Neutropenia Febril
Dr. Clóvis Arns da Cunha
Professor de Infectologia da UFPR
Infectologista da Unidade de Transplante de Medula Óssea do HC–UFPR
Chefe do Serviço de Infectologia do H.N.Sra. das Graças e do HC-UFPR
Neutropenia Febril
Caso Clínico
• Masc, 30 anos, apresentando febre após QT
para LMA (3o ciclo).
• Nos 2 ciclos anteriores apresentou 2-3 semanas
de neutropenia. Sem ”foco” clinicamente
evidente; colhidas 2 hemoculturas (1 central e 1
periférica)
• “ANC” (CAN = Contagem absoluta de
neutrófilos): 200/mm 3 . Neutropênico há 2
semanas.
• O QUE FAZER ?
Neutropenia Febril
O que sabemos de infecção como causa
da febre em neutropênico ?
• Em cerca de 40-50% dos casos há evidência de
infecção como causa da febre. A outra metade é
“FOI” (febre de origem indeterminada).
• Infecção pode ser “microbiologicamente”
documentada (hemocultura +, por exemplo) ou
“clinicamente” documentada (pneumonia, sem
diagnóstico microbiológico)
• Particularmente a infecção bacteriana pode ser
rapidamente fatal (24-48h). Logo:
neutropenia febril = Emergência Médica
Etiologia - diagnósticos
Cohen. Infectious Diseases, 2005.
Neutropenia Febril
O que sabemos de infecção como
causa da febre em neutropênico ?
• A
maioria
das
infecções
“microbiologicamente” documentadas são
de origem bacteriana. Em 2o lugar, vêm as
infecções fúngicas.
• Consenso de conduta neste caso: Iniciar
imediatamente antibacteriano com
cobertura para Pseudomonas
Etiologia das Infecções em
Neutropênicos
35
30
25
20
15
10
5
0
Bacteria
Fungi
Viruses
Picazo JJ. Int J Hematol 1998;68 (Suppl 1):S535-538.
Neutropenia Febril
Conduta
• O que não é consenso, é qual esquema
antibacteriano iniciar. A escolha depende
da realidade epidemiológica de cada
hospital.
• Discussão: Monoterapia X duoterapia
(com ou sem vanco)
Etiologia – mudanças
Cohen. Infectious Diseases, 2005.
Etiologia das Infecções em Neutropênicos
• Gram-positivos: são isolados em 60%
 Mais indolentes:
• Estafilococo coagulase-negativo (+ freqüente);
• Corynebacterium
 Mais agressivos:
• S. aureus;
• Estreptococos viridans;
• Pneumococo
• Gram-negativos: 40%
 Escherichia coli; Klebsiella pneumoniae;
 Pseudomonas aeruginosa
 ESBL, “SPICE BUGS / CESP”
Neutropenia Febril
Conduta
• Foi iniciado cefepima 2g IV 12/12h
(Experiência brasileira)
Neutropenia Febril
Evolução
• 5 dias depois do início da cefepima,
paciente persistia febril, sem “foco”
clinicamente evidente, hemoculturas ( 5
ao todo) negativas, CAN = 300/mm3.
RX de tórax PA/PE: normal
• Qual conduta tomar ? Justifique sua
resposta (opção)!
Neutropenia Febril
Conduta: as 3 alternativas podem ser
consideradas adequadas
a) Aguardar (=manter cefepima), já que o paciente
está clinicamente estável e há expectativa de
recuperação da neutropenia em breve.
Tomografia
de
tórax
(pensando
em
aspergilose) é uma conduta prudente
(tendência atual: mais diagnóstico e menos
tratamento empírico !)
Tomografia de abdome e/ou crânio-encefálica
sem manifestação clínica é questionável (já a
aspergilose pulmonar pode ser inicialmente
“silenciosa”)
Neutropenia Febril
Conduta: as 3 alternativas podem ser
consideradas adequadas
a) Aguardar (=manter cefepima)
Princípio: Resolvendo a neutropenia, deve
resolver a febre.
Neutropenia Febril
Conduta: as 3 alternativas podem ser
consideradas adequadas
b) Ampliar o espectro do esquema antibacteriano:
imipenem/cilastatina ou meropenem
+/vancomicina.
