PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ
CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
CURSO DE PEDAGOGIA
FLORIPES MARIA DE SOUZA
VOZ DE CRIANÇA É COISA SÉRIA:
As revelações que elas fazem durante as brincadeiras
São José
2011
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ
CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
CURSO DE PEDAGOGIA
FLORIPES MARIA DE SOUZA
VOZ DE CRIANÇA É COISA SÉRIA:
As revelações que elas fazem durante as brincadeiras
Trabalho elaborado para a disciplina de Conclusão
de Curso (TCCII) do Curso de Pedagogia, como
requisito parcial para aprovação no curso de
graduação em Pedagogia do Centro Universitário
Municipal de São José- USJ.
Orientadora: Profª. MSc. Arlete de Costa Pereira
São José
2011
FLORIPES MARIA DE SOUZA
VOZ DE CRIANÇA É COISA SÉRIA:
As revelações que elas fazem durante as brincadeiras
Trabalho de Conclusão de Curso elaborado como requisito parcial para
obtenção do grau de licenciado em Pedagogia do Centro Universitário Municipal
de São José – USJ avaliado pela seguinte banca examinadora:
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________________
Profª. Msc. Arlete de Costa Pereira
Orientadora- USJ
_________________________________________________________
Profª. Msc. Débora Cristina Sampaio Peixe
Examinadora - NDI/CED/UFSC
____________________________________________________
Profª. Msc. Andréa Rivero
Examinadora - USJ
São José, 23 de novembro de 2011
Dedico este trabalho aos meus filhos e neta, Fernanda
Luiza Peres, Nelson Ruda Able, Arthur Souza de Oliveira e
Bernardo Souza de Oliveira, Scarlleth Mayana Peres da
Silva (neta). Em especial, ao meu esposo Álvaro Francisco
de Oliveira, que sempre me apoiou, me incentivando, e
sendo o melhor companheiro em todas as horas.
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar agradeço a Deus pela permissão de eu poder crescer
espiritualmente, e quando isso acontece minha visão de mundo também cresce.
Agradeço ao meu mestre espiritual Meishu Sama, que me guia na trajetória da
minha vida iluminando meus caminhos, me dando discernimento e confiança,
me fazendo acreditar que sou capaz de realizar meus sonhos, de ser feliz.
Agradeço ao meu pai Raul de Souza (in memorian) que sempre foi justo,
amável, gentil, honesto, alegre, me mostrando que a vida deve ser vivida com
paz, harmonia, felicidade, gratidão.
A minha querida mãe Cecília Scóz, que me mostrou ser a maior guerreira
que já conheci, vencendo grandes batalhas que a vida lhe pôs a prova. Obrigada
mãe por me ensinar a ser forte. Esse é um presente para você!
E especialmente para minha amada neta Scarlleth Mayana Peres da Silva, e
meus filhos, deixo como exemplo aqui minha força de vontade e alegria em
poder ter concluído um curso superior aos 53 anos de idade.
Aos meus irmãos, e em especial Raul de Souza Filho (in memorian) que
nos deixou muitas saudades e nos faz tanta falta.
A minha querida orientadora Arlete de Costa Pereira. Que sempre com
muita sabedoria, me deixava tranquila nas horas mais difíceis dessa caminhada.
Também a minha querida USJ. Universidade da qual eu tenho o maior
orgulho, feita para pessoas especiais que almejam um objetivo de alcançar o
sonho de uma formação no ensino superior. Ela está ali de braços abertos, feita
para estas pessoas.
A todos os meus colegas de turma, em especial ao Oésle Luis Alexandre e
Kryslaine de Morais Vieira, que sempre foram os melhores amigos,
companheiros, que alguém poderia ter.
A todos os meus professores que contribuíram para que eu me
transformasse em uma pessoa com mais conhecimentos e com certeza, melhor.
Ao CEI Flor de Nápoles, onde sempre fui recebida com muito carinho por
todos me oportunizando o estágio, e a pesquisa de TCC, e também a todas as
crianças do CEI, que ficarão para sempre no meu coração.
A todas as pessoas que não foram aqui citadas, mas que de alguma forma
contribuíram para que esse sonho se tornasse realidade.
Nós somos as crianças do mundo.
Somos as crianças das ruas.
As crianças da guerra.
As vítimas e os órfãos da AIDS.
Somos as crianças cujas vozes não são ouvidas.
Agora chegou o momento de nos ouvirem.
Gabriela Azurduy Arrieta, 13 anos, Bolívia.
Inauguração da Sessão especial da ONU para a infância, reunida em Nova York,
(9 de maio de 2002)
RESUMO
Este trabalho busca investigar o que as crianças dizem quando estão brincando
nos diferentes espaços da Instituição de Educação Infantil. Ouvir as crianças,
dar visibilidade às suas vozes, imaginação e sentimentos, perceber seus pontos
de vista, desejos e suas mais diversas manifestações de expressão foram os
objetivos deste trabalho. A questão que norteou o trabalho teve como foco
investigar sobre o que podemos aprender ao observar as brincadeiras das
crianças e ouvir suas vozes. O que as crianças nos dizem, o que desejam, o que
expressam, o que revelam enquanto brincam? A pesquisa, que se insere no
campo das pesquisas qualitativas, envolveu um período de aproximadamente
um mês em campo, fazendo observações participantes com registros em diário
de campo e registros fotográficos, e teve como sujeitos, crianças de dois a seis
anos de idade. A instituição escolhida como campo de pesquisa foi um Centro
de Educação infantil da Rede Municipal de Ensino de São José - SC. As
análises indicaram que nesse CEI acontecem múltiplas manifestações das
crianças durante as brincadeiras. Olhar para as brincadeiras das crianças com
um olhar mais sensível, tentar entrar nesse mundo e descobrir o que elas nos
dizem quando estão brincando é uma tarefa que demanda sensibilidade, pois é
preciso desconstruir o olhar adulto para compreender a lógica da criança. Para
que a professora consiga perceber as mais diversas formas de manifestações e
expressões das crianças durante as brincadeiras, é necessário acordar a criança
que está adormecida dentro dela. Muitas vezes, as crianças não conseguem
dizer com palavras o que estão sentindo, mas conseguem fazer isso com outras
formas de linguagens como os gestos, olhares, choros, sorrisos. Por isso, o
olhar sensível dos adultos, nesse momento, é fundamental para ouvir, perceber,
sentir o que as crianças nos revelam quando estão brincando.
Palavras-Chave: Crianças. Voz de Criança. Brincadeiras. Educação Infantil.
LISTA DE IMAGENS
Fotografia 1 – Criança desenhando ....................................................................20
Fotografia 2 – Meninas tirando fotos ...................................................................21
Fotografia 3 – Meninas tirando fotos....................................................................21
Fotografia 4 – Crianças fazendo(arte)..................................................................27
Fotografia 5 – Valentina brincando de faz de conta.............................................28
Fotografia 6 – Pedro trocando fraldas..................................................................29
Fotografia 7 – Olhar entristecido de Valentina.....................................................31
Fotografia 8 - Menino brincando com a boneca...................................................35
Fotografia 9 – Aconchego da professora............................................................38
Fotografia 10 – Crianças trocam só um pé de seus calçados........................... 39
Fotografia 11 – Carinho da professora...............................................................40
Fotografia 12– Em volta da professora...............................................................40
Fotografia 13 – Beijo carinhoso..........................................................................40
Fotografia 14 – Abraço amigo.............................................................................40
Fotografia 15 – Um colinho.................................................................................40
Fotografia 16 – Amigos bem juntinhos................................................................40
Fotografia 17 – Dividindo o mesmo espaço........................................................41
Fotografia 18 – Parque lugar de princesa...........................................................41
Fotografia 19 – Parque lugar de super-heróis....................................................41
Fotografia 20 – Parque lugar de faz de conta.....................................................42
Fotografia 21 – Parque lugar de compartilhar espaço........................................42
Fotografia 22 – Parque lugar de fazer comidinha...............................................42
Fotografia 23 – Parque lugar para ver meus e-mails..........................................42
Fotografia 24 – Parque lugar de ajuda mútua.....................................................42
Fotografia 25 – Despedida..................................................................................49
LISTAS DE ABREVIATURAS
ANPED- Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CEI – Centro de Educação Infantil
DCNEI – Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC – Ministério da Educação e Cultura
NUPEIN - Núcleo de Estudos e Pesquisas da Educação na Pequena Infância.
PCSJ – Proposta Curricular de São José
SCIELO- Scientific Electronic Library Online
TCC – Trabalho de Conclusão de Curso
UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina
USJ – Centro Universitário Municipal de São José
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................11
2 CARACTERIZAÇÃO DA INSTITUIÇÃO..........................................................16
3 OS CAMINHOS DA PESQUISA ......................................................................17
3.1UMA IMAGEM, UM CLICK..............................................................................20
4 AS CRIANÇAS E AS LEGISLAÇÕES: ONDE ESTÃO SUAS VOZES ..........23
4.1 BRINQUEDOS, BRINCADEIRAS E AS CRIANÇAS ....................................26
4.2 CRIANÇAS DE DOIS A TRÊS ANOS: DIZENDO TUDO SEM PRECISAR
FALAR NADA...................................................................................................... .28
4.2.1 Expressões de Sentimentos: gestos e olhares que falam por si................30
4.3 OUVINDO AS CRIANÇAS DE TRÊS A QUATRO ANOS.............................32
4.3.1 Ouvindo as crianças falarem......................................................................34
4.4 DAR VOZ AS CRIANÇAS DE 04 A 05 ANOS......................... ......................36
4.4.1 Momentos de carinho e afetos............................................................ ........38
4.4.2 Parque, lugar de troca entre os pares...................................... ...................39
5 ORGANIZAR E PLANEJAR ESPAÇOS PARA AS CRIANÇAS.....................44
6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES AINDA PROVISÓRIAS........ .........................49
REFERÊNCIAS...................................................................................................52
ANEXOS..............................................................................................................55
11
1 INTRODUÇÃO
A presente pesquisa corresponde ao Trabalho de Conclusão de Curso – TCC
do curso de Pedagogia, do Centro Universitário Municipal de São José e foi
realizada no segundo semestre de 2011, em um Centro de Educação Infantil- CEI
Flor de Nápolis, da Rede Municipal de Educação do Município de São José.
