FALACIOSO DÉFICIT DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
Findas as eleições presidenciais, é hora de começar a planejar e estruturar o
novo governo. Como seu primeiro compromisso há de ser a honestidade e a
transparência frente aos cidadãos brasileiros, é hora de superar uma
vergonhosa mentira governamental, relativa ao déficit da previdência social.
O governo federal difunde essa falácia há anos, para sustentar o seu discurso
ad terrorem de que a previdência social é deficitária e economicamente
insustentável, com o único propósito de lograr o apoio político necessário para
mutilar os direitos dos aposentados e pensionistas.
No Brasil, escutamos essa mentira passivamente. Permanecemos inertes e
permitimos que ela seja difundida aos quatro ventos. Diferentemente dos
franceses, que derrubaram a monarquia absoluta e até hoje vão em massa às
ruas para lutar pelos seus direitos, nós, brasileiros, permanecemos apáticos,
assimilando as inverdades que o governo forja e submetendo-nos às
consequências do nefasto jogo político que impera em Brasília.
Esse é o panorama geral, mas felizmente existem exceções. Há quem ouse
escancarar as mentiras governamentais e lutar pela transparência, pela ética e
pelos direitos dos cidadãos. Foi o que recentemente fizeram os auditores da
própria Receita Federal, ao divulgarem minucioso estudo em que destroem o
mito do déficit da previdência, comprovando que o sistema de seguridade
social é, na realidade, superavitário (Nota Técnica nº 21 do Sindifisco Nacional,
elaborada em setembro de 2010).
O déficit da previdência é uma mentira construída a partir dos mais variados
artifícios financeiros. Em primeiro lugar, a questão está mal posta: não se deve
falar em déficit da previdência, mas da seguridade social. Não existe sequer
um orçamento da previdência social que permita identificar o déficit propalado
pelo governo. A Constituição Federal instituiu o "orçamento da seguridade
social" (art. 165, § 5º, III), que engloba a previdência, a assistência social e a
saúde. Esses três segmentos são financiados por recursos comuns, dentre os
quais sobressaem as receitas oriundas das contribuições de seguridade social
(contribuições dos empregados e empregadores, COFINS, CSL, etc.),
cobradas para custear não apenas as aposentadorias e pensões, mas também
os programas de assistência social e de saúde.
Considerada como um todo, a seguridade social é significativamente
superavitária. Tanto que já em 2000 se criou um instrumento financeiro,
denominado DRU (Desvinculação das Receitas da União), para permitir a
transferência de até 20% dos recursos da seguridade social para o orçamento
fiscal, de modo que eles sejam utilizados para pagar os juros da dívida pública.
Apenas em 2009, os recursos desviados da seguridade social mediante tal
artifício totalizaram o valor de R$ 39,85 bilhões. Mesmo com o desvio de 20%
dos seus recursos, o orçamento da seguridade social permanece superavitário
(R$ 64,4 bilhões, entre 2006 e 2009), se corretamente calculado.
Não são apenas estes os artifícios utilizados pelo governo federal para
sustentar o seu discurso ad terrorem. Ele recorre a outras artimanhas
contábeis, incluindo, por exemplo, no resultado da previdência social as
despesas com pensões militares, para chegar ao resultado deficitário que
divulga mensalmente.
É hora de exigirmos o cumprimento da Constituição Federal, a transparência
das contas públicas e a lealdade de nossos governantes, a começar pela
divulgação de informações idôneas acerca da situação financeira da
seguridade social. Se não tivermos acesso a dados fidedignos e claros, jamais
poderemos controlar as decisões políticas fundamentais, tomadas por aqueles
a quem outorgamos a relevantíssima incumbência de governar a nação
brasileira. Seremos manipulados por eles, tal qual uma multidão de fantoches
apáticos.
Andrei Pitten Velloso - Juiz Federal e Doutor em Direito Tributário
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O falacioso déficit da Previdência Social