”BGNs ESBL” (2/3 BGNs + freqüentes em
neutropenia febril: E. coli e Klebsiella) e
Pseudomonas (muitas X só S a imip ou
meropenem).
Vanco vai depender da epidemiologia de
MRSA.
Neutropenia Febril
Conduta: as 3 alternativas podem ser
consideradas adequadas
b) Ampliar o espectro do esquema antibacteriano:
imipenem/cilastatina ou meropenem
+/vancomicina.
Como regra geral, acrescentar vancomicina, sem
ter isolado estafilococo resistente à oxacilina
ou infecção relacionada a CVC, é de pouca
utilidade (CID 37:382, 2003)
Neutropenia Febril
Conduta: as 3 alternativas podem ser
consideradas adequadas
c) Iniciar antifúngico, já que:
> 2 semanas de neutropenia;
períodos recentes de neutropenia;
se for infecção fúngica, o início precoce
tem impacto na mortalidade.
Neutropenia Febril
Conduta: as 3 alternativas podem ser
consideradas adequadas
c) Iniciar antifúngico, já que:
Princípio: A maioria dos “guidelines” de
neutropenia febril recomenda iniciar antifúngico
empírico quando paciente permanece febril por
5 dias ou mais apesar de antibacteriano
“aprovado” (ceftazidima, cefepima, imipenemcilastatina e meropenem)
Qual a diferença entre o tratamento
do paciente neutropênico e o
imunocompetente quando se conhece o
patógeno ?
Manter cobertura para gramnegativos, mesmo quando
estafilococo oxa-R é isolado.
Exemplo: isolado ENPC em 2 hemoculturas,
acrescentamos vancomicina, mas não
suspendemos cobertura para BGN
TRATAMENTO
EMPÍRICO COM
ANTIFÚNGICOS:
USAR OU NÃO USAR ?
Tratamento empírico - Antifúngicos
• Fungemia por Candida: neutropenia > 1
semana
• Aspergilose invasiva: neutropenia >2-3
semanas
• Infecção fúngica não costuma ocorrer em
neutropenia de curta duração (<1 semana)
Antifúngico Empírico
Por que usar ?
PRÓS
• Infecções fúngicas estão relacionadas
com alta mortalidade
• Diagnóstico difícil
• Menor sucesso se início do tratamento é
postergado (“início atrasado”)
Antifúngico Empírico
Por que não usar ?
CONTRAS
• Possibilidade de toxicidade adicional em
paciente de alto risco
• Mais confiança e menos desempenho na
busca do diagnóstico etiológico
• Dados mais “emocionais” que científicos ?
• Risco de subdose por indicação
questionável e paciente de alto risco
Marc A. Boogaerts. Advances in Empirical Antifungal Therapy in Patients with Febrile Neutropenia.
Atividade
emocional do
médico
Pensa em
acrescentar
antifúngico
Adiciona
antifúngico
empírico
Plano de saúde
questiona o
custo da
estratégia
estabelecida
Adiciona
G-CSF
Adiciona
novo ATB
empírico
ATB
empírico
24 h
72 h
96 h
Duração da febre e
neutropenia
Marc A. Boogaerts. Advances in Empirical Antifungal Therapy in Patients with Febrile Neutropenia.
Fungos em Neutropênicos
• “Clássicos”
 Candida albicans
 Candida nãoalbicans
•
•
•
•
•
C. krusei
C. parapsilosis
C. glabrata
C. lusitaneae
C. tropicalis
 Aspergillus
fumigatus
• Emergentes
 Não-fumigatus
Aspergillus spp.
 Fusarium spp.
 Trichosporon spp.
 Scedosporium spp.
 Acremonium spp.
 Zygomycetes spp.
Alvo: terapia pré-emptiva
SNC
Sinais/sintomas respiratórios
Lesões de pele
Lesões hepáticas
Sintomas/sinais seios da face
Azotemia
Febre
Poliartralgia
Candida
Aspergillus
raro
++
+++
+
++
++
++
++++
++
raras
++
++++
-
Wingard, JR. CID 39, SS38-43, 2004.