O estudo tem o objetivo dar voz às crianças, ou seja, busca investigar o que
as crianças dizem e revelam enquanto brincam ou como se expressam nas suas
brincadeiras nos contextos de Educação infantil. Discute sobre a importância de se
ouvir o que as crianças têm a dizer a respeito das brincadeiras, dando voz a estes
“sujeitos de pouca idade”. (SARMENTO, 1997).
Com esse trabalho pretendo desencadear uma reflexão sobre a importância
de ouvirmos as vozes das crianças durante suas brincadeiras, valorizando seus
pontos de vistas, suas falas, suas ações como elementos importantes para pensar o
processo de apropriação e ampliação dos conhecimentos pelas crianças nas
Instituições de Educação Infantil.
Seja brincando ou se utilizando das linguagens simbólicas, as crianças estão
sempre interpretando algo, expressando diferentes formas de linguagens, elas têm
um jeito específico de se comunicar, com uma lógica própria, diferente da lógica dos
adultos.
O ato de ver e ouvir as crianças se expressando, nas mais variadas
formas de linguagem, sobre seus interesses e seus jeitos específicos de pensar o
mundo e as questões que as cercam revela a distância e desconhecimento que
ainda separa o mundo adulto deste grupo etário. A brincadeira parece ser uma das
formas de linguagens das crianças para comunicarem aos adultos o seu lugar neste
mundo.
Ao brincar, as crianças dão significados próprios às coisas que vivenciam no
seu cotidiano. Também interpretam, experimentam e exploram, expressando todo o
seu sentimento e emoção.
Partindo do pressuposto de que brincar é direito de todas as crianças e ouvir
o que elas têm a dizer quando estão brincando é uma necessidade e um dever de
todas/os as/os profissionais de Educação infantil, principalmente daqueles que estão
envolvidas/os e comprometidas/os com uma prática que venha ao encontro dos
12
direitos das crianças, é que se destaca a relevância deste trabalho.
Portanto, com esse trabalho busco dar visibilidade às vozes das crianças,
durante suas brincadeiras, revelando aspectos do brincar que são próprios dos
mundos infantis, e com isto contribuir para a melhoria das práticas pedagógicas em
contextos de Educação Infantil, ampliando as possibilidades de desenvolvimento das
crianças, em todos os aspectos físico, psicológico, intelectual e social.
O interesse pela temática surgiu a partir das vivências durante o período de
estágio realizado em uma instituição pública de Educação Infantil, no Município de
São José.
Nas observações feitas durante o estágio e posteriormente na docência, foi
possível constatar a necessidade e a importância de se ouvir o que as crianças têm
a nos dizer, e que um bom lugar para ouvir as crianças é nos momentos de
brincadeiras, que acontecem nos espaços da Instituição de Educação Infantil,
principalmente no parque.
Na inserção junto às crianças, percebi a importância da brincadeira e do faz
de conta e, principalmente, de suas falas durante estas brincadeiras, pois elas se
utilizam desta linguagem como forma de expressarem seus sentimentos, desejos e
seus pontos de vistas.
A riqueza dos elementos que são revelados durante as brincadeiras das
crianças, os jeitos próprios de interpretar o seu cotidiano, a magia dos personagens
e das possibilidades ilimitadas de transformação dos mundos indicaram um caminho
desafiador para a construção da pesquisa.
O registro a seguir ilustra esse „jeito criança de ser’, quando, certo dia,
“apareceu um elefante na creche”:
Apresentei a eles o livro que se chamava Animais da Floresta.
E durante a contação da história, os bichos foram surgindo: A
onça, o macaco, a girafa, e as crianças foram interagindo com
o livro, fazendo comentários, acrescentando outros textos a
cada imagem mostrada. Uma menina disse: - Eu vi um macaco
lá no circo! Eu virava a página e aparecia outro animal, desta
vez um elefante, e outro menino logo comentou: - Eu tenho um
elefante bem grandão na minha casa. Eu vo trazê ele pra
13
creche1, i ele vai cume um pedaço da creche. Percebemos que
a linguagem do faz de conta facilitou para uma aprendizagem
significativa, para a criança, onde ela se expressa interage
enquanto aprende vivenciando os personagens do livro.
(REGISTRO DE CAMPO, 2010).2
Por meio do registro é possível ouvir as vozes das crianças e perceber o
quanto o brincar, o lúdico, o imaginário, o faz de conta estão permeando os espaços
da Educação Infantil. Compreender melhor estes elementos que fazem parte das
brincadeiras das crianças, ouvir o que elas nos dizem enquanto brincam, perceber
seus desejos, preferências, seu jeito próprio de ser e agir no mundo poderá
contribuir para que haja uma rotina mais prazerosa tanto para as professoras quanto
para as crianças nos contextos coletivos de educação e cuidados.
Desde o início da minha atuação como professora da Educação Infantil, tenho
procurado ter um olhar mais atento e profundo ao observar uma brincadeira de
criança. Sempre procuro ouvir o que elas estão querendo dizer, com palavras,
gestos, brincadeiras, as revelações que elas fazem que muitas vezes não são o que
parece ser aos olhos de um adulto. Por isso, ter esse olhar aguçado e sensível me
ajuda a perceber e refletir sobre o que de fato tem importância e faz sentido para
uma prática cotidiana planejada e significativa para e com as crianças.
Na atualidade, fala-se muito sobre as crianças enquanto sujeitos sociais de
direitos, garantidos na legislação (LDBEN, 1996). A partir do entendimento das
crianças como sujeitos ativos, participativos, pensantes, é que defini pesquisar as
vozes das crianças durante as brincadeiras, ou seja, ouvindo-as, uma vez que elas
são as maiores interessadas no assunto.
O objetivo da pesquisa é trazer à tona as falas das crianças durante as
brincadeiras, dando visibilidades às suas vozes, sua imaginação, valorizando seus
pontos de vistas, seus desejos e suas ações como elementos importantes para a
vivência plena das suas infâncias.
Para atingir este objetivo, foi necessário refletir sobre a importância de se
ouvir e dar voz às crianças, na tentativa de compreender as linguagens expressadas
1
Estarei apresentando as falas das crianças tal como foram expressas, respeitando seus “jeitos de
falar”, suas singularidades.
2
Esta observação foi realizada durante o estágio, no segundo semestre de 2010, no CEI Flor de
Nápolis. Foi a partir daí que comecei a observar mais atentamente as falas das crianças durante as
brincadeiras.
14
nas brincadeiras, assim como Investigar sobre o que as crianças querem nos dizer
quando estão brincando nos espaços da instituição de Educação Infantil.
Houve um tempo em que as crianças eram consideradas “seres inacabados”,
ou também “adultos em miniaturas”. Não se olhava para as crianças como seres
completos, totais e indivisíveis. Hoje sabemos que elas estão inseridas na sociedade
e são parte da mesma, consideradas seres produtoras de cultura, que interpretam o
mundo a sua maneira, e expressam isso por meio das brincadeiras. (RIVERO,
2011).
Dar voz às crianças, ouvir o que elas têm a nos dizer em suas brincadeiras
significa compreender a linguagem que elas se utilizam para interpretar seus
desejos, anseios e alegrias.
Estudos recentes apontam para a necessidade de aprendermos a ouvir as
crianças (SARMENTO, 1997; CERISARA, 2004; ROCHA, 2008, 2010) de todas as
formas manifestadas, para que possamos interpretar o que elas querem nos dizer
quando estão brincando nesses espaços das instituições de Educação Infantil.
Portanto, ouvir as crianças para que elas nos indiquem, nos digam o que é mais
importante para elas, acerca das brincadeiras.
Porém, essa não é uma tarefa fácil. Dar voz às crianças é uma concepção
ainda muito recente, e por isso, temos que aprender como fazer. Para isso, é
necessário um exercício de sensibilizar o olhar, aprender a observar e refletir muito.
Afinal, o que as crianças querem nos dizer nas suas brincadeiras? Qual a
importância de ouvirmos a voz das crianças, de compreendermos essa linguagem
da brincadeira nos contextos de Educação Infantil? Ao observar as brincadeiras das
crianças e ouvir suas vozes, o que podemos aprender com elas? O que as crianças
nos dizem, o que desejam, o que expressam, o que revelam?
Foram estas questões que desencadearam a necessidade de ir para a
realidade e pesquisar, aprender, ouvir as crianças, compreender o que elas têm para
nos dizer. Ouvir as crianças para que elas nos indiquem, nos digam o que é mais
importante para elas acerca das brincadeiras, pois assim poderemos aprender a
conhecer melhor as crianças, e esta pesquisa poderá ser reveladora de suas vozes.
Para subsidiar esta pesquisa, procurei me apoiar teoricamente em Vigotski
(1984,1994), Kishimoto (1998,2005), Sarmento (1997), Ostetto (2000, 2004, 2008),
Cerisara (2004), Rocha (2008, 2010), entre outros.
