e p(x) ∈ R[x], então Dp(x) ∈ R. Demonstração [14, página 567] ¤ 20 1.3 CAPÍTULO 1. PRELIMINARES Teoria de Galois Neste parágrafo revemos alguns resultados bem conhecidos da teoria de Galois. A partir de extensões de corpos formamos grupos; os grupos de Galois associados a uma extensão. As propriedades dos grupos de Galois dependem das propriedades das extensões. Definição 1.3.1 Sejam L e M duas extensões de um corpo K. Um Kisomorfismo de M para L é um isomorfismo de corpos ϕ : M → L tal que ϕ (k) = k, para todo k ∈ K. Um K-automorfismo de L é um K-isomorfismo ϕ : L → L. Duas extensões F e F0 de K dizem-se isomorfas se existir um K-isomorfismo entre elas. Consideramos agora o conjunto de todos os K-automorfismos de uma extensão L do corpo K. Teorema 1.3.2 Seja L uma extensão de um corpo K. O conjunto de todos os K-automorfismos de L é um grupo, relativamente à operação de composição de aplicações. Definição 1.3.3 O grupo constituído por todos os K-automorfismos de L é designado por grupo de Galois da extensão L de K, e será denotado por G(L : K). Definição 1.3.4 Seja G um grupo de automorfismos de um corpo K. O conjunto de elementos de K que ficam fixos por todos os automorfismos de G formam um subcorpo, chamado o corpo fixo de G. Este corpo fixo será denotado por KG : KG = {α ∈ K : ϕ(α) = α, para todo ϕ ∈ G} . Definição 1.3.5 Seja f (x) um polinómio sobre F e E o seu corpo de decomposição sobre F. Dizemos que G(E : F) é o grupo de Galois de f sobre F. Definição 1.3.6 Seja L uma extensão do corpo K. Dizemos que L/K é uma extensão de Galois se for uma extensão finita, normal e separável sobre K. 1.3. TEORIA DE GALOIS 21 A proposição seguinte relaciona extensões de Galois, corpos de decomposição e corpos fixos: Proposição 1.3.7 Seja L uma extensão de K e G o grupo de K-automorfismos de L. As seguintes afirmações são equivalentes: 1. L é uma extensão de Galois de K; 2. L é um corpo de decomposição de um polinómio separável sobre K; 3. LG = K. Se qualquer uma destas condições se verifica, então |G(L : K)| = [L : K]. Demonstração [4, Proposição 7.7.4] ¤ Proposição 1.3.8 Seja f (x) ∈ K[x] um polinómio de grau n. Então, o seu grupo de Galois é isomorfo a um subgrupo de Sn . Demonstração [3, Proposição V.1.6] ¤ A seguir enunciamos a correspondência existente entre subgrupos de determinadas extensões de um corpo K, as de Galois, e os corpos intermédios dessa mesma extensão. A bijecção existente permite-nos caracterizar corpos intermédios que são extensões normais de K em função dos subgrupos de alguns grupos de Galois. Teorema 1.3.9 (Teorema da Correspondência de Galois) Seja L/K uma extensão de Galois e consideremos S(G(L : K)) = {G : G ≤ G(L : K)} , o conjunto dos subgrupos de G(L : K) e CI(L/K) = {M : K ⊂ M ⊂ L} , o conjunto dos corpos intermédios entre K e L. Considerem-se também as aplicações e G(L : ) : CI(L/K) −→ S(G(L : K)) M 7→ G(L : M), ∀M : K ⊂ M ⊂ L f ix() : S(G(L/K)) −→ CI(L/K) G 7→ f ix(G), ∀G : G ≤ G(L : K). 22 CAPÍTULO 1. PRELIMINARES (a) As aplicações são bijecções, cada uma inversa uma da outra, que invertem inclusões. (b) Tem-se que |G(L : K)| = [L : K] e |G| = |L : f ix(G)|, ∀M ∈ CI(L/K), ∀G ∈ S(G(L : K)). 1. Tem-se que G E G(L : K) se e só se a extensão f ix(G)/K é normal; e 2. Tem-se que a extensão M/K é normal se e só se G(L : M) E G(L : K). (c) Se a extensão M/K for normal então G(L : K)/G(L : M) ' G(M : K). Demonstração [3, Teorema V.2.6] ¤ Teorema 1.3.10 (Artin) Seja K um corpo e seja G um grupo finito de automorfismos de K, de ordem n. Seja L = KG o corpo fixo de G. Então K/L é uma extensão de Galois e o seu grupo de Galois é G. Tem-se que [K : L] = n. Demonstração [8] ¤ Como aplicação da teoria de Galois podemos demonstrar propriedades do discriminante de um dado polinómio sobre um corpo K. Proposição 1.3.11 Seja K um corpo e p(x) ∈ K[x] um polinómio separável e irredutível. Sejam α1 , ..., αn as raízes de p(x) num corpo de decomposição E de p(x). Então Dp(x) ∈ K. ¡ ¢ Demonstração Seja σ ∈ G = G(E : K). Note-se que σ Dp(x) = Dp(x) , logo Dp(x) ∈ EG . Como E é corpo de decomposição de um polinómio separável sobre K, pela Proposição 1.3.7, EG = K, deduzindo-se o pretendido. ¤ Proposição 1.3.12 Seja K um corpo e p(x) ∈ K[x] um polinómio separável e irredutível. Sejam α1 , ..., αn as raízes de p(x) num corpo de decomposição E. Então Dp(x) é um quadrado perfeito em K se e só se o grupo de Galois de p(x), G(E : K), é um subgrupo de An . 1.3. TEORIA DE GALOIS Demonstração Seja σ ∈ G = G(E : K) e d = 23 p Q Dp(x) = (ri − rj ). i<j Pela Proposição 1.3.8 podemos pensar em σ como sendo uma permutação do conjunto dos zeros de p(x). Tal como na demonstração da Proposição 1.3.11, EG = K. Tem-se então que d ∈ K se e só se d ∈ EG , isto é, se e só se σ(d) = d. Mas tal só acontece se σ for uma permutação par, logo, G é um subgrupo de An . ¤ 24 CAPÍTULO 1. PRELIMINARES Capítulo 2 Sn como grupo de Galois Neste capítulo demonstramos que dado n ∈ N e Sn , o grupo simétrico em n elementos, existe um polinómio em Q[x] cujo grupo de Galois é isomorfo a Sn (Teorema 2.3.5). Começamos por verificar na secção 1 que dado um corpo K, se o grupo de Galois de um polinómio f (x) ∈ K[x] de grau n é isomorfo a Sn , então f é irredutível sobre K. Na secção 2 estudamos elementos α1 , ..., αn algebricamente independentes sobre Q. Mostramos que dado n elementos algebricamente independentes sobre Q, as suas n! permutações induzem Q-automorfismos na extensão gerada por estes elementos. Finalmente na secção 3 tomamos elementos α1 , ...αn algebricamente independentes sobre Q e à custa destes definimos f (x) e b1 , ..., bn ∈ Q(α1 , ..., αn ) que permitirão demonstrar o resultado pretendido. 2.1 Preliminares Sabemos pela Proposição 1.3.8 que o grupo de Galois de um polinómio f de grau n sobre um corpo K é isomorfo a um subgrupo de Sn . Por definição, o corpo de decomposição de f não é mais que Λ = K(α1 , ...αn ) onde α1 , ..., αn são as raízes de f (x). Sabemos também que zeros de factores irredutíveis de f (x) são transformados sob acção de elementos de G(Λ : K) em zeros desses mesmos factores. Note-se ainda que os automorfismos de G(Λ : K) são determinados pelas imagens das raízes de f (x). Definição 2.1.1 Seja E uma extensão algébrica de um corpo F. Dois elementos α1 , α2 ∈ E dizem-se conjugados se são zeros do mesmo polinómio 25 26 CAPÍTULO 2. SN COMO GRUPO DE GALOIS irredutível de F[x]. Proposição 2.1.2 Seja f (x) um polinómio de grau n sobre um corpo K cujo grupo de Galois é isomorfo a Sn . Então f é irredutível sobre K. Demonstração Seja f (x) um polinómio nas condições do enunciado e suponhamos, por redução ao absurdo, que f (x) não é irredutível, isto é, que se pode escrever como produto de dois polinómios distintos não constantes. Assim, podemos tomar num corpo de decomposição do polinómio duas raízes, ai e aj , que pertencem a factores irredutíveis distintos, não sendo portanto conjugadas. Consequentemente, o grupo de Galois de f (x) sobre K não conteria nenhum automorfismo que envia ai em aj , uma vez que este envia raízes de factores irredutíveis em raízes desses mesmos factores. Deste modo não poderia conter todas as permutações dos zeros de f (x), logo não seria isomorfo a Sn . ¤ 2.2 Elementos algebricamente independentes sobre Q Na secção 1.2. introduzimos a definição de elemento algébrico. Dada F extensão de Q e α ∈ F, dizemos que α é algébrico sobre Q se existir p(x) ∈ Q[x], não nulo, tal que p(α) = 0. Podemos agora demonstrar que o conjunto dos elementos algébricos sobre Q é numerável, isto é, que existe uma bijecção entre este conjunto e N. Proposição 2.2.1 O conjunto dos números algébricos sobre Q é númerável. Demonstração Notemos que todo o número algébrico é a raiz de algum polinómio de coeficientes inteiros. Comecemos por ver que o conjunto de tais polinómios é numerável. Consideremos a sequência de primos p1 , p2 , p3 , .... A cada polinómio an xn + an−1 xn−1 + ... + a0 não trivial associamos o racional n . Atendendo à decomposição dos naturais como propositivo pa10 pa21 pa32 ...pan+1 duto de potências de primos, estabelecemos uma bijecção entre os racionais positivos diferentes de 1 e o conjunto dos polinómios sobre Q. Como o conjunto dos racionais positivos diferentes de 1 é numerável, o conjunto dos polinómios com coeficientes inteiros é numerável, podendo os polinómios ser 2.2. ELEMENTOS ALGEBRICAMENTE INDEPENDENTES SOBRE Q27 listados como f1 , f2 , f3 , ... . Para obter o conjunto dos números algébricos em Q, basta listar as raízes de f1 , de f2 , e assim sucessivamente, obtendo-se no final um conjunto numerável. ¤ Definição 2.2.2 Dizemos que n elementos a1 , a2 , ..., an são algebricamente independentes sobre Q se não existe um polinómio p(x1 , x2 , ..., xn ) ∈ Q[x1 , x2 , ..., xn ] tal que p(a1 , a2 , ..., an ) = 0, ou seja, se não existe uma relação algébrica entre eles. Lema 2.2.3 Para todo o n, existem n elementos algebricamente independentes sobre Q. Demonstração Comecemos por reparar que, pelo Lema 2.2.1, o conjunto dos números algébricos sobre Q é numerável. Uma vez que C não é numerável, sabemos que existe um número a1 transcendente sobre Q, isto é, tal que a1 não é raiz de qualquernpolinómio de Q[x]. o (a1 ) : f (x) , g (x) ∈ Q[x], g (x) = 6 0 e f (a1 ), g(a1 ) 6= Note-se que Q (a1 ) = fg(a 1) 0 uma vez que a1 é transcendente sobre Q. Assim, cada elemento é da forma αn an1 + αn−1 an1 + ... + α0 m−1 β m am + ... + β 0 1 + β m−1 a1 Logo, Q (a1 ) é um conjunto numerável. Portanto, tal como anteriormente, podemos escolher um elemento a2 transcendente sobre Q(a1 ); de seguida um elemento a3 transcendente sobre Q(a1 , a2 ) e assim sucessivamente, até obtermos uma sequência a1 , a2 , ..., an , onde an é transcendente sobre Q(a1 , a2 , ..., an−1 ). Vejamos agora, por redução ao absurdo, que os elementos encontrados são algebricamente independentes sobre Q. Para tal, suponhamos que existe um polinómio em Q[x1 , x2 , ..., xn ] tal que p(a1 , a2 , ..., an ) = 0. Seja k o maior índice que aparece nesta relação (1 ≤ k ≤ n). Então, ak seria algébrico sobre Q(a1 , a2 , ..., ak−1 ), o que é uma contradição, atendendo à escolha dos ai ’s. Portanto a1 , a2 , ..., an são algebricamente independentes sobre Q como se pretendia demonstrar. ¤ Mostramos agora, de que modo permutações de elementos algebricamente independentes sobre Q originam automorfismos das extensões geradas por esses elementos. 28 CAPÍTULO 2. SN COMO GRUPO DE GALOIS Lema 2.2.4 Sejam a1 , a2 , ..., an n elementos algebricamente independentes sobre Q e E = Q(a1 , a2 , ..., an ). Então, cada uma das n! permutações do conjunto a1 , a2 , ..., an induz um automorfismo em E que mantém fixo Q. Demonstração Note-se que toda a permutação (a1 a2 ... an ) se pode escrever como uma sequência de transposições (a1 an )(a1 an−1 )...