Alvo: terapia pré-emptiva
Sinal do
Halo
Sinal do
Crescente
Diagnóstico
96%
0
D3
68%
8%
D7
22%
28%
D14
19%
63%
Necessidade de novos métodos
diagnósticos!!!
Caillot D et al. J Clin Oncol 2001; 19:253-9.
IN GOD
WE TRUST .
FROM ALL OTHERS
WE NEED HARD DATA !
Marc A. Boogaerts. Advances in Empirical Antifungal Therapy in Patients with Febrile Neutropenia.
Antifúngico profilático em TMO
• Randomizado, controlado com placebo
• Fluconazol ou placebo no
condicionamento até recuperar 1000
neutrófilos, toxicidade suspeita ou
confirmação de infecção fúngica sistêmica
• Infecção fúngica invasiva em 21 (116)
grupo placebo vs 1 (101) = 18% vs 1%
p<.001
Goodman JL et al. N Engl J Med, 1992; 236:845-51.
Antifúngico empírico:
Estudos clínicos prospectivos,
randomizados
• Pizzo et al, 1982
 Neutropênicos com febre > 7 dias com ATB
 3 braços:
• Parar ATB, manter ATB, associar anfo-B
 Melhor evolução no braço antifúngico
• EORTC Intern Antimicrobial Therapy
Cooperative group
 Anfo B vs sem antifúngico
 Ausência de óbito por doença fúngica no grupo anfo
 Melhor usar em quem não estava com profilaxia
(fluco), >15 anos, neutropenia severa ou infecção
documentada
Pizzo PA et al. Am J Med 1982; 72:101-11.
EORTC International Antimicrobial Therapy Cooperative Group. Am J Med 1989; 86:668-72.
Anfo B deoxicolato
• Diminuição da frequência de infecções
fúngicas
• Diminuição da morbi-mortalidade por
infecções fúngicas
• Eventos adversos relacionados com
infusão e nefrotoxicidade
Exigência de estudos testando novos
antifúngicos
Wingard, JR. CID 39, SS, 2004.
Anfo B vs Anfo B Lipossomal
• Walsh et al, 1999.
• 687 pacientes, duplo-cego, randomizado
anfo B 0.8mg/kg
Randomizado
anfo B lipossomal 3 mg/kg
• FUO: febre sem resposta a 4 dias de ATB de amplo
espectro
• Neutropenia : neutrófilos < 500
• Anfo B lipossomal 171/343 (50%)
• Anfo B convencional 169/344 (49%)
• Menos eventos adversos relacionados com infusão
e menos nefrotoxicidade no grupo anfo B lipossomal
Walsh TJ et al. N Engl J Med 1999.
Anfo B lipossomal vs Voriconazol
• Estudo prospectivo, randomizado, aberto.
• 849 pacientes >96 horas de febre em uso
de ATB amplo espectro
• Randomização 1:1
• Sucesso
 26% voriconazol X 30.6% anfo lipossomal (CI
-10.6% a 1.6%, >-10%) = não provou
ausência de inferioridade
Walsh TJ et al. N Engl J Med 2002, Jan 24.
Marr KA. N Engl J Med 2002, Jan 24.
Anfo B lipossomal vs Voriconazol
Nº pacientes
Sucesso
Diferença entre braços
Voriconazol
AnfoB lipos
415
422
23.7%
30.1%
-6.1% (-12%, -0.1%)
Voriconazol falhou no seu primary
endpoint
Walsh TJ et al. N Engl J Med 2002, Jan 24.
Marr KA. N Engl J Med 2002, Jan 24.
Anfo B lipossomal vs Voriconazol
Voriconazol AnfoLipos

No Breakthrough
infection
98.1%
95.0%
+3.1%
Sobrevida
92.0%
94.1%
-2.1%
Ausência de
descontinuação
90.1%
93.4%
-3.3%
Defervescência
33.0%
36.0%
-3.0%
Resposta à infecção do
baseline
46.0%
67.0%
-20.5%
Walsh TJ et al. N Engl J Med 2002, Jan 24.
Marr KA. N Engl J Med 2002, Jan 24.