O trabalho está estruturado em seis capítulos. No capítulo 1, Introdução, faço
15
um apanhado geral do trabalho. Em seguida falo sobre a Instituição, depois
apresento Os caminhos da pesquisa. No capítulo 4, As crianças e as legislações:
onde estão suas vozes? Inicio trazendo um pouco sobre as legislações, Crianças,
brincadeiras, características por faixa etária. Na sequência, o capítulo 5, Organizar e
planejar espaços para as crianças; no capítulo 6, Algumas considerações ainda
provisórias e encerro com as Referências e Anexos.
16
2 OS LUGARES DA PESQUISA
A pesquisa foi realizada no Centro de Educação Infantil – CEI Flor de Nápolis,
que pertence à Rede Municipal de Educação de São José e fica localizado no bairro
Flor de Nápolis. O CEI possui uma estrutura física ampla, e atende, neste ano, 164
crianças da comunidade, a maioria em período integral. Ao todo são cinco turmas
matutinas e vespertinas, sendo setenta e cinco crianças no período matutino e
oitenta e nove crianças no período vespertino, isto porque algumas crianças
frequentam somente o período da tarde. Trabalham no CEI trinta e uma
profissionais, entre Diretora, Auxiliares de Direção, Auxiliares de Ensino,
Professoras, Auxiliares de Sala, Professora de Educação Física, Merendeira e
Auxiliar de Serviços Gerais.
Optei por fazer minha pesquisa neste CEI, porque já havia feito o estágio em
Educação Infantil nessa mesma instituição de educação pública. Sempre fui muita
bem acolhida por parte de toda a direção, funcionárias e crianças, onde já me sentia
como parte deste CEI. Todos me abriram as portas para que eu pudesse fazer a
pesquisa com liberdade e tranquilidade.
O CEI abriu-me as portas para que a pesquisa fosse realizada em todos os
espaços, contemplando as salas, o parque, os corredores, os cantos, o refeitório.
Sendo o TCC um momento de suma importância em nossa vida acadêmica,
realizar a pesquisa em um espaço onde nos sentimos acolhidas já é um bom
começo.
17
3 PERCURSOS METODOLÓGICOS: DESAFIOS DA PESQUISA
O primeiro desafio é descobrir o objeto da pesquisa e construir o projeto de
TCC. Para isto, é necessário mergulhar nas leituras. E o ponto de partida foi a
experiência de estágio, portanto, estava relacionado as falas das crianças durante
as brincadeiras.
Para uma melhor compreensão do objeto investigado, foi necessário,
primeiramente, realizar um levantamento bibliográfico acerca da temática visitando
Bibliotecas, sites, obras estudadas no decorrer do curso de pedagogia, e obras
sugeridas pela orientadora. Os principais autores pesquisados foram: Kishimoto
(2005), Brougère (1995), Vigotski (1984, 1994), Ostetto (2000, 2004, 2008) e
Sarmento (1997), sendo que outros autores também contribuíram e serão citados no
decorrer da apresentação desse trabalho.
Após selecionar os trabalhos, passei para etapa dos fichamentos das
principais obras de interesse.
Com as leituras e reflexões suscitadas durante a elaboração do projeto,
surgiram dúvidas e assim, senti a necessidade de ter um contato mais direto com o
ambiente e o objeto a ser investigado, ou seja, o retorno ao campo de estágio foi
uma necessidade imediata. Queria olhar as crianças, ouvi-las um pouco mais para
poder ter clareza acerca do meu objeto de pesquisa.
Então, retornei ao CEI e fui conversar com as crianças, queria sentir se
conseguiria fazer um TCC tendo como foco as suas vozes. E lá, fui recebida
carinhosamente pelas crianças e equipe de profissionais, o que fortaleceu meu
desejo de realizar a pesquisa naquele espaço ouvindo as crianças nas suas
brincadeiras.
A pesquisa se insere no campo das pesquisas qualitativas, uma vez que
envolveu um período de aproximadamente um mês em campo junto às crianças,
para realizar as observações participantes com registros em Diário de Campo, além
de registros fotográficos.
De acordo com Minayo (1999):
18
[...] a técnica de observação participante se realiza através do contato direto
do pesquisador com o fenômeno observado para obter informações sobre a
realidade dos atores sociais em seus próprios contextos. O observador,
enquanto parte do contexto de observação, estabelece uma relação face a
face com os observados. Nesse processo, ele, ao mesmo tempo, pode
modificar e ser modificado pelo contexto. A importância dessa técnica reside
no fato de podermos captar uma variedade de situações ou fenômenos que
não são obtidos por meio de perguntas, uma vez que, observados
diretamente na própria realidade, transmitem o que há de mais
imponderável e evasivo na vida real. (p.59)
A pesquisa foi realizada no segundo semestre de 2011, (TCCII), com crianças
dos dois aos seis anos de idade.
Ouvir as crianças, observar o que elas nos dizem quando estão brincando, ter
um olhar
mais
profundo
e
apurado diante
das
suas
brincadeiras,
dos
comportamentos, das ações e reações infantis é algo, no mínimo, instigante. É
sempre um grande desafio. Neste sentido, concordo com Cerisara (2004) ao dizer
que “[...] realizar pesquisas buscando captar as vozes das crianças é um desafio
para os adultos, uma vez que, por mais comprometidos que formos com as crianças,
seremos sempre adultos falando pelas crianças e sobre elas”. (p.49).
Por isso, esta pesquisa tem o intuito de ouvir a voz das crianças, buscando
uma maior compreensão das suas variadas formas de linguagens.
Sobre as metodologias de pesquisa com crianças, Sarmento (1997, p. 24) diz
que “[...] as metodologias utilizadas devem ter por principal escopo a recolha da voz
das crianças, isto é, a expressão da sua acção e da respectiva monitorização
reflexiva”.
Para conseguir ouvir as crianças, fui descobrindo, como pesquisadora que, ao
observar as crianças para enxergar de fato o que elas expressam em suas
brincadeiras, é necessário estar livre de preconceitos pré-concebidos diante das
brincadeiras infantis, ressignificando esse olhar, apreendendo seus jeitos próprios de
ser. Neste sentido, Gandini e Goldhaber (2002, p. 52) acrescentam que “através da
observação e da escuta atenta e cuidadosa às crianças, podemos encontrar uma
forma de realmente enxergá-las e conhecê-las”. Assim as crianças fazem quando
estão brincando, nos revelam vivências dos seus cotidianos, que têm significados
importantes para elas, e que muitas vezes passam despercebidas pelo olhar do
adulto.
Neste sentido, Sarmento e Pinto (1997, p. 24) indicam a necessidade de “[...]
partir das crianças para o estudo das realidades de infância”. Os autores
19
prosseguem dizendo que o estudo das realidades da infância com base na própria
criança é um campo de estudos emergente, e por isso é necessário adotar um
conjunto de orientações metodológicas capazes de auxiliar na recolha da voz das
crianças. Portanto, um estudo que se propõe partir das crianças é desafiador, mas,
de acordo com os autores, de grande relevância, pois:
O estudo das crianças a partir de si mesmas permite descortinar uma outra
realidade social, que é aquela que emerge das interpretações infantis dos
respectivos mundos de vida. O olhar das crianças permite revelar
fenómenos sociais que o olhar dos adultos deixa na penumbra ou
obscurece totalmente. Assim, interpretar as representações sociais das
crianças, pode ser não apenas um meio de acesso à infância como
categoria social, mas às próprias estruturas e dinâmicas sociais que são
desocultadas no discurso das crianças. (SARMENTO; PINTO, 1997, p. 25).
Essa pesquisa procura trazer as vozes das crianças em suas mais simples,
espontâneas e verdadeiras formas de linguagens. Tentando trazer suas falas na
forma como elas se apresentam, captando a essência, o sentimento com que as
crianças estavam querendo dizer com essas formas de se expressar. O exercício do
registro diário foi fundamental para captar as vozes das crianças. Sobre o ato de
registrar e documentar, Gandini e Goldhaber (2002, p. 161) afirmam:
[...] o processo de documentação amplia o nosso entendimento sobre os
conceitos que as crianças estão elaborando, sobre as teorias que elas
estão construindo e sobre os questionamentos que elas propõem. O
processo de documentação nos une como comunidade de aprendizagem e
nos desafia a expressar os nossos pensamentos, articulada e publicamente,
e a aceitar a responsabilidade, como sugere Carlina Rinaldi (1998), de
escutar atentamente a fim de compreender o ponto de vista dos outros.
Sobre a contribuição das pesquisas com crianças, Cerisara (2004) fala que:
Pode dizer-se que as pesquisas voltadas para as crianças e as culturas
infantis ou para os fazeres e saberes das crianças, trazem uma importante
contribuição para a área da Educação Infantil à medida que evidenciam a
necessidade de todos os professores educarem o seu olhar no sentido de
aprenderem a ver, observar e conhecer as crianças para tomá-las como
ponto de partida para a organização do tempo e do espaço dentro das
creches e pré-escolas. (p. 51).
Durante a pesquisa de campo, em muitos momentos, as crianças solicitavam
participar ativamente dos meus registros, contribuindo com suas formas de
expressão:
20
As crianças sempre querendo desenhar no papel onde eu
registrava as observações. Sempre „rabiscavam‟ a folha e
depois queriam assinar o seu nome na obra de arte. Queriam
registrar seus nomes, assumindo a autoria da arte. Queriam
ser visíveis, mostrar como são capazes. Então, o menino João
pegou a folha e a caneta e começou a desenhar e disse:
“Existi minina só com uma perna, né? Eu vi uma cando eu
fui cu meu pai lá nu mercado, Intão vo dejenhá uma minina
assim3.”
(DIÁRIO DE CAMPO/12/08/11).
Foto 1 - Criança desenhando a menina só com uma perna.
Fonte: Floripes Maria de Souza, 12/08/2011.