(a1 a2 ). Como a composição de automorfismos é um automorfismo, basta mostrar que toda a transposição (c, d) do conjunto {a1 , ..., an } induz um automorfismo de Q(c, d) que mantém Q fixo. Note-se que a extensão E obtida de Q se mantém invariante, quando trocamos a ordem dos ai ’s. Consideremos a transposição que permuta ai e aj , e K a extensão de Q gerada por todos os outros ai ’s, isto é, K = Q(a1 , ..., ai−1 , ai+1 , ..., aj−1 , aj+1 , ..., an ). Assim, E = K(ai , aj ). Sejam c = ai e d = aj . Então E ( = K(c, d)) pode ser representado por ¾ ½ p(c, d) : p, q ∈ K[x1 , x2 ]; q 6= 0 . q(c, d) O candidato natural para o automorfismo induzido pela transposição que permuta os elementos c e d é a aplicação φ : K(c, d) −→ K(c, d) p(c,d) 7−→ p(d,c) . q(c,d) q(d,c) Verificamos agora que esta aplicação está bem definida, que é bijectiva, que preserva a adição e a multiplicação e que mantém os elementos de Q invariantes. Com vista a mostrar que φ está bem definida, consideramos p2 (c, d) p1 (c, d) = ∈ K. q1 (c, d) q2 (c, d) (1) Queremos ver que as imagens por φ destas duas representações são iguais, isto é, que p2 (d, c) p1 (d, c) = . (2) q1 (d, c) q2 (d, c) Da equação (1) tem-se que x = c e y = d é solução da equação polinomial p1 (x, y)q2 (x, y) − p2 (x, y)q1 (x, y) = 0 2.2. ELEMENTOS ALGEBRICAMENTE INDEPENDENTES SOBRE Q29 Como (c, d) são algebricamente independentes, não poderá existir um polinómio não trivial p ∈ K[x1 , x2 ] tal que p(c, d) = 0. Portanto, p1 (x, y)q2 (x, y) − p2 (x, y)q1 (x, y) terá de coincidir com o polinómio nulo. Assim, qualquer par ordenado é solução desta equação. Em particular, (d, c) também é solução deste polinómio, ou seja, p1 (d, c)q2 (d, c) − p2 (d, c)q1 (d, c) = 0, deduzindo-se assim a equação (2). Para mostrar que φ é injectiva, isto é, que µ p1 (c, d) φ q1 (c, d) ¶ µ p2 (c, d) =φ q2 (c, d) ¶ =⇒ p1 (c, d) p2 (c, d) = q1 (c, d) q2 (c, d) ou seja, que p2 (d, c) p1 (c, d) p2 (c, d) p1 (d, c) = =⇒ = , q1 (d, c) q2 (d, c) q1 (c, d) q2 (c, d) basta usar um argumento análogo ao anterior. Atendendo à forma como φ está definida, φ é obviamente sobrejectiva. (c,d) p2 (c,d) , q2 (c,d) ∈ K quaisquer. Tem-se que Sejam pq11(c,d) φ ³ p1 (c,d) q1 (c,d) e que φ ³ + p2 (c,d) q2 (c,d) p1 (c,d) q1 (c,d) × ´ = = p2 (c,d) q2 (c,d) ³ p1 (c,d)q2 (c,d)+p2 (c,d)q1 (c,d) q1 (c,d)q2 (c,d) p1 (d,c)q2 (d,c)+p2 (d,c)q1 (d,c) q1 (d,c)q2 (d,c) p1 (d,c) (d,c) + pq22(d,c) q1 (d,c) = φ ´ = = = ³ ´ ´ 2 (c,d) φ pq11 (c,d)p (c,d)q2 (c,d) p1 (d,c)p2 (d,c) q1 (d,c)q2 (d,c) p1 (d,c) (d,c) × pq22(d,c) , q1 (d,c) assim φ preserva a adição e a multiplicação. Para concluir apenas notamos que esta aplicação mantém os elementos de Q invariantes uma vez que só impõe transformações a c e d, que são elementos de E\Q. ¤ 30 2.3 CAPÍTULO 2. SN COMO GRUPO DE GALOIS Polinómios cujo grupo de Galois é Sn Consideremos n elementos a1 , a2 , ..., an algebricamente independentes sobre Q e seja f (x) o polinómio definido do seguinte modo f (x) = n Q i=1 n (x − ai ) = x + b1 xn−1 + ... + bn , onde os bi ’s são dados por: b1 = −(a1 + ... + an ) b2 = a1 a2 + ... + an−1 an .. . bi = (−1)i × (soma de todos os produtos de i diferentes ai ’s) .. . bn = (−1)n a1 a2 ...an , isto é, bi = (−1)i ei (a1 , ..., an ) onde ei é a i-ésima função simétrica de n variáveis. Então: Lema 2.3.1 O polinómio f (x) definido antes é irredutível sobre Q (b1 , b2 , ..., bn ) . O grupo de Galois de f (x) sobre Q (b1 , b2 , ..., bn ) é isomorfo a Sn . Demonstração Seja E = Q(a1 , a2 , ..., an ) e K = Q (b1 , b2 , ..., bn ). Note-se que, atendendo à definição de f e dos bi ’s, E é o seu corpo de decomposição. Pelo Lema 2.2.4, cada permutação dos ai ’s induz um automorfismo de E que fixa todos os elementos K = Q (b1 , b2 , ..., bn ), e portanto, induz um elemento de G(E : K), pelo que, |G(E : K)| ≥ n!. Uma vez que o grupo de Galois do polinómio f , de grau n, é isomorfo a um subgrupo de Sn (Proposição 1.3.8), temos que G(E : K) ' Sn . Pela Proposição 2.1.2, f é irredutível sobre K. ¤ Como E = Q(a1 , a2 , ..., an ) é uma extensão finita de K = Q (b1 , b2 , ..., bn ), E é uma extensão simples de K. No próximo lema mostramos de forma simples tal facto. 2.3. POLINÓMIOS CUJO GRUPO DE GALOIS É SN 31 Lema 2.3.2 Sejam a1 , a2 , ..., an algebricamente independentes sobre Q e E = Q(a1 , a2 , ..., an ). Então existem inteiros m1 , m2 , ..., mn tais que E = K(m1 a1 + m2 a2 + ... + mn an ). A soma m1 a1 + m2 a2 + ... + mn an assume n! valores distintos, que correspondem às n! permutações possíveis dos ai ’s, onde K = Q (b1 , b2 , ..., bn ). Demonstração Uma vez que E é corpo de decomposição do polinómio f (x) ∈ K[x], pela Proposição 1.3.7, E é extensão de Galois de K, logo finita. Note-se que atendendo à definição dos bi ’s, E = Q(a1 , a2 , ..., an ) = K (a1 , a2 , ..., an ). Pelo Teorema do Elemento Primitivo (Teorema 1.2.26), esta extensão pode ser escrita como uma extensão simples. NoµTeorema¶1.2.26 n P demonstra-se que existem inteiros m1 , ..., mn tais que E = K mi ai . Pei=1 lo Lema 2.3.1 e Teorema 1.3.9, Assim, o grau de sobre K do qual n P i=1 n P [E : K] = |G(E : K)| = n!. mi ai sobre K é n!, ou seja, o grau do menor polinómio mi ai é raiz é n!. Então, i=1 os quais não são mais do que imagens de n P i=1 de G(E : K). Tais automorfismos associam a n P mi ai terá n! conjugados i=1 mi ai pelos n! automorfismos n P mi ai somas idênticas com i=1 os ai ’s permutados. Estes conjugados são todos distintos, uma vez que são raízes de polinómios irredutíveis que, pelo Teorema 1.2.24, não podem ter raízes múltiplas. Portanto, todas estas somas são distintas. ¤ Denotemos por c1 , c2 , ..., cn! os n! valores distintos obtidos de n P mi ai i=1 permutando os ai ’s. n! Q Seja g(x) = (x−ci ). Note-se que as permutações dos ai ’s correspondem i=1 a permutações dos ci ’s, não alterando portanto g(x). Portanto, os coeficientes de g(x) são polinómios simétricos avaliados em (a1 , a2 , ..., an ). Como estes ai ’s são raízes de um polinómio sobre K, por 1.2.41, os coeficientes de g(x) pertencem a K. O corpo de decomposição de g(x) será então K(c1 , ..., cn ). Pela demonstração do Lema 2.3.2, K(c1 , ..., cn ) = E, logo o grupo de Galois de g(x) é G(E : K) ' Sn . Assim, pela Proposição 2.1.2, g (x) é irredutível. 32 CAPÍTULO 2. SN COMO GRUPO DE GALOIS Lema 2.3.3 O grupo de g(x) sobre K é isomorfo a Sn e o polinómio g(x) é irredutível sobre K = Q (b1 , b2 , ..., bn ). Acábamos de ver que tanto o grupo de Galois de f como o de g sobre K são isomorfos a Sn . Construímos agora dois polinómios F (t1 , t2 , ..., tn , x) e G(t1 , t2 , ..., tn , x) de n + 1 variáveis sobre Q. O grau de cada um destes polinómios será n e n!, respectivamente, tal como f e g. Comecemos por tomar n variáveis s1 , s2 , ..., sn e definir n funções ti do seguinte modo: ti = (−1)i ei (s1 , s2 , ..., sn ) , onde ei corresponde ao i-ésimo polinómio simétrico de (s1 , s2 , ..., sn ). Definamos também n! funções ui da seguinte forma ui = n P mi si i=1 e todas as somas obtidas permutando os si ’s. Construímos agora F e G; F (t1 , t2 , ..., tn , x) = xn + t1 xn−1 + ... + tn n Q = (x − si ) i=1 e G(t1 , t2 , ..., tn , x) = n! Q i=1 (x − ui ) . Enquanto que para a função F temos uma representação explícita em termos de t1 , t2 , ..., tn e x, para G não temos. Sabemos que os coeficientes das potências de x em G podem ser escritas como polinómios em si ’s e que são simétricos como funções dos si ’s. Assim, pelo Teorema Fundamental dos Polinómios Simétricos (Teorema 1.2.39) sabemos que G representa uma função nas variáveis t1 , t2 , ..., tn e x. Note-se que F (b1 , b2 , ..., bn , x) = f (x) e G(b1 , b2 , ..., bn , x) = g(x). Lema 2.3.4 Os polinómios F e G são irredutíveis em Q. Demonstração Consideremos os polinómios G(t1 , t2 , ..., tn , x) e F (t1 , t2 , ..., tn , x) sobre Q definidos anteriormente. 2.3. POLINÓMIOS CUJO GRUPO DE GALOIS É SN 33 Suponhamos que F não é irredutível sobre Q, isto é, que existem polinómios R e S não triviais de coeficientes racionais tais que F (t1 , t2 , ..., tn , x) = R(t1 , t2 , ..., tn , x)S(t1 , t2 , ..., tn , x). Esta factorização, a existir, seria válida para quaisquer valores de t1 , t2 , ..., tn , em particular, para ti = bi = (−1)i ei (a1 , a2 , ..., an ). Tendo R e S graus em x não inferior a um, esta substituição resultaria numa factorização de f , contrariando o facto de, pelo Lema 2.3.1, f ser irredutível sobre Q(b1 , ..., bn ). Suponhamos agora que S tem grau 0 em x. Neste caso, S(t1 , t2 , ..., tn , x) = s(t1 , t2 , ..., tn ). Então, o coeficiente de xn no produto RS será dado por r(t1 , t2 , ..., tn )s(t1 , t2 , ..., tn ), sendo r(t1 , t2 , ..., tn ) o coeficiente de xn de R(t1 , t2 , ..., tn , x). Mas como F (t1 , t2 , ..., tn , x) tem coeficiente de xn igual a 1, o grau do polinómio r(t1 , t2 , ..., tn )s(t1 , t2 , ..., tn ) terá de ser nulo. Visto que o grau do produto de polinómios corresponde à soma dos graus de cada factor, concluimos que r e s têm ambos grau zero em qualquer uma das variáveis, ou seja, r e s reduzem-se a constantes não nulas. Mas, neste caso, S também é uma constante e portanto a factorização F = RS é uma factorização trivial, ou seja, F é irredutível em Q. Um argumento análogo prova a irredutibilidade de G. ¤ Demonstramos agora o resultado principal deste capítulo. Teorema 2.3.5 Para todo o inteiro positivo n, existe um polinómio em Q cujo grupo de Galois é isomorfo a Sn . Demonstração Seja n ∈ N e G(t1 , t2 , ..., tn , x) = n! Q i=1 (x − ui ) o polinómio so- bre Q construído antes. Pelo Teorema de Hilbert (Teorema 1.1.11), podemos escolher racionais β 1 , β 2 , ..., β n tais que o polinómio e G(x) = G(β 1 , β 2 , ..., β n , x) é irredutível em Q[x]. Pretendemos demonstrar que o grupo de Galois de Fe(x) = F (β 1 , β 2 , ..., β n , x) = xn + β 1 xn−1 + ... + β n é isomorfo a Sn . 34 CAPÍTULO 2. SN COMO GRUPO DE GALOIS Sejam α1 , α2 , ..., αn as raízes de Fe. Então, m1 α1 + m2 α2 + ... + mn αn pertence ao corpo de decomposição de Fe, Q(α1 , α2 , ..., αn ). Por definição de G e de F , m1 α1 + m2 α2 + ... + mn αn é um zero de G, o qual é um polinómio irredutível de grau n! sobre Q. Assim existe em Q(α1 , α2 , ..., αn ) um elemento de ordem n! sobre Q. Logo [Q(α1 , α2 , ..., αn ) : Q] ≥ n!. Portanto, o grupo de Galois de Fe tem ordem não inferior a n!. Como este grupo corresponde ao conjunto das permutações dos α1 , α2 , ..., αn , a sua ordem poderá ser, no máximo, n!. Deste modo, o grupo de Galois de Fe terá, precisamente, ordem n!, ou seja, é isomorfo a Sn . ¤ Capítulo 3 Números Construtíveis Um dos problemas da geometria clássica consistia no traçado de diversas figuras e na realização de diversas construções, tendo como únicos instrumentos uma régua (não graduada) e um compasso. Um número real α diz-se construtível se for possível construir um segmento de recta de comprimento |α| a partir de um segmento de recta unitário num número finito de passos usando apenas uma régua e um compasso. Nesta secção, sempre que usarmos o verbo “construir” estaremos a falar em construir usando apenas régua e compasso. Neste capítulo demonstramos que dado um real α, para que ele seja construtível é necessário que o grau de α sobre Q seja uma potência de 2. A condição obtida não é no entanto suficiente tal como é demonstrado na proposição 3.2.7. Para tal consideramos um polinómio sobre Q cujo grupo de Galois é isomorfo a Sn . A existência deste polinómio é-nos garantida pelo Teorema 2.3.5. 3.1 Preliminares Dada uma régua (não graduada) e um compasso as operações que podemos realizar com estes instrumentos são chamadas construções fundamentais e são: 1. Dados dois pontos, podemos traçar uma recta que passa pelos dois pontos e prolongá-la até ao infinito nas duas direcções; 35 36 CAPÍTULO 3. NÚMEROS CONSTRUTÍVEIS 2. Dados dois pontos podemos traçar o segmento de recta que une os dois pontos; 3. Dado um ponto e um segmento de recta, podemos traçar a circunferência com centro nesse ponto e raio igual ao comprimento do segmento de recta. O lema seguinte diz-nos que a soma e o produto de números reais construtíveis ainda é um número construtível. A sua demonstração será omitida mas demonstração análoga é feita em 3.1.3. Lema 3.1.1 Dados segmentos de comprimentos 1, α e β, com α > β e β 6= 0, é possível construir segmentos de comprimentos α + β, α − β, αβ e α/β. Definição 3.1.2 Dizemos que um número real α é construtível se, dado um segmento de comprimento 1, é possível construir, num número finito de passos, um segmento de comprimento |α|. Pelo Lema 3.1.1 podemos concluir que todos os números racionais são construtíveis. A proposição seguinte é apenas uma reformulação deste Lema usando o conceito de números reais construtíveis: Proposição 3.1.3 Sejam α e β dois reais construtíveis. Então também α + β, α − β, αβ e α/β são construtíveis. Demonstração Consideremos dois reais construtíveis α e β, com α > β. Traçamos sobre uma recta s um segmento [AB] de comprimento α e um segmento de recta [CD] de comprimento igual a β de modo que B coincida com C. Construa-se uma circunferência com centro em B e raio CD. A circunferência intersecta a recta s nos pontos D e E tais que B está entre A e D e E está entre A e B. Então, o comprimento de [AD], AD, é α + β e o de [AE] é α − β, concluindo-se que α + β e α − β são construtíveis. 