Anfotericina B lipossomal
versus Caspofungina no
tratamento empírico de
neutropênicos febris
Walsh, TJ et al. N Engl J Med 2004, Sep 30.
www.cancidas.com
Anfo B lipossomal vs caspofungina
Objetivo
• Comparar os pacientes com febre
persistente e neutropenia que atingem
uma resposta favorável com tratamento
com caspofungina, comparado com
tratamento com anfotericina B lipossomal
Anfo B lipossomal vs caspofungina
Desenho do Estudo
• Duplo-cego, multicêntrico, randomizado
• Caspofungina 50 mg qd (após 70 mg dia 1)
versus L-AMB 3 mg/kg qd
• Data Safety and Monitoring Board monitored
accumulating data
• Blinded Adjudication Committee assessed
baseline and
breakthrough fungal infections
Anfo B lipossomal vs caspofungina
População
• Critérios de inclusão:
 Idade >16 anos
 Qt para leucemia,linfoma, outras neoplasias OU
transplante de MO ou células tronco.
 Neutropenia (neutrófilos <500) por 4 dias
 >4 dias de terapia antibacteriana prévia
 Febre (>38.0ºC)
Anfo B lipossomal vs caspofungina
“Endpoints” primários
 Sucesso no tratamento da infecção de base
 Ausência de “breakthrough infection” during
treatment or within 7 days post-therapy
 Sobrevida até 7 dias após tratamento
 Ausência de descontinuação da droga do estudo
precocemente (por toxicidade ou falência)
 Resolução da febre por 48 horas durante o
período de neutropenia.
Anfo B lipossomal vs caspofungina
Sucesso no tratamento da infecção do
baseline – Candida e Aspergillus
Aspergillus
42
Caspofungina (n=12)
L-AMB (n=12)
8
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
Candida
Caspofungina (n=12)
67
L-AMB (n=12)
42
0
10
20
30
40
50
% de pacientes
60
70
80
Anfo B lipossomal vs caspofungina
Sobrevida
100
90
80
p=0.044
Sobrevida %
70
60
50
40
30
20
Caspofungina (n=556)
L-AMB (n=539)
10
0
7
14
21
28
35
42
49
56
63
8
8
6
6
Dia do Estudo
Caspofungin n= 556
L-AMB
n= 539
547
523
412
362
192
185
82
80
37
38
18
20
13
10
Anfo B lipossomal vs caspofungina
Mortalidade
Número (%) de mortes
em pacientes com
Caspofungina L-AMB
(n=556) (n=539)
Infecção no baseline
3/27
12/27
(11.1%) (44.4%)
Breakthrough infections
10/29
9/23
(34.5%) (39.1%)
Anfo B lipossomal vs caspofungina
Eventos Adversos
A favor Caspofungina A favor
L-AMB
Nefrotoxicidade
EAs relacionados à infusão
EAs relacionados com adroga*
Descontinuação devido
a EAs relacionados
com a droga*
–30
–20
–10
0
10
Diferença em %
*Considerados possível, provável ou definitivamente relacionados com a droga do estudo na opinião
do investigador.
Anfo B lipossomal vs caspofungina
Resumo e Conclusões (Eficácia)
• Caspofungina foi tão efetiva quanto L-AMB
como terapia empírica na suspeita de infecção
fúngica em pacientes neutropênicos febris.
• Caspofungina apresenta benefícios quando
comparada com L-AMB:
 Resposta ao tratamento das infecções fúngicas do baseline
 Ausência de descontinuação precoce
• Caspofungina influenciou favoravelmente a
sobrevida
 Sobrevida em 7 dias
 Sobrevida por Kaplan-Meier (p=0.044)
 Sobrevida após infecção fúngica do baseline (p<0.01)
Anfo B lipossomal vs caspofungina
Resumo e Conclusões
• Caspofungina e L-AMB foram semelhantes
para:
 Breakthrough infection
 Resolução da febre
• Caspofungina foi melhor tolerada que L-AMB
com relação a:




Nefrotoxicidade
Eventos relacionados a infusão
EAs relacionados com a droga
Descontinuação devido a EAs
Resumo do Resumo !
• Caspofungina passa a fazer parte do
nosso “armamentário” antifúngico em
neutropenia febril
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Neutropenia Febril