3.1 UMA IMAGEM, UM CLICK:
Duas meninas com quase quatro anos de idade, me observavam, enquanto
eu tirava fotos das crianças. E para não perder o momento exato, muitas vezes eu
ficava no chão, de cócoras, de lado, enfim o meu objetivo era registrar o momento
exato do fato, por isso não tinha uma pose certa para bater as fotos. De repente,
3
Para saber mais sobre os jeitos de falar próprios das crianças, ver Vigotski (2004, p.356) que diz
que “A maioria de nossas crianças fala uma linguagem contra natural, deformada pelos adultos e não
se pode imaginar nada de mais falso do que esse discurso dissimulado.”
21
elas começaram a me imitar, e batiam fotos umas das outras, de várias formas. A
menina que batia a foto buscava um ângulo mais perfeito para tirar a melhor foto.
Exatamente o que eu estava fazendo. Como elas conseguiram captar em mim esse
meu objetivo; que não era só tirar as fotos, simplesmente, mas sim, pegar o melhor
ângulo, e para isso, eu me posicionava de diversas formas, e elas também.
Foto 2 - Meninas tirando fotos.
Fonte: Floripes Maria de Souza, 12/08/2011.
Foto 3 - Meninas tirando fotos.
Fonte: Floripes Maria de Souza, 12/08/2011.
22
Sobre esta questão, Caputo indica:
Ao regular a abertura da máquina, ao optar por este ou aquele filtro de luz,
ao decidir que velocidade será usada na hora do “clic”, ou seja, no exato
momento da “captura” do objeto a ser fotografado, o fotógrafo o faz baseado
em seus pressupostos teóricos. (CAPUTO, 2001, p. 6).
Procurei registrar fotografando o momento exato do fato, da ação, onde as
crianças brincavam e se expressavam de maneira espontânea e própria delas.
Mas, enquanto eu fazia esses registros, também era observada por elas, que
me imitavam fazendo de conta que tiravam fotos de verdade uma da outra, e ainda
buscavam se posicionar do melhor ângulo possível. Percebi que, ao registrar e
documentar suas ações, também estava sendo observada, registrada, ou seja, as
crianças estavam elaborando suas próprias teorias acerca das minhas ações
naquele espaço. De acordo com Gandini e Goldhaber (2002, p. 161):
[...] o processo de documentação amplia o nosso entendimento sobre os
conceitos que as crianças estão elaborando, sobre as teorias que elas
estão construindo e sobre os questionamentos que elas propõem. O
processo de documentação nos une como comunidade de aprendizagem e
nos desafia a expressar os nossos pensamentos, articulada e publicamente,
e a aceitar a responsabilidade, como sugere Carlina Rinaldi (1998), de
escutar atentamente a fim de compreender o ponto de vista dos outros.
Portanto, registrar fotografando é também uma forma de documentar as
ações das crianças. Estamos observando as crianças em seus momentos de
construção acerca de suas experiências cotidianas e isto nos remete a pensar que
devemos ouvir mais as crianças enquanto brincam. Assim, tentar compreender as
suas mais variadas formas de se expressarem.
23
4 AS CRIANÇAS E AS LEGISLAÇÕES: ONDE ESTÃO SUAS VOZES?
Cada cultura tem uma maneira diferente de ver as crianças, de como educar
e cuidar delas. Antigamente, meados do século XV, a criança foi considerada como
„adulto em miniatura‟, depois, como um „ser inacabado‟, uma ‘tábula rasa‟ e,
chegando ao início do século XX como uma concepção oriunda da psicologia do
desenvolvimento que considerou a criança como um futuro “vir a ser”.
Todas essas concepções partiam da ideia negativa da infância, daquilo que
faltava às crianças, que eram vistas sem nenhuma especificidade, nem valor
positivo. Eram consideradas à margem da família, e só passavam a condição de
sujeitos prontos e acabados, quando atingiam a idade adulta, que era considerada a
idade da razão. Então, a partir de Rousseau, as crianças passaram a ser vistas
como seres portadores de uma natureza própria que deve ser desenvolvida.
(KISHIMOTTO, 2005).
No pensamento das épocas passadas, a infância era vista como sinônimo de
inocência, fragilidade, docilidade natural e se tinha, em relação a elas, um
pensamento de homogeneidade, onde se acreditava que todas as crianças eram
iguais, com a mesma cultura, interesses e possibilidades de desenvolvimento
(PCSJ, 2000). Este jeito de ver e pensar as crianças como sendo homogêneas
permaneceu até recentemente e ainda não está totalmente superado.
A concepção de infância vem mudando ao longo dos tempos. Hoje, já se
percebe as crianças como sujeitos sociais de direitos, garantidos e reconhecidos na
legislação atual, embora não totalmente concretizados, mesmo assim, significa um
avanço legal.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 205, fala que “[...] a educação
é direito de todos e dever do estado e da família.”Tendo como objetivo, o
desenvolvimento da criança para o exercício da cidadania. E, em seu artigo 208,
define:
Art. 208 - O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a
garantia de:
IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco)
anos de idade4;
4
Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006.
24
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional também reafirma essa
condição de sujeito de direitos e expressa como finalidade o desenvolvimento
integral das crianças (LDBEN/1996). Esta legislação destaca em seu artigo 29: “[...]
a Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o
desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico,
psicológico, intelectual, e social, complementando a ação da família e da
comunidade.”
O Estatuto da Criança e do Adolescente, datado de 1990, também vem
reafirmar a condição legal das crianças e adolescentes enquanto sujeitos sociais de
direitos:
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do
poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos
referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária5.
Entendemos que as crianças são sujeitos de direitos, e que devemos
respeitá-las e auxiliá-las no seu desenvolvimento integral, e que esta é uma grande
responsabilidade das instituições de educação. Esta finalidade está expressa na
Proposta Curricular de São José (PCSJ, 2000, p. 177):
As instituições de Educação Infantil devem associar práticas de educação e
cuidado que possibilitem a integração entre os aspectos físicos,
emocionais, afetivos, cognitivos, linguísticos e sociais da criança.
Entendendo que ela é um ser completo, total e indivisível.
O caderno do MEC “Critérios para um atendimento que respeite os Direitos
Fundamentais das Crianças”, vem ratificar essa ideia, definindo alguns direitos a
serem garantidos para estes sujeitos crianças. De acordo com o material, a criança
tem direito à brincadeira, a desenvolver sua curiosidade, imaginação, a um ambiente
aconchegante seguro e estimulante, direito ao contato com a natureza, direito a
saúde, higiene, a uma alimentação sadia, a movimento em espaços amplos, a
proteção, ao afeto e à amizade, direito a expressar seus sentimentos, a atenção
especial, ao desenvolver sua identidade cultural, racial e religiosa. (CAMPOS, 2009,
p. 13).
5
Para maior esclarecimento, leia a Lei 9394/96 (Lei de Diretrizes e bases da Educação Nacional) e a
Lei 8069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente).
25
Nesta
mesma
perspectiva,
recentemente
foi
instituída
as
Diretrizes
6
Curriculares Nacionais Para a Educação Infantil (BRASIL, 1999; 2009), que, em seu
Art. 3º, determina:
III – As Instituições de Educação Infantil devem promover em suas
Propostas Pedagógicas, práticas de educação e cuidados, que possibilitem
a integração entre os aspectos físicos, emocionais, afetivos,
cognitivo/lingüísticos e sociais da criança, entendendo que ela é um ser
completo, total e indivisível.
As diretrizes vêm reforçar a ideia das crianças enquanto seres íntegros e de
direitos, e isto fica evidente no artigo IV:
IV – As Propostas Pedagógicas das Instituições de Educação Infantil, ao
reconhecer as crianças como seres íntegros, que aprendem a ser e
conviver consigo próprios, com os demais e o próprio ambiente de maneira
articulada e gradual, devem buscar a partir de atividades intencionais, em
momentos de ações, ora estruturadas, ora espontâneas e livres, a interação
entre as diversas áreas de conhecimento e aspectos da vida cidadã [...].
No entanto, não é suficiente apenas a existência de documentos legais para a
garantia das crianças enquanto sujeitos de direitos; as legislações, por si só não
garantem práticas diferentes em relação às crianças, é necessário também uma
mudança de postura e um investimento sério em formação. Assim como não é
suficiente somente deixá-las falar, pois, como diz Rocha (2010, p.16).
Deixar as crianças falarem não é suficiente para o pleno reconhecimento de
sua inteligibilidade, ainda que nem isso se tenha conquistado no campo
científico e da ação; depende de uma efetiva garantia de sua participação
social, da construção de estratégias, em especial no âmbito das Instituições
educativas, da qual fazem parte e que tem representado espaço e contexto
privilegiado das vivências da infância.
As Instituições de Educação Infantil são lugares onde o exercício desses
direitos das crianças devem ser efetivados nas práticas cotidianas.
6
Resolução CEB, nº 1, de 7 de abril de 1999.
Resolução CNE/CEB 5/2009. Diário Oficial da União, Brasília, 18 de dezembro de 2009, Seção 1, p. 18.
Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CEB0199.pdf
26
4.1 BRINQUEDOS, BRINCADEIRAS E AS CRIANÇAS
Já faz muitos anos que o brincar e as brincadeiras das crianças têm sido
objeto de pesquisas nas academias. Um dos pesquisadores que contribuiu muito
com a construção de teorias acerca do brincar e continua sendo referência para
muitos trabalhos é Vigotski. Este autor considera o ato de brincar muito importante
para o desenvolvimento integral da criança. De acordo com ele, as crianças quando
brincam dão novo significado para aquilo que vivem e sentem no seu dia a dia.
Quando uma criança brinca de mãe, de professora, de irmão, ela imita e recria
situações assumindo papéis de na vida real não poderia assumir enquanto criança.
(VIGOTSKI, 1994).