3.1. PRELIMINARES A 37 E B=C D s Figura 3.1: Construção da soma e da diferença de dois reais construtíveis Com vista a demonstrar a segunda parte da Proposição, marcamos sobre uma recta dada s um segmento de recta [AB] de comprimento igual a α. Por A, traçamos outra recta r, concorrente com a anterior. Em r marcamos a partir de A um segmento unitário, digamos [AC], e o segmento [AD] de comprimento igual a β. De seguida traçamos a recta t que contém os pontos B e C e construímos a recta t0 paralela a t que passa por D. Seja P o ponto de intersecção das rectas t0 e s. Então o comprimento de [AP ], AP = αβ, uma vez que, pelo Teorema de Tales, AC AB = AD AP isto é, 1 α . = β AP Concluímos assim que αβ é construtível. Nas mesmas condições do caso anterior, traçamos a recta t que contém os pontos B e D e construímos por C a recta t0 paralela a t que intersecta a recta s no ponto Q. Então AQ = α/β uma vez que AC AQ = , AD AB isto é, 1 AQ = . β α 38 CAPÍTULO 3. NÚMEROS CONSTRUTÍVEIS r t' t D C A P B s Figura 3.2: Construção do produto de dois reais construtíveis ¤ Mostramos agora que se α é construtível, √ α também o é. Lema 3.1.4 Dados segmentos√de comprimentos 1 e α é possível construir um segmento de comprimento α. Demonstração Consideremos sobre uma recta s o segmento unitário [AB] e o segmento [BC] de comprimento BC = α. Seja M o ponto médio do segmento [AC] e construa-se uma semicircunferência com centro em M e diâmetro AC. De seguida construa-se a perpendicular s0 a s pelo ponto B e seja D o ponto de intersecção da recta s0 com a semicircunferência. √ Então, [BD] é um segmento de comprimento α já que BC BD = , BD AB isto é, α BD = , 1 BD concluindo-se o pretendido. ¤ 3.2. EXTENSÕES QUADRÁTICAS 39 r t t' D C s A Q B Figura 3.3: Construção do quociente de dois reais construtíveis Definição 3.1.5 Seja F um corpo. Designamos por plano de F o conjunto dos pares ordenados (x, y), com x, y ∈ F. Entende-se por recta de F a recta que passa por dois pontos distintos do plano de F e por circunferência de F a circunferência cujo centro e algum ponto da circunferência pertencem ao plano de F. Lema 3.1.6 Toda a recta do plano de F pode ser representada por uma equação do tipo ax + by + c = 0, com a, b, c ∈ F. Toda a circunferência pode ser representada por uma equação do tipo x2 + y 2 + ax + by + c = 0, com a, b, c ∈ F. 3.2 Extensões quadráticas Relacionamos agora o conceito de número construtível com a existência de certas extensões. Começamos por introduzir o conceito de extensão quadrática de um corpo. 40 CAPÍTULO 3. NÚMEROS CONSTRUTÍVEIS s' D A B M C s Figura 3.4: Extracção da raiz quadrada de um real construtível Definição 3.2.1 Seja F um corpo. Dizemos que F(k) é uma extensão / F. quadrática de F se k2 ∈ F e k ∈ Lema 3.2.2 O ponto de intersecção de duas rectas de F pertence a F. Os pontos de intersecção de uma recta com uma circunferência de F, assim com os pontos de intersecção de duas circunferências de F pertencem ao plano de F ou ao plano de alguma extensão quadrática de F. Demonstração O caso da intersecção das duas rectas de F equivale à solução das duas equações a1 x + b1 y + c1 = 0 a2 x + b2 y + c2 = 0, com a1 , a2 , b1 , b2 , c1 , c2 ∈ F (Lema 3.1.6). É óbvio que a resolução deste sistema envolve operações racionais, estando as soluções x e y em F, ou seja, (x, y) pertence ao plano de F, {(x, y) : x, y ∈ F}. O caso da intersecção de uma recta com uma circunferência em F reduz-se à solução do sistema de equações em F ½ a1 x + b1 y + c1 = 0 x2 + y 2 + a2 x + b2 y + c2 = 0, 3.2. EXTENSÕES QUADRÁTICAS 41 com a1 , a2 , b1 , b2 , c1 , c2 ∈ F. Como os coeficientes a1 e b1 não podem ser simultâneamente zero, a primeira equação pode ser resolvida em ordem a qualquer uma das duas variáveis. Sem perda de generalidade consideremos a equação resolvida em ordem a y: y=− c1 a1 − x. b1 b1 Substituindo na segunda equação obtemos uma equação do segundo grau em x com coeficientes em F. Sabemos que, utilizando a fórmula resolvente, √ obtemos soluções do tipo A ± B k, com A, B, k ∈ F e k ≥ 0. Substituindo estas soluções na primeira equação obtemos uma √ solução para y do tipo √ 0 0 0 0 A ± B k, com A , B , k ∈ F. Assim, √ quando k ∈ F os pontos pertencem a F. Caso contrário, isto é, quando k ∈ / F, os pontos pertencem ao plano √ de F( k). No caso da intersecção de duas circunferências, as equações: x2 + y 2 + a1 x + b1 y + c1 = 0 x2 + y 2 + a2 x + b2 y + c2 = 0 podem ser subtraídas, obtendo-se uma equação linear com coeficientes em F. A equação obtida pode ser resolvida em simultâneo com uma das equações da circunferência, reduzindo este caso ao caso anterior. ¤ Lema 3.2.3 Seja E uma extensão quadrática de F. Então [E : F] = 2. √ Demonstração Pela√definição de extensão√ quadrática, E = F( k), para √ / F. Uma vez√que k e − k não pertencem a F, o algum k ∈ F tal que k ∈ polinómio x2 − k é irredutível. Assim k é raiz de um polinómio irredutível de grau 2 sobre F. Pela Proposição 1.2.16, [E : F] = 2. ¤ Lema 3.2.4 Dado α, se existe uma sequência finita de corpos Q = F0 ⊂ F1 ⊂ ... ⊂ FN , tal que α ∈ FN , e tal que para todo o j, 0 ≤ j ≤ N − 1, Fj+1 é uma extensão quadrática de Fj , então α é construtível. Demonstração A demonstração faz-se por indução em N. Se N = 0, F0 = Q, α é racional e portanto construtível. 42 CAPÍTULO 3. NÚMEROS CONSTRUTÍVEIS Suponhamos que a afirmação se verifica para um dado n. Queremos ver que então também se verifica para n + 1. Se α ∈ Fn+1 , como Fn+1 √ é uma extensão quadrática de Fn , α pode ser escrito na forma an + bn kn , com an , bn , kn ∈ Fn . Por hipótese de indução, an , bn ,√ kn são construtíveis. Pelos Lemas 3.1.1 e 3.1.4, conclui-se que α = an + bn kn é construtível como se desejava demonstrar. ¤ O resultado seguinte caracteriza os números construtíveis como sendo aqueles para os quais existe uma sequência finita de extensões quadráticas de Q (podemos chamar extensão multi-quadrática a uma extensão deste tipo). Teorema 3.2.5 Um número α é construtível se e só se existe uma sequência de corpos Q = F0 ⊂ F1 ⊂ ... ⊂ FN , com α ∈ FN , tal que para todo o j, 0 ≤ j ≤ N − 1, Fj+1 é uma extensão quadrática de Fj . Demonstração Consideremos os pontos (0, 0) e (1, 0) no plano cartesiano e α um número construtível. Por definição, pode ser construído um segmento de comprimento |α|. É claro que podemos usar este segmento, o ponto (0, 0) e a recta que passa pelos pontos (0, 0) e (1, 0) para construir o ponto P = (α, 0). É portanto suficiente mostrar que o ponto P pertence ao plano de um corpo FN que verifica as condições do enunciado, isto é, um corpo obtido a partir de Q através de uma sequência finita de extensões quadráticas. A construção do ponto P envolve um número finito de passos de construções fundamentais, cada um dando origem a um número finito de pontos novos resultantes de intersecções. Listemos todos estes pontos segundo a ordem da sua construção. Se no i-ésimo passo da construção resultarem, pela primeira vez, mais do que um ponto, suponhamos m pontos, estes são listados na i-ésima, i + 1-ésima, etc. posição por qualquer ordem. No i + 1-ésimo passo da construção os pontos são listados começando agora na posição i+m. Suponhamos que o ponto P se encontra na t-ésima posição. Temos então P1 , P2 , ..., Pt−1 , Pt = P . Verificamos agora que existe um corpo F, que se pode obter a partir de Q através de uma sequência de extensões quadráticas, tal que P1 , P2 , ..., Pt−1 , Pt pertencem ao plano de F. Como P1 e P2 são os dois pontos de partida, (0, 0) e (1, 0), estes pertencem desde logo ao plano de Q, estando a afirmação provada para t = 1 e t = 2. Suponhamos que um dado Pt−1 construtível pertence a uma extensão quadrática. Para mostrar que a afirmação é válida 3.2. EXTENSÕES QUADRÁTICAS 43 para qualquer t, recordemos que a construção de Pt apenas envolve figuras construídas usando os pontos P1 , P2 , ..., Pt−1 , e portanto, por hipótese de e que pode ser indução, figuras que pertencem ao plano de algum corpo F obtido de Q através de uma sequência de extensões quadráticas. No entanto, √ e e pelo Lema √ 3.2.2, Pt pertence ao plano do corpo F ou F( k), para algum e e Em cada um dos casos, Pt , assim como os outros Pi ’s, k ∈ F e k ∈ / F. pertencem ao plano de um corpo do tipo pretendido. Com o Lema 3.2.4 conclui-se o resultado. ¤ A partir da existência de extensões quadráticas de um dado número real construtível, demonstra-se que o grau desse número sobre Q será uma potência de 2. Teorema 3.2.6 Seja α um real construtível. Então degQ α é uma potência de 2. Demonstração Seja α um número construtível. Então, existe uma sequência de corpos Q = F0 ⊂ F1 ⊂ ... ⊂ FN tais que α ∈ FN e para cada j, Fj+1 é uma extensão quadrática de Fj . Deste modo, para cada j, [Fj+1 : Fj ] = 2. Aplicando sucessivamente o Teorema 1.2.4, [FN : Q] = 2N . Como α ∈ FN , Q(α) ⊂ FN . Deste modo, [FN : Q] = [FN : Q(α)] [Q(α) : Q] 2N = [FN : Q(α)] [Q(α) : Q] . Assim, nenhum dos factores do membro direito pode ter factores ímpares. Portanto, [Q(α) : Q] é uma potência de 2, que pela Proposição 1.2.16 iguala a degQ α. ¤ Usando o Teorema 2.3.5 podemos demonstrar que existe um número α cujo grau sobre Q é uma potência de 2 mas que não é construtível. Demonstrase assim que o resultado obtido em 3.2.6 não é suficiente. Proposição 3.2.7 Para todo m ≥ 2, existe um número α, tal que degQ α = 2m , e tal que α não é construtível. 44 CAPÍTULO 3. NÚMEROS CONSTRUTÍVEIS Demonstração Seja n = 2m , para algum m ∈ N \ {1}. Pelo Teorema 2.3.5, podemos considerar f (x) um polinómio sobre Q cujo grupo de Galois é isomorfo a Sn . Pela Proposição 2.1.2, f (x) é irredutível. Assim, pelo Teorema 1.2.24, f (x) não tem raízes múltiplas de onde, cada uma das suas raízes tem grau n = 2m sobre Q. Suponhamos que todas estas raízes eram construtíveis. Então, todo o elemento do corpo de decomposição E de f (x) seria construtível, uma vez que todos os elementos de E poderiam ser definidos através de combinações racionais das raízes de f (x). O grau de [E : Q] é n!, uma vez que é igual à ordem do grupo de Galois. Se escrevermos E como uma extensão simples de Q, E = Q(α), então degQ α = n!. Mas m ≥ 2 pelo que n ≥ 4. Assim, n! contém o factor ímpar 3, ou seja, n! não é uma potência de 2. Pelo Teorema 3.2.6, α não é construtível. Portanto, pelo menos uma das raízes de f não é construtível. Seja α essa raiz. ¤ Capítulo 4 Polinómios com raízes não exprimíveis por radicais As raízes de um polinómio f (x) = ¡ax2 + bx grau com coefi√ + c de segundo ¢ 2 cientes reais são dadas pela fórmula −b ± b − 4ac /2a. A mesma fórmula é válida para um polinómio f (x) ∈ F[x] onde F é um corpo de característica diferente de 2. Sobre Q, o polinómio x2 + 2x − 2 ∈ Q[x] tem como raízes ou zeros √ ¡√ ¢ −2± 4+4·2 ∈ Q 2 . A questão que se pode pôr é se fórmulas análogas 2 podem ser encontradas para polinómios de grau maior que 2 com coeficientes em Q, isto é, fórmulas que envolvam uma sequência de operações racionais e extracções de raízes. A resposta é afirmativa para polinómios de terceiro e quarto grau com coeficientes em Q. Já para polinómios de grau 5 tal nem sempre é possível. Mostrar-se-á que para cada n ≥ 5, existem polinómios de grau n tais que nenhuma das suas raízes pode ser calculada da forma desejada. 