DA DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE
INCONSTITUCIONALIDADE NO ÂMBITO DOS TRIBUNAIS
Rogério Luiz Coelho1
Resumo
A proposta deste estudo é a de fornecer ao leitor uma compreensão das
diversas categorias nominativas utilizadas durante o processo de fiscalização
da constitucionalidade de uma lei ou ato normativo. Tal preocupação se
justifica, uma vez que, no tocante à sua aplicabilidade, as formas de
manifestação do controle envolvem várias questões que se entrelaçam no
estudo do tema, indo desde a indagação sobre qual o órgão encarregado de
apreciar a matéria, até o modo de manifestação e provocação. Para tanto,
analisamos os pressupostos para fiscalização da constitucionalidade dos atos
normativos,
bem
como
definimos
institutos
jurídicos
essências
para
compreensão do sistema de controle de constitucionalidade brasileiro.
Palavras chave: controle de constitucionalidade, pressupostos, conceitos
operacionais.
Abstract
The purpose of this study is to provide the reader with an understanding of the different
word categories used during the review of the constitutionality of a law or normative
act. This concern is justified, since, in terms of its applicability, the forms of
manifestation of control involve several issues that are intertwined in the study of the
subject, ranging from the question about which the body responsible for assessing the
matter, even the way demonstration and provocation. For this purpose, we analyze the
conditions for review of constitutionality of normative acts, as well as define legal
institutions
to
understand
the
essence
of
judicial
system
in
Brazil.
Keywords: judicial review, assumptions, operational concepts.
1
Professor da UNIPAC-Araguari.
1
1 Pressupostos do controle
É cediço que o controle de constitucionalidade tem por objetivo
primordial a defesa da Constituição.
A Constituição, por sua vez, dever ser considerada como um conjunto
estruturado, não de partes que se adicionam ou se somam, mas de
elementos e membros que se enlaçam num todo unitário, que tem, como
forma um complexo de normas; como conteúdo, a conduta motivada pelas
relações sociais (econômicas, políticas, religiosas, etc.); como fim, a
realização dos valores que apontam para o existir da comunidade; e
finalmente como causa criadora e recriadora, o poder2.
Estabelecidas
tais
premissas
questiona-ser:
Se
a
Constituição,
considerada como lei fundamental de um Estado, carece do sistema de
controle de constitucionalidade para se auto-proteger, seria legítimo, portanto,
concluir que todo Estado Constitucional, utiliza-se da fiscalização constitucional
para efetivar suas matrizes fundamentais?
A problemática da indagação exige sejam colocados e definidos, para o
exercício do controle, certos pressupostos básicos, haja vista que inexistindo
estes não a que se aceitar aquele como mecanismo de concretização
constitucional.
Para tanto, de maneira geral é possível elencar os seguintes requisitos:
a) existência de uma Constituição formal; b) compreensão da Constituição
como lei fundamental (rigidez e supremacia constitucionais; distinção entre leis
ordinárias e leis constitucionais); c) previsão de pelo menos um órgão dotado
de competência para o exercício dessa atividade.3
1.1 A Constituição Formal
A palavra Constituição abrange toda uma gradação de significados. Em
2
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 1999.
p.36
3
CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. 2. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. pág. 29.
2
sentido amplo, Constituição é toda a forma de um corpo; em nossa disciplina,
emprestando um sentido mais restrito, é a particular maneira de ser do Estado.
Do ponto de vista material, a Constituição é o conjunto de normas
pertinentes à organização do poder, à distribuição de competência, ao
exercício da autoridade, à forma de governo, aos direitos da pessoa humana,
enfim, tudo quanto for conteúdo básico referente à composição e ao
funcionamento da ordem política.4
Debaixo desse aspecto, não há Estado sem Constituição, visto que em
toda sociedade o poder encontra-se arranjado de certo modo, havendo, ainda
que apoiada em arquitetura rudimentar, uma determinada distribuição de
tarefas entre os diversos órgãos competentes da Coletividade Política.