A brincadeira é uma forma de linguagem que a criança faz uso para se
comunicar com o mundo a sua volta. Por meio da brincadeira, a criança se socializa,
expressa sentimentos, interpreta, cria e recria o que está a sua volta. No entanto,
pensar a brincadeira e o brinquedo como fundamentais no desenvolvimento das
crianças é algo recente, deste século.
O brinquedo educativo data dos tempos do Renascimento, e começa a
ganhar espaço a partir deste século com a expansão da Educação Infantil.
Reconhecido como recurso pedagógico que auxilia na educação das crianças
de forma prazerosa, Kishimoto (2005, p. 36) diz que:
O uso do brinquedo/ jogo educativo com fins pedagógicos remete-nos para
a relevância desse instrumento para situações e ensino-aprendizagem e de
desenvolvimento infantil. Se considerarmos que a criança pré-escolar
aprende de modo intuitivo, adquire noções espontâneas, em processos
interativos, envolvendo o ser humano inteiro com suas cognições,
afetividade, corpo e interações sociais, o brinquedo desempenha um papel
de grande relevância para desenvolvê-la.
Quando criamos situações lúdicas, intencionalmente, com o objetivo de
provocar as crianças a certos tipos de aprendizagens, então estamos aí criando uma
dimensão educativa. A professora estará potencializando as situações de
aprendizagem, bem como introduzindo a construção do conhecimento utilizando-se
desse recurso pedagógico, desafiando as crianças a desenvolverem suas
capacidades de ações e habilidades.
27
Foto 4 - Crianças fazendo arte- Estágio Educação Infantil 2010.
Fonte: Floripes Maria de Souza
O meio social no qual as crianças vivem, vai influenciar na forma como essas
crianças, quando adultos, irão lidar com o imaginário, com a sensibilidade, tornandoos adultos que sentem e compreendem o faz de conta, se vivenciarem isto, em suas
infâncias. Portanto nós adultos devemos oportunizar as crianças a explorarem suas
imaginações na brincadeira.
De acordo com Kishimoto (2005, p. 53) “A cultura torna-se parte da natureza
humana”. A criança é influenciada pelo meio social no qual está inserida.
Kishimoto ao falar na cultura, destaca a Arte, também como elemento
importante:
A arte, como parte da cultura, é um dos grandes patrimônios da
humanidade, ao qual, todos os homens deveriam poder ter acesso para se
nutrir cognitiva e espiritualmente, ampliando suas possibilidades de
pensamento e de ação no mundo, enriquecendo o espaço imaginativo e
simbólico, capazes de alargar e flexibilizar o pensamento racional.
As crianças quando brincam de faz de conta estão geralmente imitando o
mundo adulto, transportando para seu mundo imaginário, situações do seu
cotidiano, ou do seu meio social, onde elas podem transformar em algo mais
agradável e possível o que desejam, enquanto vivenciam esses papéis. Então,
passam a vivenciar os papéis de princesa, de mãe, de médico, do irmão, da
professora e fazem isso da forma mais prazerosa para elas. No entanto, em alguns
momentos, essas brincadeiras de representação também podem provocar tensões.
28
Fotos 5 - Valentina brincando de faz de conta colocando a fralda na boneca.
Fonte: Floripes Maria de Souza 04/08/11
Isto fica evidente na brincadeira de Valentina, quando cuida de seu bebê,
troca fraldas, imita o papel de mãe ou adulto responsável pelo bebê.
Percebi que ao brincar de trocar as fraldas do bebê, imitava um adulto e que
certamente ela já havia visto alguém trocar as fraldas de alguma criança e, portanto,
está recriando o fato enquanto brinca. Para Vigotski (1984, p.49):
[...] o que define a brincadeira é a situação imaginária criada pela criança.
Oportunizar a brincadeira para a criança é dar a ela oportunidade de criar e
recriar suas vivências, brincando ela descobre, experimenta, dá novo
sentido, nova forma como gostaria que fosse, imita, mas também reproduz
situações reais observadas ou vividas por elas.
4.2 CRIANÇAS DE DOIS A TRÊS ANOS DE IDADE: DIZENDO TUDO, SEM
PRECISAR FALAR NADA
As crianças, até os três anos de idade, aproximadamente, „falam‟ muito com
a linguagem corporal, imitam os adultos, dão novos significados àquilo que vêem,
reproduzem situações que vivenciam no seu cotidiano enquanto estão brincando de
faz de conta. Assim nos diz Kishimoto (2005, p. 39):
A brincadeira de faz de conta, também conhecida como simbólica, de
representação de papéis ou sociodramática, é a que deixa mais evidente a
presença da situação imaginária. Ela surge com o aparecimento da
representação e da linguagem, em torno de 2/3 anos, quando a criança
começa a alterar o significado dos objetos, dos eventos, a expressar seus
sonhos e fantasias e a assumir papéis presentes no contexto social.
Nessa idade entre dois e três anos, as crianças imitam os adultos, mas
também começam a dar significados próprios às brincadeiras, reproduzem aquilo
29
que vêem se expressando de uma forma toda própria.
Pedro, de dois anos e sete meses de idade, pegou uma
boneca, colocou-a deitada sobre um tapete que estava no
chão, e levantando as pernas da boneca, passou um lenço
umedecido nas partes íntimas da boneca. Depois, olhou para o
lenço como se o mesmo estivesse sujo de verdade. Não sabia
o que fazer com o lenço. Então, segurando-o com as pontas
dos dedos, caminhou até a lixeira e jogou-o fora, na lixeira.
(DIÁRIO DE CAMPO, 04/08/11).
Fotos 6 - Pedro trocando fraldas e limpando a boneca.
Fonte: Floripes M. de Souza, 04/08/2011.
A partir desta representação vivenciada por Pedro, é possível inferir que esta
criança vive uma situação imaginária como se fosse real para ela, ao menos,
naquele momento, na brincadeira. Sobre esta questão, Vigotski (1994, p.136) fala
30
que: “Para uma criança de até três anos de idade, o brinquedo é um jogo sério. [...]
para uma criança muito pequena, brinquedo sério, significa que ela brinca sem
separar a situação imaginária da situação real”
Ao olhar atentamente para a cena, onde Pedro limpava a boneca como se
estivesse trocando as fraldas de um bebê de verdade, percebi que o menino poderia
estar reproduzindo algo que faz parte do seu cotidiano. Ele imita os adultos, e
quando o faz por meio da brincadeira de representação, vive esse momento como
se fosse real. Ao pegar o lenço pelas pontas dos dedos, como se o mesmo estivesse
sujo, em silêncio, caminhou até a lixeira e jogou fora. É possível que esta criança já
tenha observado um adulto fazer isso antes, em situação semelhante. Portanto,
Pedro pode estar manifestando comportamentos e costumes de seu contexto
cultural e social. Neste sentido, Brougère (2008, p. 97) aponta: “A criança está
inserida, desde seu nascimento, num contexto social e seus comportamentos estão
impregnados por essa imersão inevitável.”
Ao observar as crianças em suas brincadeiras, é possível perceber que elas
dizem muito quando estão brincando. Mesmo quando ainda não desenvolveram a
oralidade, quando não falam uma só palavra, nos dizem muitas coisas por meio de
outras linguagens, gestos, olhares, brincadeiras, expressões, que para elas, naquele
momento em que estão vivenciando, a situação vivenciada é coisa séria, é real.
4.2.1 Expressão de Sentimentos: Gestos e olhares que falam por si
Valentina é uma garotinha linda, muito alegre e esperta. Esta
semana completou três anos de idade. Fala as palavras quase
perfeitamente. Nesse dia, a professora fez uma roda com todas
as crianças. E convidou-as para cantar uma música, chamada
Bonequinha de Paris7. Valentina, então, pegou a boneca
alegremente e começou a cantar a música e a interpretar,
fazendo gestos com a boneca como se fosse real cada fala da
7
“A Bonequinha” Cantada por Xuxa. Composição: Rennan Cantuária da Silva, João Paulo
Gonçalves. Letra da Música: Eu tenho uma bonequinha assim, ela veio de Paris pra mim, ela tem um
lindo chapéu e também um amor de véu. Eu ponho ela de pé, não cai; ela diz mamãe, papai. Mas um
dia sem razão, escorregou e caiu no chão. Quebrou o rostinho dela e também o dedinho do pé. Eu
levei levei ela ao doutor, que sabia curar sem dor. A bonequinha chorou, chorou. Eu também chorei,
chorei. Só depois que ela sarou, eu brinquei, brinquei, brinquei.
31
música. Até chegar a parte da música onde fala que a boneca
se machucou e foi ao médico. Então, ela começa a ficar triste,
abraça a boneca fortemente e para pensativa, com um olhar
fixo distante; fica por alguns instantes abraçada a boneca sem
dizer uma só palavra. (DIÁRIO DE CAMPO, 04/08/11).
Foi possível perceber que a menina, inicialmente estava alegre cantando a
música, e de repente, se deu conta do conteúdo da música e quando a bonequinha
fica doente e é levada ao doutor, a menina sente tristeza, como se fosse verdade. O
gesto da menina em relação à boneca, de segurar cuidadosamente, como se
estivesse confortando-a da dor, da tristeza, reforça as falas da música que
certamente essa bonequinha passou por maus momentos de verdade, então a
menina entristeceu por alguns minutos, solidária à sua boneca.
Foto 7- O olhar entristecido de Valentina
Fonte: Floripes M. de Souza, 04/08/2011.
Sobre essa questão, Vigotski (1994, p.128) fala que:
A criança não consegue, ainda, separar o pensamento do objeto real. A
debilidade da criança está no fato de que, para imaginar um cavalo, ela
precisa definir a sua ação usando um “cavalo de-pau” como pivô. [...], toda a
percepção humana é feita de percepções generalizadas e não isoladas.