4.1 Extensões por radicais Começamos por formalizar a ideia de um elemento se conseguir obter de elementos de um dado corpo usando sequências finitas de somas, diferenças, produtos, quocientes e extracções de raízes. Definição 4.1.1 Um corpo E é uma extensão por radicais de um corpo F se existem elementos α1 , ..., αn ∈ E e inteiros positivos n1 , ..., nj tais que: 45 46CAPÍTULO 4. POLINÓMIOS COM RAÍZES NÃO EXPRIMÍVEIS POR RADICAIS 1. E = F(α1 , ..., αn ) 2. αn1 1 ∈ F 3. αni i ∈ F(α1 , ..., αi−1 ) para 1 < i < n. Um polinómio f (x) ∈ F[x] diz-se resolúvel por radicais sobre F se o seu corpo de decomposição sobre F está contido numa extensão por radicais de F. De acordo com a definição anterior um polinómio f (x) ∈ F[x] é resolúvel por radicais sobre F se conseguirmos obter todos os zeros de f (x) usando uma sequência finita de somas, diferenças, produtos, quocientes e n-ésimas raízes começando o processo com elementos de F. Definição 4.1.2 Um elemento β diz-se exprimível por radicais sobre F quando existem α1 , ..., αm tais que F(α1 , ..., αm , β) é uma extensão radical de F. Mostramos agora que relações existem entre um polinómio ser resolúvel por radicais e o grupo de Galois desse polinómio; demonstrar-se-á no fim desta secção que Teorema 4.1.3 Um polinómio é resolúvel por radicais se e só se o seu grupo de Galois for solúvel. Relembramos que um grupo G se diz solúvel se existir uma sequência de subgrupos G = H0 ⊇ H1 ⊇ ... ⊇ HN = {id} tal que cada Hi+1 é um subgrupo normal de Hi , para cada 0 ≤ i ≤ N − 1 e |Hi | / |Hi+1 | é primo. A uma sequência como a indicada antes dá-se o nome de série de decomposição de G com factores primos. Caso nada em contrário seja dito, nesta secção consideramos o polinómio f (x), F o menor corpo que contém os coeficientes de f (x) e E o seu corpo de decomposição. Relembramos agora um resultado importante da teoria de grupos; demonstrase que Sn , para n ≥ 5, não é solúvel. Necessitamos porém do seguinte lema: Lema 4.1.4 Se N é um subgrupo normal de um grupo H com índice primo p, então para quaisquer elementos φ, ψ ∈ H, φ−1 ψ −1 φψ ∈ N. 4.1. EXTENSÕES POR RADICAIS 47 Demonstração Sejam N, H, φ, ψ nas condições do enunciado do Lema. Se φ ∈ N, como N E H, ψ −1 φψ ∈ N . Como φ ∈ N e N é subgrupo de −1 −1 H, é fechado para o produto, logo © kφ ψ φψ ∈ N. ª e = φ n : n ∈ N, k ∈ Z . Facilmente se verifica Se φ ∈ / N, considere-se N e é um subgrupo normal de H. Pelo Teorema de Lagrange, como que N ¯ ¯ ¯ e¯ e N ≤ N, |N| é divisor de ¯N ¯, isto é, ¯ ¯ ¯ e¯ ¯N ¯ = q |N| ¯ ¯ ¯ e¯ para algum q. Mas ¯N ¯ | |H| e |H| = p |N|. Logo p |N| = aq |N|, para algum e já a. Como p é primo, conclui-se que q = 1 ou q = p. Como φ ∈ / N, N 6= N e Logo q 6= 1. Portanto q = p e N e = H. Podemos assim escrever que φ ∈ N. ψ ∈ H na forma ψ = φk n para alguns k ∈ Z e n ∈ N. Mas então φ−1 ψ −1 φψ = φ−1 n−1 φ−k φφk n = φ−1 n−1 φn e uma vez que N E H, φ−1 n−1 φ ∈ N. Como n ∈ N, deduz-se que φ−1 n−1 φn ∈ N, logo φ−1 ψ −1 φψ ∈ N. ¤ Proposição 4.1.5 Se n ≥ 5, então Sn não é solúvel. Demonstração Suponhamos, com vista a um absurdo, que Sn é solúvel. Assim, existe uma cadeia de subgrupos Sn = G = H0 ⊃ H1 ⊃ ... ⊃ HN = {id} tal que para cada j ∈ {0, ..., N − 1}, Hj+1 é um subgrupo normal de índice primo de Hj . Mostrar-se-á, por indução em N, que para todo o j, Hj contém todos os ciclos de comprimento 3. Isto contraria o facto de HN = {id}. Se N = 0, então G = H0 = Sn e H0 contém, em particular, todos os ciclos de comprimento 3. Suponhamos agora que Hj contém todos os ciclos de comprimento 3. Mostraremos que Hj+1 também os contém. Seja (ijk) um 48CAPÍTULO 4. POLINÓMIOS COM RAÍZES NÃO EXPRIMÍVEIS POR RADICAIS ciclo de comprimento 3 arbitrário. Uma vez que n ≥ 5, podemos escolher i, j, k, l, m ∈ N todos distintos. Sejam φ = (mji) e ψ = (ilk). Pela hipótese de indução sabemos que φ, ψ ∈ Hj . Assim, pelo Lema anterior, φ−1 ψ −1 φψ ∈ Hj+1 . Mas φ−1 ψ −1 φψ = (ijm)(kli)(mji)(ilk) = (ijk). Portanto, (ijk) ∈ Hj+1 . Como este ciclo era arbitrário, concluímos o pretendido. ¤ Atendendo à definição de polinómio resolúvel tem-se o seguinte: Corolário 4.1.6 Todo o polinómio cujo grupo de Galois é isomorfo a Sn , para algum n ≥ 5, não é resolúvel por radicais. Apresentamos agora vários lemas que nos irão permitir demonstrar o resultado desejado. Lema 4.1.7 Seja F um corpo de característica zero e f (x) ∈ F[x] irredutível tal que o seu grupo de Galois é solúvel. Então existe uma sequência de corpos F = F0 ⊂ F1 ⊂ ... ⊂ FN = E tal que, para cada j, 0 ≤ j ≤ N − 1, Fj+1 é extensão normal de Fj de grau primo. Demonstração Por hipótese, existe uma sequência de subgrupos G = H0 ⊇ H1 ⊇ ... ⊇ HN = {id} tais que cada Hj+1 é um subgrupo normal de Hj de índice primo. Tomem-se os corpos fixos de E por cada um dos Hj , F = F0 ⊂ F1 ⊂ ... ⊂ FN = E onde Fj = EHj . Como E é corpo de decomposição de f (x), E é extensão normal de F logo, pela Proposição 1.2.34, é também uma extensão normal de cada um dos corpos Fj . Assim, Hj = G(E : Fj ) (já que E é uma extensão normal e separável de Fj ). Como Hj+1 é um subgrupo normal de Hj , pelo Teorema 1.3.9 (Teorema da Correspondência de Galois) Fj+1 é uma extensão normal de Fj cujo grau é |Fj+1 : Fj | = = = = = [E : Fj ] / [E : Fj+1 ] |G(E : Fj )| / |G(E : Fj+1 )| |Hj | / |Hj+1 | |Hj : Hj+1 | p, primo, 4.1. EXTENSÕES POR RADICAIS 49 como se desejava demonstrar. ¤ Mostrar-se-á que todo o elemento de uma extensão normal de grau primo de um corpo K, pode ser obtido a partir de K usando apenas operações racionais e extracções de p-ésimas raízes. Lema 4.1.8 Seja L uma extensão normal de grau primo p sobre um corpo K de característica zero que contém as p-ésimas raízes da unidade. Então existe uma família de p − 1 elementos a1 , ..., ap−1 tais que para cada i, api ∈ K e L ⊂ K(a1 , ..., ap−1 ). Demonstração Considere-se G(L : K). Como L é normal sobre K e L é separável sobre K, |G(L : K)| = p, logo como p é primo, G(L : K) é cíclico. Seja φ um seu gerador. Pelo Teorema 1.2.26, podemos tomar r ∈ L tal que L = K(r). Como L é normal, todos os conjugados de r estão em L. Sabemos também que os automorfismos φ de G = G(L : K) transformam r nos seus conjugados. Seja ri = φi (r) para cada 1 ≤ i ≤ p. Se i, j ∈ {1, ..., p}, com i 6= j, então φi 6= φj , pelo que ri 6= rj . Como [L : K] = p, r tem exactamente p conjugados. Seja g o polinómio mínimo de r sobre K, r1 , ..., rp as suas raízes e w uma p-ésima raiz primitiva da unidade. Consideremos, para 0 ≤ j ≤ p − 1, aj = r1 + wj r2 + w2j r3 + ... + w(p−1)j rp , isto é, a0 = r1 + r2 + r3 + ... + rp , a1 = r1 + wr2 + w2 r3 + ... + w(p−1) rp , a2 = r1 + w2 r2 + w4 r3 + ... + w2(p−1) rp , .. . 2 ap−1 = r1 + wp−1 r2 + w2(p−1) r3 + ... + w(p−1) rp . Podemos considerar estas equações como um sistema linear de p equações em p incógnitas r1 , ..., rp . Note-se que a0 ∈ K uma vez que podemos pensar em a0 como um polinómio simétrico elementar nas incógnitas r1 , ..., rp , que são as raízes de g sobre K. Verificamos agora que, para 0 ≤ j ≤ p − 1, os (aj )p são invariantes por G(L : K) e que (aj )p ∈ K. Tem-se que, para cada 50CAPÍTULO 4. POLINÓMIOS COM RAÍZES NÃO EXPRIMÍVEIS POR RADICAIS 0 ≤ j ≤ p − 1 e para cada φ ∈ G(L : K), φ [(aj )p ] = [φ (aj )]p £ ¤p = φ (r1 ) + wj φ (r2 ) + w2j φ (r3 ) + ... + w(p−1)j φ (rp ) £ ¤p = r2 + wj r3 + w2j r4 + ... + w(p−1)j r1 £ ¤p = w−j aj = (aj )p , portanto (aj )p ∈ K. Calculemos agora o determinante da matriz dos coeficientes do sistema de equações acima: ¯ ¯ 2 3 p−1 ¯ 1 ¯ 1 1 1 · · · 1 ¯ ¯ 2 3 p−1 ¯ 1 w ¯ w w ··· w ¯ ¯ 2 3 p−1 2 2 2 ¯ 1 w2 ¯ (w ) (w ) · · · (w ) ¯ ¯ ¯ .. ¯ ¯ . ¯ ¯ ¯ 2 3 p−1 ¯ 1 wp−1 (wp−1 ) (wp−1 ) · · · (wp−1 ) ¯ O que se obtém é o determinante de Vandermonde o qual é Y ¡ j ¢ w − wi . 0≤i<j≤p−1 Este determinante é não nulo uma vez que wj 6= wi , quando 0 ≤ i < j ≤ p−1. Assim, como a matriz é não singular, pela regra de Cramer, os ri ’s podem ser obtidos a partir dos aj ’s e de w através de operações racionais. Deste modo, para cada i, ri ∈ K(a1 , ..., ap−1 ), de onde L = K(r) ⊂ K(a1 , ..., ap−1 ). ¤ Lema 4.1.9 Seja K um corpo de característica zero. Se L é uma extensão normal e radical de K então G(L : K) é um grupo solúvel. Demonstração Seja L = K(α1 , ..., αn ), com αn1 1 ∈ K e αni i ∈ K(α1 , ..., αi−1 ), para alguns n1 , ..., nn ∈ N. É fácil demonstrar que podemos, sem perda de generalidade, supor que todos os expoentes ni são primos. Seja p um primo tal que αp1 ∈ K. A demonstração efectua-se agora por indução em n. Se n = 0, L = K e G(L : K) = {id}, logo solúvel. Suponhamos agora o resultado para extensões radicais da forma K(β 1 , ..., β j ) tal que β ni i ∈ K(β 1 , ..., β i−1 ) e j < n. Se α1 ∈ K então L = K(α2 , ..., αn ) e o 4.1. EXTENSÕES POR RADICAIS 51 resultado é válido por hipótese de indução. Supomos agora que α1 ∈ / K. Seja f (x) o polinómio mínimo de α1 sobre K. Assim deg f (x) ≥ 2 e como L é uma extensão normal de K, f (x) decompõe-se em factores lineares em L[x]. Como K é um corpo de característica zero, pelo Teorema 1.2.24, todas as raízes de f (x) são distintas. Seja β 6= α1 uma raiz de f (x). Como αp1 ∈ K (onde p = n1 , primo), α1 é raiz de xp − a, para algum a ∈ K. Consequentemente, f (x) divide xp − a. Como β é um zero de f (x), β p − a = 0. Logo µ α1 β ¶p = 1. Como p é primo e β 6= α1 , αβ1 tem ordem prima p no grupo (L − {0} , ·) e ³ ´2 ³ ´p−1 1, αβ1 , αβ1 , ..., αβ1 são as p raízes distintas do polinómio g(x) = xp − 1 em L. O corpo M = K( αβ1 ) ⊆ L é um corpo de decomposição de g(x) sobre K. Obtemos assim a seguinte cadeia K ⊆ M = K( α1 ) ⊆ M(α1 ) ⊆ L. β Uma vez que as raízes de xp − αp1 são da forma εα1 , onde ε ∈ M é raiz de xp − 1 (ver, por exemplo, [4, Proposição 7.6.10]), tem-se que M(α1 ) é corpo de decomposição de xp − αp1 sobre M. Mais, cada M-automorfismo de M(α1 ) é determinado pela imagem do elemento α1 ; para cada ϕ ∈ G(M(α1 ) : M) ϕi (α1 ) = εi α1 , onde εi é raiz de xp − 1. Assim, G(M(α1 ) : M) é abeliano. Uma vez que M é corpo de decomposição de xp − 1, existem p raízes distintas e o conjunto das raízes do polinómio constitui um grupo cíclico para o produto. Sendo α um gerador do grupo das raízes, qualquer K-automorfismo fica determinado pela sua imagem, a qual será αj para j ∈ {0, ..., p − 1}. Assim G(M : K) é cíclico. Temos que L = K(α1 , ..., αn ) = M(α1 , ..., αn ) = M(α1 )(α2 , ..., αn ) é extensão normal e radical de M(α1 ), logo por hipótese de indução, G(L : M(α1 )) é solúvel. 52CAPÍTULO 4. POLINÓMIOS COM RAÍZES NÃO EXPRIMÍVEIS POR RADICAIS Como L é uma extensão finita, normal e separável de K, o mesmo acontece a M, pela Proposição 1.2.34. Pelo Teorema 1.3.9 tem-se que G(M(α1 ) : M) ∼ = G(L : M) . G(L : M(α1 )) Como G(M(α1 ) : M) é abeliano e G(L : M(α1 )) é solúvel, G(L : M) é solúvel [11, Teorema 4.11.14]. Aplicando agora o Teorema 1.3.9 à sequência de extensões K⊂M⊂L tem-se G(L : K) G(M : K) ∼ . = G(L : M) Como G(M : K) é abeliano e G(L : M) é solúvel, deduz-se que G(L : K) é solúvel como se pretendia, [11, Teorema 4.11.14]. ¤ Introduzimos agora uma nova definição necessária para o desenrolar do trabalho Definição 4.1.10 Seja L uma extensão algébrica de K. Dizemos que uma extensão N de L é um fecho normal de L se: 1. N é uma extensão normal de K; 2. Se M é um corpo tal que L ⊂ M ⊂ N e M é extensão normal de K, então M = N. Estão agora reunidos os requisitos necessários para demonstrar o Teorema pretendido Demonstração do Teorema 4.1.3 Seja f (x) um polinómio sobre um corpo F de característica zero, E o seu corpo de decomposição e suponhamos que G(E : F) é solúvel. Pelo Lema 4.1.7 existe uma sequência de corpos tais que F = F0 ⊂ F1 ⊂ ... ⊂ FN = E, |Fj+1 : Fj | = pj e Fj+1 é extensão normal de Fj . Para cada j ∈ {0, ..., N − 1} seja wj uma pj -ésima raiz primitiva da unidade e considere-se Fj (wj ) e Fj+1 (wj ). Sabemos que |Fj (wj ) : Fj | = degFj (wj ) ≤ pj − 1 e |Fj+1 (wj ) : Fj+1 | |Fj+1 : Fj | = |Fj+1 (wj ) : Fj | = |Fj+1 (wj ) : Fj (wj )| |Fj (wj ) : Fj | . 