Todavia, o controle de constitucionalidade exige mais do que uma
Constituição Material. Exige uma Constituição em que o processo de
elaboração ou modificação das normas constitucionais se diferencie da
categoria das normas ordinárias.
Esta especificidade traduz-se no quorum exigido para aprovação, na
existência de um órgão especial para elaboração, na iniciativa reservada. 5
Demanda, portanto, o reconhecimento de uma Constituição escrita, pois
esta é a forma que possibilitaria a realização de uma Constituição formal –
pressuposto do controle e que considera como elemento discriminatório o
regime jurídico das normas – cujos preceitos só podem ser modificados através
de um processo especial, mais difícil do que o exigido para elaboração das leis
ordinárias.
Nesse sentido, nos países que prescindem da noção de Constituição
escrita, como a Inglaterra – Constituição costumeira – não há razão para
aceitar o controle de constitucionalidade das leis, eis que não existindo
dualidade de processos para elaboração normativa a diferença entre lei
ordinária e lei constitucional inexiste, por conseguinte desaparece a
superioridade destas em relação àquelas.
Contudo, não se quer afirmar que a Constituição escrita é pressuposto
4
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 63.
5
FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. 4. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1999. p. 45.
3
suficiente para justificar uma operação de controle de constitucionalidade. É
indispensável, também, a compreensão da Constituição como lei fundamental,
visto que somente algo que se reconheça como fundamental para um Estado,
pode requerer a fiscalização da constitucionalidade das leis.
Por outro lado, compreender a Constituição como mandamento
essencial exige-se interligar pelo menos três conceitos básicos: a) rigidez
constitucional; b) supremacia constitucional; c) distinção entre lei constitucional
e lei ordinária.
1.2 A Constituição como Lei Fundamental
Foi a partir da existência de constituições escritas que se pode falar em
superioridade da lei constitucional frente à ordinária. Com isso, porém, não se
quer dizer que em todas as constituições do tipo escrito encontramos
superioridade. É necessária uma formal diferença entre leis constitucionais e
leis ordinárias, fato este que nos leva a distinção entre constituições rígidas e
flexíveis.
Diz-se flexível a Constituição cujo processo de reforma coincide com o
modo de produção da legislação ordinária, inexistindo diferença formal entre
norma constitucional e norma infraconstitucional.6
Já a rigidez constitucional traduz a necessidade de um processo
especial para reforma da Constituição, distinto e, em regra, mais oneroso e
complexo do que o necessário para a edição das leis infraconstitucionais.7
Portanto, o sistema rígido de Constituição, bem como a distinção entre
poder constituinte e poder constituído, formam o fundamento do princípio da
supremacia constitucional, uma vez que colocam a Constituição no topo de
ordenamento jurídico, servindo de embasamento de validade de todas as
demais normas.
Nesse ínterim, vê-se que só é possível verificar o controle em sistemas
de caráter constitucional escrito-rígido, já que só onde se haja estabelecido
uma formal diferenciação entre as leis constitucionais e ordinárias – de tal
6
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 152.
7
Idem, ibidem, p. 154.
4
forma a reconhecer a superioridade daquela frente a esta – é que existe a
necessidade de comprovar a adequação das primeiras frente às segundas.
O resultado de ordem prática da compreensão da Constituição como Lei
Fundamental traduz-se em uma superlegalidade formal e material. A
superlegalidade formal identifica a Constituição como a fonte primária da
produção normativa, ditando competências e procedimentos para a elaboração
dos atos normativos inferiores. E a superlegalidade material subordina o
conteúdo de toda a atividade normativa estatal à conformidade como os
princípios e regras da Constituição.
A inobservância dessas prescrições formais e materiais deflagra um
mecanismo de proteção da Constituição, conhecido na sua matriz norteamericana como judicial review, e batizado entre nós de controle de
constitucionalidade.8
1.3 Existência de um órgão competente
A instituição das regras acima expostas faz surgir a necessidade de se
ter um órgão para controlar a constitucionalidade das leis. Ocorre, porém, que
com essa necessidade surgiu um grande problema que tem dividido os
Estados cultores das Constituições rígidas: A que órgão confiar o controle da
constitucionalidade das leis?