Para uma criança, o objeto é dominante na razão objeto/significado e o
significado subordina-se a ele.
32
Com isso, observei que o brinquedo - a boneca - e a música foram elementos
extremamente importantes para que Valentina sentisse como se fosse real esse fato
e mostrasse que ficou muito triste quando a boneca teve que ir ao médico.
Simplesmente, ela manifestou isso com a expressão corporal, onde os olhos de
Valentina falaram por ela. Sobre isto, Vigotski (1994, p.130) diz que “Para uma
criança, a palavra “cavalo” aplicada ao cabo de vassoura significa “eis um cavalo”,
porque mentalmente ela vê o objeto por trás da palavra.” Assim, percebo que
Valentina segura a boneca e abraça muito forte, porque as palavras da música
diziam que aquela bonequinha estava machucada e foi ao médico. Ela chorou,
passou por maus momentos e, agora em seu colo, estava segura, ganhando
aconchego e afeto.
Ao tratar de sentimentos expressos nas brincadeiras, Brougère (2008, p.14)
afirma que:
A brincadeira não pode estar limitada ao agir: o que a criança faz tem
sentido, é a lógica do fazer de conta é de tudo o que Piaget chama de
brincadeira simbólica (ou semiótica). O objeto tem o papel de despertar
imagens que permitirão dar sentido a essas ações.
4.3 OUVINDO AS CRIANÇAS DE TRÊS A QUATRO ANOS
Dar voz às crianças significa também entrar no mundo da imaginação.
Compreender seus significados, suas lógicas. A imaginação é a forma de linguagem
mais simples que as crianças fazem uso para nos dizer, indicar, comunicar. É uma
forma ilimitada de explorar o conhecimento, abrange tudo que envolve as crianças,
incentiva a evolução social e afetiva das mesmas. Assim, Ostetto (2004, p. 83) diz:
Ensinar a linguagem, permitindo o fluir de significados e sentidos no espaço
educativo, em situações sociais reais de enunciação, é ir além dos aspectos
formais do conhecimento escolarizado. É seguir abrindo cominhos para a
imaginação, é possibilitar ferramentas para as crianças entrarem cada vez
mais no mundo simbólico da nossa cultura, que se expressa também, mas
não só, pela escrita.
As crianças são surpreendentes e nos dão respostas muitas vezes diferentes
daquelas que esperamos ouvir delas, quando fazemos alguma pergunta.
A professora de Educação Infantil pode se utilizar dessa linguagem que é da
brincadeira, do faz de conta, para que as crianças interpretem o mundo a sua volta,
desenvolvendo com isso seus aspectos afetivos, intelectuais, suas interações,
33
podendo assim interagir e se relacionar com as outras crianças e com o mundo que
as cerca.
Em uma das observações em sala, registrei o seguinte episódio:
A professora levou as crianças até o tapete da sala para
fazerem uma roda de conversas. Lá ela começou a fazer
algumas indagações:
- Quem tem bichinho de estimação em casa? Perguntou a
professora. Alguns disseram:
- Eu tenho!
A professora continua perguntando:
- Qual é o seu bichinho? Um diz:
- Eu tenho um cachorrinho! O outro diz:
- Eu tenho um tucano e um peixe!
Então, um menino levantou a mãozinha e disse:
- Eu tenho uma barata lá em casa!
(DIÁRIO DE CAMPO, 12/08/11).
As crianças sempre estão nos dizendo alguma coisa. O menino talvez
quisesse dizer com isso que em casa ele não tinha nenhum bichinho de estimação,
porque, caso contrário, ele teria falado qual era o seu bichinho. Ou, é possível que
ele tivesse visto uma barata, que não era de estimação, mas que também é um
bicho para ele. Assim, ele interagiu com os amigos, e respondeu a pergunta da
professora. Ele também participou da atividade, embora certamente, não tenha dado
a resposta que a professora esperava.
4.3.1 Ouvindo as crianças falarem
Costumamos ouvir as crianças? Consideramos importante o que elas nos
dizem? As falas das crianças fazem sentidos para nós? O que elas revelam em suas
falas, em suas brincadeiras?
Matheus três anos e meio de idade dizia para Maria:
- Óia a minha baliga!”, levantando a camiseta;
34
A menina Maria dizia para outra criança:
- O meu pai compo cola cola pa tomá!”
Hora de pintar o papai no desenho. A menina Maria disse:
- Esse é o meu pai João. A professora pergunta:
- Qual é o nome do papai? Ela responde:
- É malido. (marido).
Miau, miau, au, au, hora de andar de quatro no chão e imitar
os bichinhos. Algumas crianças no chão da sala fazendo au,
au, e miau, miau, como se fossem bichinhos de verdade.
(DIARIO DE CAMPO,12/08/11).
As crianças estão sempre nos dizendo alguma coisa. Se expressando com
gestos, com palavras, com olhares, com sorrisos, com choros. Tudo isso nos diz
alguma coisa. Por isso, é importante organizar as rotinas garantindo momentos onde
as crianças possam falar o que desejam, tendo a certeza de que serão ouvidas, de
que elas são importantes para quem as ouve. Mostrar a elas que naquele momento
estamos ali, inteiros dispostos a ouvi-las. Ostetto (2004, p.89), diz que:
É necessário criar espaços e momentos de interlocução, partilhando a
palavra com as crianças, ouvindo suas histórias, deixando fluir suas
vivências, possibilitando que cada um e todos se transformem em
protagonistas de uma história que só pode ser coletiva.
Ainda nesse mesmo dia, o menino Rafael, de três anos e sete meses de
idade, rondava as meninas para tentar pegar a boneca que as meninas estavam
brincando. Até que houve um momento certo, e ele conseguiu tomar das meninas a
boneca. Ele ficou algum tempo balançando a boneca, colocou-a debaixo do braço,
ficou olhando para a mesma e brincou um bom tempo com a boneca na mão. Foi
possível observar que essa criança sentiu vontade de experimentar como era brincar
com a boneca, pois neste grupo, muitos meninos e meninas brincam juntos de
boneca.
Sobre as brincadeiras de bonecas, Kishimoto (2005, p.18), afirma:
35
Uma boneca permite à criança várias formas de brincadeiras. Desde a
manipulação até a realização de brincadeiras como “mamãe e filhinha”. O
brinquedo estimula a representação, a expressão de imagens que evocam
aspectos da realidade.
Fotos 8 - Menino brincando com a boneca
Fonte: Floripes Maria de Souza, 12/08/2011.
Em vários momentos, percebi que as crianças se utilizam desse brinquedo
que é a boneca para vivenciarem experiências parecidas com as ações dos adultos
com seus bêbês, então, quando brincam também imitam, ou ressignificam o que
observam como se estivessem ensaiando uma representação da realidade, ao seu
modo. Segundo Cerisara (2002, p. 154),
36
[...] Isso acontece porque tanto a atividade lúdica quanto a atividade criativa
surgem marcadas pela cultura imediatas pelos sujeitos com quem a criança
se relaciona. Em outras palavras, as crianças só puderam criar essa nova
síntese porque, em sua experiência anterior, já conheciam todos os
elementos envolvidos, sem o que não teriam podido inventar nada.
4.4 DAR VOZ AS CRIANÇAS DE 04 A 05 ANOS DE IDADE
Na roda de combinados com a professora da turma, muitas vozes, diversas
falas e uma infinidade de assuntos paralelos fazem parte das rotinas das crianças.
Algumas crianças não ficavam quietas enquanto a professora
tentava explicar que trabalharia neste dia o personagem Saci
Pererê. Então, ela disse:
- Se não ficarem quietos, vou chamar o pai aqui!
Um menino olhou para ela e falou:
- Meu pai não mora cumigo, ele mora na casa da minha vó.
Logo, outra criança disse:
- Intão, chama a bruxa aqui professora!
Outra criança falou:
- O Saci tem cachimbo. O meu pai também fuma cachimbo, ele
tá ficando velho.
Isto significa dizer que quando nos propomos a ouvir o que as crianças têm a
nos dizer, nem sempre vamos conseguir compreender, ou traduzir para a nossa
lógica adulta, pois elas conseguem misturar assuntos como família, bruxas, Saci
Pererê e velhice em segundos de conversas.
Segundo Ostetto (2000, p. 61), “Ver e ouvir, antes de falar, é um exercício
difícil, porém necessário, que auxilia o adulto/educador na compreensão de seu
papel na relação com crianças pequenas que tem contextos sociais e culturais
diferentes”.
As crianças nos revelam muitas coisas quando se expressam. Ter um olhar
mais profundo diante de seus comportamentos nos leva a perceber que gostariam
de uma maior atenção por parte dos adultos. Ouvir as crianças é importante para
que possamos compreender o porquê daqueles seus determinados comportamentos
ou atitudes, em suas mais profundas manifestações. É tentar enxergá-las
37
profundamente, buscando compreendê-las na sua essência, nos seus desejos,
sonhos e fantasias. E para isso, é necessário aprendermos a observar, escutar,
olhar atentamente. Só assim, é possível respeitar as crianças, como sujeitos de
direitos que são.
Através da observação e da escuta atenta e cuidadosa às crianças,
podemos encontrar uma forma de realmente enxergá-las e conhecê-las. Ao
fazê-lo, tornamo-nos capazes de respeitá-las pelo que elas são e pelo que
elas querem dizer. [...] para um observador atento, as crianças dizem muito.
(GANDINI; GODHABER, 2002, p.152).
Portanto, enxergar as crianças realmente não significa somente olhar para
elas e para as suas brincadeiras, mas nos transportarmos para o mundo infantil, na
tentativa de perceber e sentir a forma como as crianças vivenciam as coisas do
mundo.