4.1. EXTENSÕES POR RADICAIS 53 Como p = |Fj+1 : Fj | e |Fj (wj ) : Fj | ≤ pj − 1, das igualdades anteriores conclui-se que p | |Fj+1 (wj ) : Fj (wj )|. Portanto, |Fj+1 (wj ) : Fj (wj )| ≥ p. Mas, |Fj+1 (wj ) : Fj+1 | = degFj+1 wj ≤ degFj wj = |Fj (wj ) : Fj | . Logo, |Fj+1 (wj ) : Fj (wj )| ≤ p, de onde |Fj+1 (wj ) : Fj (wj )| = p. Como Fj+1 = Fj (aj ) para algum aj , seja gj o polinómio mínimo de aj sobre Fj . Então Fj+1 (wj ) é o corpo de decomposição de gj (x)(xpj − 1) sobre Fj (note-se que Fj+1 é extensão normal de Fj ). Logo Fj (wj ) ⊂ Fj+1 (wj ) é uma extensão normal de grau p. Pelo Lema 4.1.8, Fj+1 ⊆ Fj (wj , aj1 , ..., ajpj −1 ) tal p que para cada i, aj j ∈ Fj . Considere-se E0 = F(w0 , a0,1 , ..., a0,p0 −1 , ..., wN−1 , aN−1,1 , ..., aN−1,pN −1 −1 ) extensão por radicais de F. Como E = FN = FN−1 (wN−1 , aN −1,1 , ..., aN−1,pN −1 −1 ), demonstra-se, atendendo à construção dos aji , que E ⊆ E0 . Mas então, f (x) é resolúvel por radicais. Reciprocamente, suponhamos que f (x) é resolúvel por radicais. Por definição, o corpo de decomposição de f (x) sobre F está contido numa extensão de F por radicais, E. Seja M uma extensão radical de F, com F ⊆ E ⊆ M, G = G(E : F), K = EG e N um fecho normal da extensão K. Assim, F ⊆ K ⊆ E ⊆ M ⊆ N. Como M é uma extensão radical de K, por definição, M = K(α1 , ..., αr ), com αn1 1 ∈ K e αni i ∈ K(α1 , ..., αi−1 ). Seja fi (x) o polinómio mínimo de αi sobre K para cada i ∈ {1, ..., r}. É fácil verificar que sendo N o fecho normal de M sobre F, N é o corpo de decomposição do polinómio f1 (x) · ... · fn (x). Sejam β ij os zeros de fi (x), para cada i ∈ {1, ..., r}. Para cada β ij podemos estabelecer um isomorfismo σ ij : K(αi ) −→ K(β ij ). o qual se estende a um K-automorfismo de N. Como cada αi é exprimível por radicais sobre K, β ij também o é. Logo, N é uma extensão radical de K. Pelo Lema 4.1.9, G(N : K) é solúvel. Como E é uma extensão normal de K (E é corpo de decomposição de um polinómio sobre K), pelo Teorema 1.3.9, G(N : K) G(E : K) ∼ . = G(N : E) 54CAPÍTULO 4. POLINÓMIOS COM RAÍZES NÃO EXPRIMÍVEIS POR RADICAIS Assim, G(E : K) é solúvel. Por [11, Teorema 4.11.14], uma vez que G(E : F) = G(E : K), tem-se o pretendido. ¤ 4.2 Polinómios sem zeros exprimíveis por radicais Pretendemos agora construir polinómios cujos zeros não sejam exprimíveis por radicais. Começamos por verificar que todos os zeros de polinómios de terceiro e quarto graus podem ser expressos por radicais. Considere-se a equação ax3 + bx2 + cx + d = 0 onde a, b, c, d ∈ F corpo de característica zero. Vemos agora que todas as equações do terceiro grau são resolúveis por radicais. Sem perda de generalidade podemos supor que a = 1. Assim, x3 + bx2 + cx + d = 0. Aplicando a seguinte mudança de variável x=y+L para algum L ∈ F, obtém-se a equação ¡ ¢ y 3 + (3L + b) y 2 + 3L2 + 2bL + c y + L3 + bL2 + cL + d = 0. Fazendo L = −b/3, obtém-se uma equação do tipo y 3 + By + C = 0, para alguns B, C ∈ F. Se C = 0, a resolução é evidente. Se C 6= 0, y = 0 não é solução da equação. Fazendo a substituição y = z + K/z, para algum K, tem-se z 6 + (3K + B) z 4 + Cz 3 + (3K + B) Kz 2 + K 3 = 0. Neste caso, dois coeficientes anulam-se quando se substitui K por −B/3, resultando a equação z 6 + Cz 3 + K 3 = 0. 4.2. POLINÓMIOS SEM ZEROS EXPRIMÍVEIS POR RADICAIS 55 Esta equação pode agora ser resolvida do mesmo modo que uma equação quadrática, considerando ¡ 3 ¢2 ¡ ¢ z + C z 3 + K 3 = 0. Demonstra-se assim que Lema 4.2.1 Seja F um corpo de característica zero. Então, todo o polinómio p(x) = ax3 + bx2 + cx + d ∈ F [x] é resolúvel por radicais. Demonstramos que um resultado análogo é válido para equações de grau 4. Lema 4.2.2 Seja F um corpo de característica zero. Então, todo o polinómio p(x) = ax4 + bx3 + cx2 + dx + e ∈ F[x] é resolúvel por radicais. Demonstração Se a = 0 estamos nas condições do Lema 4.2.1. Se a 6= 0, podemos, sem perda de generalidade, supor que a = 1. Assim, x4 + bx3 + cx2 + dx + e = 0. Da mudança de variável x=y− b 4 resulta uma equação do tipo y 4 + Cy 2 + Dy + E = 0. Somando a ambos os membros da equação anterior o termo y 2 t + é um elemento do corpo F, obtemos µ ¶2 ∙ ¸ t t2 2 2 y + − y (t − C) − Dy + − E = 0. 2 4 t2 , 4 onde t De forma a que t2 −E 4 seja um quadrado perfeito, escolhemos t tal que o binómio discriminante da 2 equação y 2 (t − C) − Dy + t4 − E = 0 seja nulo, isto é, ¶ µ 2 t 2 (−D) − 4 (t − C) − E = 0, 4 y 2 (t − C) − Dy + 56CAPÍTULO 4. POLINÓMIOS COM RAÍZES NÃO EXPRIMÍVEIS POR RADICAIS obtendo a equação do terceiro grau −t3 + Ct2 + 4Et + D2 − 4CE = 0. Pelo Lema 4.2.1 esta equação é resolúvel por radicais. Seja t0 uma das suas raízes. Então, µ ¶2 t20 D 2 . y (t0 − C) − Dy + − E = (t0 − C) y − 4 2(t0 − C) Assim, µ µ ¶2 ¶2 t0 D 2 y + − (t0 − C) y − = 0. 2 2 (t0 − C) Usando a diferença do quadrado, µ µ ∙ ¶¸ ∙ ¶¸ p p D D 2 2 y + t0 /2 − t0 − C y − y + t0 /2 + t0 − C y − = 0. 2 (t0 − C) 2 (t0 − C) Igualando cada termo a zero obtemos y em função de radicais, e consequentemente x, como era pretendido. ¤ No lema seguinte demonstramos que se alguma raiz de um dado polinómio irredutível pode ser obtida por radicais, então todas podem. Lema 4.2.3 Seja f (x) ∈ F[x] irredutível e r uma raiz de f (x) exprimível por radicais. Então f (x) é solúvel por radicais. Demonstração Seja f (x) ∈ F[x] irredutível e r uma raiz de f (x) exprimível por radicais. Então existem α1 , ..., αm+1 tais que 1. αn1 1 ∈ F, 2. αni i ∈ F(α1 , ..., αi−1 ), 3. r ∈ F (α1 , ..., αm+1 ), para alguns n1 , ..., nm , m ∈ Z. Seja Fi = F (α1 , ..., αi−1 ). Assim, Fj+1 = Fj (αj ) e r ∈ F (α1 , ..., αm , αm+1 ). Tome-se αm+2 = r. n Seja bj = αj j ∈ Fj−1 e sejam bj = bj1 , bj2 , ..., bjmj os conjugados de bj em Fe gj (x) = (xnj − bj1 )(xnj − bj2 )...(xnj − bjmj ). 4.2. POLINÓMIOS SEM ZEROS EXPRIMÍVEIS POR RADICAIS 57 Assim definido, g(x) é um polinómio cujos coeficientes são os polinómios simétricos avaliados em bj1 , bj2 , ..., bjmj . Assim, para cada j, gj (x) ∈ F[x]. Considere-se m+1 Q h(x) = gj (x) ∈ F[x] j=1 e E o seu corpo de decomposição sobre F. Assim, E = F(b11 , ..., b1m1 , b21 , ..., b2m2 , ..., bm+1,1 ..., bm+1,mm+1 ) e E é uma extensão por radicais de F. Como E é corpo de decomposição de um polinómio, E é normal. Uma vez que r ∈ E, todas as raízes de f (x) estão em E. Consequentemente, f (x) é resolúvel por radicais. ¤ Mostra-se assim que se uma raiz de um polinómio irredutível pode ser exprimível por radicais, todas podem. Caracterizamos agora o grupo de Galois de um polinómio de grau primo sobre Q dependendo do número das suas raízes reais. Lema 4.2.4 Seja f (x) ∈ Q[x] um polinómio irredutível de grau primo p. Se f (x) tem duas e só duas raízes complexas não reais, então o grupo de Galois de f (x) é o grupo simétrico Sp . Demonstração Seja L (⊆ C) o corpo de decomposição de f (x) sobre Q e G o grupo de Galois de f (x) sobre Q. Uma vez que Q tem característica zero, p(x) tem exactamente p raízes distintas, logo |G| ≤ p!. Note-se que, por construção de corpo de decomposição, p divide [L : Q]. Pelo Teorema 1.3.9, p divide |G|, logo, pelo Teorema de Cauchy, G tem um elemento de ordem p, isto é, um ciclo de comprimento p. Consideremos o Q-automorfismo de L induzido pela conjugação dos números complexos. Assim, este mantém invariante os p − 2 zeros reais de f (x) e que permuta os dois zeros não reais. Então, G contém uma transposição. Uma vez que G contém um ciclo de comprimento p e uma transposição G = Sp . ¤ Usando o Lema anterior podemos agora construir um polinómio de grau 5 resolúvel por radicais sobre Q. Consideremos o polinómio p(x) = x5 − 6x + 3. 58CAPÍTULO 4. POLINÓMIOS COM RAÍZES NÃO EXPRIMÍVEIS POR RADICAIS Pelo critério de Eisenstein, Teorema 1.1.12, p(x) é um polinómio irredutível em Q[x]. Tem-se que p(−2) = −17 p(−1) = 8 p(1) = −2 p(2) = 23 e uma vez que p0 (x) = 5x4 − 6 tem dois zeros reais, resulta que p(x) tem exactamente três raízes reais. Uma vez que Q tem característica zero, p(x) não pode ter raízes múltiplas. Portanto p(x) tem duas raízes complexas não reais. Pelo Lema 4.2.4, o grupo de Galois de p(x) será S5 , que não é um grupo solúvel. Logo, pelo Teorema 4.1.3, o polinómio p(x) não é resolúvel por radicais sobre Q. Multiplicando o polinómio p(x) por xk , obtemos um polinómio de grau 5+k o qual não é resolúvel por radicais. Mostra-se assim o Teorema de Abel. Teorema 4.2.5 (Teorema de Abel) Para cada n ≥ 5, existem polinómios de grau n não resolúveis por radicais. Isto é, mostra-se a existência de polinómios de grau n, para cada n ≥ 5, para os quais existe pelo menos uma raiz não exprimível por radicais. Notese que os polinómios construídos para a demonstração do Teorema de Abel resultam do produto de um polinómio de grau 5 por uma potência adequada de x, logo não são irredutíveis. Usando o Teorema 2.3.5 demonstra-se, para cada n ≥ 5, a existência de polinómios sobre Q de grau n tal que nenhuma das suas raízes é exprimível por radicais. Teorema 4.2.6 Para cada n ≥ 5, existe um polinómio sobre Q de grau n tal que nenhum dos seus zeros pode ser exprimível por radicais. Demonstração Seja n ≥ 5. Pelo Teorema 2.3.5, existe um polinómio p(x) sobre Q cujo grupo de Galois é Sn . Pelo Lema 4.1.5, Sn não é solúvel. Assim, pelo Teorema 4.1.3, p(x) não é resolúvel por radicais. Porém, como o grupo de Galois de p(x) é Sn , pela Proposição 2.1.2, p(x) é irredutível. Pelo Lema 4.2.3, conclui-se que nenhuma das suas raízes pode ser exprimível por radicais. ¤ Capítulo 5 Problema Inverso de Galois O problema inverso da teoria de Galois consiste em descobrir em que condições podemos encontrar uma extensão de um corpo K com um dado grupo de Galois. Por outras palavras, dado G um grupo finito e K um corpo, a questão é: será que existe uma extensão de Galois L/K, finita, tal que o grupo de Galois da extensão é isomorfo ao grupo G? Neste capítulo estudaremos extensões de Galois do tipo C(x) ⊂ L, ou, mais geralmente, do tipo K(x) ⊂ L, onde K é um corpo algebricamente fechado de característica zero. Pelo Teorema do Elemento Primitivo (Teorema 1.2.26) existe y ∈ L tal que L = C(x)(y) e y é algébrico sobre C(x). Assim, existe F (x, z) ∈ C(x)[z] tal que F (x, y) = 0. Tenta-se encontrar y que seja uma série de potências em x, C[[x]]. Começamos por caracterizar extensões finitas de K((t)) = Λ, corpo de fracções de K[[t]]. Na segunda secção trabalhamos com extensões de Galois de K(x) e a estas associamos dois invariantes, o índice de ramificação e a classe de conjugação. Fixado um grupo G finito, um subconjunto finito de P1C e uma família C de classes de conjugação não triviais indexadas por P , ao terno Γ = [G, P, C] damos o nome de tipo de ramificação. A uma extensão de Galois fazemos corresponder um tipo de ramificação, já que demonstramos que os pontos de ramificação são finitos. O Teorema da Existência de Riemann (Teorema 5.2.13) será apenas enunciado, uma vez que não é conhecida alguma demonstração algébrica. Este teorema dá-nos condições necessárias e suficientes para que existam extensões de Galois de C(x) de determinado tipo. A secção e o capítulo é terminado com a demonstração da unicidade de extensões de Galois de C(x) de determinado tipo. Para tal introduzimos o conceito de tipo (fracamente) rígido. 59 60 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS 5.1 Extensões das Séries Formais de Laurent Seja K um corpo algebricamente fechado de característica zero. Nesta secção construímos Λ o corpo das séries formais de Laurent sobre K e demonstramos algumas das suas propriedades. Em particular, descrevemos as suas extensões finitas. Começamos por definir o conjunto de certas sequências em K: Definição 5.1.1 Seja K um corpo. Definimos Λ como sendo o conjunto das sequências (ai )i∈Z , com ai ∈ K tal que existe um inteiro n ∈ Z tal que ai = 0, para todo i < n. Em Λ, define-se uma adição e uma multiplicação da seguinte forma: (ai ) + (bi ) = (ai + bi ) e (ai ) . (bj ) = (cn ) = à X i+j=n ai bj ! . Lema 5.1.2 Seja K um corpo. O conjunto Λ definido na definição 5.1.1, algebrizado com as operações definidas antes, é um corpo. Demonstração O conjunto Λ é um anel comutativo, cujo elemento neutro da adição é a sequência formada apenas por zeros e cujo elemento neutro da multiplicação é a sequência ½ 1 se i = 0 (ai ) = 0 se i 6= 0 . Seja (ai )i∈Z ∈ Λ um elemento não nulo. Então existe um inteiro N ∈ Z tal que ai = 0 para i < N e aN 6= 0. Seja bj = 0 para j < −N e b−N = a−1 N . Então, a equação X ai bj = 0, n = 1, 2, ... i+j=n pode ser resolvida em bj indutivamente fazendo,, j = −N + 1, −N + 2, .... A sequência (bi ) será o elemento inverso de (ai ). As restantes propriedades são facilmente demonstráveis, deduzindo-se que Λ é de facto um corpo. ¤ 5.1. EXTENSÕES DAS SÉRIES FORMAIS DE LAURENT 61 Podemos considerar K um subcorpo de Λ através do seguinte mergulho: K → a Λ 7−→ (ai ) := ½ a0 = a . ai = 0, se i 6= 0 Seja t := (ti ) a sequência tal que t := (ti ) = ½ t1 = 1 ti = 0, i 6= 1 e K[t] o subanel de Λ gerado por K e t. K[t] é o anel de polinómios sobre K na variável t cujos elementos são da forma M X ai ti , (ai ) = i=0 com ai = 0 se i < 0 ou i > M. Dado (ai )i∈Z ∈ Λ tal que ai = 0 se i < n para algum n ∈ Z, podemo-lo escrever da seguinte forma ∞ X (ai ) = ai ti . i=n Assim, chamamos a Λ o corpo das séries formais de Laurent