Conforme a natureza do órgão encarregado de exercê-lo, o controle
pode ser classificado em político, jurisdicional ou misto.
No controle político, a verificação de compatibilidade das normas com a
Constituição Federal é reservada a um órgão sem poder jurisdicional, ou seja,
que não compõe a estrutura do Poder Judiciário, geralmente uma corte
constitucional autônoma, como por exemplo na França.
O controle jurisdicional, por sua vez, é o exercido por órgãos integrantes
da estrutura do Poder Judiciário. No Brasil, apesar dos Poderes Legislativo e
Executivo realizarem a verificação de compatibilidade, a função precípua é do
Judiciário, razão pela qual é o sistema por nós adotado.
8
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição. São Paulo: Saraiva, 1996. pág. 153.
5
De se observar que nesse sistema a identificação do órgão jurisdicional
responsável depende do tipo de controle. No controle concentrado, o órgão é o
STF, quando o ato normativo for questionado em face da Constituição Federal.
No controle difuso, todo e qualquer juiz o tribunal possui competência para
declarar a inconstitucionalidade das normas.
Já no controle misto, temos certas categorias de leis se submetendo ao
controle político e outras ao controle jurisdicional. É o controle adotado na
Suíça, já que no referido país as leis locais são submetidas ao controle do
Poder Judiciário, enquanto as leis federais ficam a cargo da Assembléia
Nacional.9
2 Conceito de Inconstitucionalidade
O transitar pelo terreno da fiscalização da constitucionalidade exige o
domínio de alguns conceitos a todo momento utilizados. Bem por isso, “convém
precisar a noção de inconstitucionalidade e oferecer um panorama a respeito
de sua tipologia”.10
Nesse sentido, traz-se à baila os irretocáveis ensinamentos de Regina
Maria Macedo Nery Ferrari:
“Concernente à supremacia constitucional, isto é, ao fato de
que a Constituição é a lei fundamental da ordem jurídica, ou,
ainda, que para uma norma ser válida necessita buscar sua
validade
na
norma
superior
–
de
tal
forma
que,
sistematicamente escalonada em um ordenamento jurídico, a
sua unidade reduz-se à conformação de todo o ordenamento
jurídico á lei fundamental, que, considerada como a de maior
escalão, é orientadora da produção de todas as demais normas
do sistema –, encontra-se a impossibilidade de as normas
inferiores, que buscam validade nas normas superiores,
9
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. pág. 51
10
CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. 2. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 35.
6
contrariem estas e conseqüentemente a Constituição.11
Chega-se dessa forma à noção de inconstitucionalidade (situação ou
estado decorrente de um ou de vários vícios), a qual a maioria da doutrina
costuma definir como a desconformidade do conteúdo veiculado pelo ato
normativo
como
algum
preceito
ou
principio
constitucional
(inconstitucionalidade material), ou vício no devido processo de criação dos
atos infraconstitucionais. (inconstitucionalidade formal).12
Por outro lado, o vício de inconstitucionalidade emanado pelo Poder Público
pode estar relacionado com uma ação ou com a inexistência dessa ação.
A primeira, denominada de inconstitucionalidade por ação, resulta da
prática de ato que, por qualquer de seus elementos, viola a Constituição.
Já a inconstitucionalidade por omissão advém da inércia ou do silêncio de
qualquer órgão do poder, que deixa de praticar o ato exigido pela
Constituição.13 Nesse sentido, a Lei Maior, obra do poder constituinte, só será
efetivamente cumprida quando da atuação dos poderes constituídos no sentido
de preencher os espaços deixados à sua atuação. Essa atuação do poder
constituído pode significar a edição de uma lei, como a realização de qualquer
medida necessária à efetiva aplicação e cumprimento da Constituição. Na
verdade, representa um poder-dever constitucionalmente determinado.14
2.1 O controle e suas formas de manifestação
O objetivo deste tópico é proporcionar ao leitor uma visualização e
compreensão das diversas categorias nominativas utilizadas durante o
processo de fiscalização da constitucionalidade de uma lei ou ato normativo.