4.4.1 Momentos de Carinho e Afetos
No caderno de “Critérios para um Atendimento em Creches que Respeite os
Direitos Fundamentais das Crianças” estão
definidos
alguns dos direitos
fundamentais que devem ser garantidos nas Instituições de Educação Infantil, entre
eles: “Nossas crianças têm direito à proteção, ao afeto e à amizade; Nossas crianças
têm direito a expressar seus sentimentos.” (CAMPOS, 2009, p. 24-25).
Este material, do MEC, teve sua primeira edição em 1995 e foi novamente
publicado em 2009, com o mesmo texto, no entanto, continua atual e um desafio a
ser posto em prática na sua totalidade. É possível perceber alguns avanços, mas
muito ainda temos que caminhar para garantirmos os direitos previstos neste
caderno, dentro das instituições de Educação Infantil.
Seria mais fácil se pudéssemos colocar em prática todos esses direitos,
dando afeto, amizade, aconchego, possibilitando que elas expressem seus
sentimentos, pois, algumas crianças, em muitos momentos se sentem carentes,
precisando de um abraço, um colo, um carinho. Foi o que registrei neste episódio a
seguir:
Isac se aproxima da professora, vem chegando devagarzinho
e deita a cabecinha sobre seu colo. Esse é um dos momentos
38
de troca de afeto entre o adulto e a criança, de transmitir
segurança a ela. A professora, então, abraça a criança e faz
carinho. Depois, a criança sai e vai brincar novamente e fica
feliz. (DIÁRIO DE CAMPO, 19/08/2011).
Foto 9- Aconchego da professora. Observação TCC 19/08/11
Fonte: Floripes Maria de Souza
4.4.2 Parque, Lugar de Troca entre os Pares
A cumplicidade entre as crianças está expressa na troca dos calçados. Estão
explícitas ali interações de afetos, amizades e também dos sapatos, onde o que é de
um também pode ser partilhado com o outro.
39
Foto 10- Crianças trocaram só um pé de seus calçados no parque
8
Fonte: Floripes Maria de Souza
Quando observei o momento no parque onde havia crianças de dois a seis
anos de idade brincando juntas e dividindo o mesmo espaço, percebi muito afeto
entre elas. Muitas ficavam bem perto, davam as mãos, abraçavam-se, beijavam e
até seguravam outras no colo, demonstrando que parque também é lugar de trocas,
de afetos, de aconchego e claro, de muitas brincadeiras divertidas. Conforme
Agostinho (2003, p. 9-10):
A alegria e a satisfação por ela manifestada nos fez entender o parque
como espaço da creche de grande expressão e encontro de liberdade. Nele,
as crianças encontram a chance instituída, permitida da brincadeira livre,
oportunidades para movimentos amplos, convívio/confronto com as
diferenças, lugar de exercitar o livre arbítrio, onde o adulto é fugazmente um
olho vigilante.
O parque é um lugar de aconchego junto às professoras, lugar de expressar
carinho entre os pares, de dar beijinhos e abraços gostosos, de colinho, de falar tudo
o que, muitas vezes, não pode ser manifestado em outros lugares.
8
Foto tirado durante o Estágio Educação Infantil, 2010, na mesma Instituição.
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Foto 11 - aconchego professora
Foto 12 - Em volta da professora.
Fonte: Floripes Maria de Souza
Fonte: Floripes Maria de Souza
Foto 13 - Beijo carinhoso
Foto 14 - abraço amigo
Fonte: Floripes Maria de Souza
Fonte: Floripes Maria de Souza
Foto 15 - Um colinho
Foto 16 - Amigas bem juntinhas
Fonte: Floripes Maria de Souza
Fonte: Floripes Maria de Souza
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Foto 17- Dividindo o mesmo balanço
Fonte: Floripes Maria de Souza
Fotos 18 - Parque lugar de princesa
Fonte: Floripes Maria de Souza
Fotos 19 - Parque lugar de Super-herói
Fonte: Floripes Maria de Souza
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Foto 20 - Parque lugar de faz de conta
Foto 21 - Parque lugar de compartilhar espaço
Fonte: Floripes Maria de Souza
Fonte: Floripes Maria de Souza
Fotos 22 - Parque lugar de fazer comidinha
Fonte: Floripes Maria de Souza
Foto 23 - Parque lugar para ver meus e-mails
Foto 24 - Parque lugar de ajuda mútua
Fonte: Floripes Maria de Souza
Fonte: Floripes Maria de Souza
Pude perceber que o parque é um lugar encantado, onde as crianças
interagem, compartilham, criam e ressignificam o que vivem no seu cotidiano. Elas
podem se sentir livre para correr, brincar, experimentar, viver as mais variadas
formas de expressar seus sentimentos, afetos, alegrias, saudades, disputas,
carências, e felicidades, enquanto compartilham o mesmo espaço com crianças de
diferentes idades.
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5 ORGANIZAR E PLANEJAR ESPAÇOS PARA E COM AS CRIANÇAS
As crianças, quando estão brincando, expressam o que pensam, gostam,
percebem acerca da sua vida e do mundo. Quando elas brincam, estão produzindo
culturas. De acordo com Rocha (2010, p.16) “[...] as crianças não só reproduzem,
mas produzem significações acerca de sua própria vida e das possibilidades de
construção de sua existência concreta”. Estão criando e recriando fatos,
interpretando o mundo e interagindo com seus pares. Estão, assim exercendo um
direito que é seu, na condição de cidadãs.
Isso engloba uma concepção de criança “[...] como sujeito social de direitos,
um ser completo em si mesmo, que pensa, se expressa por meio de múltiplas
linguagens, que produz cultura e é produzido numa cultura”. (ROCHA; OSTETTO,
2008, p. 104).
Na medida em que as crianças ampliam seu desenvolvimento e
compreendem o mundo a sua volta, o interesse delas acerca dos objetos em si
cresce. E é nas brincadeiras de faz de conta que as crianças ampliam seu
conhecimento do mundo, enquanto imitam os adultos, experimentam novos
desafios. Organizam e reorganizam seus pensamentos, têm uma compreensão do
mundo e da sociedade em que se encontram, e fazem isso enquanto interpretam os
mais diferentes papéis.
“No brinquedo, no entanto, os objetos perdem sua força
determinadora. A criança vê um objeto, mas age diferente em relação aquilo que vê”.
(VIGOTSKI, 1994, p.127).
Pensar as crianças enquanto sujeitos de direitos implica pensar as práticas,
as rotinas, os espaços organizados para elas. Neste sentido, quando pensamos em
organizar o espaço no cotidiano das crianças da Educação Infantil em uma
Instituição de Educação e cuidados coletivos, não podemos considerar somente o
espaço físico, devemos observar o grupo de crianças e suas necessidades.
Observar as crianças brincando, do que gostam de brincar ou não, que tipo de
brincadeiras organizam, os espaços que preferem para desenvolver a brincadeira, o
que mais as atrai para dar início a uma brincadeira. E, além disso, é fundamental
ouvir as crianças, dar voz a estes sujeitos de direitos, considerar importantes seus
pontos de vista, sua lógica própria de compreender e organizar os cotidianos.
É importante termos esse conhecimento para, então, a partir daí, garantir que
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as rotinas possam ser estruturadas para possibilitar a participação das crianças, que
possam contemplar a simultaneidade de ações deste grupo social, que sejam
desafiadoras, superando e transformando a ideia de uma rotina sempre igual e
repetitiva.
A forma de organizar o trabalho nesse espaço deve possibilitar o
envolvimento das crianças para que as mesmas tenham compreensão do modo
como as situações sociais são organizadas e, também com isso permitir que as
mesmas interajam entre si trocando conhecimentos, descobrindo juntas como se faz,
e trocando experiências umas com as outras. Assim, nos falam as autoras Craidy e
Kaercher (2001, p. 67):
[...] a ideia central é que as atividades planejadas diariamente devem contar
com a participação ativa das crianças garantindo as mesmas a construção
das noções de tempo e de espaço, possibilitando-lhes a compreensão do
modo como as situações sociais são organizadas e, sobretudo, permitindo
ricas e variadas interações sociais.
Planejar e organizar os espaços físicos para que as crianças possam
manifestar suas vozes e organizar suas brincadeiras é um dos papéis das
professoras de Educação Infantil, e para isso, é necessário conhecê-las melhor.
Saber que esse espaço não pode ser igual para todas as crianças, pois elas são
diferentes, têm saberes, desejos e culturas diferentes. É importante possibilitar às
crianças movimentos livres, autonomia, aconchego, liberdade para que possam
expressar seus medos, suas alegrias, seus sentimentos, enfim um ambiente onde
elas possam sentir-se seguras e partícipes.
Segundo Prado (1999, p.115):
Dessa forma, como espaço de vida, a creche deve proporcionar espaços
para brincar, em que adultos e crianças possam vivenciar, experimentar,
sentir, conhecer, explorar toda a riqueza que esta atividade encerra, entre
fantasias e histórias, danças, musicas, transgressões, imprevistos,
sociabilidades, invenções, convites a brincadeiras e outras manifestações
de expressão culturais de crianças pequeninas.
Ao planejar as rotinas para crianças na Educação Infantil, deve-se levar em
conta tudo o que a criança nos indica. Esses indícios são manifestados nas
brincadeiras, nas falas, nas ações, quando elas interpretam, vivenciam, choram,
sorriem, cantam, dançam, perguntam e também explicam as suas maneiras de
45
compreender as coisas que vivenciam. Com um olhar atento, observação, escuta, é
possível oportunizar a elas brincadeiras onde possam aprender e ampliar seus
repertórios de uma forma mais prazerosa, brincando. Para Ostetto (2000, p. 139):
Planejar na educação infantil é planejar um contexto educativo, envolvendo
atividades e situações desafiadoras e significativas que favoreçam a
exploração, a descoberta e a apropriação de conhecimento sobre o mundo
físico social. Para isso, é preciso que se pense em um planejamento do
tempo e do espaço a partir da criança e não do adulto.