sobre K e notamos Λ = K((t)). Ao subanel de Λ (∞ ) X i K[[t]] := ai t ∈ Λ i=0 dá-se o nome de anel das séries de potências formais sobre K. O lema seguinte relaciona-nos os vários anéis introduzidos até ao momento: Lema 5.1.3 Seja K um corpo. Tem-se que K(t) ⊆ K((t)), K(t) é o corpo das fracções de K[t] e Λ = K((t)) é o corpo das fracções de K[[t]]. Proposição 5.1.4 K[[t]] é um domínio de factorização única e y n − t é irredutível em K((t))[y] qualquer que seja n ∈ N. 62 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS Demonstração Note-se que em K[[t]] todo o elemento da forma ∞ P ai ti com i=0 a0 6= 0 é invertível e que t é primo. É então fácil concluir que K[[t]] é um domínio de factorização única. Como t é primo e K[[t]] é DFU, pelo critério de Eisenstein ( [4, exercício 3.8.3]) y n − t é irredutível em K((t))[y] qualquer que seja n ∈ N. ¤ A aplicação K[[t]] −→ K ∞ P ai ti 7−→ a0 ϕ: i=0 é um homomorfismo de anéis. Dado F (y) ∈ K[[t]][y] um polinómio com coeficientes em K[[t]] na incógnita y, podemos construir F0 (y) ∈ K[y] da seguinte forma; se à ! M ∞ P P ai,j tji y i , F (y) = i=0 F0 (y) = M P i=0 ϕ à ∞ P ji =0 ai,j tji ! yi = M P ji =0 ai,0 y i , isto é, estendemos ϕ a um homo- i=0 morfismo de K[[t]][y] em K[y]. A proposição seguinte permite-nos relacionar factorização em K[y] com factorização em K[[t]][y]. Proposição 5.1.5 (Lema de Hensel) Seja F um polinómio mónico na variável y com coeficientes em K [[t]]. Suponhamos que o polinómio associado a F (y), F0 (y) ∈ K [y] se factoriza F0 = gh, para g, h ∈ K [y] polinómios mónicos tais que m.d.c (g, h) = 1. Então, F = GH, com G, H polinómios mónicos na variável y e com coeficientes em K [[t]] tais que G0 = g, H0 = h. 5.1. EXTENSÕES DAS SÉRIES FORMAIS DE LAURENT 63 Demonstração Seja F tal como nas hipóteses do enunciado do Lema. Podemos escrever ∞ P F = Fi ti i=0 com Fi ∈ K[y]. Seja M := deg(F ) = deg(F0 ). Então, deg(Fi ) < M para todo i > 0. Seja r = deg(g) e s = deg(h). Pretendemos encontrar G= ∞ P Gi ti e H = i=0 ∞ P Hi ti i=0 com G0 = g, H0 = h e Gi , Hi ∈ K[y] de graus inferiores que r e s, respectivamente. A condição F = GH é equivalente ao sistema de equações P Fn = Gi Hj , i+j=n para cada n = 0, 1, .... Estas equações serão resolvidas por indução. Por hipótese, para n = 0, F0 = gh = G0 H0 . Suponhamos que para dado n > 0 se tem para qualquer m ∈ {1, ..., n − 1}, P Fm = Gi Hj . i+j=m Então da n-ésima equação Fn = P Gi Hj i+j=n deduz-se que Fn − Seja Un = Fn − n−1 P i=1 n−1 P Gi Hn−i = G0 Hn + H0 Gn (1) i=1 Gi Hn−i . Assim definido, Un ∈ K[y] e tem grau inferior a m. Como, por hipóteses, (G0 , H0 ) = 1, o ideal gerado por eles é K[y]. Logo, existem polinómios P, Q ∈ K[y] tais que G0 P + H0 Q = Un . Pelo algoritmo da divisão, podemos escrever P = H0 S + R 64 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS para alguns polinómios R, S ∈ K[y], tais que deg(R) < deg(H0 ) = s. Sejam Hn = R e Gn = Q + G0 S. Então, de (1) tem-se G0 R + H0 (Q + G0 S) = = = = G0 R + H0 Q + H0 G0 S G0 (H0 S + R) + H0 Q G0 P + H0 Q Un com deg(Hn ) = deg(R) < s. Uma vez que deg(G0 ) = r, deg(Hn ) < s, m = rs e H0 Gn = Un − G0 Hn deduz-se que deg(H0 Gn ) < m. Logo, deg(Gn ) < r. ¤ Note-se que K[[y]] é um anel local completo (é de facto a completação mádica com m = hyi em K[y], com K algebricamente fechado de característica zero cujo ideal maximal é hyi). A Proposição 5.1.5, exactamente com o mesmo enunciado, é válida para anéis locais completos (em vez de K[[t]] e em vez do homomorfismo ϕ usamos A[y] −→ (A/m) [y] onde m é o ideal maximal do anel local, [2, Exercício 9]). Deduzimos agora algumas consequências do Lema de Hensel (Proposição 5.1.5) que serão necessárias para o desenvolvimento do trabalho. Corolário 5.1.6 Seja K um corpo algebricamente fechado de característica zero e F um polinómio com coeficientes em K [[t]] na variável y de grau superior a 1. Se o coeficiente de F0 , de grau n, em y n−1 é zero e F0 (y) 6= y n , então F factoriza-se em F = GH, com G, H polinómios mónicos na variável y com coeficientes em K [[t]]. Demonstração Como K é um corpo algebricamente fechado, o polinómio F0 ∈ K[y] decompõem-se num produto de polinómios mónicos lineares. Suponhamos que estes factores lineares não são todos iguais. Então, F0 = gh, onde g, h são polinómios não constantes e (g, h) = 1 em K[y]. Neste caso, o resultado segue do lema anterior. 5.1. EXTENSÕES DAS SÉRIES FORMAIS DE LAURENT 65 Por outro lado, se os factores em que F0 se decompõe forem todos iguais, podíamos escrever F0 = (y − a)n , a ∈ K = y n − nay n−1 + ... Como, por hipótese, o coeficiente do termo y n−1 é zero, teríamos que a = 0, dado que K é um corpo de característica zero. Deste modo teríamos F0 = y n , o que contraria a hipótese inicial. Logo, F = GH, para alguns G, H ∈ K[[t]][y] mónicos. ¤ Corolário 5.1.7 Seja K um corpo algebricamente fechado de característica ∞ P ai ti com a0 6= 0. Então, para qualquer n ∈ N, zero e g ∈ K[[t]] da forma i=0 existe f ∈ K[[t]] tal que f n = g. Demonstração Seja g ∈ K[[t]] nas condições do enunciado do Lema e a0 6= 0. Considere-se F (y) = y n − g ∈ K[[t]][y]. Assim, tem-se que F0 (y) = y n − a0 . Como K é algebricamente fechado podemos escrever F0 (y) como produto de polinómios lineares mónicos. Note-se que F0 (y) tem n raízes distintas. Seja a1 uma raiz simples de F0 (y). Então existe g ∈ K[y] tal que F0 (y) = (y − a1 )g e (y − a1 , g) = 1. Pelo Lema de Hensel, Proposição 5.1.5, existem H, G ∈ K[[t]][y] mónicos tais que H0 = y − a1 , G0 = g e F = HG. Logo, ∞ P H = y− bi ti onde b0 = a1 , isto é, F (y) tem raiz em K[[t]] como se desejava i=0 demonstrar. ¤ Introduzimos agora um novo conjunto; dado e um número natural seja Z1/e o conjunto de todos os números racionais da forma ei , com i ∈ Z, isto é, Z1/e = {i/e : i ∈ Z} . £ ¤ Proposição 5.1.8 O grupo aditivo Z1/e é isomorfo a Z e Z1/e : Z = e. Demonstração A aplicação α : Z → Z1/e i 7→ i/e 66 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS representa um isomorfismo entre Z1/e e Z. ¤ Seja Λe o conjunto das sequências (aj )j∈Z1/e com aj ∈ K, tais que aj = 0 para quase todos os j < 0. Defina-se a adição e a multiplicação de forma análoga à definida para Λ. Então: Lema 5.1.9 Λe é um corpo e a aplicação α: → Λ Λe (aj )j∈Z1/e 7→ (bi ) onde bi = ai/e , é um ½ isomorfismo. a1/e = 1 Tomando τ := , tem-se que α (τ ) = t. aj = 0, caso contrário O corpo Λ pode ser visto como um subcorpo de Λe identificando cada elemento (aj )j∈Z ∈ Λ com (ãj )j∈Z1/e onde ãj = 0 se j ∈ / Z, ãj = aj se j ∈ Z. e Verifica-se então que τ = t. Note-se também que, se e | e0 , então Λe é subcorpo de Λe0 . Dado (aj ) ∈ Λe , este pode ser escrito da forma X X P aj tj = ai τi = bi τ i , (aj ) = j∈Z1/e e i∈Z i∈Z ¡¡ ¢¢ identificamos assim Λe com K t1/e = K ((τ )). Definição 5.1.10 Um elemento ζ ∈ K tal que ζ n = 1 diz-se uma n-ésima raiz da unidade. Assim, o conjunto das n raízes da unidade coincide com as raízes do polinómio xn − 1. Estas raízes formam um grupo cíclico. Às raízes geradoras deste grupo chamamos raiz primitiva da unidade. Introduzimos agora condições suficientes para o corpo Λe ser uma extensão de Galois de Λ. Lema 5.1.11 Suponhamos que K contém ζ e uma e-ésima raiz primitiva da unidade. Então Λe é Galois sobre Λ de grau e. O grupo de Galois associado à extensão é cíclico, gerado pelo elemento → P ¡ Λe ¢ ω : PΛe i bi τ 7→ bi ζ ie τ i . i∈Z i∈Z Tem-se ainda que Λe = Λ (τ ) com τ e = t. 5.1. EXTENSÕES DAS SÉRIES FORMAIS DE LAURENT 67 Demonstração Note-se que pela observação anterior enunciado do Lema, P ao i cada elemento de Λe pode ser escrito na forma bi τ . i∈Z ω : Λe → Λe é um automorfismo de corpos. Assim definido, P Seja x = bi τ i ∈ Λe qualquer tal que i∈Z ω à X bi τ i i∈Z Assim, X i∈Z bi ζ ie ! X = bi τ i . i∈Z X bi ζ ie τ i = bi τ i . i∈Z = bi . Assim, bi = 0 ou ζ ie = 1. Se bi 6= 0, como Logo, para cada i ∈ Z, ζ e é uma e-ésima raiz primitiva da unidade, e | i, isto é, i = je. Ora τe = t logo τ i = τ je = tj . Dado que X X X bi τ i = bi τ i = bje tj ∈ Λ x= i∈Z bi 6=0∧e|i conclui-se quePx ∈ Λ e (Λe )G = Λ onde G = hωi. Dado x = bi τ i ∈ Λe tem-se que i∈Z ωe à X i∈Z bi τ i ! = X i bi ζ ie e τ = Logo o(ω) < e. Seja n ∈ N tal que ωn = id. Assim, ωn (τ ) = τ logo ζ ne τ = τ concluindo que ζ ne = 1 X bi τ i = x. 68 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS e consequentemente que e | n. Logo o(ω) = e e G = hωi é um grupo finito de ordem e. Pelo Teorema de Artin, Teorema 1.3.10, conclui-se que Λe é de Galois sobre Λ e o grupo de Galois da extensão é hωi. Mais, tem-se que ¤ [Λe : Λ] = |G(Λe : Λ)| = e. O Teorema seguinte descreve-nos as extensões finitas de corpos das séries formais de Laurent sobre corpos K algebricamente fechados de característica zero. Teorema 5.1.12 Seja K um corpo algebricamente fechado de característica zero. Seja ∆ uma extensão de corpos de Λ = K ((t)) de grau finito e. Então ∆ = Λ (δ) com δ e = t. Com vista a demonstrar o Teorema 5.1.12, começamos por demonstrar um resultado acerca da existência de raízes para alguns polinómios com coeficientes em K[[t]]. Demonstra-se que todo o polinómio sobre Λ tem uma raiz em algum Λe . Mostramos depois que os dois resultados, Lema 5.1.13 e Teorema 5.1.12 são equivalentes, obtendo assim uma demonstração do resultado pretendido. Lema 5.1.13 Seja K um corpo algebricamente fechado de característica zero. Seja F um polinómio mónico não constante com coeficientes em K [[t]] na variável y. Então F tem uma raiz em Λe , para algum e. Demonstração A demonstração é feita por redução ao absurdo. Suponhamos que existem polinómios não constantes com coeficientes em K[[t]] na variável y sem raízes em Λe , qualquer que seja e. Seja F um polinómio de grau mínimo entre os polinómios sem raízes em qualquer Λe . Então n = deg(F ) ≥ 2, F (y) = y n + λn−1 y n−1 + ... + λ0 com λν ∈ K [[t]]. Então o polinómio Fe(y) = F (y − λn−1 ) n´ ³ ´n−1 ³ n λn−1 y − + λ + ... + λ0 = y − λn−1 n−1 n n .. . = (y n − λn−1 y n−1 + ...) + λn−1 (y n−1 − ...) 5.1. EXTENSÕES DAS SÉRIES FORMAIS DE LAURENT 69 tem o coeficiente do termo y n−1 nulo. Portanto podemos, sem perda de generalidade escolher um polinómio com coeficiente em y n−1 nulo. Suponhamos que F0 (y) 6= y n . Então, pelo Corolário 5.1.6, F (y) decompõe-se, contrariando a minimalidade de F (y). Portanto F0 (y) = y n , concluindo-se que todos os λν têm os termos constantes nulos. Sabemos que, para algum ν = 0, 1, ..., n − 2, λν 6= 0, caso contrário, F (y) = y n admitiria a raiz nula. Consideremos apenas tais ν. Seja mν a menor potência de t que ocorre com coeficiente não nulo em cada λν : λν = aν tmν + termos de maior potência, onde aν ∈ K é não nulo. Então mν > 0. Seja u o mínimo dos valores isto é, ¾ ½ mν : ν = 0, 1, ..., n − 2 com λν = 0 . u = min n−ν mν , n−ν Então u é um número racional positivo. Tomemos u = de , com d, e ∈ N. Considere-se o mergulho de Λ = K((t)) em Λe e o polinómio F ∗ (y) = τ −dn F (τ d y) = y n + n−2 P ν=0 λν τ d(ν−n) y ν ∈ Λe [y]. O coeficiente em y ν deste polinómio, caso seja diferente de zero, é uma série de Laurent em τ da forma λν τ d(ν−n) = atmν τ d(ν−n) + (termos de maior potência) τ d(ν−n) = aτ Eν + (termos de maior potência) τ d(ν−n) onde µ ¶ mν Eν = e(n − ν) − u ≥ 0, n−ν e Eν = 0 para pelo menos um ν. Deste modo, cada coeficiente de F ∗ é uma série de potências em τ , e para, no mínimo um ν esta série de potências tem termos constantes não nulos. Portanto, F ∗ satisfaz as condições do Corolário 5.1.6 (substituindo t por τ ), sendo que F ∗ = GH, isto é, F ∗ decompõe-se sobre K[[τ ]]. Assim, pela minimalidade de ¡n, H,¢que tem grau estritamente 0 menor que n, tem uma raiz em algum Λe ¡τ 1/e ¢. Portanto também F ∗ e, 0 consequentemente, F , têm uma raiz em Λe τ 1/e = Λee0 . ¤ 70 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS Demonstração (do Teorema 5.1.12) Seja ∆ uma extensão de corpos de Λ = K((τ )) de grau finito e. Como K é um corpo de característica zero, existe θ tal que ∆ = Λ(θ). Deste modo, existe um polinómio irredutível F ∈ Λ[y] que admite θ como raiz. Pelo Lema 1.2.22 podemos supor que θ ∈ ∆é tal que F (t) ∈ K [[t]] é mónico em y. Assim, pelo Lema 