Tal preocupação se justifica, uma vez que, no tocante à sua
11
FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. 4. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1999. p. 56.
12
CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. 2. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. pág. 36.
13
FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. 4. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1999. p. 57.
14
Idem, ibidem, p. 219.
7
aplicabilidade, as formas de manifestação do controle envolvem várias
questões que se entrelaçam no estudo do tema, indo desde a indagação sobre
qual o órgão encarregado de apreciar a matéria, até o modo de manifestação e
provocação.
Englobando as diversas formas de manifestação do controle de
constitucionalidade, Clèmerson Clève15, Gilmar Ferreira Mendes16, Gomes
Canotilho17, José Afonso da Silva18, Luís Roberto Barroso19, Paulo Bonavides20
e Regina Maria Macedo Nery Ferrari21 oferecem elementos que permitem
organizar o seguinte quadro:
I – QUEM CONTROLA: os sujeitos do controle (natureza do órgão exercente):
1. controle político;
2. controle jurisdicional:
a) sistema difuso ou americano
b)sistema concentrado ou austríaco
3. misto
II – O QUE SE CONTROLA: o objeto do controle:
1. ação do Poder Público
2. omissão do Poder Público
15
CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. 2. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
16
MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
17
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 6. ed. Coimbra: Almedina, 1993.
18
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 1998.
19
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição. São Paulo: Saraiva, 1996.
20
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1996.
21
FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. 4. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1999.
8
III – COMO SE CONTROLA: o tempo do controle (momento de sua
realização):
1. controle preventivo (ou a priori);
2. controle repressivo (sucessivo ou a posteriori)
IV – COMO SE CONTROLA: o modo de controle:
1. controle por via incidental;
2. controle por via principal;
3. controle abstrato e controle concreto:
4. controle por via de exceção e controle por via de ação
Nesse sentido, para defender a supremacia constitucional contra as
inconstitucionalidades existem três sistemas de controle de constitucionalidade:
o político, o jurisdicional e o misto.
Segundo José Afonso da Silva “o Controle político é o que entrega a
verificação da inconstitucionalidade a órgãos de natureza política, tais como: o
próprio Poder Legislativo, solução predominante na Europa no século passado;
ou um órgão especial, como o Presidium do Soviete Supremo da ex-União
Soviética (Constituição da URSS, art. 121, n.4); e o Conseil Constitutionnel da
vigente Constituição francesa de 1958 (arts. 56 a 63)”.22
O controle jurisdicional é o sistema em que a apreciação será sempre
feita pelo Poder Judiciário que, de resto é o órgão a quem compete a última
palavra sobre o Direito. Nestes termos, o próprio art. 5º, XXXV, expressamente
consagra que “a lei não excluirá da apreciação do judiciário lesão ou ameaça
de Direito”.
Não se discute qual seja a lesão a Direito, ou que Direito seja lesionado,
basta que alguém alegue violação ou ameaça a Direito seu e estarão abertas
as portas do Poder Judiciário para a apreciação. Trata-se de sistema que teve
22
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 51.
9
origem nos Estados Unidos e é o adotado pelo Brasil.
Por outro lado, o controle jurisdicional concebe outras duas formas de
sistema: sistema difuso ou americano e o sistema concentrado ou austríaco.
No difuso a competência para fiscalizar a constitucionalidade das leis é
reconhecida a qualquer juiz chamado a fazer a aplicação de uma determinada
lei a um caso concreto submetido à apreciação judicial23.
Já no sistema concentrado a competência para julgar definitivamente
acerca da constitucionalidade das leis é reservada a um único órgão, que
concentra o exercício no Supremo Tribunal Federal e nos Tribunais de Justiça
dos Estados-membros.