A professora deverá estar muito atenta às brincadeiras das crianças,
oferecendo recursos e novos elementos que possam ampliar as atividades infantis,
buscando
desafiar
para
novos
conhecimentos,
instigando
a
curiosidade,
promovendo interações entre os pares, mediando conflitos que possam surgir,
Intervindo somente quando necessário, não interferir quando a atividade estiver
organizada e desenvolvida pelas próprias crianças. Assim observar o grupo
brincando será importante para se construir um futuro planejamento a partir das
crianças e para as crianças. Assim nos fala Machado (2005, p. 282):
O educador deve usar todas as oportunidades para fazer avançar o
raciocínio infantil para noções mais complexas, sendo sensível para
reformular com as crianças as explicações simplistas e erradas sobre os
fenômenos. Não se trata de “dar aulas” sobre temas, mas estar atento para
não deixar que certos significados se estruturem incorretamente. O
educador deve assumir a intencionalidade do ato educativo a cada situação
de interação.
Quando a professora propõe uma brincadeira intencional, como instrumento
de ampliação dos conhecimentos, deve primeiramente sentir como as crianças agem
e se envolvem, ver o modo como elas enxergam o mundo, imaginam, reproduzem,
recriam. Entrar nesse mundo de faz de conta e mergulhar com elas nessa aventura
de aprender e ensinar brincando. Neste sentido, Kishimoto (2005, p. 122) nos diz
que:
A concepção e capacidade lúdica do professor. Um professor que não sabe
e/ou não gosta de brincar dificilmente desenvolverá a capacidade lúdica dos
seus alunos. Ele parte do princípio de que o brincar é bobagem, perda de
tempo. Assim, antes de lidar com a ludicidade do aluno, é preciso que o
professor desenvolva a sua própria.
Planejar na educação Infantil para que se torne um espaço de emancipação,
liberdade e aconchego, que seja um lugar de múltiplas vivências, é preciso que as
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crianças sejam respeitadas nas suas variadas formas de cultura, desejos, saberes
vontades, fantasias e autonomia. É preciso, acima de tudo, que as crianças sejam
ouvidas. É importante aprender a observar e se utilizar dessa linguagem, que é o
faz de conta infantil. Assim, é possível ampliar os conhecimentos acerca das
crianças, compreender como elas interpretam o mundo a sua volta, como se
desenvolvem, suas necessidades afetivas, corporais, físicas, seu intelectual e forma
como interagem e se relacionam com as outras crianças e com o mundo que as
cerca. De acordo com Ostetto (2004, p. 90):
Assim, mais do que dar a voz e a vez às crianças, de forma que possam
participar e falar realmente de suas coisas, cabe ao professor investir nesse
processo, via linguagem, via diálogo, estabelecendo a polifonia, deixando
emergir a polissemia, rompendo com a interpretação única tradicionalmente
instalada nos espaços educativos.
Também, é preciso rever práticas pedagógicas que na maioria das vezes se
repetem como “reguladoras e homogêneas”, que não permitem as crianças
vivenciarem um direito seu, dentro desse espaço, que é brincar, inibindo sua
imaginação, regulando suas mais diversas manifestações de crianças, de criar,
recriar, interagir, de dar prioridade ao brincar. Essas práticas não são
emancipadoras e negam às crianças o direito de explorarem sua imaginação e viver
o faz de conta como crianças, nos seus mais variados papéis, em tempos e
momentos em que a professora planejou e, muitas vezes o brincar não conta, nesse
planejamento pedagógico. Preocupadas com essa questão, as autoras Batista et al
(2002, p. 55) nos alertam:
[...] Considero que a relevância desta reflexão consiste em “introduzir uma
atitude crítica aquelas práticas que são dadas à nossa experiência presente
como se fossem naturais, inquestionáveis e eternas.” É preciso que nos
incomodemos com as experiências vividas no cotidiano das instituições de
educação infantil, principalmente aquelas cuja tendência é a de uniformizar,
controlar, vigiar, conformar, ordenar, engessar o pensamento, a criatividade,
a ousadia, a espontaneidade, a ludicidade que constituem as dimensões
humanas.
Devemos pensar o planejamento a partir do que as crianças nos indicam.
Elas fazem isso em suas brincadeiras, utilizando suas vozes e as mais diferentes
linguagens. As crianças sempre nos dão dicas, nos falam o que querem e o que não
querem também. Termos que ter um olhar mais atento ao que as crianças nos
indicam e a partir daí, então, planejar as práticas cotidianas.
47
6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES AINDA PROVISÓRIAS
Quando decidi pelo tema da pesquisa já tinha certeza do que queria buscar,
pois, desde a 6ª fase do curso de Pedagogia, quando iniciei meu estágio em
Educação Infantil e passei a observar as crianças em suas brincadeiras, já fui me
encantando com a riqueza das vozes que as crianças expressam durante as
brincadeiras.
Buscando sempre um olhar mais profundo e atento aos comportamentos
infantis dentro da instituição, procurei ouvir as crianças, o que elas nos dizem em
suas mais variadas formas de linguagens.
Essa pesquisa revelou que as crianças nos dizem muitas coisas quando estão
brincando. Dizem quando estão felizes, tristes, carentes, que precisam ser ouvidas,
que precisam que se dê valor e atenção as suas falas.
A pesquisa mostrou também que quando brincam, as crianças ampliam seus
repertórios de brincadeiras e conhecimentos. Desenvolvem o campo intelectual,
físico, afetivo, emocional. Quando brincam, as crianças dão um significado todo
próprio, recriam, imitam, fazem de conta, vivem diferentes papéis que só poderiam
experimentar nas brincadeiras e no faz de conta.
Percebi que nas brincadeiras, diversos fatores vêm a contribuir para o seu
desenvolvimento, como o fator social, onde as crianças se relacionam com os pares,
trazendo para as brincadeiras coisas dos seus cotidianos, do meio social ao qual
estão
inseridas,
mostrando
diferentes
culturas
e
assim
ampliando
seus
conhecimentos para um desenvolvimento que será de extrema importância na
constituição do sujeito.
A pesquisa também trouxe à tona a importância de se ouvir as crianças, de ter
uma sensibilidade maior diante de suas expressões. Onde muitas vezes, tive que
observar as crianças e me transpor para seus mundos infantis, para poder sentir
como elas sentem, vivem o faz de conta, falam nas suas mais variadas linguagens e,
para enxergar isso, tudo olhei muitas vezes suas manifestações “Com olhos de
criança.” (TONUCCI, 1997).
A pesquisa reflete também sobre a importância de garantirmos os direitos das
crianças, expressos nos documentos legais e aponta também a necessidade de se
planejar, com intencionalidade, os espaços para as brincadeiras infantis dentro das
instituições. Sendo que as crianças criam seus próprios espaços para brincadeiras,
48
basta que lhe possibilitemos, dentro das rotinas, tempos e espaços para que elas se
organizem. Na sala, estavam sempre inventando um canto todo especial, com
cadeiras enfileiradas, ou almofadas amontoadas para fazer de conta que era uma
casinha.
Mas, com certeza, o local preferido da maioria delas, era o parque da
instituição. Lá observei todos os tipos de brincadeiras possíveis, sendo um lugar
onde as crianças corriam livremente, brincavam explorando o potencial físico,
experimentando e desafiando os brinquedos mais altos, por exemplo. E até subiam,
balançavam-se em uma pequena árvore que teimou e vingou no meio do parque.
As crianças brincavam de faz de conta, onde vi muitos super heróis,
princesas, mamães, que brincavam de casinhas e faziam comida „de mentira‟;
Presenciei muitas trocas entre os pares, conflitos onde elas próprias resolviam e
outros em que as professoras mediavam.
Observei muitos momentos de afeto entre as crianças e também com as
professoras; observei, na maioria das vezes, crianças felizes, mas também observei
crianças tristes, nesse lugar que nós adultas, às vezes, pensamos ser só alegria,
mas isso é um pensamento que procura homogeneizar os sentimentos infantis, e
não corresponde a realidade.
No parque, pude perceber que esse é um lugar onde as crianças podem criar,
recriar e vivenciar diferentes papéis, enquanto ampliam e desenvolvem todos os
seus potenciais que são necessários para a formação do sujeito.
Observei que no parque as crianças expressavam diversos sentimentos,
como de alegria, felicidade, e até momentos de tristeza, ou carência, saudades,
resignificavam experiências vividas nos seus cotidianos, imaginavam, exploravam os
espaços. Havia muita troca entre os pares, sentimentos de afeto, e liberdade de
correr livremente subindo nos brinquedos mais altos com capa de super herói,
sentindo-se com muito poder. É no parque que elas percebem esse poder de ser
muito grande e realizar o que desejam.
Na Educação Infantil, é fundamental que se ouça a voz das crianças, o que
elas estão querendo comunicar quando estão brincando, para que compreendendo
a lógica infantil, seja possível pensar proposições em que o ato de ensinar e
aprender se torne menos difícil e doloroso para as crianças, facilitando também a
ação e os planejamentos daqueles que estão assumindo a função de professoras e
professores nestes espaços, tornando as rotinas mais significativas e lúdicas.
49
Foto 25 - Despedida estágio Educação Infantil 2010
Fonte: Floripes Maria de Souza
50
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53
ANEXOS
ANEXO A – CARTA DE APRESENTAÇÃO EM CAMPO
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SOUZA, Floripes Maria de. A voz da criança é coisa séria