5.1.13, F tem uma raiz ρ ∈ Λe0 , para algum e0 . Uma vez que existe um monomrfismo de ∆ = Λ (θ), para Λ (ρ) ⊆ Λe0 , podemos, sem perda de generalidade, supor que ∆ ⊆ Λe0 . Uma vez que G(Λe0 : Λ) é cíclico, para cada divisor e de e0 0 0 existe um único corpo ¡ 1/eΛ¢ com Λ ⊂ Λ ⊂ Λe0 de grau e sobre Λ. Pelo Lema 5.1.11, ∆ = Λe = Λ t . Fica assim demonstrado o Teorema. ¤ 5.2 Extensões de K(x) Tal como foi afirmado no início do capítulo, tomamos K um corpo algebricamente fechado de característica zero. Dada K(x) ⊂ L uma extensão de Galois, introduzimos nesta secção dois invariantes que lhe estão associados; os pontos de ramificação e as classes de conjugação associadas a um ponto p ∈ P1K = K ∪ {∞}. Começamos por fixar um sistema (ζ e )e∈N de e-ésimas raízes primitivas da 00 unidade tais que se e = e0 e00 então ζ ee = ζ e0 . Seja Λ = K((t)) e consideremos ∆ uma extensão de Galois de Λ. Suponhamos que [∆ : Λ] = e. Pelo Teorema 5.1.12, ∆ = Λ (δ) onde δ e = t. Assim, G(∆ : Λ) é um grupo cíclico cuja ordem é e. Note-se novamente que por xe −t ser irredutível (por 5.1.4),os elementos de G(∆ : Λ) são determinados pelas imagens dos elementos da base da extensão, 1, δ, δ2 , ..., δ e−1 . Assim, todo o elemento de G(∆ : Λ) é determinado pela imagem de δ. Mas, se α ∈ G(∆ : Λ), α (δ) satisfaz a equação xe − t = 0. As raízes de xe − t são {zδ : z e − 1 = 0}. Tome-se ω ∈ G(∆ : Λ) tal que ω (δ) = ζ e δ. Assim definido, ω gera G(∆ : Λ). Chamaremos a ω o gerador especial de G(∆ : Λ). Seja δ 0 ∈ ∆ tal que 0 e (δ 0 ) = t para algum inteiro e0 ≥ 1. Note-se que xe − t é um polinómio irredutível em K((t))[x]. Assim, e0 = [Λ (δ 0 ) : Λ] e e0 | [∆ n : Λ]0 = e. Portanto o e/e0 0 0 e0 é solução de x − t = 0. Assim, δ ∈ zδ e/e : z e − 1 = 0 . e/e ∈ Z e δ Tem-se que 0 ω(δ 0 ) = ω(zδ e/e ) 5.2. EXTENSÕES DE K(X) 71 0 = zω(δ e/e ) 0 = z(ζ η )e/e δe/e 0 = (ζ η )e/e zδe/e ¡ ¢e/e 0 = ζη δ Mas, dada a hipótese do sistema de raízes, 0 (ζ e )e/e = ζ e/(e/e0 ) = ζ e0 . Portanto, ω(δ 0 ) = ζ e0 δ 0 . Em particular, se Λ ⊂ ∆0 ⊂ ∆ então ω |∆0 é o gerador especial de G(∆0 : Λ). Seja p ∈ P1K . Para cada p ∈ P1 define-se ϑp : K(x) −→ K(t) κ 7−→ κ ½∈ K t + p se p 6= ∞ x 7−→ 1/t se p = ∞ um isomorfismo-K de corpos. Seja K(x) ⊂ L uma extensão de Galois e γ um elemento primitivo associado a esta extensão, F (y) ∈ K(x)[y] o polinómio mínimo de γ sobre K(x) e ϑp (F ) ∈ K(t)[y] o polinómio obtido a partir da extensão de ϑp a K(x)[y]; isto é ϑp : K(x)[y] P i −→ PK(t)[y] i pi y 7−→ ϑp (pi )y Seja h um factor irredutível qualquer de ϑp (F ) em K((t))[y], hhi o ideal gerado por h em K((t))[y] e ∆ = K((t))[y]/ hhi. Como h é irredutível e h ∈ K((t))[y], anel de polinómios com coeficientes num corpo, hhi é maximal. Logo ∆ é corpo. Mais, ∆ é extensão finita de K((t)) = Λ e [∆ : Λ] = deg(h). Seja γ 0 raiz de h em ∆. Tem-se que ∆ = Λ [γ 0 ]. Como γ 0 é raiz de h ∈ Λ[y], é também raiz de ϑp (F ) ∈ K(t)[y]. Portanto γ 0 é algébrico sobre K(t) e K(t)[γ 0 ] = K(t)(γ 0 ) é corpo. Podemos agora comparar as seguintes extensões K(x) ↓≈ K(t) Galois ,→ ,→ L = K(x)[γ] ↓ Lϑ := K(t)[γ 0 ] ,→ ∆ = K((t))[γ 0 ] 72 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS Consideremos o isomorfismo anterior ϑp : K(x) −→ K(t) e F (y) ∈ K((x))[y] um polinómio irredutível. Como ϑp : K(x) −→ K(t) é um isomorfismo, ϑp (F ) é irredutível. Como γ é raiz de F (y) e γ 0 é raiz de ϑp (F ) tem-se que L = K(x)[γ] ≈ K(t)[γ 0 ] = Lϑ . Note-se também que L é corpo de decomposição de F e, dada a forma como Lϑ foi construído, Lϑ é corpo de decomposição de ϑp (F ). Sabemos que [∆ : Λ] = deg(h). Seja e = deg(h). Pelo Teorema 5.1.12, conclui-se que ∆ = Λ(γ 0 ) ' Λe sobre Λ (isto é, existe um Λ− isomorfismo de ∆ em Λe ). Pelo Lema 5.1.11 conclui-se que ∆ é extensão de Galois de Λ. Assim pelo que foi dito antes, |G(∆ : Λ)| = o(ω), onde ω é o gerador especial de G(∆ : Λ). Logo, e = [∆ : Λ] = |G(∆ : Λ)| = o(ω). Mais, G(∆ : Λ) −→ G(Lϑ : K(t)) α 7−→ α |Lϑ é um homomorfismo de grupos injectivo. Assim, o(ω) = o(ω |Lϑ ). Portanto, [∆ : Λ] = |G(∆ : Λ)| = o(ω |Lϑ ). Antes de enunciar o próximo resultado relembramos o conceito de classe de conjugação num grupo. Definição 5.2.1 Dois elementos a e a’ de um grupo G dizem-se conjugados se a0 = bab−1 , para algum b ∈ G. Definição 5.2.2 A classe de conjugação de um elemento x num grupo G é o conjunto de todos os conjugados de x em G: © ª Cx = x0 ∈ G : gxg −1 = x0 , para algum g ∈ G . Lema 5.2.3 Seja K(x) ⊂ L, nas condições anteriores, podemos estender ϑp : K(x) −→ K(t) ao isomorfismo ϑ : L −→ Lϑ onde Lϑ é um subcorpo de uma extensão ∆ de Galois de Λ. Mais G(∆ : Λ) deixa Lϑ invariante. Seja gϑ = ϑ−1 ◦ ω ◦ ϑ ∈ G = G(L : K(x)) onde ω é o gerador especial de e for outra extensão de Galois de Λ G(∆ : Λ) construído anteriormente. Se ∆ e : L −→ Le um isomorfismo que estende ϑp , então ge e com subcorpo Lϑ e ϑ ϑ ϑ gϑ estão na mesma classe de conjugação de G. 5.2. EXTENSÕES DE K(X) 73 Demonstração Tome-se ∆ = Λ[y]/ hhi como antes e Lϑ = K(t)[γ 0 ]. A primeira afirmação foi demonstrada antes. Resta-nos demostrar que G(∆ : Λ) deixa Lϑ invariante assim como a terceira afirmação. Uma vez que Lϑ é corpo de decomposição de ϑp (F ), Lϑ é gerado sobre K(t) pelas raízes de ϑp (F ). Como G(∆ : Λ) permuta estas raízes, tem-se que Lϑ é invariante por G(∆ : Λ). e extensões de Galois de Λ. Podemos supor que existe ∆0 Sejam ∆ e ∆ e ⊆ ∆0 . Temos que uma extensão extensão finita de Galois tal que ∆, ∆ Λ ⊆ ∆ é Galois se e só se ∆ é uma extensão finita, normal e separável de Λ. e corpo de decomposição de g(x), e Seja ∆ corpo de decomposição de f (x) e ∆ consideremos ∆1 o corpo de decomposição de f (x)g(x). Como uma extensão é finita e normal se e só se for o corpo de decomposição de algum polinómio e uma vez que toda a extensão de um corpo de característica zero é separável, resulta que ∆1 = ∆0 é uma extensão finita, normal e separável de ∆, isto é, ∆0 é uma extensão de Galois de Λ. Note-se que todas as extensões de Galois de Λ são da forma Λe . e construído de forma análoga ao subcorpo Lϑ Seja Lϑe o subcorpo de ∆ e a extensão de ϑp ao isomorfismo de L em Le . Assim, Lϑ e Le são de ∆ e ϑ ϑ ϑ gerados sobre K(t) pelas raízes de ϑp F em ∆0 . Logo Lϑ = Lϑe . Seja h = e ∈ G = G(L : K(x)). Como, G(∆0 : Λ) = hω 0 i e G(∆ : Λ) = hω 0 |∆ i, ϑ−1 ϑ então, e = h−1 ϑ−1 ω0 ϑh = h−1 gϑ h, e−1 ω 0 ϑ gϑe = ϑ isto é, gϑe e gϑ pertencem à mesma classe de conjugação de G. ¤ Definição 5.2.4 Dada K(x) ⊂ L uma extensão de Galois, a classe de conjugação de gϑ em G nota-se por Cp e designa-se por classe de G associada a p. Note-se que Cp depende unicamente de p e de L. Definição 5.2.5 À ordem (comum) dos elementos de Cp dá-se o nome de índice de ramificação de L em p e nota-se por e = eL,p . Proposição 5.2.6 Nas condições anteriores, todos os factores irredutíveis de ϑp F em Λ[y] têm o mesmo grau, o qual é igual ao índice de ramificação de L em p. 74 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS Demonstração Seja ω o gerador especial de G(∆ : Λ). Como Λ ⊆ ∆ é uma extensão de Galois, [∆ : Λ] = |G(∆ : Λ)| = o(ω). Uma vez que a restrição induz um monomorfismo e Portanto, G(∆ : Λ) ,→ G(Lϑ : K(t)) , α 7→ α |Lϑ o(ω) = o(ω |Lϑ ) = o(gϑ ) eL,p = [∆ : Λ] = deg(h). Se h0 for um outro factor irredutível de ϑp F em K((t))[y], ∆0 = K((t))[y]/ hh0 i é outra extensão de Galois. Pela segunda parte do Lema 5.2.3 sabemos que se e : L 7−→ Le um isomorfismo Lϑe for um subcorpo intermédio da extensão e ϑ ϑ que estende ϑp , então gϑe e gϑ estão na mesma classe, logo, ¤ deg(h0 ) = [∆0 : Λ] = o(gϑe ) = o(gϑ ) = eL,p = deg(h). Estabelecemos agora condições suficientes para o índice de ramificação de uma extensão L de Galois de K(x) num ponto p, eL,p , ser 1. Note-se que isto é o mesmo que se ter que ϑp F se decompõe em factores lineares em K((t))[y]. Proposição 5.2.7 Nas condições anteriores, podemos escolher um elemento primitivo γ de L sobre K(x) tal que o polinómio mínimo de γ sobre K(x) F (y) = F (x, y) ∈ K[x, y] é mónico em y. Assim, o discriminante D(x) de F (y) sobre K(x) é um elemento de K[x]. Se p ∈ K e D(p) 6= 0 então eL,p = 1. Demonstração Seja γ tal que L = K(x)(γ) e F (y) ∈ K(x)[y] irredutível tal que F (γ) = 0. Existe d (x) ∈ K [x] tal que d (x) F (y) ∈ K[x][y]. Usando a demonstração do Lema 1.2.22 podemos, sem perda de generalidade, supor que F (y) ∈ K[x, y] e que é mónico em y. Considere-se agora o seu discriminante, para tal, e atendendo à forma como a noção de discriminante foi introduzida, pensamos em F (y) ∈ K(x)[y]. Sejam pi (x) as suas raízes. Pela Proposição 1.2.42, Y D(x) = (pi (x) − pj (x))2 ∈ K[x]. i<j 5.2. EXTENSÕES DE K(X) 75 Como F (y) é irredutível em K(x)[y] e K é um corpo de característca zero, F (y) é separável logo, por 1.2.36, D(x) 6= 0. Considere-se p ∈ K e o polinómio em y, F (p, y) ∈ K[y]. As suas raízes serão p1 (p), ..., pn (p) e o seu discriminante D(p). Se p ∈ K for tal que D(p) 6= 0, então F (p, y) ∈ K[y] é separável. Tem-se que (ϑp F )(y) = F (t + p, y). Assim ϑp F é um polinómio mónico em y com coeficientes em K[t]. Mais, (ϑp F )0 (y) = F (p, y). Se F (p, y) é separável, pelo Lema de Hensel, Lema 5.1.5, ϑp F factoriza-se em produtos de factores lineares em Λ [y]. Logo eL,p = 1 = grau dos factores irredutíveis de ϑp F . ¤ Definição 5.2.8 Seja K(x) ⊂ L uma extensão de Galois e p ∈ P1K . Diz-se que p é um ponto de ramificação da extensão K(x) ⊂ L se eL,p > 1, isto é, se a classe Cp de G(L : K(x)) é não trivial. A Proposição 5.2.7 dá-nos condições suficientes para um ponto não ser ponto de ramificação. Mais, podemos concluir que o conjunto dos pontos de ramificação é finito. Seja K(x) ⊂ L, nas condições anteriores, podemos estender ϑp : K(x) −→ K(t) ao isomorfismo ϑ : L −→ Lϑ onde Lϑ é um subcorpo de uma extensão ∆ de Galois de Λ. Mais G(∆ : Λ) deixa Lϑ invariante. Seja gϑ = ϑ−1 ◦ ω ◦ ϑ ∈ G = G(L : K(x)) onde ω é o gerador especial de G(∆ : Λ) construído e for outra extensão de Galois de Λ com subcorpo Lϑ e anteriormente. Se ∆ e : L −→ Le um isomorfismo que estende ϑp , então ge e gϑ estão na mesma ϑ ϑ ϑ classe de conjugação de G, pelo Lema 5.2.3. Proposição 5.2.9 Seja K(x) ⊂ L uma extensão de Galois e K(x) ⊂ L0 outra extensão de Galois com L0 ⊂ L. Então a aplicação restrição de G = G(L : K(x)) em G0 = G(L0 : K(x)) envia as classes de conjugação Cp de G nas classes de Cp0 de G0 associadas a p. Demonstração Consideremos o isomorfismo ϑ : L → Lϑ definido no Lema 5.2.3 e gϑ = ϑ−1 ◦ ω ◦ ϑ ∈ G = G(L : K(x)) onde ω é o gerador especial de G(∆ : Λ). Seja ϑ0 = ϑ |L0 . Assim, ϑ0 é um isomorfismo de L em ϑ0 (L0 ) ⊂ ∆. Uma vez que −1 gϑ0 = (ϑ0 ) ωϑ0 = ϑ−1 ωϑ |L0 76 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS tem-se o resultado. ¤ Exemplo Seja K um corpo de característica zero, f (x) ∈ K(x), n ∈ N, n ≥ 2, g(y) = y n − f ∈ K(x)[y] e f0 uma raiz de g em alguma extensão de K(x). Considere-se L = K(x)(f0 ). Como K é algebricamente fechado, a menos de n-ésimas potências, podemos supor que Y f (x) = (x − pj )mj j com pj ∈ K distintos doisQ a dois e 1 ≤ mj ≤ n − 1. Portanto, g(y) = y n − (x − pj )mj . Consideremos o isomorfismo definido j anteriormente, ϑp : K(x) −→ K(t) κ 7−→ κ ½∈ K . t + p se p 6= ∞ x 7−→ 1/t se p = ∞ Seja p ∈ K. Então, ϑpi (y n − f (x)) = y n − n Y j = y − tmi Mas g(t) = Q j6=i (t + pi − pj )mj Y j6=i (t + pi − pj )mj (t + pi − pj )mj ∈ K[[t]] e, pelo Corolário 5.1.7, para algum h ∈ K[[t]], g (t) = hn . Portanto, ϑpi (y n − f (x)) = y n − tmj hn Notemos ei = eL,pi . Deste modo, ´ ³ ¡ ¢ ¡ ¢ Λei = Λ (tmi hn )1/n = Λ tmi /n h = Λ tmi /n , uma vez que h ∈ K[[t]]. Pela demonstração do Lema 5.1.11 tem-se que ei = [Λei : Λ] = |G(Λei : Λ)| 5.2. EXTENSÕES DE K(X) 77 onde Λei = Λ(tmi /n £ ). 1/n ¤ Uma vez que Λ(t ) : Λ = n e como Λ ⊆ Λ(tmi /n ) ⊆ Λ(t1/n ), ei | n e G(Λ(tmi /n ) : Λ) ≤ G(Λ(t1/n ) : Λ). Seja ω o gerador de G(Λ(t1/n ) : Λ). Assim, ω mi é o gerador de G(Λ(tmi /n ) : Λ) e ei = o(G(Λ(tmi /n ) : Λ)) = n . m.d.c.