O misto, por sua vez, “realiza-se quando a Constituição submete certas
categorias de leis ao controle político e outras ao controle jurisdicional, como
ocorre na Suíça, onde as leis federais ficam sob controle político da
Assembléia Nacional, e as leis locais sob o controle jurisdicional”.24
De mais a mais, é imperativo ressaltar que a violação da Constituição
não se configura apenas pela ação dos Poderes Públicos. Tanto se ofende o
Direito fazendo o que ele proíbe como não fazendo o que ordena. Assim que
as inconstitucionalidades podem ser cometidas tanto por ação quanto por
omissão do Poder Legislativo, ou seja, quando esta elabora legislação
infraconstitucional que afronta a Constituição, ou quando fica inerte, isto é, não
elabora a legislação infraconstitucional exigida pelo texto constitucional25.
Outra forma de manifestação do controle pauta-se pelo ingresso da lei
ou ato normativo no ordenamento jurídico. Assim, enquanto o controle
preventivo pretende impedir que alguma norma maculada pela eiva da
inconstitucionalidade ingresse no ordenamento jurídico, o controle repressivo
busca dele expurgar a norma editada em despeito à Constituição.
Por derradeiro, observa-se que para atacar tanto as ações quanto
omissões dos Poderes Públicos, o controle judicial ou jurisdicional da
23
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 6. ed. Coimbra: Almedina, 1993. pág. 964.
24
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. pág. 51.
25
BESTER, Gisela Maria. Cadernos de direito constitucional: parte I: Teoria constitucional. Porto Alegre:
Síntese, 1999. pág. 112.
10
constitucionalidade dos atos normativos estatais apresenta duas modalidades,
ou seja, assume forma bipartite:
a) Controle de Constitucionalidade Difuso, Concreto, Incidental, por via de
Exceção ou Indireto.
Este modelo de Controle da constitucionalidade surgiu nos EUA, em
1803, por obra do juiz John Marshall, no famoso caso Marbury versus Madison.
É conhecido lá como Judicial Review, contemplando o principio do Stare
Decisis (estando as coisas assim), em que embora não se preveja um órgão
judicial especialmente destinado ao controle, os órgãos judiciários inferiores
estão vinculados às decisões preferidas pelos Tribunais Superiores. Baseia-se
no critério de interpretação das leis pelos juizes conforme o postulado “lei
superior derroga lei inferior”.
Vale dizer que com este modelo é que nasceu toda a teoria a respeito de
controle de constitucionalidade amplamente falado. Foi acatado em 1890,
ainda pela Constituição Provisória e se oficializou na Constituição Republicana
de 1891, perdurando até hoje.
Diz-se
difuso
porque
é
permitido
a
qualquer
órgão
judicial,
independentemente de sua hierarquia, ou seja, a competência para apreciar a
matéria constitucional não se limita a um único órgão, mas se estende a todos.
Diz-se concreto porque é suscitado em um caso concreto (situação especifica)
que está sob a apreciação do Poder Judiciário. Incidental por se um incidente
no processo principal (surge como um incidente em relação à causa principal).
Diz-se, por fim, por exceção e indireto, porque o arguente age apenas em
defesa de seu interesse, isto é, não é arguido em uma ação específica e
proposta diretamente para tal, mas enquanto matéria de defesa (exceção
processual) em um pleito em andamento.26
Desse modo, este sistema é feito no caso concreto por qualquer órgão
do Poder judiciário, de qualquer instância, nos processos de sua competência.
A questão constitucional não é objeto da causa, apenas surge como um
incidente lógico a ser resolvido sem o que não se pode passar ao mérito.
26
BESTER, Gisela Maria. Cadernos de direito constitucional: parte I: Teoria constitucional. Porto Alegre:
Síntese, 1999. p. 116.
11
Observa-se,
ainda,
que
no
controle
difuso,
só
se
declara
a
inconstitucionalidade de uma norma pelo voto da maioria absoluta dos
membros dos tribunais ou dos respectivos órgãos especiais (art. 97 da CF/88),
valendo esta regra também para o Supremo Tribunal Federal. Mencionado
dispositivo, na realidade, trata do Princípio da Reserva de Plenário, o que
significa que o órgão fracionário do Tribunal (Turma, Câmara, Seção) não
poderá declarar a inconstitucionalidade da lei.27
b) Controle de Constitucionalidade Concentrado, Abstrato, Principal, por
via de Ação ou Direto.
Seu surgimento oficial deu-se na Constituição Austríaca de 1º
de outubro de 1920, com a criação de uma Corte Constitucional com base nas
idéias de Hans Kelsen, sendo que tal Corte era incumbida de apreciar a
legitimidade dos atos estatais face à Constituição28.
Foi inserido no Brasil em 1965, pela Emenda Constitucional nº.
16/65 com competência exclusiva para a sua propositura atribuída ao
Procurador-Geral da República e julgamento pelo Supremo Tribunal Federal,
sendo que inicialmente se realizava por meio de “Representação de
Inconstitucionalidade” e não por uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, o
que se veio a ser instituído em 1988, com a promulgação da atual Constituição
Federal.
Importante
esclarecer
que
o
controle
concentrado
de
constitucionalidade baseia-se em uma doutrina contraposta aos fundamentos
do controle difuso, especificamente pelo fato de que neste, qualquer juiz ou
Tribunal, ao interpretar o direito, deve primar pela prevalência da Constituição
sobre qualquer lei que lhe seja contraria e naquele, ao contrario, é defeso, aos
juizes comuns apreciar a constitucionalidade das leis, eis que esta tarefa passa
27
CAPEZ, Fernando. Direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Edições Paloma, 2000. p. 51.
28
Idem, ibidem, pág. 114.
12
a ser reservada somente a um órgão (art. 102, I, CF/88)29.
De outra forma, diz-se abstrato porque não leva em conta um
caso ou situação concreta, mas sempre em relação à lei considerada em tese,
abstratamente; Diz-se principal, pois existem ações específicas para tal, nas
quais a argüição de inconstitucionalidade é o objeto em discussão; Por fim, o
sistema se diz por ação porque é feito exclusivamente com a propositura de
ação direta de inconstitucionalidade.
OBS: Quadro Comparativo:
CONTROLE DIFUSO (OU ABERTO)
(MATRIZ AMERICANA)
EUA - 1803
CONTROLE CONCENTRADO OU RESERVADO
(MATRIZ AUSTRÍACA)
Áustria - 1920
→ Todos os órgãos do Poder Judiciário realizam
→ Apenas o órgão de cúpula do Poder Judiciário
(sejam Juízes ou Tribunais)
realiza (no âmbito federal, STF; no âmbito estadual
o Tribunal de Justiça)
29
BESTER, Gisela Maria. Cadernos de direito constitucional: parte I: Teoria constitucional. Porto Alegre:
Síntese, 1999. pág. 115.
13
→
Ocorre pela Via Incidental
→ Ocorre pela Via Principal (de ação direta)
(de defesa ou exceção)
(ADI GENÉRICA, ADI POR OMISSÃO, ADC, ADPF)
→ Analisa-se o caso concreto (controle concreto)
→ Analisa-se a lei em tese (controle abstrato)
(processo subjetivo)
(processo objetivo)
Referências bibliográficas
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição. São Paulo: Saraiva,
1996.
BESTER, Gisela Maria. Cadernos de direito constitucional: parte I: Teoria constitucional.
Porto Alegre: Síntese, 1999.
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1999.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 6. ed. Coimbra: Almedina,
1993.
14
CAPEZ, Fernando. Direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Edições Paloma, 2000.
LÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. 2.
ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade.
4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.
MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional. 15. ed. São Paulo: Malheiros,
1998.
15
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