(n, mi ) Se p ∈ K é tal que p 6= pi então D(p) 6= 0, e pela Proposição 5.2.7, eL,p = 1. Como, por definição, p é um ponto de ramificação se eL,p > 1, tem-se que apenas os p0i s são pontos de ramificação de L. No caso em que p = ∞, tomemos o polinómio f (x) na forma f (x) = am xm + ... + a0 com am 6= 0. Então ϑ∞ (y n − f (x)) = y n − (am (1/t)m + ... + a0 ) = y n − t−m (am + ... + a0 tm ). Assim, fazendo e∞ = eL,∞ , ³ ´ ³ ´ ¡ ¢ ¡ ¢ Λe∞ = Λ f (1/t)1/n = Λ t−m/n (am + ... + a0 tm )1/n = Λ t−m/n = Λ tm/n . Por argumento análogo ao anterior, e∞ = n m.d.c(n, m) onde m = deg(f ). Tem-se que e∞ > 1 se e só se n não divide deg(f ). Sabemos que o número de pontos de ramificação de uma extensão L de Galois de K(x) é finito. Pretendemos agora estudar como é que os pontos de ramificação e as classes de conjugação de uma extensão de Galois K(x) ⊂ L variam quando passamos para uma determinada extensão de Galois de K(x). Lema 5.2.10 (Argumento do ciclo da ramificação) Sejam K(x) ⊂ L e K(x) ⊂ L0 extensões de Galois de grau n. Para cada p ∈ PK1 , seja Cp (respectivamente, Cp0 ) a classe de G = G(L : K(x)) (respectivamente, G0 = 78 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS G(L0 : K(x))) associada a p. Seja α ∈ Aut (K) e m ∈ N tal que α−1 (ζ n ) = ζm n (onde (ζ e )e∈N é um sistema compatível de e-ésimas raízes primitivas da unidade em K). Suponhamos que α se estende a um isomorfismo λ : L → L0 tal que λ (x) = x. Seja λ∗ o isomorfismo de grupos de G em G0 induzido por λ (g ∈ G −→ λgλ−1 ). Então 0 Cα(p) = λ∗ (Cp )m . Note-se que no caso em que L = L0 , α pode ser estendido a um isomorfis0 mo λ de L em L0 tal que λ(x) = x, temos que Cα(p) = λCpm λ−1 , isto é, o Lema 5.2.10, diz-nos como variam as classes de conjugação quando consideramos as imagens dos pontos por um automorfismo de K. Demonstração [do Lema 5.2.10] Seja p ∈ PK1 e e = eL,p . Como, por definição, e é a ordem de elementos de G e |G| = n, e | n. Se a ∈ N for tal que n = ae, dada a forma do sistema (ζ n )n∈N (sistema compatível de raízes primitivas da unidade em K), temos que ζ an = ζ e , logo ¡ ¢a a a m m α−1 (ζ e ) = α−1 (ζ an ) = α−1 (ζ e ) = (ζ m n ) = (ζ n ) = ζ e . Considere-se = K((τ )) −→ ΛP α e : Λe P e = K((τ )) . bi τ i 7−→ α (bi ) τ i É fácil verificar que α e é um automorfismo que estende α ∈ aut(K). Considerese a identificação de K((t)) com um subcorpo de Λe , com t = τ e . Tal como no Lema 5.1.11, seja ω o gerador de G (Λe : ∆) tal que ω (τ ) = ζ e τ . Assim, tem-se que m α e −1 ωe α (τ ) = α e −1 ω (τ ) = α−1 (ζ e τ ) = α−1 ζ e τ = ζ m e τ = ω (τ ) . Portanto, α = ωm. α e −1 ωe Seja ϑ o isomorfismo de L num subcorpo de Λe que estende ϑp (existe pelo Lema 5.2.3). Assim, ϑ0 := α e ◦ ϑ ◦ λ−1 é um isomorfismo de L0 num subcorpo de Λe . Tem-se também que ϑ0 (x) = α e (ϑ(x)) = α e (t + p) = t + α (p) , se p 6= ∞ 5.2. EXTENSÕES DE K(X) 79 e 1 1 e (ϑ(x)) = α e ( ) = , se p = ∞. ϑ0 (x) = α t t Uma vez que λ e α e induzem o automorfismo α em K, ϑ0 é a identidade em K e podemos concluir que ϑ0 é um isomorfismo que estende ϑα(p) de L0 a um subcorpo de Λe . gϑ0 = = = = = = (ϑ0 )−1 ◦ ω ◦ ϑ0 (e αϑλ−1 )−1 ω(e αϑλ−1 ) e −1 ωe αϑλ−1 λϑ−1 α λϑ−1 ωm ϑλ−1 λgϑm λ−1 λ∗ (gϑ )m conclui-se o resultado pretendido. ¤ Associada a K(x) ⊂ L extensão de Galois temos o grupo dos automorfismos de L que fixam K(x), G = G(L : K(x)), o conjunto finito P ⊆ P1K de pontos de ramificação e para cada p ∈ P1K , a classe de conjugação Cp de G. Definição 5.2.11 Considere-se os triplos (G, P, C) onde G é um grupo finito, P um subconjunto finito de P1C e C = (Cp )p∈P uma família de classes de conjugação não triviais de G, indexadas por P . Diz-se que dois triplos (G, P, C) e (G0 , P 0 , C0 ) são equivalentes se P = P 0 e se existe um isomorfismo ϕ de G em G0 tal que ϕ (Cp ) = Cp0 , para todo o p ∈ P . A relação “ser equivalente a” definida no conjunto dos triplos define uma relação de equivalência. Definição 5.2.12 Dado um triplo (G, P, C) onde G é um grupo finito, P um subconjunto finito de P1C e C = (Cp )p∈P uma família de classes de conjugação não triviais de G, indexadas por P denotamos por Γ = [G, P, C] a classe de equivalência de (G, P, C). A Γ damos o nome de tipo de ramificação. Pelo Lema 5.2.10 concluimos que o tipo de ramificação é invariante por K(x)-isomorfismos de L, onde L é uma extensão de Galois de K(x). Seja G = (L : C(x)). A existência da extensão de Galois de C(x) do tipo Γ = [G, P, C], onde P é um subconjunto finito de P1C e C = (Cp )p∈P uma 80 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS família de classes de conjugação não triviais de G, indexadas por P , é-nos garantida no próximo teorema desde que certas condições sejam satisfeitas. A sua demonstração será omitida, mas pode ser encontrada em [13].Não é conhecida demonstração algébrica do resultado que será apresentado. Teorema 5.2.13 (Teorema da Existência de Riemann) Seja Γ = [G, P, C] um tipo de ramificação, r = |P | e enumeremos os elementos de P , p1 , ..., pr . Então existe uma extensão de Galois de C(x) do tipo Γ se e só: 1. se existem geradores g1 , ...gr de G com g1 · ... · gr = 1; 2. gi ∈ Cpi para i = 1, ..., r. Note-se que se C(x) ⊂ L for uma extensão de Galois com apenas um ponto de ramificação, então L é uma extensão do tipo [(G, P, C)] onde P = {p}, G = G(L : C(x)), e C = {Cp }. Pelo Teorema da Existência de Riemann, conclui-se que existe um gerador g de G tal que g = Id e g ∈ Cp . Então G = {Id} e consequentemente L = C(x). Conclui-se assim que não existem extensões de Galois próprias de C(x) com menos de 2 pontos de ramifcação. Suponhamos agora que a extensão de Galois de C(x) ⊂ L tem exactamente dois pontos de ramificação. Assim, C(x) ⊂ L é do tipo [(G, P, C)] onde P = {p1 , p2 }, G = G(L : C(x)), e C = {Cp1 , Cp2 }. Pelo Teorema da Existência de Riemann, existem g1 , g2 geradores de G tais que 1. g1 g2 = Id; 2. g1 ∈ Cp1 , g2 ∈ Cp2 . Conclui-se então que g1−1 = g2 e que G é cíclico. Observação 5.2.14 Todo o grupo finito é grupo de Galois de alguma extensão de C(x). Uma vez que pode existir mais do que uma extensão de Galois de C(x) com determinado tipo de ramificação Γ sem que estas sejam necessariamente isomorfas, impomos agora uma nova condição, exigindo que os geradores de G, grupo de Galois da extensão cuja existência nos é dada pelo Teorema da Existência de Riemann, sejam de certa forma únicos. 5.2. EXTENSÕES DE K(X) 81 Definição 5.2.15 Seja (C1 , ..., Cr ) um r-uplo de classes de conjugação num grupo G. Dizemos que o uplo de classes é rígido (respectivamente, fracamente rígido) em G se: 1. existem geradores g1 , ..., gr ∈ G com g1 · ... · gr = 1 e gi ∈ Ci , para i = 1, ..., r. 2. Se g10 , ..., gr0 é outro conjunto de geradores de G com as mesmas propriedades (dos geradores de 1.), então existe um único elemento g ∈ G (respectivamente, um automorfismo γ de G) tal que ggi g −1 = gi0 (respectivamente, γ (gi ) = gi0 ), para i = 1, ..., r. Note-se que no caso de extensões de Galois do tipo Γ onde as classes formam um conjunto fracamente rígido, o automorfismo γ é único já que é definido pelas imagens de conjuntos de geradores. h i Definição 5.2.16 Um tipo Γ = G, P, (Cp )p∈P diz-se rígido (respectivamente, fracamente rígido) se os elementos de P podem ser enumerados por p1 , ..., pr , com r = |P | tais que as classes Ci = Cpi , i = 1, ..., r formem um r-uplo rígido (respectivamente, fracamente rígido) em G. Teorema 5.2.17 Para cada Γ = [G, P, C] tipo fracamente rígido, existe uma única extensão de Galois de C(x) do tipo Γ, a menos de isomorfismo. Demonstração A existência é consequência do Teorema da Existência de Riemann. Sejam L1 e L2 duas extensões de Galois fracamente rígidas do mesmo tipo Γ. Podemos, sem perda de generalidade, supor que L1 e L2 estão contidas em L, extensão de Galois de C(x). Sejam G = G(L : C(x)), G1 = G(L1 : C(x)) e G2 = G(L2 : C(x)). Podemos agora definir para cada j ∈ {1, 2}, a aplicação ρj : G → Gj g − 7 → g |Lj é um homomorfismo de grupos. Note-se que a aplicação está bem definida já que L, sendo extensão de Galois, é corpo de decomposição de algum polinómio sobre C(x) e as suas raízes são transformadas por qualquer elemento de G ainda em raízes do mesmo polinómio. 82 CAPÍTULO 5. PROBLEMA INVERSO DE GALOIS (j) Dado p ∈ P1C sejam Cp e Cp as classes de conjugação associadas a G e a Gj , respectivamente, então, pela Proposição 5.2.9, ρj (Cp ) = Cp(j) . Sejam p1 , ..., pr os pontos de ramificação de L. Pelo Teorema da Existência de Riemann existem geradores g1 , ..., gr de G com g1 · ... · gr = 1 e gi ∈ Cpi , para cada i = 1, ..., r. Então, para cada j ∈ {1, 2}, ρi (g1 ) , ..., ρi (gr ) são geradores de Gj e satisfazem propriedades análogas. Como L1 e L2 são do mesmo tipo, existe um isomorfismo ² : ´ ³ extensões (2) (1) G2 → G1 tal que ² Cp = Cp , ∀p ∈ P . Assim, ² (ρ2 (g1 )) , ..., ² (ρ2 (gr )) satisfazem as mesmas propriedades que ρ1 (g1 ) , ..., ρ1 (gr ). Uma vez que o tipo é fracamente rígido, existe um automorfismo δ de G1 tal que δ (² (ρ2 (gi ))) = ρ1 (gi ), para todo i = 1, ..., r. Considere-se γ := δ² : G2 → G1 . Assim, γ é um isomorfismo tal que γ (ρ2 (gi )) = ρ1 (gi ), qualquer que seja i = 1, ..., r. Assim, ρ1 = γ ◦ ρ2 (basta que as imagens dos geradores sejam as mesmas). Como γ é um isomorfismo, facilmente se verifica que ker ρ1 = ker ρ2 . Uma vez que G(L : L1 ) = {g ∈ G(L : C(x)) : g |L1 = Id} = ker ρ1 , resulta que Lker ρ1 = L1 , pois a extensão L ⊇ L1 é Galois. Analogamente, Lker ρ2 = L2 . Como ker ρ1 = ker ρ2 , resulta que L1 = L2 . ¤ Índice anel das séries de potências formais, 61 transcendente, 9 elementos algebricamente independentes, 27 conjugados, 25, 72 extensão, 9 algébrica, 9 dimensão, 9 finita, 9 normal, 17 separável, 14 simples, 10 transcendente, 9 extensão de Galois, 20 por radicais, 45 quadrática, 40 característica, 5 classe de conjugação, 72 de conjugação de g, 73 de G associada a p, 73 classes de conjugação fracamente rígido, 80 rígido, 80 construtível número, 36 corpo, 5 algebricamente fechado, 8 das séries formais de Laurent, 61 de decomposição, 16 fixo, 20 fecho algébrico, 12 normal, 52 discriminante, 18 domínio de factorização única, 8 de integridade, 5 Grupo de Galois, 20 elemento algébrico, 9 exprimível por radicais, 46 separável, 14 Lema Argumento do ciclo da ramificação, 77 de Hensel, 62 K-automorfismo, 20 K-isomorfismo, 20 83 84 polinómio, 5 anel de, 61 grau, 6 irredutível, 7 mínimo, 10 mónico, 6 raiz, 7 resolúvel por radicais, 46 separável, 14 simétrico, 18 simétrico elementar, 18 raiz, 7 múltipla, 7 n-ésima da unidade, 66 primitiva da unidade, 66 ramificação índice de, 73 ponto de, 75 tipo de, 79 Teorema Critério de Eisenstein, 8 da correspondência de Galois, 21 da Divisão, 6 da existência de Riemann, 79 de Abel, 58 de Artin, 22 de Hilbert, 8 do elemento primitivo, 15 fundamental de polinómios simétricos, 19 ÍNDICE Bibliografia [1] Michael Artin, Algebra, Englewood Cliffs, Prentice-Hall, 1991. [2] M. F. Atiyah, I. G. Macdonald, Introduction to Commutative Algebra, University of Oxford, Addison-Wesley, 1969. [3] Owen J. Brison, Teoria de Galois, Textos de Matemática (3a edição), Volume 6, Departamento de Matemática, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999. [4] Rui Loja Fernandes e Manuel Ricou, Introdução à Álgebra, Ensino da Ciência e da Tecnologia, Instituto Superior Técnico, IST Press, 2004. [5] John B. Fraleigh, A First Course in Abstract Algebra (5a edição), Addison-Wesley, Reading, Massachusetts, 1967. [6] Frederick M.Goodman, Algebra, Abstract and Concrete, Prentice Hall, New Jersey, 1998. [7] Charles Hadlock, Field Theory and its Classical Problems, The Carus Mathematical Monographs, Volume 16, The Mathematical Associaion of America, 1978. [8] Serge Lang, Algebra (3a edição), Addison-Wesley, Reading, Massachusetts, 1993. [9] Gunter Malle e B. Heinrich Matzat, Inverse Galois Theory, SpringerVerlag, Berlin, 1999. [10] John Maxfield, Abstract Algebra and Solutions by Radicals, Dover Publications, Inc., New York, 1992. 85 86 BIBLIOGRAFIA [11] António Monteiro e Isabel Matos, Algebra, Um primeiro curso, 2a edição, Escolar Editora, Lisboa, 2001. [12] Joseph J. Rotman, Advanced Modern Algebra, Prentice Hall, 2002. [13] Helmut Volklein, Groups as Galois groups: an introduction, Cambridge University Press, Cambridge, 1996. [14] Seth Warner, Modern Algebra, Dover Publications, Inc., New York, 1990.